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O Paraíso

Entrada do Céu

Capítulo XLVI

Oculus non vidit, nec auris audivit, nec in cor hominis ascendit quae praeparavit Deus iis qui diligunt illum – “O olho não viu, nem o ouvido ouviu, nem jamais veio ao coração do homem o que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1Cor 2, 9)

O paraíso! O paraíso!… Ah! Deus meu! Ao só pensar nesta bela mansão, minha alma se inunda de consolações, meu coração desfalece de alegria e de amor, e meus olhos se convertem em duas fontes de lágrimas. Ao pensar no paraíso compreendo que não há proporção entre as penas desta vida e a recompensa que na outra nos está preparada.

Ao pensar no paraíso, os sofrimentos tornam-se-me delicias, as humilhações e desprezos revestem-se-me de encantos, e as mais pesadas cruzes me parecem fazer-se leves.

Ó paraíso! Qual é o homem que nos ensinará o que tu és?… David exclama: Coisas gloriosas se nos tem dito de ti, cidade de Deus! Oh! Quão amáveis são teus tabernáculos! E nada mais diz. São Paulo é arrebatado até ao terceiro Céu, este vai sem dúvida fazer-nos um quadro magnífico do que viu. Mas não. O que eu vi, diz numa de suas epistolas, não pode pintar-se, língua nenhuma do mundo pode explicar a beleza do paraíso, nem as delicias que nele se gozam. Tudo o que eu posso dizer é que “nem os olhos viram, nem os ouvidos ouviram, nem jamais o coração do homem concebeu o que Deus preparou para os que o amam”.

Assim falia o grande apostolo. E depois disto não sou eu bem temerário em ousar pôr-me a pintar as belezas e delicias do Céu? Não é isto parecer-se com um menino criado nas florestas selvagens, que querendo dar uma ideia da magnificência dos palácios dos nossos reis, os comparasse com a miserável cabana onde nasceu?… Sim, meu Deus, reconheço minha temeridade e toda a minha impotência; contudo sempre falarei. Um infeliz exilado acha sempre prazer em falar da sua pátria, embora ele saiba que tudo quanto d’ela diz está longe de chegar à realidade. Falarei pois.

Oh! Que doce mansão é a celeste Jerusalém! Seus muros são construídos das pedras mais preciosas, suas portas refulgem com o brilho das pérolas mais finas, suas ruas e praças são calçadas de ouro mais puro, seus jardins, esmaltados de flores, oferecem o mais risonho espetáculo. Ali continuamente retumbam palavras de alegria, ali incessantemente se entoam cânticos de jubilo, ali se renovam sem interrupção brados de regozijo, ali se fazem sempre ouvir os concertos dos espíritos Bem-aventurados. Ali o balsamo e os perfumes derramam os mais doces odores, ali reina uma paz, um repousou que excede a todo o sentimento, uma calma acima de toda a imaginação, uma claridade eterna, uma união formada por um só e mesmo espirito que anima tudo, uma firme segurança, uma eternidade segura, uma tranquilidade perpetua, uma agradável felicidade, doçura inefável, um delicioso encanto; ali os justos brilharão como o sol no reino do seu pai. Oh! Que dita assistir aos coros dos anjos e estar para sempre em sociedade com os apóstolos e mártires, com os confessores e as virgens e sobre tudo com a gloriosa Virgem Maria, Mãe de Deus! Que felicidade ver-se para sempre exemplo de tenor, de tristeza, de aflições, de penas, de dissabores, de trabalho, de embaraço, de desgostos; numa palavra, de toda a indigência! Mas que abundancia de consolações! Que multidão de delicias, que excessos de alegria! Que vasta extensão, e que abismo de prazer ver a gloria inefável da Trindade, desse ser imenso que não se pode compreender, dessa luz doce e arrebatadora que nunca se poderá amar assaz; ver na Sião o Deus dos deuses, o Senhor dos senhores, vê-lo não num espelho nem em enigma, mas face a face, ver enfim a humanidade santa de Jesus Cristo em seu estado de gloria!

Se cá na terra sentimos tanto enlevo ao considerar a grandeza, a diversidade, as resoluções, a brilhante claridade dos astros, a deslumbrante alvorada da lua, o resplendor e raios do sol, a luz derramada nos ares, ao ver a variedade das aves, das flores, das paisagens, das cores; ao escutar o som harmonioso de belas vozes e a doce consonância dos instrumentos; ao aspirar o odor das flores e dos perfumes; ao nutrirmo-nos de delicioso? Manjares, se tudo isto deleita a nossa alma e a penetra de alegria, qual não será a torrente de deleites de que será inebriada esta alma, quando poder ver, escutar, sentir, gostar, possuir plenamente Aquele que é a beleza e a bondade mesma, o principio d’onde emana tudo o que há de belo e bom no universo, o manancial fecundo de todas as perfeições, do qual tudo o mais não passa de um fraco arroio? Ah! Compreendo o que é o estado de um homem ressuscitado, quando entra na sua bem-aventurada eternidade. É como a primavera, quando, sucedendo aos rigores do inverno, vem renovar a natureza, adornar o céu e a terra, encher de regozijo todos os corações. Mas que digo? É maior a diferença entre estas duas coisas do que entre as espessas trevas da mais cerrada noite e resplendor do sol do meio dia. Quão deliciosa é pois essa morada da celeste Jerusalém, em que tudo o que pode deleitar se encontra, e d’onde tudo o que poderia molestar está banido! Quanto é deliciosa, pois nela tem-se a felicidade de louvar o Todo Poderoso por todos os séculos dos séculos.

Ó bem-aventurada mansão toda resplandecente de gloria! Quanto amo a tua beleza! Como te amo, querida morada da gloria do meu Senhor e meu Deus! Meu coração te deseja com ardor, e por ti suspira sem cessar. Santa Jerusalém, estancia toda deslumbrante de luz, minha maior felicidade é pensar em ti; por ti desfaleço de amor, porque só tu podes deixar-me ver o meu Deus face a face e tal qual é. Não poder eu hoje mesmo entrar no recinto de teus muros, para ai amar o meu doce Salvador quanto eu possa! Quando verei acabar-se esta peregrinação tão triste que já tem durado de mais? Quando me verei livre deste exilio que me retém num tal afastamento do meu Senhor e meu Deus? Ó Jesus! Tanto tempo errei longe de vós qual ovelha desgarrada; mas vós tivestes de mim compaixão, e me reconduzistes ao vosso aprisco. Eu vos suplico, em nome da vossa misericórdia, tende piedade da minha miséria e minhas lágrimas, e dai-me o vosso paraíso afim que vos ame como vós mereceis. Ai! Eu quero amar-vos muito, muito, e morro de dor por vos ter amado tão pouco e tão mal.

Tem paciência, alma minha. A voz do nosso Jesus se faz ouvir; disse que o nosso exilio não durará sempre, e que nossa peregrinação terá um termo. Soframos pois com coragem todas as misérias na vida; sejamos sempre fieis a todos os nossos deveres; exercitemo-nos a todo o instante na pratica das virtudes, e levemos corajosamente a nossa cruz até ao termo da nossa carreira: lá está a nossa recompensa. E que recompensa! Lá está o nosso bom Jesus com uma coroa de gloria: que doce acolhimento nos não fará ele?

Portas do céu, abri-vos! Deixai-me ver por alguns instantes o que se passa no recinto de Sião. Quero ser testemunha da entrada triunfante de uma alma fiel, quero assistir á sua coroação. Abri-vos, portas do céu!

Eis chega uma alma pura e revestida da veste da inocência; ela traz algumas gloriosas cicatrizes, testemunhos de sua coragem nos combates: ela vem ornada de pedras preciosas, merecimentos que adquiriu na terra pelos sofrimentos, pela resignação com a vontade de Deus, e pela felicidade a todos os seus deveres. Os pecados que cometeu e que tão generosamente reparou pela penitencia, esses mesmos contribuem ainda para realçar a sua beleza. Adianta-se conduzido por seu anjo da guarda.

“Entra, lhe diz este, alma querida do soberano Senhor: este é o lugar do teu repouso eterno”

Ó Deus! Qual não é a comoção desta alma ao ver-se na bem-aventurada pátria pela qual ela tanto suspirava! E que olhares ela lança sobre todos os objetos que a extasiam! que riquezas! Que resplendores! que magnificência!

Os anjos e santos vêm ao seu encontro e lhe dizem:

“Bem-vinda sejais”

Para logo ela se vê cercada de seus pais, de seus amigos, de seus conhecidos, que a felicitam da sua felicidade; ela reconhece um pai, uma irmã, um marido, que a precederam nesta feliz cidade; ela reconhece os santos patronos que lhe prodigalizaram os seus socorros enquanto estava ainda na terra; reconhece os santos e santas por quem teve especial devoção; reconheço-os, e experimenta tal alegria que língua nenhuma humana o poderia exprimir.

E ela lá vai atravessando esta inumerável multidão de Bem-aventurados, acompanhada sempre do seu anjo da guarda, que a conduz á Santíssima Virgem. Ah! Quem poderia dizer a surpresa, a alegria, a ternura que esta pobre alma experimenta ao ver pela primeira vez a augusta Mãe de Deus, a doce Maria, a quem ela tanto amava na terra, a quem ela tantas vezes chamava a sua Mãe, a sua patrona, a sua amável Senhora? Quem poderia dizer os transportes do seu reconhecimento, quando ouve Maria fazer-lhe a enumeração de todas as graças que lhe obteve? Ela lança-se aos seus pés e com transporte os beija. Mas a Santa Virgem levanta-a, estreita-a ternamente contra o coração e a apresenta a Jesus.. Jesus está assentado sobre um trono brilhante de glória. Apenas apercebe a recém-chegada, lhe diz com o acento da mais arrebatadora bondade:

“Levanta-te, apressa-te, amada minha, cuja beleza me encanta; vem depressa. O inverno passou, as molestas chuvas deram lugar a agradáveis rocios, as flores começam a aparecer; a estação de podar chegou, já nos campos se ouve a rola, já as figueiras brotam seus botões e suas tolhas, já a vida está florida e começa a espalhar seu agradável aroma; apressa-te pois, ó minha querida, a tua beleza me fascina!! Ó minha cara pomba! Tu saíste ao fim desses velhos pardieiros onde fazias tua morada. Mostra-te a meus olhos, e que eu ouça a tua voz; a tua voz me é doce, a tua face me encanta. Vem pois mais uma vez, pomba minha sem macula, tu que eu escolhi por minha esposa querida; vem, no teu coração estabeleça eu o meu trono: vem gozar da felicidade suprema que te prometi; vem depois de tantos perigos, tantas penas, tantos trabalhos, vem partilhar com meus anjos as delicias do Senhor teu Deus; vem vê-lo enfim sem véu, e ama-lo por toda a eternidade”

Então Jesus a abraça, abençoa-a, põe-lhe na cabeça uma coroa brilhante, e a assenta sobre o trono que lhe preparou. Os anjos e santos aplaudem ao seu triunfo, e clamam:

“Assim será coroado todo o homem que até á morte for fiel a Jesus! Benção, e gloria, e sabedoria, e ações de graça, e honra, e virtude e fortaleza a nosso Deus pelos séculos dos séculos”

Amem. Vãos triunfos da terra, falsas honras, fementida gloria deste lugar d’exilio, desaparecei, desaparecei. Nunca, nunca vós sereis objeto de meus desejos, assim o espero da misericórdia do meu Jesus: nunca vós ocupareis o menor lugar no meu coração. Desaparecei: vós para mim vos convertestes em fardo depois que eu entrevi a gloria solida, verdadeira, eterna, que no céu me está reservada. Desaparecei: vossos encantos são falazes, são misturados de amargura vossos prazeres. Eu só quero o céu, porém lá estarei com o meu Jesus, lá amarei ao meu Jesus, lá serei coroado pelo meu Jesus.

Oh! Que bom não será estar no paraíso ao pé de Jesus e Maria! Ali o coração está plenamente satisfeito; todos os meus desejos estão repletos. Ali, não mais uma lágrima, não mais uma dor, não mais tristeza, não mais aflições; ali não mais doenças, não mais receios da morte. Deus mesmo enxugará as lágrimas dos seus eleitos. Ali viverei na sociedade dos anjos e santos.

Ó céu! Se cá na terra é tão doce conversar de Deus com alguns verdadeiros amigos, se é tão doce falar da esperança de um dia o amar eternamente no paraíso, se é doce comunicar-se mutuamente as alegrias que no serviço de Jesus se experimentam e animar-se a ama-lo sempre mais, que será vê-lo no meio dessa gloriosa sociedade de santos, conversar familiarmente com cada um deles, falar de Deus em presença do mesmo Deus, recordar-se dos perigos passados, das graças que recebemos, e dizer uns aos outros: Somos felizes para sempre! Se é tão doce tornar a ver uma mãe depois de um ano da ausência, que será torná-la a ver sem temor de jamais nos separarmos dela!

Se é tão doce na terra partilhar as penas de um amigo, o que será partilhar seus prazeres no paraíso? Ah! Brilhante sociedade dos santos, quando serei eu admitido em teu seio!!!

Ali verei o meu Deus tal qual é. Há nada que possa comparar-se a esta felicidade! Ó meu Deus! Fazei-me compreender o que vós sois, e eu compreenderei que felicidade se experimenta contemplando a vossa bondade.

Vi as mais mimosas flores, contemplei-as em toda a gala de seus atavios; admirei a delicadeza de seu tecido e a variedade das suas cores; cheio de admiração me disse a mim mesmo: Belas são as folhas da primavera!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Bela é a terra que por morada nos foi dada. Seus prados estão esmaltados de flores, suas montanhas estão cobertas de verdes pâmpanos caindo em festões, seus outeiros estão carregados de vinhas e seus caminhos estão orlados de odoríferas plantas. Árvores de todas as espécies a ornam e com seus frutos a enriquecem; rios saídos de seu seio levam a toda a parte a fertilidade e a abundancia. Sim, bela é a terra que habitamos!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Bela é uma floresta com suas copadas arvores e com suas frescas sombras. Tudo ali é calma, tudo ali é paz: somente ali se ouvem, ou os gorjeios das aves ou o murmúrio do regato que cai em cascata da montanha, ou o leve sussurro das folhas pelos zéfiros agitadas. Bela é uma floresta com sua doce solidão!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Bela é uma fértil campina, ou a mão da primavera ali estenda um verde tapete de mil flores nascentes esmaltadas, ou o estio lhe doure as espigas, ou o inverno a envolva num véu de deslumbrante alvura, e a geada prendendo-se ás arvores as mude noutros tantos penachos que majestosamente se elevam até ao céu!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Belo é o vasto mar, sob qualquer aspecto que se nos ofereça. Ora suas ondas estão calmas, e rolam suaves umas sobre outras: então é um espelho que reflete o doce azul do firmamento. Ora elas se irritam e com furor se arremessam até ás nuvens; os raios do sol penetram e divertem-se nestas vagas amontoadas, e dir-se-iam montanhas de fogo que vem quebrar-se contra os rochedos da praia. Oh! Belo é o vasto mar!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Bela é a aurora, quando ela aparece a anunciar-nos a chegada do astro do dia, quando ela orna o oriente das mais vivas e mais riscas cores, e quando ela no-lo mostra todo em fogo. Bela é a aurora surgindo!… mas, ó meu Deus, é isto a vossa beleza?

Bela é a luz do sol, que cada dia se lança qual gigante em sua carreira, e vai publicar em todo o universo a gloria do seu Senhor!… mas, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Bela é a tarde de estio; de um lado o sol ocultando seus últimos raios sob nuvens de franjas de ouro e de azul; do outro a lua elevar-se majestosa no horizonte: e em toda a extensão da abobada celeste miríades de estrelas resplandecentes! Que espetáculo! Quantas vezes enterneceu a minha alma até a fazer derramar abundantes lágrimas! Quantas vezes arrancou do meu coração esta exclamação do Profeta: Senhor, quanto as vossas obras são belas!… mas ainda uma vez, ó meu Deus! É isto a vossa beleza?

Não, não: vossa beleza é toda espiritual, e nada neste mundo pode dar dela justa ideia. Ah! Meu Deus! Se vossas obras são tão belas, tão admiráveis, tão arrebatadoras, o que não deveis ser vós mesmo? Se há tanta alegria pura em contemplar as maravilhas da natureza, em que somente pusestes a sombra da vossa magnificência e perfeições, que será ver-vos face a face?… Detenho-me: minha pena não pode descrever a felicidade de vos ver e de vos amar.

Ó bem-aventurada mansão da celeste cidade! dia luminoso da eternidade, que nunca a noite obscurece e que a verdade soberana perpetuamente ilumina com seus raios: dia imutável de alegria e repouso que nenhuma vicissitude perturba, quando luzirás tu para mim? quando virá o fim de meus males? Quando serei livre de minhas misérias? Ó bom Jesus! Quando me será dado ver-vos, contemplar a gloria do vosso reino? quando estarei eu convosco no “reino que vós preparastes de toda a eternidade para os vossos eleitos?” — (De Imitação de Cristo. liv. III, cap. XLVIII). Estou ao desamparo, pobre, exilado em terra inimiga, onde há contínua guerra e grandes infortúnios. Consolai o meu exilio; adoçai a angustia do meu coração, porque ele por vós suspira com todo o ardor de seus desejos. Tudo o que o mundo aqui me oferece para me consolar, me é pesado. Ó Jesus! Eu só a vós quero; dai-me o vosso paraíso, afim que nele possa amar-vos perfeitamente e por toda a eternidade; dai-o a meus parentes e amigos; dai-o a tantas pobres almas que o inferno está a ponto de devorar; e todos vos louvaremos, todos nós vos bem-diremos, todos nós vos amaremos por todos os séculos dos séculos. Assim seja.

RESOLUÇÕES PRÁTICAS

Animar-nos ao Serviço de Deus pelo Pensamento do Céu

Que te direi eu agora, meu caro Teótimo, senão que deves trabalhar com coragem por merecer o céu? Nosso Senhor nos advertiu que o céu não é para os frouxos, e que é preciso fazermos violência a nós mesmos para o obter. Aproveita-te deste aviso. Desce até ao fundo do teu coração e vê se nele encontras algum pecado mortal. — Não, pela misericórdia de Deus. Muito bem! Estás no caminho do paraíso: continua a marchar por ele e não te esqueças que só será coroado aquele que legitimamente tiver combatido até ao fim. Sofre com paciência e resignação as penas, as privações, os desgostos, os revezes desta vida corruptível; resiste às sugestões do inimigo da tua salvação; trabalha por te fazer humilde, paciente, mortificado: todos os teus sofrimentos passarão depressa, mas a gloria que há de ser a tua recompensa, essa será eterna. Ah! Meu caro Teótimo, em qualquer circunstancia difícil que te encontres, olha para o céu e ficarás fortificado. Se o demônio te atormenta, te arma ciladas, olha para o céu, e ele será vencido. Se o mundo procura ganhar-te ostentando diante de ti seus encantos e prazeres enganosos, olha para o céu, e ele não poderá fazer-te mal. Coragem! Tu não hás de estar muito tempo aqui em baixo no trabalho nem sempre carregado de dores. Espera um pouco, e veras em breve o fim dos teus males: porque tudo o que passa com o tempo é pouca coisa e não dura nada. Escreve, lê, conta os louvores de Deus; guarda silencio, ora, sofre corajosamente: a vida eterna é digna de todos estes combates e de mais ainda. (De Imitação de Cristo. Liv. III, cap. XLVII, n° 1, 2). Desprende-te de todas as coisas deste mundo, desprende-te de ti mesmo e repete incessantemente:

“Meu Jesus venha a nós o vosso reino”

Adeus, meu caro Teótimo, adeus: mas não para sempre. Ainda que eu gema de há muito tempo sob o peso das minhas numerosas misérias, tenho confiança na misericórdia do meu Jesus, espero da sua bondade o céu que ele nos mereceu. Lá é que há de ser o nosso encontro, lá é que nos havemos de ver. Entretanto ora por mim, recomenda-me alguma vez por caridade ao nosso divino Senhor, afim que ele me abençoe e me dê a eterna recompensa de que sou tão pouco digno. Adeus até que estejamos no paraíso aos pés de Jesus e Maria, ocupados em cantar sua misericórdia e seu amor; adeus.

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(Pinnard, Abade Dom. As Chamas do Amor de Jesus ou provas do ardente amor que Jesus nos tem testemunhado na obra da nossa redenção. Traduzido pelo Rev. Padre Silva, 1923, p. 341-352)