Sumário. As enfermidades são a pedra de toque para se conhecer o espírito de uma pessoa. Meu irmão, quando o Senhor te visita com esta tribulação, sem dúvida te é lícito rogar-lhe que te restitua a saúde, a fim de a empregar ao seu serviço: podes também tomar os remédios prescritos; mas, afinal, resigna-te sempre à vontade divina, que dispõe tudo para o nosso bem. Para te animar à paciência, lembra-te do que sofreram os santos. Olha sobretudo para Jesus, que durante toda a sua vida foi Homem de dores, e sê devoto de Maria Santíssima, a Rainha dos mártires.Infirmitas gravis sobriam facit animam — “A enfermidade grave faz a alma sóbria” (Eclo 31, 2)
Sumário. O demônio se ri de todos os propósitos e promessas de um pecador que se arrepende, se não evitar a ocasião. O espírito maligno sabe por experiência que, quem se expõe voluntariamente ao perigo, com certeza se perderá; porquanto a ocasião, especialmente em matéria de prazeres sensuais, é como que uma venda, que cobre a vista e não deixa ver nada. Quem, pois, quer salvar-se, deve absolutamente afastar-se da ocasião do pecado; seja um companheiro, certa casa, uma relação, um livro.Cor durum habebit male in novissimo; et qui amat periculum, in illo peribit —“O coração endurecido se sentirá mal no fim; e quem ama o perigo, nele perecerá” (Eclo 3, 27)
Sumário. É na hora da morte que se acaba a coroa dos escolhidos, porque é então que se recolhem mais merecimentos. Então pode-se mesmo ser mártir, aceitando tudo com resignação e pelo amor de Deus. Mas por ser difícil que então tenha estes bons sentimentos aquele que não os tiver praticado na vida, convém que se renove cada mês a protestação para a boa morte. Imaginemos, pois, que estamos para morrer, e abraçando o Crucifixo, digamos de coração a Jesus o que lhe quiséramos dizer nesses derradeiros momentos.Haec dicit Dominus: Dispone domui tuae, quia morieris tu, et non vives — “Eis aqui o que diz o Senhor: Dispõe da tua casa, porque morrerás e não viverás” (Is 38, 1)
I
Quando uma coisa tem estes dois predicados, beleza e utilidade atrai o coração das criaturas com doce violência, que as obriga a amá-la, e buscar possui-la; como desejo que vos apaixoneis pela perfeição cristã, e procureis com muito empenho conseguir sua feliz posse, quero apresentar-vos parte da sua celeste beleza, e algumas razões da sua incompreensível utilidade. Começando pelo primeiro destes predicados, quanto é belo a Santidade que consiste na simples posse da graça santificante, tal beleza tem que enamora não só os Santos e Anjos, mas até o próprio Deus; a alma que a possui é na realidade amiga do Senhor, sua filha, embora tivesse e tenha bastantes manchas veniais. Ainda que uma alma fosse manchada com um milhão de faltas veniais, tendo a graça santificante, seria, porém resplandecente com tal formosura, que agradaria a Deus, que sempre a olharia como sua amiga e filha.Sumário. Meu irmão, já que é certo que deves morrer, coloca-te aos pés de Jesus crucificado, e prepara as contas para esse grande dia. Quanto ao passado, sendo preciso, faze uma boa confissão geral. Quanto ao futuro, emprega os meios apropriados para te sustentar na graça de Deus. Estes meios são: a missa todos os dias, a meditação das verdades eternas, o exame de consciência todas as noites, a frequência dos sacramentos e sobretudo alguma devoção especial a Maria Santíssima. Fazendo assim, terás um certo penhor da tua predestinação.Quodcumque facere potest manus tua, instanter operare; quia nec opus nec ratio... erunt apud inferos quo tu properas — “Obra com presteza tudo quanto pode fazer a tua mão; porque, na sepultura, para onde te encaminhas, não haverá obra nem razão” (Ecl 9, 10)
Sumário. Meu irmão, começaste a servir a Deus, mas não penses que tenham acabado as tentações. Agora, mais do que nunca, deves preparar-te para o combate, porque o mundo, o demônio e a carne, mais do que nunca, se aprestarão para te combater, a fim de te fazer perder o que ganhaste. A arma principal que deves empregar para alcançar a vitória, deve ser um perpétuo recurso a Deus pela santa oração; e lembra-te sempre desta grande máxima: Quem reza, certamente se salva; quem não reza, certamente se condena.Vigilate et orate, ut non intretis in tentationem — “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação” (Mc 14, 38)
I A prática dos Conselhos Evangélicos não é necessária para a Perfeição Cristã
Não obstante o que se disse alma devota, talvez penseis que para possuir a perfeição, a santidade perfeita, se exige muito mais; primeiro que tudo perguntais que valia dou aos Conselhos Evangélicos, que não mencionei, e que hão de ter o primeiro lugar quando se trata da perfeição. Se os julgais indispensáveis, estais enganada. Primeiro, como diz Santo Tomás, só é preciso para a santidade à obediência aos mandamentos (ver Sum. Teol. 2-2 que. 184 a. 3) tão grande autoridade deveria bastar-vos, porém quero convencer-vos com razões evidentes. Os Conselhos Evangélicos são três, Pobreza, Obediência, Castidade perfeita. Porém se fosse verdade que a prática destes conselhos fosse necessária para se obter a santidade, talvez que só os frades e freiras pudessem aspirar a tal glória. Dela seriam excluídos os casados e todos que não sujeitam a mãos alheias a vontade própria, nem vivem de esmolas. Neste caso não seria verdade que Deus quer que todos sejam Santos, como em vários lugares afirma a Sagrada Escritura, pois não quer que todos os homens pratiquem os Conselhos. A ordem de sua Providência quer que uns observem a continência, outros se casem, sejam ricos, pobres, não desaprova o Senhor que algumas pessoas se governem a si, aprecia, porém os que se submetem à obediência sacrificando a vontade própria. No entanto, quer que todos se tornem Santos. É, pois, um erro verdadeiro pensar que os Conselhos Evangélicos são necessários para a santidade.Sumário. Eis aí uma ilusão comum aos pecadores, a qual fez e ainda faz com que muitos se condenem. Os miseráveis dizem: Deus é misericordioso, e assim como no passado tem sido tão indulgente para conosco, sê-lo-á também no futuro. Consideremos, porém, que o Senhor não é só misericordioso, mas também justo. Por isso, quando estiver cheia a medida dos pecados que ele quer perdoar, faz descer os mais formidáveis castigos. Ah! Quantos daqueles que sempre adiavam a sua conversão, confiados na bondade divina, estão agora queimando no inferno!Ne dixeris: Peccavi, et quid mihi accidit triste? Altissimus enim est patiens redditor — “Não digas: Pequei, e que mal me veio daí porque o Altíssimo, ainda que sofrido, é justiceiro” (Eclo 5, 4)