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Mortificação da Vista e do Ouvido

Meditação para a Décima Sétima Quinta-feira depois de Pentecostes. Mortificação da Vista e do Ouvido

Meditação para a Décima Sétima Quinta-feira depois de Pentecostes

SUMARIO

Como todos os nossos sentidos são outras tantas portas por onde o pecado ameaça entrar na nossa alma, meditaremos sobre dois dos nossos principais sentidos: a vista e o ouvido.

– Tomaremos depois a resolução:

1.° De não perdermos o tempo a olhar e ver de uma porta ou janela os que passam, ou a visitar as vãs curiosidades do mundo;

2.° De evitarmos todas as novidades que sempre distraem, quando não causam algum desgosto.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Espírito Santo:

“O olho não se farta de ver, nem o ouvido se enche de escutar” – Non saturatur oculos visu, nec auris auditu impletur (Ecl 1, 8)

Meditação para o Dia

Adoremos Nosso Senhor Jesus Cristo no tão admirável uso que faz dos sentidos da vista e do ouvido. Que modéstia no seu olhar! Que aversão a todos os vãos discursos e a tudo que serve unicamente para lisonjear o ouvido! Tributemos-Lhe a nossa adoração, admiração e louvor.

PRIMEIRO PONTO

A Mortificação da Vista

O Espírito Santo, diz-nos pela boca do Sábio, que nada há na terra que possa causar-nos tanto mal como a demasiada liberdade da vista (1). São Jerônimo, escrevendo sobre estas palavras de Jó: Não se nos abriram as portas da morte? (2) diz, no mesmo sentido, que os nossos olhos são essas portas da morte, porque é por eles que o pecado mortal entra na alma; são, segundo as palavras de Jeremias, as janelas por onde a morte penetra em nós (3). Com efeito, por ali entram os maus pensamentos e as perigosas imaginações, as imagens lascivas, que muitas vezes acendem ou conservam no coração o fogo das paixões. Por ali, a alma contrai um hábito de distração, que inabilita para a oração, e para as coisas de Deus; que faz perder o tempo, transtorna todo o interior, dissipa todas as virtudes adquiridas e a energia para o bem.

“Se não vigiardes sobre os vossos sentidos, diz a Imitação, perdereis num instante tudo o que tiverdes juntado em muito tempo e com muito trabalho”

“Se não acostumardes os vossos sentidos, diz Santa Tereza, a não vaguear pelas vãs curiosidades da terra, a liberdade, que, lhes concederdes, vos distrairá do cuidado da vossa salvação”

 

“São João Batista, diz São Jerônimo, retirado no deserto, julgou que os seus olhos, destinados a ver Jesus Cristo, deviam desprezar as coisas terrenas” – Oculis Christum desiderantibus, nihil dignatus est aspicere (São Jerônimo, ep. 4)

A seu exemplo, os nossos olhos, destinados a contemplar durante toda a eternidade os esplendores dos santos, com a gloriosa humanidade de Jesus Cristo, não devem divagar por tantas coisas que nenhuma necessidade temos de ver, por tantas pessoas que passam pelas ruas, e que não nos interessam. Devem servir o que é útil à glória de Deus, ao serviço do próximo, ou aos nossos próprios interesses; e além disto, ser comedidos e modestos, em toda a parte, mas principalmente na igreja e na oração; de contrário, ou não se orará, ou se pensará antes no que se vê do que no que se diz. O recato nas vistas é a salvaguarda da Inocência, da meditação, do espírito de oração, de todas as virtudes; e nenhum santo há que não tenha sido habitualmente moderado no seu olhar. Somos nós deste número?

SEGUNDO PONTO

A Mortificação do Ouvido

A mortificação do ouvido requer que não escutemos as maledicências, as palavras desonestas, as palavras equívocas e ambíguas, as conversações que a consciência reprova. Exige até mesmo que se não perca o tempo em ouvir os discursos frívolos, inúteis e indignos; e ainda os elogios que nos fizerem; e que desviemos, o mais depressa possível, a conversação de tais assuntos. Não aprova que busquemos saber notícias; que nos entretenhamos com romances, comédias e dramas que corrompem o coração. Condena ainda mais as cantigas profanas, as arias lascivas, e tolera a custo os cantos, que só têm por fim recrear. Finalmente, recorda o conselho do Espírito Santo: Tende cobro em vós, e ouvi com atenção o que vos disserem (4); isto é, não deis ouvidos às palavras vãs, inúteis, e que nada aproveitam à salvação.

Examinemos se temos alguma coisa de que nos arguirmos com relação a estas regras; e procuremos privar-nos cá na terra do prazer de ouvir, para melhor ouvir no céu os cânticos dos anjos e dos santos.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Nequius oculo quid creatum est? (Ecl 31, 15)

(2) Numquid apertae sunt tibi portae mortis? (Jó 35, 17)

(3) Ascendit mors per fenestras (Jr 9, 21)

(4) Cave tibi, et attende diligenter auditui tuo (Ecl 13, 16)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo V, p. 32-34)