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O Amor-próprio engana-nos a respeito do que somos e do que é o próximo

Meditação para a Décima Segunda Terça-feira depois de Pentecostes. Décima Nona razão de sermos Humildes: O Amor-próprio engana-nos a respeito do que somos e do que é o próximo

Meditação para a Décima Terceira Terça-feira depois de Pentecostes

Décima Nona razão de sermos Humildes

SUMARIO

Meditaremos sobre uma décima nona razão de sermos humildes, e é que o amor-próprio nos oculta:

1.° O que somos;

2.° O que é o próximo.

Depois destas reflexões, tomaremos a resolução:

1.° De nos precatarmos das ilusões do amor-próprio, e de não as olharmos como realidades;

2.° De nada dizermos nem fazermos por amor-próprio.

O nosso ramalhete espiritual será a máxima da Imitação:

“Aquele que se conhece bem a si mesmo é vil a seus próprios olhos, e não se compraz nos louvores dos homens” – Qui bene seipsum cognoscit, sibi ipsi vilescit, nec laudibus dilectatur humanis (I Imitação 2, 1)

Meditação para o Dia

Adoremos Nosso Senhor Jesus Cristo escolhendo para Si, durante todo o tempo que passou na terra, a vida obscura e retirada, para nos ensinar a não ouvir as sugestões do amor-próprio, que nos impele a aparecer em público. Em vão lhe dizem seus Pais: Descobri-vos ao mundo (1); não ouve esses conselhos da carne e do sangue, que buscam mais a glória dos homens que a glória de Deus (2). Demos-Lhe graças por este exemplo, e roguemos-Lhe que faça que nos aproveitemos bem dele.

PRIMEIRO PONTO

O amor-próprio oculta-nos o que somos

Causa admiração ver como o amor-próprio nos engana. Tantos defeitos, que nos fazem desprezíveis, não bastam para nos tornar humildes, enquanto que a menor vantagem, que julgamos ter, nos enche de vaidade. Qual é a razão disto? É:

1.° Porque, como queremos a todo o custo estimar-nos, fechamos os olhos sobre as nossas misérias, para não nos vermos senão à boa parte. Olhamo-nos debaixo deste ponto de vista com complacência, conversamos a esse respeito conosco, ou com os outros, não falando senão de nós, não aprovando senão o que fazemos, não esquecendo circunstância alguma para que nos louvem, e considerando todos os louvores que obtemos, todas as atenções de que somos objeto, como dívidas que nos pagam.

2.° Apropriamo-nos o pouco bem que Deus pôs em nós, e exageramo-lo; aquele que é pobre de virtude, de talento, julga-se rico de talento e virtude; o que só tem um medíocre talento, imagina que tem um grande talento, e o que apenas tem a aparência da virtude julga-se realmente virtuoso. De boa vontade nos fazemos inovadores, críticos e censores, porque cuidamos que somos mais hábeis que os outros.

3.° Não contentes com nos apropriarmos e exagerarmos o bem, ocultamos o mal que existe em nós, a ponto que o que é visível, nos escapa, e é para nós como as palavras de um livro selado (3), ou se não podemos escondê-lo a nós mesmos, atenuamo-lo, revestimo-lo de cores sedutoras, que o fazem quase amar; desculpamo-lo com a fragilidade humana!

Finalmente cobrimo-lo com o bem, que praticamos, de maneira que consigamos que o esqueçam. Assim chegamos a não nos conhecermos a nós mesmo, e o entendimento, enganado pelo coração causa-nos ilusões. Aquele que se julga humilde, paciente, desinteressado, na ocasião mostra-se soberbo, impaciente, cheio de paixões. O que se fia na sua virtude, cai nas mais graves culpas.

SEGUNDO PONTO

O amor-próprio oculta-nos o que é o próximo

Com uma traça oposta ao que nos concerne, o amor-próprio engrandece-nos o mal que existe em outrem, e oculta-nos o bem que se acha nele. Aquele que não vê um argueiro nos seus olhos, vê uma tranca nos do próximo, e descobre, nos outros os menores defeitos. Um modo de falar ou de obrar, aqui muito simples, ali muito afetado; as maneiras, o andar, nada lhe escapa, e lisonjeando-se de ser isento dos defeitos, que censura, arroga-se a superioridade e goza-se. Daí a tendência para a crítica, para o escárnio; daí a prontidão em acreditar o mal, e a lentidão em acreditar o bem, as suspeitas de um defeito sobre os menores indícios e a dificuldade em acreditar uma virtude apesar das mais fortes provas. Não se gosta de ouvir elogiar os outros, sente-se um maligno prazer em deprimi-los. Vê-se o seu mérito com repugnância, procura-se não o ver, e minora-se quanto se pode. A todo o louvor opõe-se a crítica; ao lado de todo o mérito reconhecido, põe-se um defeito. É assim que o amor-próprio nos oculta o que é o próximo. Reflitamos nesta injustiça, a fim de a evitarmos.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Manifesta teipsum mundo (Jo 7, 4)

(2) Dilexerunt gloriam hominum magis quam gloriam Dei (Jo 12, 43)

(3) Visio omnium sicut verba libri signati (Is 29, 11)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo VI, p. 132-135)