Skip to content Skip to footer

A Alma Infiel e a Alma Fiel

Meditação para o Sábado de Pentecostes. A Alma Infiel e a Alma Fiel

Meditação para o Sábado de Pentecostes

SUMARIO

Continuaremos as nossas meditações sobre a correspondência à graça, e veremos:

1.° O que arrisca a alma infiel à graça;

2.° O que lucra a alma fiel.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De nos conservarmos, durante o dia, atentos à voz interior do Espírito Santo para ouvir o que Ele exige de nós;

2.° De Lhe obedecermos em tudo com prontidão e generosidade.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Salmista:

“Se vós ouvirdes hoje a sua voz, vede não endureçais o vosso coração” – Hodie si vocem ejus audieritis, nolite abdurare corda vestra (Sl 93, 8)

Meditação para o Dia

Adoremos o Espírito Santo como onipotente auxiliador da nossa salvação; agradeçamos-Lhe a Sua cooperação tão benévola, tão contínua roguemos-Lhe que nos faça compreender quanto nos importa sermos-Lhe fiéis.

PRIMEIRO PONTO

O que arrisca a alma infiel à Graça?

Não arrisca nada menos que a sua salvação eterna. Porque, assim como há na ordem física certas coisas, ligadas entre si, de tal sorte que não se chega à última sem passar por aquelas que a precedem, há também na ordem sobrenatural uma série de graças ligadas com a nossa perseverança final por meio de relações secretas, que ignoramos. Perder uma destas graças, é perder o fio que nos guia; é expôr-nos a desviar-nos do caminho, que devia salvar-nos.

Quem nos diz que a graça, a que somos infiéis, não é, nos desígnios de Deus, uma dessas graças decisivas? Santa Teresa viu o lugar que lhe era destinado no inferno, se ela tivesse resistido à graça, que lhe dizia, que combatesse uma tentação de amor-próprio; e o moço do Evangelho, que tinha praticado todos os mandamentos, deixou duvidosa a sua salvação, por ter resistido à graça, que lhe dizia:

“Vendei o que possuís, e dai-o aos pobres” (Lc 12, 33)

A privação das graças é a pena ordinária do abuso, que delas se faz.

“Porque rejeitaste a minha graça, diz o Senhor, é que te rejeitei” – Quia projecisti sermonem Domini, et projecit te Dominus (1 Rs 15, 25)

E não é isto Justo? Quando o Espírito divino bate à porta de um coração, e recusam abrir-lh’O, vai-Se; quando fala, e não O querem ouvir, cala-Se. Quando faz brilhar a Sua luz, e fecham os olhos, retira-Se (1). Terrível castigo! Temei, diz Santo Agostinho, não passe a graça de Jesus, que se vos apresenta (2). Porque então o demônio, que o adverte, multiplica os seus assaltos; e o homem que o não adverte, desfalece na negligência e tibieza, que o leva à morte eterna. Eis aqui a que se arrisca sendo infiel à graça. A quem não causaria isto terror?

SEGUNDO PONTO

O que lucra a alma fiel à Graça?

Lucra duas coisas: a felicidade e a santidade.

1.° Lucra a felicidade. Há um prazer inefável em nos deixarmos conduzir em todas as coisas pelo Espírito de Deus, como o menino pela mão de sua mãe, em lhe dizer com amor e simplicidade, como São Paulo: Senhor, que quereis vós que eu faça? (At 8, 6) e logo que ouvimos a Sua voz, em Lhe obedecer com alegria, correndo e voando de alguma sorte para onde Ele nos chama (3). Então o coração está em paz porque está na tranquilidade da ordem (4); a intenção é pura, as ações são regradas, as paixões domadas; a fé mais viva. Se a graça pede sacrifícios, é mais uma felicidade, porque é ocasião de mostrar mais amor; e gosta-se então a verdade da palavra de São Luiz de Gonzaga, que um sacrifício que se fez por Deus dá mil vezes mais gozo à alma do que lhe daria a mesma coisa, que se sacrificou.

2.º A alma fiel lucra a santidade:

“Aquele que me ouvir, diz o Espírito Santo, descansará sem temor e gozará da abundância de bens” – Qui me audierit, absque terrore requiescet et abundantia perfruetur (Pr 1, 33)

Adiantamos mais com alguns dias de perfeita correspondência à graça, que com meses inteiros de exercícios espirituais. Ó Espírito Santo não deixa de inspirar, quando se corresponde às Suas inspirações; e a sua unção, que ensina em todas as coisas (1Jo 2, 27), instrui mais a alma que renuncia a si mesma para seguir a Sua direção, que todos os preceitos e lições da vida espiritual. Daí provém, que vemos muitas vezes almas simples e retas, privadas de todo o socorro humano, mas atentas e dóceis à voz da graça, fazer na santidade progressos, que causam admiração e elevar-se às mais sublimes virtudes. Oh! Se deixássemos obrar o Espírito Santo em nós, se nos deixássemos dirigir por Ele, sem estorvar com as nossas distrações e pusilanimidades as Suas divinas operações, como Ele nos transformaria! Reconheçamos esta verdade, e corrijamo-nos.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Sin autem… movebo candelabrum… de loco suo (Ap 2, 5)

(2) Time Jesum transeuntem

(3) Amans volat, currit, et laetatur (III Imitação 5, 4)

(4) Pax est tranquillitas ordinis

Voltar para o Índice das Meditações Diárias de Mons. Hamon

(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo III, p. 135-138)