Meditação para a Quinta-feira da 4ª Semana depois da Páscoa
SUMARIO
Meditaremos sobre as vantagens que podemos tirar das desconsolações; e veremos que podemos tirar:
1.° Os maiores méritos;
2.° As mais sólidas virtudes.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° Nos tempos de desconsolação, de sermos tão exatos no cumprimentos dos nossos deveres como nos dias de consolação;
2.° De nos aproveitarmos com alegria desses dias de prova, para nos acostumarmos pela renuncia e pelo sacrifício à pratica das sólidas virtudes.
O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Evangelho:
“O reino dos céus padece força, e os que fazem violência são os que o arrebatarão” – Regnum caelorum vim patitur, et violenti rapiunt illud (Mt 11, 12)
Meditação para o Dia
Adoremos Jesus Cristo sujeitando-se no Horto das Oliveiras à prova da desconsolação e do enfado (1), a fim de nos ensinar a suportar provas semelhantes, e de nos ensinar que esses desgostos, que contristam a alma, longe de ser um mal, podem ser, ao contrário, ocasião dos maiores méritos e das mais sólidas virtudes. Louvemo-lO por este exemplo, e supliquemos-Lhe a graça de nos aproveitarmos bem dEle.
PRIMEIRO PONTO
O tempo das Desconsolações é para a alma fiel o tempo dos maiores Méritos
É uma grande ilusão pensar que tudo o que se faz sem gosto é por isso mesmo sem mérito e pouco agradável a Deus. Deus não exige que O sirvamos fielmente, a despeito de todos os desgostos. Compraz-se na generosidade da alma fiel, que desgostada do dever, e como que acurvada ao peso das repugnâncias, se levanta como Jesus Cristo no Horto das Oliveiras, dizendo: Vamos; vamos, ainda que seja necessário morrer (2). Quanto mais desgosto tem um servo por aquilo que lhe é ordenado, tanto mais digno é da afeição do seu senhor, quando não obstante esse desgosto, faz com exatidão tudo o que lhe é mandado. Sucede o mesmo com o serviço de Deus. Nunca este bom Senhor preza mais o que fazemos por Ele, nunca adquirimos mais méritos do que quando vencemos as repugnâncias para seguir a cada momento a voz do dever. Fazer o bem, que apraz, é um medíocre mérito; algumas vezes até é para temer que, fazendo-o pelo prazer que nisso se acha, e não por Deus, que se perca todo o mérito, e que Deus diga: Eles receberam a sua recompensa (3); mas cumprir o nosso dever, superando as repugnâncias da natureza, é o mérito superior a que está prometida a mais bela corôa. As obras, pois, feitas com desconsolação e sem gosto, longe de ser menos meritórias, são as mais ricas de mérito, e receberão uma recompensa proporcionada ao que custaram a fazer. Por conseguinte, longe de nos descuidarmos nestas circunstâncias, devemos pôr mãos à obra com mais energia, porque é melhor experimentar menos prazer cá na terra e ter mais gozo na eternidade.
SEGUNDO PONTO
O tempo da Desconsolação é para a alma fiel o tempo de crescer em sólida Virtude
A virtude que precisa do leite das consolações está ainda na infância. Não é necessário, diz o autor da Imitação, grande esforço para ser piedoso, quando a unção do Espírito Santo a isso nos atrai, para correr quando a graça de Deus nos impele para diante, para suportar o peso quando a mão do Todo-Poderoso nos sustenta (4). A única virtude sólida é a do homem maduro, que, privado destas doçuras, come o pão substancial da tribulação e da prova. Sucede aqui com a alma o mesmo que com o corpo. À medida que se sabe da infância, deixa-se de prestar ao corpo os ternos e delicados cuidados, que lhe eram prodigalizados na sua entrada na vida; é submetido a penosos exercícios que, fatigando, o fortificam. Do mesmo modo Deus tira á alma os gozos sensíveis que, enervando-a, impediam que o seu vigor se desenvolvesse. Exercita-a com as provas da desconsolação, que a acostumam à abnegação, à paciência, ao amor das tribulações, e a tornam mais vigorosa e mais capaz de grandes sacrifícios.
É assim que se formam as almas fortes e que se implantam nos corações as sólidas virtudes. Todo aquele que souber entre os desgostos e as desconsolações cumprir sempre com perfeição o seu dever, será capaz das mais difíceis coisas; e a sua varonil energia será superior a todos os obstáculos. Oxalá possamos gostar esta útil lição!
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Cepit pavere et taedere (Mc 14, 33)
(2) Surgite, eamus (Mt 26, 46)
(3) Receperunt mercedem suam (Mt 6, 2)
(4) Quid magni est, si bilaris sis et devotus, adveniente gratia?… Satis suaviter equitat, quem gratia Dei portat. Et quid mirum si onus non sentit qui portatur ab Omnipotente? (II Imitação 9, 1)
Voltar para o Índice das Meditações Diárias de Mons. Hamon
(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo III, p. 55-57)