I. Da grande clemência e piedade de Maria
Maria é toda clemência e bondade
O autor dos Discursos sobre a Salve Rainha diz que Maria é a terra prometida pelo Senhor, na qual manava leite e mel. Quer assim mostrar-nos de modo bem intuitivo a grande bondade dessa Rainha para conosco, miseráveis e deserdados. São João acrescenta que Maria tem entranhas de tanta misericórdia, que merece ser chamada não só misericordiosa, mas a própria misericórdia. Por causa dos infelizes foi Maria constituída Mãe de Deus e colocada para lhes dispensar misericórdia, ensina-nos São Boaventura. Considera em seguida a imensa solicitude que ela tem para todos os miseráveis, bem como a sua grande bondade que acima de tudo deseja socorrer aos necessitados. Essa consideração leva o Santo a dizer: Quando olho para vós, ó Maria, parece-me não ver mais a divina justiça, mas a divina misericórdia somente, da qual estais cheia. Em suma, tanta lhe é a piedade que, como diz o Abade Guerrico, seu amoroso coração não pode cessar um momento de ser misericordioso conosco. E que outra coisa pode jorrar de uma fonte de piedade, senão piedade? pergunta São Bernardo. Por isso, Maria foi chamada “uma bela oliveira no campo” (Eclo 24,19). Como da oliveira só sai o óleo, símbolo da misericórdia, também só graças e misericórdias destilam as mãos de Maria.I. Maria livra do inferno a seus devotos
Um verdadeiro devoto de Maria não se perde
É impossível que se perca um devoto de Maria, que fielmente a serve e a ela se encomenda. À primeira vista talvez pareça um tanto ousada esta proposição. Antes, porém, que seja rejeitada, peço se leia o que a respeito eu vou apresentar. Afirmo que é impossível perder-se um devoto da Mãe de Deus. Não me refiro àqueles que abusam dessa devoção para pecarem com menos temor. Desaprovam alguns que muito se celebrem as misericórdias de Maria para com os pecadores, dizendo que estes dela abusam para mais pecarem. Mas injustamente o desaprovam. Pois esses presumidos, por esta sua temerária confiança, merecem castigo e não misericórdia. Falo tão somente daqueles devotos de Maria que, ao desej o de emenda, unem a perseverança em obsequiá- la. Quanto a estes, repito, é moralmente impossível que se percam. O mesmo afirma o Padre Crasset em seu livro sobre “A verdadeira devoção à Virgem Maria”. E antes já o afirmaram Vega em sua Teologia Mariana, Mendoza e outros teólogos. Que não falaram irrefletidamente, vê-lo-emos pelas afirmações dos Doutores e dos santos. Ninguém se admire à vista de tantas sentenças uniformes dos autores. Quis referi-las todas, a fim de provar o acordo geral dos escritores sobre este ponto.I. Maria é advogada poderosa para todos salvar
Maria é todo-poderosa junto de Deus
Tão grande é o prestígio de uma mãe, que nunca pode tornar-se súdita de seu filho, ainda que ele seja monarca e tenha domínio sobre todas as pessoas do seu reino. É verdade, sentado agora à direita de Deus Pai, no céu, reina Jesus e tem supremo domínio sobre todas as criaturas e também sobre Maria. E o tem mesmo como homem, diz Santo Tomás, por causa da união hipostática com a pessoa do Verbo. Todavia, é também certo que nosso Redentor, quando vivia na terra, quis humilhar-se a ponto de ser submisso a Maria. “E lhes estava sujeito” (Lc 2,51). Sim, desde que Jesus Cristo se dignou escolher Maria por Mãe, estava como Filho realmente obrigado a obedecer-lhe, diz Santo Ambrósio. Os outros santos - reflete Ricardo de São Lourenço - estavam unidos à vontade de Deus, mas também o Senhor se submeteu à sua vontade. Das outras virgens diz-se que “seguem o Cordeiro por toda parte”. Porém de Maria dizer se pode que o Cordeirinho de Deus a seguia, porque lhe foi submisso. Daí concluímos que são as súplicas de Maria eficacíssimas para obterem tudo quanto ela pede, ainda que não possa dar ordens a seu Filho no céu. Pois os seus rogos sempre são rogos de Mãe. Tem Maria o grande privilégio de ser poderosíssima junto ao Filho, diz Conrado de Saxônia. E por quê? Justamente pela razão já apresentada, e que mais abaixo vamos examinar minuciosamente: porque as súplicas de Maria são súplicas de Mãe. De onde as palavras de São Pedro Damião: A Virgem consegue quanto quer, no céu como na terra; até aos desesperados pode dar esperança de salvação. O Santo chama o Redentor de altar de misericórdia, onde os pecadores obtêm de Deus a graça do perdão. A ele, Jesus, dirige-se Maria quando quer obter-nos alguma graça. O filho tanto aprecia, porém, os rogos de sua Mãe e tanto deseja ser-lhe agradável, que sua intercessão mais afigura uma ordem do que uma prece, e ela parece antes uma Rainha do que uma serva, remata o Santo. Assim quer Jesus honrar sua querida Mãe, que tanto o honrou em vida, prontamente concedendo-lhe tudo que pede ou deseja. Belamente o exprime São Germano nas suas palavras dirigidas à Virgem: Sois onipotente, ó Mãe de Deus, para salvar os pecadores; não precisais de recomendação alguma junto de Deus, pois que sois a Mãe da verdadeira vida. Não receia São Bernardino de Sena concordar com a sentença de que “ao império de Maria todos estão sujeitos, até o próprio Deus”. Isto é, Deus lhe atende os rogos como se fossem ordens. Exclama por isso Eádmero: Virgem, de tal modo vos elevou o Senhor, que podeis obter para vossos servos todas as graças possíveis; pois é onipotente vosso patrocínio, como assevera Cosmas de Jerusalém. Maria, sim, sois onipotente - acentua Ricardo de São Lourenço; pois que, conforme as leis, deve a rainha gozar dos mesmos privilégios que o rei. Por isso, colocou Deus toda a Igreja não só sob o patrocínio, senão também sob o império de Maria, observa Santo Antonino. Convindo, portanto, à mãe o mesmo império que ao filho, com razão Jesus, que é onipotente, tornou Maria todo-poderosa. Contudo, sempre será verdade que o Filho é onipotente por natureza e a Mãe o é por graça. E isto se verifica, porque, quando pede a Mãe, tudo lhe concede o Filho, como justamente foi revelado a Santa Brígida. Ouviu ela Jesus dizer a Maria: Minha Mãe, já sabes quanto te quero; pede-me por isso o que quiseres, porque, seja qual for a tua petição, não pode deixar de ser de mim ouvida. E que bela razão alegou o Senhor! Minha Mãe, disse-lhe, nada me negavas na terra; é justo que nada eu te negue no céu. Diz-se que Maria é onipotente; mas é do modo que se pode entender de uma criatura, que não é capaz de atributo divino. Porque com seus rogos obtém tudo quanto quer, é ela, pois, onipotente. Com sobras de razão, portanto, ó excelsa advogada nossa, vos diz São Bernardo: Tudo se faz, se vós o quereis. Basta a vossa vontade para que tudo se faça. Quereis elevar a uma alta santidade o mais abjeto dos pecadores? Em vossa vontade está o fazê-lo. De Eádmero são estas palavras: Senhora, basta-vos querer a nossa salvação e nós não podemos perecer. Santo Alberto Magno põe na boca de Maria palavras semelhantes: Devo ser rogada, para que queira; porque o que eu quero é necessário que se faça.I. Necessidade da intercessão de Maria para nossa salvação
É muito salutar a intercessão dos santos
É a invocação e veneração dos santos, particularmente a de Maria, Rainha dos santos, uma prática não só lícita senão útil e santa. Pois procuramos por meio dela obter a graça divina. Esta verdade é de fé, estabelecida pelos Concílios contra os hereges que a condenam como injúria feita a Jesus Cristo, nosso único medianeiro. Mas, se, depois da morte, um Jeremias reza por Jerusalém; se os anciãos do Apocalipse apresentam a Deus as orações dos santos; se um São Paulo promete a seus discípulos lembrar-se deles depois da morte; se S. Estêvão intercede por seus perseguidores e um São Paulo, por seus companheiros; se, em suma, podem os santos rogar por nós, por que não poderíamos nós, por nossa vez, rogar-lhes para que intercedam por nós? Às orações de seus discípulos recomenda-se São Paulo: Irmãos, rezai por nós (1Ts 5,25). São Tiago exorta-nos “que roguemos uns pelos outros” (5,16). Podemos, por conseguinte, fazer o mesmo. Que seja Jesus Cristo único Mediador de justiça a reconciliar-nos com Deus, pelos seus merecimentos, quem o nega? Não obstante isso, compraz-se Deus em conceder-nos suas graças pela intercessão dos santos e especialmente de Maria, sua Mãe, a quem tanto deseja Jesus ver amada e honrada. Seria impiedade negar semelhante verdade. Quem ignora que a honra prestada às mães redunda em glória para os filhos? Os pais são as glórias dos filhos, lemos nos Provérbios (17,6). Quem muito enaltece a mãe, não precisa ter receio de obscurecer a glória do filho. Pois quanto mais se honra a Mãe, tanto mais se louva o Filho, diz São Bernardo. E observa São Ildefonso:É tributada ao Filho e ao Rei toda a honra que se presta à Mãe e à Rainha. Ao mesmo tempo está fora de dúvida que pelos merecimentos de Jesus Cristo foi concedida a Maria a grande autoridade de ser medianeira da nossa salvação, não de justiça, mas de graça e de intercessão, como bem lhe chamou Conrado de Saxônia com o título de “fidelíssima medianeira de nossa salvação”.E São Lourenço Justiniano pergunta:
Portanto, bem adverte Suárez:Como não ser toda cheia de graça, aquela que se tornou a escada do paraíso, a porta do céu e a verdadeira medianeira entre Deus e os homens?
Quando suplicamos à Santíssima Virgem nos obtenha as graças, não é que desconfiemos da misericórdia divina, mas é muito antes porque desconfiamos da nossa própria indignidade.Recomendamo-nos, por isso, a Maria, para que supra sua dignidade a nossa miséria.
I. Da prontidão de Maria em socorrer os que a invocam
Maria ajuda em muitos apuros da vida
Como pobres filhos da infortunada Eva, somos réus da mesma culpa e condenados à mesma pena. Andamos errando por este vale de lágrimas, exilados de nossa pátria, chorando por tantas dores que nos afligem no corpo e no espírito. Feliz, porém, aquele que por entre tais misérias se dirige muitas vezes à consoladora do mundo, ao refúgio dos pecadores, à grande Mãe de Deus. Feliz quem a invoca e implora com devoção! Bem-aventurado o homem que me ouve e que vela todos os dias à entrada de minha casa (Pr 8,34). Bem-aventurado, diz Maria, quem ouve meus conselhos e permanece constantemente à porta de minha misericórdia, invocando minha intercessão e meu auxílio. A Santa Igreja bem a nós, seus filhos, ensina com quanto zelo e quanta confiança devemos recorrer sem cessar a esta nossa amorosa protetora. Pois é ordem sua que lhe tribute um culto particular. Durante o ano celebra muitas festas em sua honra e prescreve que um dia da semana lhe seja especialmente dedicado. Exige também que, diariamente no Ofício Divino, todos os eclesiásticos e religiosos a invoquem em nome do povo cristão, e que três vezes ao dia os fiéis a saúdem ao toque das Ave-Marias. Bastaria, para isso, somente ver e ouvir que em todas as calamidades públicas a Santa Igreja sempre quer que se recorra à divina Mãe com novenas, com orações, com procissões e visitas às suas igrejas e imagens. Isto mesmo quer Maria que façamos. Que sempre a invoquemos, que sempre lhe peçamos, não por necessitar dos nossos obséquios, nem das nossas honras tão inadequadas aos seus merecimentos, mas sim para que, à medida da nossa devoção e da nossa confiança, possa melhor socorrer-nos e consolar-nos. Procura, na frase de São Boaventura, os que dela se aproximam devota e reverentemente; ama-os, nutre-os, aceita-os por filhos.I. Maria é a esperança de todos os homens
Maria é realmente nossa esperança
Não suportam os hereges modernos que nós saudemos e chamemos a Maria nossa esperança. Dizem que só Deus é nossa esperança, e que ele amaldiçoa quem põe sua confiança na criatura. “Maldito o homem que confia no homem” (Jr 17,5). Maria é criatura, objetam eles; como, pois, uma criatura há de ser a nossa esperança? Isto dizem os hereges. Entretanto quer a Santa Igreja que cada dia todos os eclesiásticos e todos os religiosos em voz alta, e em nome de todos os fiéis, invoquem e chamem a Maria com este nome de esperança nossa. De dois modos, diz o Angélico Santo Tomás, podemos pôr nossa esperança numa pessoa, como causa principal ou como causa mediante. Quem deseja obter do rei uma graça, espera alcançá-la do rei como soberano senhor, e espera obtê-la do seu ministro ou valido, como intercessor. No último caso a graça concedida veio do rei, mas por intermédio do seu valido. - Portanto, quem pretende a graça com razão chama aquele seu intercessor a sua esperança. Por ser de infinita bondade, sumamente deseja o Rei do céu enriquecer-nos com as suas graças. Mas porque para tanto é necessária da nossa parte a confiança, deu- nos o Senhor, para aumentá-la, sua própria Mãe por advogada e intercessora, e concedeu-lhe plenos poderes a fim de nos valer. Por esta razão quer também que nela coloquemos a esperança de nossa salvação e de todo o nosso bem. Sem dúvida são amaldiçoados pelo Senhor, como diz Jeremias, aqueles que põem sua confiança na criatura unicamente. Tal é o procedimento dos pecadores que, em troca da amizade e dos préstimos de um homem, não se incomodam de ofender a Deus. São abençoados pelo Senhor e lhe são agradáveis, porém, os que esperam em Maria, tão poderosa como Mãe de Deus, para impetrar-lhe as graças e a vida eterna. Pois assim quer Deus ver honrada aquela excelsa criatura, que neste mundo o amou e honrou mais do que todos os anjos e homens juntos. É, portanto, com muita razão que chamamos à Virgem esperança nossa, porque, como diz S. Roberto Belarmino, cardeal, esperamos por sua intercessão obter o que não alcançaríamos só com nossas orações. Invocamo-la, observa Suárez, para que a dignidade da intercessora supra a nossa falta de méritos. De modo que, continua ele, invocar a Virgem com tal esperança não é desconfiar da misericórdia de Deus, senão temer pela própria indignidade. Motivo tem, pois, a Igreja em aplicar a Maria as palavras do Eclesiástico (24,24), com as quais vos chama a Mãe da santa esperança, Mãe que faz nascer em nós, não a esperança vã dos bens transitórios desta vida, mas a santa esperança dos bens imensos e eternos da vida bem-aventurada. Salve, esperança de minha alma, saudava-a Santo Efrém, salve, ó segura salvação dos cristãos, auxílio dos pecadores, defesa dos fiéis, salvação do mundo. Aqui pondera São Boaventura que, depois de Deus, outra esperança não temos senão Maria e por isso a invoca “como única esperança nossa depois de Deus”. Também é esta a convicção de Santo Efrém. Reflete o Santo sobre a presente ordem da Providência, com que Deus tem determinado (como diz São Bernardo e adiante nós demonstraremos largamente) que todos, que se hão de salvar, hajam de o conseguir por meio de Maria. E diz-lhe então: Senhora, não deixeis de guardar- nos e de proteger-nos sob vosso manto, j á que depois de Deus não temos outra esperança senão a vós. O mesmo diz São Tomás de Vlanova, para quem Maria é nosso único refúgio, socorro e asilo. S. Bernardo parece nos dar o motivo de tudo isso, quando diz:“Considerai, ó homem, o desígnio de Deus, desígnio cuja finalidade é dispensar-nos mais profundamente sua misericórdia. Querendo ele remir o gênero humano, depositou o preço inteiro da redenção nas mãos de Maria para que o reparta à sua vontade”.Ordenou o Senhor a Moisés que fizesse de ouro puríssimo o propiciatório, dizendo que daí lhe queria falar: Farás outrossim um propiciatório de finíssimo ouro... daí é que eu te darei minhas ordens e te falarei (Êx 25,17 e 22). Na opinião de Pacciucchelli, Maria é este propiciatório de onde o Senhor fala aos homens e concede-nos o perdão, a graça e todos os seus demais dons. Por isso foi que o Verbo Divino, antes de encarnar-se no seio de Maria, mandou o arcanjo pedir-lhe o consentimento; pois Deus queria que a ela ficasse o mundo devendo o mistério da Encarnação. Assim discorre Santo Ireneu. Por este motivo diz o Abade de Celes: Todos os bens, todas as graças, os auxílios todos que jamais receberam ou até ao fim do mundo receberão os homens, lhes têm vindo e hão de vir por intermédio de Maria. É, portanto, mui justa a exclamação do piedoso Blósio: Ó Maria, sois tão amável e agradecida para com os que vos amam; quem será tão louco ou infeliz que não vos ame? Nas dúvidas e confusões ilustrais o entendimento daqueles que a vós recorrem nas suas aflições. Consolais nos perigos aqueles que em vós confiam. Acudis a quem por vós chama; vós, depois do vosso divino Filho, sois a segura salvação de vossos fiéis servos. Salve, pois, ó esperança dos desesperados, ó refúgio dos abandonados. Sois onipotente, ó Maria, visto que vosso Filho quer vos honrar, fazendo sem demora tudo quanto vós quereis.
I. Maria é nossa vida, porque nos obtém o perdão
A oração de Maria obtém-nos a graça da justificação
Para a exata compreensão da razão por que a Santa Igreja nos ordena que chamemos a Maria nossa vida, é necessário saber que, assim como a alma dá vida ao corpo, assim também a graça divina dá vida à alma. Uma alma sem a graça divina só tem nome de viva, mas na realidade está morta, como foi dito àquele bispo no Apocalipse: Tens reputação de que vives, mas estás morto (Ap 3,1). Obtendo Maria por meio de sua intercessão a graça aos pecadores, deste modo lhes dá vida. Ouçamos as palavras que a Igreja lhe põe na boca, aplicando-lhe a seguinte passagem dos Provérbios: Os que vigiam desde manhã por me buscarem, achar-me-ão (8,17). Os que recorrem a mim desde manhã, isto é, sem demora, certamente me acharão. Ou, segundo a tradução grega: acharão a graça. De modo que recorrer a Maria é recobrar a graça de Deus. Lemos por isso pouco depois: Quem me encontra, encontra a vida e receberá do Senhor a salvação (Pr 8,35). Ouvi-o, vós que procurais o reino de Deus, exclamou São Boaventura, honrai a Santíssima Virgem Maria e achareis a vida juntamente com a eterna salvação. Na afirmativa de São Bernardino de Sena, Deus não destruiu o homem logo após o pecado, devido ao singular amor para com esta sua futura filha. Não lhe resta a menor dúvida de que todas as misericórdias e mercês, em favor dos pecadores na Antiga Lei, só lhes tinham sido feitas por Deus em consideração desta abençoada Virgem. Exorta-nos por isso, com razão, São Bernardo: Procuremos a graça, mas procuremo-la por meio de Maria. Se formos tão infelizes, que perdemos a divina graça, procuremos recuperá-la por meio de Maria; porque se a perdemos ela a achou. E por este motivo o santo lhe chama descobridora da graça. Para nossa consolação declarou-o S. Gabriel Arcanjo, quando disse à Virgem: Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus (Lc 1,30). Mas, se Maria nunca se vira privada da graça, como podia dizer o anjo que a tinha achado? Só se pode achar uma coisa que se perdeu. A Virgem, entretanto, sempre esteve com Deus e não só em graça, mas cheia de graça, como o mesmo arcanjo manifestou, quando, ao saudá-la, lhe disse: Ave, Maria, cheia de graça; o Senhor é contigo...I. Nossa confiança em Maria deve ser ilimitada porque ela é Rainha de Misericórdia
Maria é Rainha
Tendo sido a Santíssima Virgem elevada à dignidade de Mãe de Deus, com justa razão a Santa Igreja a honra, e quer que de todos seja honrada com o título glorioso de Rainha. Se o Filho é Rei, diz Pseudo-Atanásio, justamente a Mãe deve considerar-se e chamar-se Rainha. Desde o momento em que Maria aceitou ser Mãe do Verbo Eterno, diz S. Bernardino de Sena, mereceu tornar-se Rainha do mundo e de todas as criaturas. Se a carne de Maria, conclui Arnoldo, abade, não foi diversa da de Jesus, como, pois, da monarquia do Filho pode ser separada a Mãe? Por isso deve julgar-se que a glória do reino não só é comum entre a Mãe e o Filho, mas também que é a mesma para ambos. Se Jesus é Rei do universo, do universo também é Maria Rainha, escreve Roberto, abade. De modo que, na frase de São Bernardino de Sena, quantas são as criaturas que servem a Deus, tantas também devem servir a Maria. Por conseguinte, estão sujeitos ao domínio de Maria os anjos, os homens e todas as coisas do céu e da terra, porque tudo está também sujeito ao império de Deus. Eis por que Guerrico abade lhe dirige estas palavras: Continuai, pois, a dominar com toda a confiança; disponde a vosso arbítrio dos bens de vosso Filho; pois, sendo Mãe, e Esposa do Rei dos reis, pertence-vos como Rainha o reino e o domínio sobre todas as criaturas.Sumário. Afiguremo-nos ver a santa Menina que, acompanhada dos seus pais e de numerosos anjos, se põe a caminho de Jerusalém. Chegada que é aos degraus do templo, beija, de joelhos, as mãos de São Joaquim e de Santa Ana, pede-lhes a bênção, e, sem mais olhar para trá, despede-se do mundo e consagra-se irrevogavelmente ao seu Deus. Felizes de nós, se pudéssemos oferecer hoje ao Senhor os primeiros anos da nossa vida! Ofereçamos-lhe ao menos os poucos que ainda nos restam; pois, melhor é começar tarde do que nunca.En dilectus meus loquitur mihi: Surge, propera, amica mea, columba mea, formosa mea, et veni — “Eis aí o meu amado que me diz: Levanta-te, apressa-te, amiga minha, pomba minha, formosa minha, e vem” (Ct 2, 10),