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Quinta razão de sermos Humildes: Peccavimus

Meditação para a Décima Sexta-feira depois de Pentecostes. Quinta razão de sermos Humildes: Peccavimus

Meditação para a Décima Sexta-feira depois do Pentecostes

SUMARIO

Meditaremos sobre uma quinta razão de sermos humildes, que é, que somos pecadores – Peccavimus:

1.° Temos pecado;

2.° Somos capazes de pecar ainda.

— Tomaremos depois a resolução:

1.º De ante estas considerações, louvarmos, admirarmos e amarmos a bondade de Deus, que se digna amar uma criatura tão miserável como nós;

2.º De nós confundirmos e humilharmos a cada tentação de soberba que nos acometer, porque cabe mal a vaidade em quem é tão miserável.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do santo rei Davi:

“O meu pecado está sempre diante de mim” – Peccatum meum contra me est semper (Sl 50, 5)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo crucificado ensinando-nos, com todas as suas ignomínias e dores, quão humilde deve ser aquele que teve a desgraça de pecar. Este divino Salvador não traz mais que a sombra e aparência do pecado, pelo qual se fez caução e vítima; e isto basta para o encher de confusão (1), para o tornar a seus próprios olhos como um objeto de maldição (2). Ó Pai celestial, que havemos, pois, de pensar de nós mesmos? Se a só aparência do pecado torna o vosso Filho abominável a seus próprios olhos, que será conosco, que, na realidade, temos pecado tantas vezes, e somos capazes de pecar ainda?

PRIMEIRO PONTO

Devemos ser humildes, porque temos pecado

Ainda que tivéssemos cometido um só pecado em toda a nossa vida, seria bastante para nos conservarmos sempre no mais ínfimo grau da humilhação, ainda abaixo do nada. Melhor fora nunca ter recebido a existência do que dela nos termos servido para ofender a Deus. Pecando pusemo-nos abaixo de tudo o que há mais miserável, abaixo até do lodo, que nos leva a vantagem de não ter ofendido a Deus. Que é um homem que cometeu apenas um pecado venial? É um ingrato que se esqueceu do melhor dos amigos, que ofendeu o seu benfeitor e Pai, ora por obras, ora por palavras. Não é isto um motivo de se confundir e humilhar? Mas, principalmente, que é um homem que cometeu um pecado mortal? É um homem expulso do céu, um condenado às penas eternas, um rebelde contra o seu Deus, um traidor infiel aos seus juramentos, um deicida que crucificou Jesus Cristo no seu coração, calcou aos pés o sangue do Testamento. Ó opróbrio, ó ignomínia! E que será, pois, se tornar a cometer várias vezes esse grande atentado, se o cometer tantas vezes como tem de cabelos na sua cabeça? Não, nunca se imaginará todo o desprezo que merece tal homem.

— E não nos digam que tudo isto foi perdoado; porque, primeiramente, ninguém o pode saber com certeza (3). Sabemos, sim, que merecemos o inferno; mas não sabemos, nunca saberemos nesta vida, se o não merecemos ainda. Que motivo de humilhação! Mas, ainda que nos fosse revelado o nosso perdão, não passaríamos de ser um homem que escapou ao inferno, como que um tição arrancado ao fogo, um indultado das penas eternas, um objeto dos insultos e dos mais cruéis desprezos dos demônios. Ora, quando se tem merecido ser assim tratado, é admissível que se seja arrogante e soberbo, que se não possa tolerar uma leve afronta? E não se deve, ao contrário, permanecer profundamente humilde e confundido?

SEGUNDO PONTO

Devemos ser humildes, porque somos capazes de pecar ainda

Somos tão maus, que não podemos dizer a Deus todas as manhãs, como São Filipe Neri, e com mais razão que ele:

«Senhor, desconfiai de mim: porque, se vos não acautelais, trair-vos-ei»

— Ó profunda miséria! Não podemos responder por nós um só instante (4). Nenhum momento há na vida, em que não possamos pecar mortalmente, e nenhum pecado mortal, depois do qual não possamos morrer é ser condenados. Basta-nos para isso um pensamento de soberba, como o provam os anjos rebeldes; uma maledicência, uma impureza, segundo São Paulo; um desejo, uma vista de olhos, segundo Jesus Cristo; e quem não temeria certas ocasiões difíceis, certos instantes funestos, em que o coração fraco, desamparado, mal se reconhece a si mesmo? Quem não temeria a soberba antes domada do que aniquilada, a impudicícia antes adormecida do que extinta? Ai! Tem caído tantos outros que valiam mais do que nós! E o que é, pois, que poderia tranquilizar-nos? Seria certo bem que temos feito? Mas, ainda que tenhamos, como os Apóstolos, deixado tudo por Jesus Cristo, como eles evangelizado os povos, obrado milagres, olhemos para o inferno, e lá veremos Judas, que fez tudo isto. Seriam as graças recebidas? Mas os anjos tinham recebido mais graças do que nós, eram puros de toda a paixão, e não perseveraram. Seria uma vida isenta de grandes culpas? Mas para ser condenado, não é necessário ter cometido grandes culpas; basta não ter obrado o bem que se devia obrar, ter sido um servo inútil (5).

Depois disto, quem terá soberba? Quem se não humilhará?

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Operuit confusio faciem meam (Sl 68, 8)

(2) Factus pro nobis maledictum (Gl 3, 13)

(3) Nescit homo utrum amore an odio dignus sit (Ecl 9, 1)

(4) Qui se existimat stare, videat ne cadat (1Cor 10, 12)

(5) Inutilem servum ejicite in tenebras exteriores (Mt 25, 30)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo VI, p. 78-81)