Skip to content Skip to footer

O Santo Sudário

Meditação para a Sexta-feira da Segunda Semana da Quaresma. O Santo Sudário

Meditação para a Sexta-feira da Segunda Semana da Quaresma

SUMARIO

Para nos conformarmos com o espírito da Igreja, que honra o Santo Sudário, consideraremos:

1.° Quão justa é a devoção a esta insigne relíquia;

2.° Quão santificante é.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De nos representarmos muitas vezes o Santo Sudário, contendo impressas as chagas do Salvador, e todo impregnado do Seu sangue;

2.° De nos excitarmos com esta lembrança ao amor de Jesus crucificado, ao horror do pecado, ao zelo da salvação e das virtudes que lá conduzem.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra de São Pedro:

“Armai-vos do pensamento de Jesus crucificado” – Christo igitur passo in carne, et vos eadem cogitatione armamini (1Pd 4, 1)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo descido da cruz depois da Sua morte, e envolto em um lençol, que lhe comprou José de Arimateia; veneremos o Seu sagrado corpo unido à pessoa do Verbo, por conseguinte sempre digno do supremo culto de latria. Juntemo-nos à adoração que lhe prestou então a Santíssima Trindade.

PRIMEIRO PONTO

Quão justa é a devoção ao Santo Sudário

Esta devoção remonta à aurora do cristianismo. Com efeito, o Evangelho mostra-nos vários lençóis postos pelo anjo no sepulcro (1). O principal destes lençóis recolhidos por Nicodemo passou das mãos deste para Gamaliel, de Gamaliel para São Thiago, que o transmitiu a São Simeão, e que a Igreja de Jerusalém conservou até 1187. Levado então para Chipre por Guido de Luzignano, foi trazido para França  em 1450 pela viúva do último dos Luzignano, que o deu de presente à duquesa de Saboia. Desde então, a casa real de Saboia tem-o conservado até aos nossos dias, cercado da veneração dos povos. Deus deu a conhecer por numerosos milagres quão agradável lhe era esta devoção; e a Santa Sé, obedecendo a esta indicação do céu, autorizou a receber o sagrado depósito uma igreja, que Paulo III converteu em colegiada, que Sixto IV decorou com o título de Santa Capela, e em que Julio II permitiu o ofício do Santo Sudário. Animada com tais autoridades, a devoção ao Santo Sudário aumentou por toda a parte. São Carlos veio desafogar o seu coração diante desta venerável relíquia. A senhora de Boissy, durante a prenhez que deu ao mundo São Francisco de Sales, veio ali encomendar, com abundantes lágrimas, o abençoado fruto que trazia no seu seio. O mesmo São Francisco de Sales veio a Turim venerar a santa relíquia, e não pôde conter o seu pranto à vista das chagas do Salvador impressas no lençol.

Esta devoção da Igreja e dos santos nada tem que deva admirar-nos: porque, se se honra a cruz como memória da Paixão do Salvador, se um crucifixo pintado por mão hábil excita a nossa devoção, quanto mais a deve excitar a representação das chagas e dores do Salvador feita não pela mão do homem, mas pelo contato do próprio corpo de Jesus Cristo!

SEGUNDO PONTO

Quão santificante é a devoção ao Santo Sudário

Com efeito, quem poderia afigurar-se o que o Santo Sudário oferece aos olhos daquele que o contempla, esse corpo todo ensanguentado, essa cabeça coroada de espinhos, esses pés e essas mãos traspassados pelos cravos, esse lado aberto pela lança, todo esse conjunto de chagas que laceraram o sagrado corpo do Salvador, desde a cabeça até à planta dos pés, sem que diga consigo:

Já que o meu Salvador padeceu tanto para me salvar, não quero perder o fruto de tantas dores; já que a minha salvação custou tão caro a Jesus Cristo, não quero deixá-la escapar, recusando fazer violências a mim próprio infinitamente menos penosas. Quero ser um santo.

À vista deste Sagrado Sudário, detesto o pecado, por cuja causa o meu Salvador derramou tanto sangue, e abraço a penitência que o expia. Poderei eu ser delicado e sensual, vendo a imagem deste corpo tão maltratado? Poderia eu fechar o meu coração a este brado que sabe das chagas impressas no lençol: Eis como Deus ama o mundo (2); e eu mesmo não exclamar do fundo das minhas entranhas:

“Amemos, pois, a Deus, porque nos amou primeiro?” – Nos ergo diligamos Deum, quoniam Deus prior dilexit nos (1Jo 4, 19)

Oh! Quem terá um coração tão endurecido, que não se deixe enternecer com a lembrança de tantas dores padecidas por nosso amor! (3)

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Vidit posita linteamina (Jo 20, 5)

(2) Sic Deus dilexit mundum (Jo 3, 16)

(3) O indurati quos non emolliret tanta benignitas! (Santo Agostinho)

Voltar para o Índice das Meditações Diárias de Mons. Hamon

(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo II, p. 128-131)