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A Caridade não pensa nem fala mal do Próximo

Meditação para a Vigésima Segunda Quarta-feira depois de Pentecostes. A Caridade não pensa nem fala mal do Próximo

Meditação para a Vigésima Segunda Quarta-feira depois de Pentecostes

SUMARIO

Meditaremos sobre o sexto caractere da caridade cristã, que é a indulgência; e veremos:

1.° Que nunca devemos pensar mal do próximo, a menos que esse mal não seja notório;

2.° Que nunca devemos falar mal dele, a menos que o mal não seja conhecido ou não haja uma razão de utilidade em o dizer.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De termos para com o próximo uma indulgência que nos leve a pensar sempre bem dele, e a não o criticar e censurar;

2.° De nunca dizermos coisa alguma que ofenda a caridade, ou que não quiséramos que dissessem de nós.

O nosso ramalhete espiritual serà a palavra de São Tiago:

“Se alguém não tropeça em qualquer palavra, este é varão perfeito” – Si quis in verbo non offendit, hic perfectus est vir (Zc 3, 2)

Meditação para o Dia

Adoremos Nosso Senhor repetindo-nos muitas vezes no Evangelho o preceito da caridade: é a prova do grande desejo que tem de nos ver evitar tudo o que pode ofender esta virtude divina; é a condenação do descomedimento que se tem muitas vezes em pensar e falar mal do próximo. Demos-Lhe graças por estes sentimentos tão benévolos para com todos nós.

PRIMEIRO PONTO

Nunca devemos pensar mal do próximo, a menos que este mal não seja notório

“A caridade, diz o Apóstolo, não suspeita mal” – Charitas… non cogitat malum (1Cor 8, 15)

Longe de fazer juízos pouco favoráveis a respeito do próximo, uma pessoa caridosa folga de pensar todo o bem possível a seu respeito. Só crê o mal incontestavelmente provado; e ainda assim, a menos que a sua posição a não obrigue a um procedimento contrário, dissimula-o, desculpa-o, e julga-o o mais pequeno possível. São muito diferentes esses críticos e censores sempre dispostos a pensar mal e a tomar tudo à má parte. Presunçosos, que imaginam ser mais sábios e prudentes que os outros, constituem-se juízes de tudo, decidem sem apelação a respeito das pessoas e das coisas. Só acham bom o que fazem ou dizem, e criticam tudo o que fazem e dizem os outros. Daí tantos males, na sociedade e na família; o esquecimento do respeito para com os superiores, das atenções para com os iguais, e dessas relações de caridade e de mútua estima que fazem o encanto da vida; não sabem senão desconsiderar, deprimir-se uns aos outros com juízos temerários, sem se lembrarem que todo o juízo temerário em matéria grave é pecado mortal. Por isso Deus abomina esses censores de toda a gente, que cuidam ser os únicos que tem sabedoria e bom senso; amaldiçoa-os (1).

Não temos nós muitas culpas de que arguir-nos a este respeito? Não somos fáceis em pensar mal do próximo, em conceber suspeitas, em formar juízos temerários e a manifestá-los nas nossas conversações?

SEGUNDO PONTO

Nunca devamos falar mal do próximo, a menos que esse mal não seja conhecido, ou haja uma razão de utilidade em o dizer

Falar mal do próximo ou murmurar, é um vício que Deus aborrece (2); é um mal, que São Paulo declara tão condenável como o mesmo roubo (3). É ainda coisa pior que o roubo, pois que a reputação, que o murmurador tira, é um bem de uma ordem muito mais elevada, e vale mais que todas as riquezas que o ladrão rouba. Finalmente, é um efeito ignóbil das piores paixões: e de que paixões? Umas vezes é a soberba, que faz que julguemos exaltar-nos à medida que deprimimos os justos, e que nos lisonjeemos interiormente de ser ou de conseguir que nos suponham melhor que aqueles de quem murmuramos; outras vezes é uma baixa inveja, que nos leva a censurar os outros, somente porque os elogiam; outras vezes ainda, é um ódio encoberto que nos faz proferir palavras amargas; uma miserável vaidade, que nos leva a dar-nos importância à custa dos outros, e regozijar-nos se, com suficiente malícia para murmurar, podemos mostrar-nos espirituosos para agradar; uma vergonhosa fraqueza, que nos faz ser pouco comedido nas palavras; uma crueldade, que nos leva a desacreditar os ausentes: considerações que impeliram Santo Agostinho a proibir expressamente este vício à sua mesa, com um rótulo gravado na parede (4).

Examinemos se temos à maledicência o mesmo horror que este grande santo. São poucas as pessoas, até entre os cristãos, diz São Paulino, que não tenham este vício. Dir-se-ia, que muitas não sabem senão falar mal do próximo, e só gostam das conversações em que se mancha a reputação de alguém (5). Não somos nós deste número?

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Vae qui sapientes estis in oculis vestris (Is 5, 21)

(2) Detractores, Deo odibiles (Rm 1, 30)

(3) Neque maledici, neque rapaces, regnum Dei possidebunt (1Cor 6, 10)

(4) Quisquis amat dictis absentum rodere vitam, Hanc mensam vetitam noverit esse sibi

(5) São Paulino, Epist. ad Celani

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo V, p. 145-148)