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Escola do Quarto Grau de Humildade

Meditação para a Sexta-feira da 3ª Semana depois da Epifania. Escola do Quarto Grau de Humildade

Meditação para a Sexta-feira da 3ª Semana depois da Epifania

SUMARIO

Meditaremos o quarto grau de humildade, que consiste em gostarmos de ser tratados sem atenção e até com desprezo, quando a Providencia permite que o sejamos; e veremos:

1.° Que Jesus Cristo nos prega esta doutrina com o Seu exemplo;

2.° Que os princípios de fé no-la confirmam.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De suportarmos em silêncio e sem azedumes as faltas de atenção e os mesmos motejos e desprezos;

2.º De combatermos intrepidamente todas as tentações para a ira, e de pedirmos muitas vezes a Deus a graça de não cedermos a elas.

O nosso ramalhete espiritual será a oitava bem-aventurança:

“Bem-aventurados sois, quando disseram todo o mal contra vós” – Beati estis cum maledixerint vobis (Mt 5, 11)

Meditação para o Dia

Adoremos o Menino Jesus tratado como o último dos homens, posto em um presépio desde o primeiro dia do Seu nascimento; mais tarde perseguido e obrigado a fugir; em toda a Sua vida e na morte, maltratado por aqueles mesmos a quem tinha feito sempre bem; e depois da Sua morte, quantas irreverências não tem Ele tido que sofrer na Eucaristia! Ó meu Jesus, como Vos tratam até no Sacramento do Vosso amor! Prestemos-Lhe os nossos respeitos nessas profundas humilhações.

PRIMEIRO PONTO

Jesus ensina-nos com o Seu exemplo a gostarmos de ser tratados sem atenção e até com desprezo, quando a Providência permite que o sejamos

Um dos rasgos mais notáveis do Evangelho é o fato de Nosso Senhor fugindo da glória, buscando o opróbrio, desejando o desprezo como outros desejam a honra e a celebridade (1). Na Sua primeira infância, se exceptuarmos os pastores e os magos, Maria e José, Ele é tratado sem atenção, como o mais vulgar dos meninos. Quando cresce, é tratado como um pobre aprendiz, que não sabe ainda a sua profissão; mais tarde, como um pobre artífice sem consideração, como um ignorante nas letras divinas e humanas (2). Ora quem somos nós para querermos ser melhor tratados do que Deus? Se nos reputamos cristãos, a nossa glória é assemelhar-nos a Jesus Cristo, viver conforme o Seu espírito e a Sua vida, amar o que Ele amou, odiar o que Ele odiou. Se nos reputamos homens, devemos aprovar que nos façam justiça; ora sendo nós nada e pecado, somente temos direito ao desprezo. Se nos reputamos viadores, nenhuma importância devemos ligar ao conceito dos homens, que dentro em pouco tempo já não existirão, e além disto cuja aprovação ou censura é para nós sem consequência, porque se nos criticam e nos desprezam, nem por isso valemos menos; se nos estimam e nos louvam, nem por isso valemos mais. Não basta dizer: se nos desprezam, temos uma bela ocasião de nos humilharmos; e se nos louvam, corremos o risco de nos fazermos soberbos. É esta a razão porque os santos se alegravam pelas imperfeições ou faltas involuntárias que lhes escapavam, como se fossem um grande lucro para a sua humildade, e temiam o louvor como uma prova em que suspeitavam que a soberba naufragasse, segundo a palavra do Baldo (3).

SEGUNDO PONTO

Os princípios da fé ensinam-nos que devemos gostar de ser tratado sem atenção e até com desprezo, quando a Providência permite que o sejamos

A Providência regulou assim as coisas: se buscamos a glória neste mundo, teremos o opróbrio no outro; e se por amor de Nosso Senhor aceitamos de boa vontade o desprezo e a falta de atenção na terra, teremos no céu uma parte abundante de glória (4). Que há mais decisivo do que este raciocínio?

Dificilmente se encontraria uma virtude que pudesse conciliar-se com a disposição contrária, ou ao menos sem que ela nos irrite fortemente. Seria a fé? Mas um dos seus primeiros ensinos é, que o homem, considerado na sua substância, que é o nada e o pecado, apenas merece o desprezo. Seria a religião? Mas ela quer que tudo se aniquile diante de Deus, para que só Deus seja grande. Seria o amor de Deus? Mas o amor compraz-se em tributar só a Deus honra e glória, e em não guardar para si senão o opróbrio. Seria o amor do próximo? Mas este amor desaparece, se não se sabe tolerar as afrontas, as faltas de atenção, as mesmas calúnias e as injúrias; ora esta tolerância pressupõe que se consente voluntariamente em ser tratado sem atenção. Seria a mansidão? Mas a menor falta de respeito a alterará; e a propensão para a ira a substituirá. Seria a paciência? Mas uma doce tranquilidade entre os desprezos é impossível a quem não gosta de ser tratado sem atenção. Seria finalmente a penitência? Mas onde há penitência, há desprezo de si próprio e profundo sentimento de que se merece o desprezo dos outros. Todavia somos tão irascíveis, tão prontos a irritar-nos à menor falta de atenção! Confessemos a nossa sem razão, e corrijamo-nos.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Improperium expectavit cor meum, et miseriam (Sl 68, 21)

(2) Quomodo hic litteras scit, cum non dedicerit? (Jo 7, 15)

(3) Quomodo probatur in confiatorio argentum, ei in fornace aurum sic probatur homo ore laudantis (Sl 27, 21)

(4) Si compatimur ut et conglorificemur (Rm 8, 17)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 239-242)