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Decreto eterno quanto ao modo da Encarnação

Meditação para a Terça-feira da 2ª Semana do Advento. Decreto eterno quanto ao modo da Encarnação

Meditação para Terça-feira da 2ª Semana do Advento

Sumário

Era já em Deus uma bondade infinita ter, desde toda a eternidade, decretado salvar-nos, e salvar-nos pela Encarnação; mas eis que agora se oferece às nossas meditações outro prodígio. Porque meio salvará o Verbo Encarnado o homem? A Santíssima Trindade decide em seus conselhos, que será:

1.° Pela humilhação;

2.° Pelo sofrimento;

3.° Pela morte.

— Depois de ter meditado estes profundos mistérios, tomaremos a resolução:

1.° De aceitar de bom grado todas as humilhações e frustradas esperanças do amor próprio, que nos sobrevierem;

2.° De submetermo-nos a todas as cruzes e provas da Providência;

3.° De oferecermo-nos a Deus como vítimas dignas da morte em virtude do pecado – Stipendia peccati mors (Rm 6, 23).

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Apóstolo:

“Fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho” – Cum inimici essemus, reconciliati sumus Deo per mortem Fili ejus (Rm 5, 10)

Meditação para o Dia

Adoremos a Santíssima Trindade decretando em Sua sabedoria, que o Verbo Encarnado teria na terra uma vida de humilhações e sofrimentos, que terminaria pela morte da cruz. Louvemos a Deus por semelhante desígnio: o mundo estava cheio de orgulho; era preciso opor-lhe a humilhação de um Deus; perdia-se pelo amor do prazer, era preciso opor-lhe os sofrimentos de um Deus; estava apegado à vida, era preciso a morte de um Deus para o despegar dela. Abençoado sejais, Senhor, por causa desta sabedoria infinita, que assim ensina ao homem a humilhar-se, sofrer e morrer; sede amado por causa desta bondade inefável que, em vez da glória e dos resplendores que vos pertenciam, abraça, para nosso bem, a humilhação, o sofrimento e a morte.

PRIMEIRO PONTO
Do decreto eterno, determinando que o Verbo Encarnado salvaria o mundo pela humilhação

Teria sido já para o Verbo eterno uma incompreensível humilhação, tão infinita era a distância, descer das alturas em que habita até aos coros dos anjos; teria sido humilhar-Se ainda mais descer até nós, ainda tomando o mais alto ponto a que possa elevar-se a humanidade, e abismar deste modo uma natureza infinitamente rica em uma natureza infinitamente pobre, esconder o Criador na sua criatura, o ser em o nada, a divindade no lodo da nossa carne. Porém, ó Trindade Santíssima, Vós vistes no meu coração orgulhoso uma repugnância tão profunda para a humilhação, que me é todavia devida por tantos títulos, que decidistes em Vossa sabedoria que era preciso descer até ao último degrau da nossa pobre natureza, e escolhestes para Vosso Verbo tudo quanto há de mais humilde na condição humana, um canto obscuro do mundo, uma pobre cabana; e nesta cabana, em vez de aparecer de repente homem feito, nove meses de vida oculta no seio de uma mulher de humilde condição; e ao cabo destes nove meses, um presépio; a fraqueza de um menino; e ao sair da infância, a condição de um pobre artífice; e ao deixar esta condição, três anos de um laborioso apostolado, perseguido pela calúnia, pelo desprezo, pelo ódio, a ponto de ser chamado um possesso do demônio, um agente de Belzebu, a ponto de ser reputado pior do que Barrabás, ladrão e assassino, a ponto de ser crucificado entre dois ladrões como o maior de entre eles; e depois de uma tal morte, as irreverências, as profanações, as humilhações infinitas e contínuas da Eucaristia! Ó meu Deus, quão incompreensíveis são os Vossos decretos! Adoro-os e amo-os, porque têm por fim corrigir o meu orgulho, a minha ambição e susceptibilidade. Não permitais que eu resista a tão forte lição.

SEGUNDO PONTO
Do decreto eterno determinando que o Verbo Encarnado salvaria o mundo pelo sofrimento

Se tivéssemos sido admitidos aos conselhos de Deus, teríamos pensado, sem dúvida, que o Verbo, tomando um corpo semelhante ao nosso, devia eximi-lo do sofrimento e inundá-lo de gozo, e felicidade. A Santíssima Trindade decidiu de outra maneira; decretou que o Verbo sofreria, e sofreria mais do que todos os mártires juntos, que toda a Sua vida seria um contínuo martírio, e mereceria, pelos seus sofrimentos, ser chamado o rei dos mártires. Ó Pai celestial, permiti-me, que Vos pergunte, porque é um decreto tão vigoroso, e isto com relação a Vosso Filho amado? Ah! Eu adivinho a Vossa resposta: é, me dizeis vós, porque quero ensinar ao mundo que o sofrimento é o castigo do pecado, cuja expiação meu Filho aceitou; que o sofrimento é o caminho da glória, o penhor e a medida da felicidade eterna para os que sofrem como convém; é porque quem consolar os aflitos de todos os séculos, mostrando-lhes que o sofrimento é um bem e uma prova do amor que tenho às almas; é, finalmente, porque quero oferecer a todos os homens, em meu próprio Filho, um modelo de paciência e resignação no meio das provações. Ó meu Deus, quão bom sois! Mil vezes obrigado por estas úteis lições, que custam tão caro ao vosso adorável Filho! Como me aproveitei eu delas até agora? Amei eu o sofrimento e a cruz? Perdão, meu Deus! A mim mesmo causo vergonha.

TERCEIRO PONTO
Do decreto eterno determinando que o Verbo Encarnado salvaria o mundo pela morte da cruz

Não era necessário que o Verbo Encarnado morresse para nos remir: uma só gota do Seu sangue teria podido expiar os pecados de milhares de mundos; mas a Santíssima Trindade escolheu a morte como o sacrifício mais próprio para reparar a ofensa feita a Deus pelo pecado, como o maior penhor da caridade divina para conosco, finalmente como o exemplo mais capaz de animar os mártires em seus sofrimentos e de ensinar a todos os cristãos que a morte, transito do desterro para a pátria, é mais para desejar do que para temer. — Entre todos os gêneros de morte, a Trindade escolheu a morte da cruz, porque sendo ao mesmo tempo a mais ignominiosa e a mais cruel, ensina-nos melhor o preço da nossa alma, a importância da nossa salvação, o horror ao pecado; é mais própria para reavivar as nossas esperanças, reanimar a nossa coragem entre os obstáculos; finalmente para nos fazer trilhar  intrepidamente o caminho do céu. Ó meu Deus, repito, quão bom sois! Como nada vos custa quando se trata do meu bem! Do alto da Vossa cruz, atrai-me a Vós, a fim de que eu só viva por amor de Vós. Tornai-me a morte amável, pois que primeiro a provastes.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 56-59)

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