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Decreto eterno quanto à Encarnação

Meditação para a Segunda-feira da 2ª Semana do Advento. Decreto eterno quanto à Encarnação

Meditação para Segunda-feira da 2ª Semana do Advento

Sumário

Para melhor apreciar o mistério da Encarnação, objeto da devoção deste santo tempo, meditaremos hoje quanto amor e quanta bondade encerra o eterno decreto:

1.° De remir o homem depois do seu pecado;

2.° De remi-lo pela Encarnação.

— Tomaremos a resolução:

1.° De evitar com grande cuidado todo o pecado, ainda que venial, que não pode ser expiado senão pela Encarnação;

2.° De não desprezar qualquer meio de salvação, por mais penoso que possa ser, pois que para a salvação um Deus se fez homem.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Evangelho:

“Amou tanto o mundo, que lhe deu o seu Filho unigênito para o salvar” – Sic Deus dilexit mundum, ut fiilium suum unigenitum daret (Jo 3, 16)

Meditação para o Dia

Elevemos o nosso espirito até ás mais intimas profundezas da Santíssima Trindade; assistamos pelo pensamento ao conselho destas três pessoas adoráveis, decretando entre Si o que vão fazer do homem depois do seu pecado. Prostremo-nos humildemente diante desse augusto conselho; adoremos, amemos, e louvemos os Seus decretos tão cheios de amor e de bondade.

PRIMEIRO PONTO
Bondade de Deus decretando desde toda a eternidade salvar o homem depois do seu pecado

Há neste decreto de Deus um insondável abismo de amor. Os anjos tinham pecado antes do homem; ficaram sem redenção, condenados para sempre ao inferno. O homem peca, e é remido. Porque é esta diferença? O homem era indigno disto por todos os títulos; porque é de uma natureza muito inferior aos anjos. Estes são os primogênitos da criação; a sua natureza é nobre, excelente, incomparavelmente superior à nossa; e nós não somos senão bichos da terra, um pouco de lodo transformado em homem. Os anjos não eram culpados senão de um pensamento de soberba; e nós, enriquecidos dos mais belos dons de Deus, apesar do nosso aviltamento, rebelamo-nos contra o nosso benfeitor; e isto em uma circunstância, em que a obediência era tão fácil, em que o preceito era intimado com tão terríveis ameaças. Porque é esta preferência do homem ao anjo? Ó mistério de amor! Sic Deus dilexit mundum! E a única resposta que se possa dar. O homem, pelos seus numerosos pecados claramente previstos, não aparecia aos olhos de Deus senão como um ser privado da graça e da justiça original, um objeto de horror para a justiça divina, um expulso do paraíso terrestre, um condenado à morte neste mundo e à morte eterna na vida futura, se não fosse remido; e Deus redime semelhante criatura com preferência aos anjos! Porque? Ó mistério de amor! (Jo 3, 16) É toda a resposta. Esse homem, que Deus favorece com tão admirável predileção, não lhe será reconhecido; Deus bem o sabe: será um coração duro, insensível a tanto amor, um pérfido que recomeçará as suas ofensas e as repetirá mais vezes do que tem de cabelos na cabeça; a maior parte dos homens até recusarão aceitar a redenção e quererão condenar-se; não haverá senão o pequeno número, que se aproveite deste benefício; e apesar disto, Deus decreta a redenção do homem com preferência aos anjos! Oh! Ainda uma vez, mistério de amor, a que somente se pode responder; Deus amou assim o mundo, porque quis! Pertence-nos adorá-lO, admirá-lO, agradecer-Lhe, amá-lO e louvá-lO.

SEGUNDO PONTO
Bondade de Deus decretando desde toda a eternidade salvar o homem pela Encarnação

Deus tinha dois meios de salvar o homem: o primeiro, perdoar-lhe gratuitamente e sem redenção; o segundo, subministrar-lhe com que pagar toda a sua dívida e oferecer à majestade divina ofendida uma reparação igual à ofensa. Deus não quis o primeiro meio, porque, se este meio fazia sobressair a sua misericórdia, não fazia sobressair nem a sua santidade, nem a sua justiça, nem a enormidade do pecado. Escolheu por conseguinte o segundo; mas, sendo infinita a gravidade da culpa, visto que a gravidade de uma injúria aumenta em proporção da superioridade da pessoa ofendida sobre a que ofende, era preciso uma reparação de um preço infinito; e onde achar uma tal reparação? Não era em Vós, ó meu Deus! Pois que não podeis humilhar-Vos nem sofrer, duas condições necessárias à expiação do pecado; não era era qualquer criatura, pois que se ela pode humilhar-se e sofrer, não pode dar às suas humilhações e aos seus sofrimentos senão um preço infinitamente limitado, o preço de um culto diminuindo em proporção da superioridade daquele que o recebe sobre o que o rende: não podia por conseguinte ser senão na hipótese da união hipostática das duas naturezas, realizada a qual, a natureza humana poderia humilhar-se e sofrer, e a natureza divina comunicar a estas humilhações e a estes sofrimentos um preço infinito. Deus adota este plano admirável, único possível; e o decreto da Encarnação lavra-se.

Ó Trindade Santíssima, eu Vos agradeço mil vezes! O Vosso decreto enleva-me. É o triunfo da justiça, que é plenamente satisfeito, o triunfo da bondade que se sacrifica, o triunfo da sabedoria, que concilia o que parecia inconciliável, o triunfo do poder, que une em uma só pessoa a extrema majestade e a extrema humildade, o triunfo da prudência que mostrando aos homens o que custa a um Deus para expiar o pecado, lhes ensina por isso mesmo a evitá-lo. Não podendo reconhecer tão grande benefício, ofereço-Vos, ó adorável Trindade, os louvores de todas as criaturas do céu e da terra, rogando-lhes que Vos bendigam e exaltem em todos os séculos. Ofereço-Vos a ação de graças que Vos ofereceu em nosso nome o Homem-Deus desde o primeiro momento de sua Encarnação; e conjuro-vos por Ele, que nos perdoeis a nossa insensibilidade e ingratidão para com tão augusto mistério de amor. Ofereço-Vos toda a minha vida, e em particular este dia, que quero empregar em amar-Vos.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 53-56)