O divino Fundador da nossa religião deu um dia a seus discípulos este mandamento eternamente memorável: “Buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça” (Mt 6, 33), e o resto vos será dado de acréscimo. A Igreja Católica sempre guardou esta regra de conduta: O Senhor me enviou para salvar as almas. Portanto, não para desenvolvera civilização? Não. Nem para trazer a felicidade à terra? Também não. Fundar o reino de Deus nas almas – eis a primeira e a mais alta tarefa da Igreja Católica.
Mas, se a Igreja sempre tem procurado unicamente cumprir essa tarefa, conforme à promessa do seu divino Fundador, as outras coisas lhe têm sido dadas por acréscimo. Se, pelo seu ensino, pela sua legislação, pelos seus mandamentos, pelo seu culto divino, ela realmente tem visado salvar as almas para a vida do outro mundo, tem entretanto comunicado ao mesmo tempo, um surto sem exemplo à felicidade terrestre da humanidade, e tornou-se a fonte de toda a civilização europeia, que com razão chamamos de “civilização cristã”.
Nesta instrução, quero completar o que disse precedentemente, dos méritos da Igreja. Na instrução anterior falei dos méritos religiosos e morais da nossa Igreja; hoje vou falar dos seus méritos em relação à civilização. Do ponto de vista religioso, o mérito da Igreja reside no fato de nos haver ela conservado sem alteração a doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo; do ponto de vista moral, pela defesa do respeito da autoridade, da justiça e dos direitos dos indivíduos, ela tornou possível a vida social do homem. Eis o que demonstrei na instrução passada.
Desejaria, agora, mostrar em largos traços, os méritos da Igreja em relação à civilização, narrando como a Igreja não só tornou possível uma vida social ordenada, mas ainda tornou mais bela, mais fácil, mais agradável a vida humana, pelo desenvolvimento em larga escala:
1. Da Civilização,
2. Das Ciências,
3. Das Artes.
1. A Igreja e a Civilização
Antes de tudo, vamos fazer esta pergunta: Que é que a civilização deve ao Cristianismo?
Há dezenove séculos soou aos ouvidos da infeliz humanidade um som desconhecido: a voz do cristianismo; e essa voz começou a traçar, no centro da sociedade pagã corrompida e ameaçando ruína, externa e internamente, o esboço de um mundo novo nas almas.
A) No tempo do paganismo, a compaixão e a piedade eram encaradas como uma vergonha, e o amor do próximo era desconhecido, não se conheciam nem orfanatos nem hospitais nem asilos de velhos, – foi só depois do cristianismo, foi só depois da doutrina de Cristo, que estender a um infeliz um simples copo de água foi considerado como uma obra meritória.
B) O paganismo não considerava a mulher como igual em direitos ao homem, pois o homem expulsava a mulher quando queria.
Escutai o que os escritores clássicos pensavam das mulheres. Hesíodo escreve:
“As mulheres são uma raça maldita, o mais pesado flagelo dos mortais” (Teogonía, v. 584, 589, 601).
Ésquilo diz das mulheres:
”Sois, na cidade e em casa os piores flagelos” (Sete contra Tebas, v. 165, 169, 172).
Catão inflamava-se contra elas:
“Quereis porventura tirar os grilhões a esses animais indomáveis e entregar-vos à esperança de que eles domarão os seus próprios rebentos?” (Tito Lívio, Hist. XXXIV, 2).
Os Romanos, ao lado da “majestade dos homens” (“majestas vitorum”), falavam do sexo feminino como do sexo “fraco” (sexus imbecilis), leve (levis), incapaz de trabalhar (impar laboribus).
Mas veio o cristianismo e tirou a mulher dessa situação humilhada, quando proclamou que o matrimônio é um sacramento que nunca pode ser rompido, e quando colocou nos altares a Virgem Maria, e desde então, nos homens, nunca se extinguiu para com a mulher um respeito tal, que, ao cabo de dezenove séculos, só a frivolidade da época moderna tem podido prejudica-lo. A família é a base da sociedade humana; ora, a consolidação da vida familiar é o imenso mérito do cristianismo.
C) No tempo do paganismo, o destino do filho era deplorável. Dependia do pai, que fosse conservado em vida ou fosse precipitado da rocha trapeia. Na “Lei das Doze Tábuas”, por exemplo, é dito: “Afogar-se-ão os filhos débeis e disformes” (Liberos, si debiles mostrosique sunt, merginus). “A criança ainda não é um ser humano” (Infans homo nondum est), – tal era o axioma da jurisprudência romana. Cristo, ao contrario, abraçava as crianças e ensinava que, mesmo na criança mais abandonada, vive uma alma imortal. Do mesmo modo que o culto da Virgem Maria foi a primeira lei de proteção à mulher, assim também Cristo promulgou a primeira lei de proteção à infância quando disse: “Aquele que escandalizar um desses pequenos que creem em mim, melhor fora para ele que lhe amarrassem ao pescoço uma mó de moinho e o precipitassem no fundo do mar” (Mt 18, 6).
D) Mencionarei ainda os longos séculos de lutas que o cristianismo sustentou pela supressão da escravidão, essa vergonha da humanidade.
Hoje em dia custa-nos crer que, durante séculos, homens foram vendidos nos mercados, como animais. Examinavam-lhes os dentes, arregaçavam-se-lhes os lábios, tateavam-se-lhes os músculos, depois fazia-se o preço e levavam-nos para casa como animais. “O proprietário açoitava-os com chicote e, se lhe aprazia, lançava-os no viveiro, e alimentava seus peixes com o corpo dos escravos” (omnia in servum licent), – se um nobre caráter tal como Sêneca pode dizer semelhante coisa (De clementia, I, 18), podemos imaginar qual seria a sorte desses infelizes. Se o dono da casa era assassinado, todos os escravos da casa eram mortos (Tácito: Anais, XIV, 42). E, enquanto a nobre Romana se enfeitava ou conversava com as amigas, divertia-se em picar com uma agulha a escrava que a servia (Ovídio: Arte de amar, III, 239).
Mas veio o cristianismo, e proclamou que, perante Deus, não há diferença entre o homem livre e o escravo, pois todo aquele que tem um semblante de homem possui uma alma à imagem de Deus; foi o cristianismo que fundou ordens religiosas para o resgate dos escravos, ordens, cujos membros deviam pôr tudo em obra para libertá-los, a ponto de, se não pudessem consegui-lo de outro modo, se entregarem a si mesmos em troca.
E) A Europa, na idade media, foi invadida pelos povos bárbaros, e foi o cristianismo quem os converteu. Os monges missionários foram a toda parte para lhes levar a luz do Evangelho; e, ao mesmo tempo que lhes pregavam Cristo, ensinaram a esses povos, que viviam numa cegueira de corpo e de alma, a agricultura, a arquitetura, o cultivo do solo, a indústria e a vida pacífica, numa palavra, a civilização. Em Pannonhalma ergue-se ainda hoje o claustro donde saiu toda a civilização húngara, e, do mesmo modo que em Santo Adalberto, em São Geraldo, e nas ordens religiosas veneramos não somente os mensageiros da fé, mas também os fundadores da cultura húngara, assim também cada povo europeu moderno venera, em tal ou tal sacerdote de alma heroica, em tal ou tal santo, em tal ou tal mártir da Igreja Católica, o criador da sua própria civilização: para os Franceses é São Remígio, para os Irlandeses é São Patrício, para os Escoceses é São Colombano, para os Alemães é São Bonifácio, para os Eslavos é São Cirilo e São Metódio, etc.
Só pode apreciar convenientemente a incomensurável obra civilizadora da Igreja Católica, quem conhece a natureza selvagem e indômita desses povos que foi preciso domar. Assim, o que os monges realizaram desbravando florestas virgens, ensinando a agricultura, transformando em povos sedentários aqueles povos nômades, e fundando escolas, foi realmente um trabalho sobre-humano.
Que teria sido mundo sem o incansável trabalho cultural dos monges da Idade Média? A conversão dos povos foi, em toda parte, seguida pela civilização material. Nos países devastados pelos Tártaros e pelos Turcos, a custo, aqui ou acolá, subsistem alguma lembrança, alguma ruína ou alguma denominação que recordam a obra dos antigos monges. Mas na Áustria, na Alemanha, na Suíça, na França, na Holanda… a cada passo, ainda hoje, ou existem, ou sobrevivem, nos apelativos de cidades ou aldeias, milhares de abadias, de colégios, de igrejas, de claustros, centros da civilização da sua época. A maioria das antigas cidades do estrangeiro tiveram por núcleo um claustro, em torno ao qual se edificaram as casas da cidade.
E o cristianismo não só criou essa civilização, mas teve também de salvaguardá-la. Primeiramente, os Vândalos, os Godos, os Hunos, os Lombardes, os Avaros, os Magiares; depois os Árabes, os Tártaros, os Turcos ameaçaram a civilização cristã. E quem a defendeu? Sempre a Igreja. A começar por São Leão Magno, que afrontou Átila, até Inocêncio XI, que conseguiu expulsar os Turcos da Hungria. No campo de batalha de Mohacs, há quatrocentos anos, bispos e arcebispos acharam a morte, e quando os Turcos instauraram a sua tirania na Hungria e o povo húngaro foi oprimido, quais foram, por assim dizer, os únicos arrimos do povo? Os religiosos franciscanos, que circulavam disfarçados pelo país. Eles foram os únicos amigos desse povo mártir; depois, foi-lhes dado o nome de “amigos”.
2. A Igreja e a Ciência
Ao lado do desenvolvimento da civilização material, o cristianismo tem ainda outro mérito: o desenvolvimento da cultura intelectual.
A) Antes de tudo, cumprir-me-ia falar, num capitulo especial, do papel do catolicismo a respeito do ensino. Mas é fato sobejamente conhecido, para que me seja preciso falar dele longamente. É fato notório que o que nos resta das obras-primas clássicas do paganismo, devemo-lo ao labor dos monges da idade media, que passavam as noites a copiá-las .
“Se a nação inglesa excede qualquer outro povo da Europa pela abundância dos seus anais e das suas reminiscências históricas, deve-o exclusivamente ao sacerdócio católico, que nos conservou esses tesouros” (David Hume, Richard III, cap. 23).
A Igreja, desde o século II, fundara escolas florescentes em Alexandria, Edessa, Antioquia, Nisiba. Em seguida, foram criadas, aos milhares, as escolas claustrais e paroquiais. E finalmente as universidades. É fato bem conhecido que a ideia de universidade é em si mesma uma ideia puramente eclesiástica, e as mais célebres e mais antigas universidades desenvolveram-se com o apoio da Igreja. Antes do século XV, já se conheciam cinquenta e duas universidades. Vinte e nove foram fundadas pelos papas, dez outras conjuntamente pelos papas e pelos soberanos. Que alegria deve encher a alma do homem moderno, tão ufano da ciência, ao pensar que outrora, há séculos, quando as pessoas mais distintas se preocupavam mais com a espada do que com a ciência, e era corrente ver até mesmo reis não saberem nem ler nem escrever, a Igreja já fundava universidades!
Hoje em dia ainda, há em muitos lugares tantas escolas religiosas quantas escolas oficiais, e é notório que, se alguém deseja dar uma boa educação à sua filha, coloca-a no Sacré-Coeur, no Sion, nas Angélicas, etc. É notório que, hoje em dia ainda, os primeiros colégios estão nas mãos dos Beneditinos, dos Jesuítas, dos Premonstratenses, dos Salesianos, etc.
B) Mas talvez não se conheça tanto, e por isto cumpre que eu o saliente especialmente, o trabalho imenso realizado pela Igreja não somente em prol da divulgação, mas também em prol do adiantamento da ciência.
A fé e a ciência, a vida religiosa e um saber muito extenso, são considerados por certas pessoas como incompatíveis. Ai! A nossa mocidade atual, que tem sede de ciência, coloca-se frequentemente diante deste dilema: “Ou ficar sendo um bom católico, ou fazer-se um sábio”. Digamos francamente que essa oposição é sem fundamento. Podemos mostrar sábios eminentes que foram, ao mesmo tempo, filhos fiéis da nossa religião.
Se há entre vós um filósofo, perguntar-lhe-ei se ele pode conceber a filosofia sem Santo Agostinho, Pedro Lombardo, Santo Alberto Magno, Santo Tomas de Aquino, São Boaventura e Duns Scott? Pois bem! Esses não eram apenas grandes filósofos, mas ao mesmo tempo católicos, que viviam segundo a sua fé.
Se há entre vós um físico, perguntar-lhe-ei se ele pode conceber a física sem Galvani, Volta, Ampère, Fraunhofer, Fizeau, Foucault, Siemens, Hertz, Ruhmkorff, Röntgen, Marconi. Não? Então não esqueçais que esses todos eram católicos sinceros.
E se há entre vós um matemático, perguntar-lhe-ei se pode conceber as matemáticas sem Cauchy, Descartes, Pascal, Leibnitz, Euler e Gauss. E a astronomia sem Copérnico, Kepler, Newton, Herschel, Leverrier. E a química sem Liebig, Pasteur, Dalton, Bequerel. Não? Pois bem! Todos esses foram não somente sábios ilustres, mas também filhos fiéis da nossa Igreja.
3. A Igreja e as Artes
A) Não posso, porém, continuar ainda esta enumeração, pois um outro terreno quase incomensurável, aguarda-me: a influência do cristianismo nas artes. Confesso que não é possível enfrentarmos esta questão no quadro duma simples instrução. Ser-me-ia preciso apresentar toda a história da arte, se eu quisesse mostrar a influência fecunda que o cristianismo tem exercido em todos os ramos da arte. Com efeito, quando o catolicismo apresenta ante as almas, as belezas infinitas da outra vida, faz nascer ao mesmo tempo na alma do artista a mais bela inspiração criadora. Não é de admirar que a Igreja Católica, que sempre considerou unicamente o mais belo como digno do louvor divino, se tenha tornado a protetora incomparável das artes, na terra.
a) Que deve a arquitetura à Igreja Católica? Basta interrogar qualquer historiador da arte se os estilos romano, gótico, renascença e barroco são outra coisa senão a representação dos esforços da Igreja Católica para glorificar a Deus, pela pedra. Se não houvesse Igreja Católica, então não haveria Santa Sofia em Constantinopla, não haveria em Worms, em Mogúncia, Bamberg, Spira e Pisa as catedrais romanas. Se não houvesse Igreja Católica, não veríamos alçando-se para o céu as catedrais de Ruão e de Reims, nem Notre-Dame de Paris, nem o “duomo” de Milão, nem as catedrais de Sevilha e Toledo, nem o zimbório de Colônia, nem a Igreja de Santo Estevão de Viena, nem Santa Isabel de Kassai, nem São Matias de Budapest. Se não houvesse Igreja Católica, então também não haveria Donatello e Cellini, nem Bernino e Maderno, nem a Basílica de São Pedro, de Miguel Ângelo, nem mil outros tesouros de arquitetura.
b) E, depois da arquitetura, deveremos dizer também uma palavra da pintura. Se, viajando pelo estrangeiro, visitamos as primeiras galerias de quadros do mundo: as galerias de Munich e de Desde, do Louvre em Paris, o museu do Estado em Amsterdam, a galeria dos Ofícios em Florença, as coleções do Vaticano… podemos perguntar-nos que restaria delas, se se tirassem os quadros religiosos? Dos primeiros museus de pintura do mundo só restariam paredes vazias. Sim: procure-se imaginar a pintura sem Guido Reni, Giotto, fra Angélico, Ghirlandaio, Filippo Lippi, Botticelli, fra Bartolomeo, Ticiano, Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo e Rafael, sem van Eyck, Memling, Rubens, van Dyck, Murillo! Ora, todos esses artistas hauriram a sua inspiração no catolicismo, e acharam no catolicismo um generoso Mecenas.
c) Deverei falar também da música? Deverei dizer que a música, e a música de igreja, longo tempo foram idênticas? Direi que a notação musical foi inventada pelos monges? Que o prefácio que a Igreja canta em toda missa é composto apenas sobre quatro notas, e que, não obstante, Mozart “se prontificava a sacrificar por ele todas as suas composições”? Falarei de Palestrina, da Ave-Maria de Gounod, das missas de Haendel, de Haydn e de Liszt, do Requiem de Mozart?
Em verdade, mesmo aqueles que não querem saber de Deus e da religião, e para os quais não tem valor a atividade religiosa da Igreja Católica, mesmo esses são forçados a reconhecer que, há dezenove séculos, o catolicismo é a fonte inesgotável da mais viva criação artística, e que a Igreja, em todos os ramos da arte, adquiriu um mérito imperecível, pela sua proteção inigualável à arquitetura, à pintura, à escultura, à música e à poesia.
B) Mas vale ainda a pena investigar qual pode ser a causa disso. Qual pode ser a explicação da grande influência da Igreja sobre a civilização?
a) Uma dessas causas – mas não a primeira – foi o generoso auxilio material concedido pelos papas e bispos, que foram verdadeiros
b) Ao lado dessa causa externa, há uma causa interna mais importante: o otimismo que banha todo o catolicismo, essa serenidade e essa alegria interiores que constituem a atmosfera vivificante de todas as artes. A vida, certamente, é penosa e austera, e a tarefa mais nobre consiste em dourar, em embelezar, em aureolar de luz essa vida austera e mesmo às vezes bem triste. E só o sol do Evangelho é capaz disso.
c) A arte precisa de ideal e de assuntos. Onde, porém, poderia ela achar ideal mais elevado e assuntos mais possantes do que no catolicismo? Assim, não foi, por acaso, que do ideal sublime do culto de Maria saíram, aos milhares, imagens mais belas umas que as outras, e que ele forneceu, às dezenas de milhares, assuntos à música e à poesia? Não houve, nem haverá jamais, tema mais sublime, mais comovente e mais capaz de estimular a alma dos maiores artistas do que o Menino Deus nos braços da Santíssima Virgem. Ora, esse é um simples episódio da vida da Bem-aventurada Virgem. Acrescentemos toda essa multidão de assuntos que sua vida põe à disposição da arte – desde a Mãe que se alegra junto ao presépio de Belém até à Nossa Senhora das Dores ao pé da cruz – e achamos uma fonte, por assim dizer, inesgotável de inspirações artística.
Lembrarei ainda quantos temas oferecem às artes, os santos, que são as obras-primas vivas, do Espírito Santo, e cuja vida reflete a fonte última de toda beleza, Nosso Senhor Jesus Cristo. Tantos temas e assuntos novos há para as artes, quantos santos na Igreja.
d) Mas, se o catolicismo se tornou a estufa das mais altas criações artísticas, fora das causas enumeradas até aqui, a razão disso está também na profundeza da vida da Igreja. As grandes ideias não nascem no barulho da rua; as concepções artísticas reclamam recolhimento, silêncio e paz da alma. Ora, o catolicismo dá-nos essas disposições e essa paz da alma. Pelos sacramentos ele comunica a graça de Deus, para que possamos dizer com São Paulo: “Já não sou eu quem vive, é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20). É o próprio Deus que vive na alma desse “homem novo”, e quem, com alma meditativa, desce ás profundezas misteriosas dessa sublime realidade, percebe que, quanto mais os olhos do corpo se fecham para o mundo, tanto mais claramente o seu gênio começa a ver belezas sobrenaturais desconhecidas. As obras-primas, de graça e fineza inigualáveis, dos artistas religiosos da idade média, são a prova dessa dependência entre a arte e a mística.
A história da arte mostra que a arte dum povo é sempre o reflexo da sua religiosidade. Só assim, pois, se pode compreender que deve ser a mais bela a arte em que se reflete a única religião verdadeira, a religião de Cristo. A beleza alimenta-se da verdade, e é por isto que a religião prega a verdade perfeita, se tornou a fonte da mais perfeita beleza.
Eis-nos agora na última razão que tem feito do catolicismo a fonte mais rica das artes. Essa causa é que a própria Igreja é Cristo continuando a viver entre nós, é que ela é a fonte última, eterna e única de toda beleza. A Igreja tornou-se a mãe das artes, porque todo o seu ser é banhado na beleza do seu divino Fundador.
***
Meus irmãos, a Igreja Católica ensinou aos Europeus esse trabalho ardente, donde saiu toda a nossa civilização, e é por isso que não posso compreender como um Europeu possa tornar-se budista, se bem que alguns, após a Grande Guerra, tenham tentado levar-nos para o budismo. Há almas preguiçosas que “flertam” com os nevoeiros do Nirvana; há almas seduzidas por uma moda insensata que, em vez do crucifixo, em vez da cruz de Cristo a padecer e morrer por nós, colocam na escrivaninha a estatua de Buda obeso, refestelado preguiçosamente, extinguindo em si todo sentimento… Mas ainda que ninguém mais contradissesse essa aberração de espírito, a alma imaginativa e perpetuamente inquieta do trabalhador europeu a isso se oporia. Onde está o Europeu que faria seu, o dogma budista da covardia e do frio da morte? “É melhor estar em pé do que andar; é melhor estar sentado que em pé; é melhor estar deitado que sentado; é melhor dormir do que estar acordado, e é melhor morrer do que viver…”.
Que túmulo! Que letargia!
Em compensação, a História dezenove vezes centenárias fala em favor da nossa Igreja. Em seu favor fala o fato de viver ela ainda, após inúmeras investidas do inimigo. Em seu favor, fala o fato de milhões de mártires terem dado sua vida por ela. Falam ainda em seu favor a sua unidade, a sua santidade, a sua apostolicidade e a sua civilização. Finalmente, falam em seu favor essas inumeráveis bênçãos que ela tem derramado sobre o indivíduo e sobre a família, sobre a vida privada e sobre a vida social, sobre os povos e sobre os países, sobre as ciências e as artes, sendo com justiça que o papa Leão XIII denominou a Igreja “a Mãe da civilização”.
Creio, pois, nessa Igreja. Sem dúvida, é só a Cristo que busco, mas peço à Igreja que me conduza a Ele por caminho seguro. Quero observar os mandamentos de Cristo mas pergunto à Igreja o que é pecado e o que não é. Creio na minha Igreja, e sigo-a, para poder viver na luz e na força, no progresso e na tranquilidade da alma.
Eis ai minha Santa Igreja Católica, “que é a Igreja do Deus vivo, a coluna e a base da verdade” (1Tm 3, 15). “Não me envergonho dela, pois sei em quem pus a minha confiança” (2Tm 1, 12).
Essa fé dá-me a calma na agitação da vida.
Dá-me a luz nas trevas da vida.
Dá-me a força nos combates da vida.
E – creio-o – dar-me-á um dia a coroa eterna, depois de haver sustentado vitoriosamente as lutas deste mundo. Amém.
(Toth, Mons. Tihamer. A Igreja Católica. Rio de Janeiro: José Olympio, 1942, p. 187-200)