Meditação para a Segunda-feira da 6ª Semana depois da Epifania
SUMARIO
Continuaremos a estudar a vida de Jesus em Nazaré, e veremos:
1.° Que foi uma vida pobre;
2.° Como devemos imitá-la.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° De escolhermos sempre para nós o que é de menos valor e mais incomodo, deixando o que é melhor aos outros;
2.° De gostarmos de ser pobres em tudo, no vestuário, no alimento, na morada, em tudo o mais.
O nosso ramalhete espiritual será a primeira das bem-aventuranças:
“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus” – Beati pauperes spiritu, quoniam ipsorum est regnum caelorum (Mt 5, 3)
Meditação para o Dia
Transportemo-nos pelo pensamento à morada de Nazaré; contemplemos ali o Filho de eterno Deus na pobreza. Tem um pobre vestuário, uma pobre comida, uma pobre cama, uma pobre casa, e ali ganha o Seu sustento, como os pobres, à força de trabalho. Tributemos-Lhe os nossos respeitos nesse estado a que o amor O reduziu.
PRIMEIRO PONTO
Maravilhas da vida pobre de Jesus em Nazaré
É necessário que a pobreza seja uma coisa bem sublime para que um Deus, vivendo sobre a terra, a escolhesse para Si. Ele que havia confiado tão grandes tesouros à terra, ao mar, ao firmamento, podia ser rico, se o tivesse querido; só dEle dependia viver no luxo e opulência, ter por morada um palácio, exceder em riquezas todos os príncipes do mundo. Mas, ó santa pobreza, a tua excelência cativou o Seu coração; preferiu-te a tudo o mais. Apareceste-lhe como a irmã da humildade; porque as riquezas tornam-nos as mais das vezes soberbos e arrogantes; julgamos valer mais do que os outros, porque temos criados mais numerosos, vestidos mais esplêndidos, uma casa mais suntuosa, campos mais extensos; enquanto que tu, santa pobreza, inspiras sentimentos inteiramente contrários; por causa de ti somos menos considerados, mais esquecidos, muitas vezes até desprezados; e então facilmente nos humilhamos. Apareceste-lhe como a companheira da mansidão; porque o rico sente-se inclinado a mandar com império e dureza; enquanto que o pobre, que vê toda a gente acima de si, se faz o mais manso que pode nas suas palavras e maneiras. Apareceste-lhe como a mãe do santo amor; porque, desprendendo a alma de todos os cuidados da terra, deixa-a mais livre para se elevar a Deus. Assim como a ave, que soltaram da sua prisão, ela toma mais facilmente o seu voo para os céus, para Deus só; enquanto que as riquezas cativam o coração; a sua posse é um estorvo que o preocupa e o distrai; a sua administração um cuidado; a sua perda uma amargura; o seu gozo um perigo; finalmente, ele viu em ti o segredo da santidade. Tirando do coração os amparos e as consolações da terra, dispõe-lo a recorrer àquele que se chama o Pai dos pobres, a implorar com confiança aquele que prometeu atender aos desejos dos pobres (1), a unir-se a Deus como ao amigo mais seguro, ao protetor mais devotado, e a entrar assim nessa vida de união divina, que é o complemento de toda a virtude.
Ó santa pobreza, quão excelente és pois! Já me não admiro da escolha que Deus fez de ti. Oxalá eu te aprecie como Ele!
SEGUNDO PONTO
Como devemos imitar a pobreza de Jesus Cristo
Há duas espécies de pobreza: a pobreza interior e a pobreza exterior.
A pobreza interior consiste em termos o coração desapegado das riquezas e dos bens do mundo; isto é, quando os não possuímos, em não nos envergonharmos de os não ter, em não os desejar, em não os buscar; e quando os possuímos, em não nos valermos deles para nos estimarmos mais, em não pensar neles com complacência, em não pôr neles a nossa confiança e o nosso amparo, em conservá-los sem inquietação, em perdê-los sem dor, em não gastar na sua administração o tempo que exigem outros deveres, em mostrarmo-nos desinteressados, em fazer de boa vontade esmolas, emprestar facilmente, contribuir para todas as boas obras, olhando-nos apenas como administradores dos bens de Deus, e não dispondo deles senão segundo o que parece mais na ordem da Providência.
Sondemos o nosso coração, e vejamos se serão estas as nossas disposições.
A pobreza exterior consiste em sofrermos, sem nos queixarmos, as privações e a miséria, o frio e o calor, o trabalho e a fadiga, tudo o que sofrermos pobres; em contentarmo-nos com móveis de pouco valor, com vestidos simples, com comeres pouco apetitosos; em sujeitarmo-nos de bom grado aos misteres mais humildes, como varrer o nosso quarto e fazer a nossa cama; em não imitarmos aqueles que querem que lhes não falte nada, ter todas as comodidades, e satisfazer a sua vaidade com o luxo dos vestidos ou dos móveis, as iguarias ou as despesas supérfluas. Quem nasceu pobre, mostra-se contente com isto. Se o vem a ser por alguns revezes sofre sem se queixar, e gosta de passar por pobre, e de se conformar nisto com Jesus Cristo pobre. São estas as nossas disposições?
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Desiderium pauperum exaudivit Dominus (Sl 9, 17)
Voltar para o Índice do Tomo I das Meditações Diárias de Mons. Hamon
(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 297-299)