Obter o Socorro Divino
O Rosário, segundo o espírito de São Domingos e pelo desejo de Nossa Senhora, tem um duplo fim: — obter do céu a proteção e a graça por Maria, e, formar as almas na escola das virtudes que é a contemplação dos mistérios.
É um brado de socorro ao céu e uma escola de virtudes. O primeiro movimento, diz Leão XIII, a atitude tradicional dos católicos nos perigos, e nas circunstâncias difíceis, foi sempre recorrer à Maria e se entregar em paz à sua maternal bondade. Esta piedade profunda e confiante na Rainha do céu, resplandece ainda mais quando se propaga o veneno das heresias, ou campeia a imoralidade, e os inimigos da fé parecem fazer periclitar a Igreja militante do Senhor.
A história antiga, a história moderna, a história eclesiástica, relatam os votos, as orações públicas, e particulares, dirigidos à Mãe de Deus, e os socorros alcançados pela sua intercessão. A paz e a tranquilidade públicas, que Ela obteve do céu. Daí tantos e belos títulos com que A saúdam as nações cristãs: — Nossa Senhora Auxiliadora, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Nossa Senhora da Consolação, Nossa Senhora dos Exércitos, Nossa Senhora da Paz! Entre estes títulos, porém, diz Leão XIII, enfim, há um que se impõe e que consagra e imortaliza os insignes benefícios de Maria à cristandade — é o de Rainha do Santíssimo Rosário (1).
É o Rosário, portanto, a forma clássica de oração com que a Igreja recorre à Maria para obter o socorro do céu nas horas de perigo, e em todos os tempos.
E por quê? Porque realiza todas as condições de uma verdadeira e eficaz oração. Quanto ao objeto, pede a Deus o que Deus nos mandou pedir na fórmula essencial de toda oração perfeita: o Pai-Nosso.
Pede com piedade, porque o Rosário facilita e favorece a boa oração, fixando a atenção nos mistérios que se contemplam. É uma oração perseverante, repetindo sempre as mesmas preces, e pedindo sempre as mesmas graças necessárias para a salvação.
Finalmente, é uma oração que recitada em comum realiza admiravelmente o desejo de Nosso Senhor, de que se reúnam os cristãos e peçam ao Pai em seu nome; e Ele estará no meio deles. Se o Rosário, pois, reúne todas as condições da verdadeira oração, como não há de ser eficaz para obter o socorro do céu?
A Formação Cristã
O fim do Rosário não é só repetir as duas mais belas orações do cristão para obter o socorro do céu. É também formar as almas na escola das virtudes, pôr diante de nós os exemplos Divinos de Jesus Cristo e as virtudes e prerrogativas de Maria. Os Papas, e sobretudo Leão XIII, diante da corrupção dos costumes e os erros contra a fé, apelam para o Rosário, e, sobre inculcarem a necessidade desta prece incomparável para alcançar do céu todas as graças, a apresentam como remédio à corrupção dos costumes e escola de santidade.
A piedade cristã, a moralidade pública, a fé que é o bem Supremo e o princípio das outras virtudes, tudo isto está sempre ameaçado, e o perigo cresce cada dia.
“Sigamos então o exemplo de São Domingos, diz Leão XIII — Este grande Santo, iluminado pela luz celeste, viu claramente que para curar os males do seu século, nada mais eficaz havia que levar os homens a Cristo que é o caminho, a verdade e a vida, pela meditação frequente da salvação que nos vem por Ele” – Supremi Apostolatus
Pela contemplação dos mistérios a alma aprende a virtude nos exemplos de Jesus e Maria, tirados do Evangelho. Nos mistérios gozosos, eis os seus frutos:
A Anunciação — a humildade.
A Visitação — a caridade.
O Nascimento de Jesus — o desapego.
A Purificação — a castidade.
O Encontro de Jesus no Templo — a obediência.
Passando a contemplação dos mistérios dolorosos, quantas lições tocantes e comovedoras!
A Agonia do Horto — o ódio ao pecado.
A Flagelação — mortificação dos sentidos.
A Coroação de espinhos — mortificação do espirito.
A cruz aos ombros de Jesus — A paciência
A Crucifixão — O amor às cruzes.
Nos mistérios gloriosos a alma reaviva a sua fé com a lembrança da Ressurreição.
Enche-se de esperança no céu com a Ascensão.
Implora a caridade, o Amor Divino, com a meditação da descida do Espirito Santo sobre os Apóstolos.
Deseja a União com Deus, ao contemplar o mistério da Assunção da Virgem, e cuida da sua Perseverança, ao meditar a Coroação, o triunfo de Maria no céu.
Pois, todas estas cenas tocantes do Evangelho, da glória de Maria, sempre lembradas cada vez que se recita o Rosário, e meditadas atentamente, com as resoluções da prática das virtudes correspondentes a cada mistério, não se tornam uma verdadeira escola de perfeição cristã? Se tanta gente que aí recita o santo Rosário não progride na virtude, é porque, ou não o compreende, ou não o recita como deve. Não o medita.
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EXEMPLO
O Rosário Santifica
Na Espanha uma menina aprendeu a recitar o Rosário contemplando os mistérios, e tomou este hábito cada dia com fidelidade. Recitava os mistérios gozosos pela manhã em jejum, os dolorosos depois do meio dia, e os gloriosos à noite antes de se deitar. Rezava de joelhos e com todo fervor. Trazia o Rosário à cintura como uma religiosa. Mais tarde, casou-se, e continuou sempre com o piedoso hábito. Teve muitos filhos e os educou todos na contemplação dos mistérios do Rosário! Um dia, celebre pregador veio à cidade onde santamente vivia esta criatura. E ela foi pedir conselhos e uma direção espiritual ao sacerdote ilustre.
— Minha filha, diz o pregador, antes de mais nada, quero dizer o que é preciso fazer: viva em perfeita união e paz com seu esposo. Procure educar os filhos na religião e com severidade e austeridade de costumes puros. Seja bem caridosa e dedicada para com os pobres e os desgraçados. Esteja sempre no trabalho ou na oração, fuja da ociosidade como da peste. E depois de todos os deveres da casa, dá algum tempo a mais, à oração e às práticas de piedade.
— Meu padre, diz a senhora, já de há muito faço tudo isto, e há uma prática de piedade que me dá força e me ensina muita coisa, é minha escola de virtude.
— Que pratica é esta? Pois já não basta o que faz?
— É o Rosário, meu padre, eu o recito inteiro cada dia em três partes. O primeiro Terço é a nossa Senhora, e lhe digo que encha meu coração de amor de Deus. Ela, cujo coração amou a Jesus, cujos olhos viram Jesus, cujos ouvidos ouviram a saudação do Anjo, cujos lábios oscularam Jesus, e sinto em mim qualquer coisa de Maria quando rezo. No segundo Terço, choro de dor de meus pecados e beijo as chagas de meu Redentor! Sinto-me inundada de amor e de compaixão. O terceiro Terço é dos santos. Peço a eles que façam minha vida como a deles! Às vezes sinto-me arrebatada e fora de mim. E com toda simplicidade, sem a mínima afetação, esta alma pura foi narrando quanto aprendera na contemplação dos mistérios. O pregador comovido exclamou:
— Minha filha, sou teólogo e doutorado há vinte anos, e nunca ouvi coisas tão belas e sublimes tiradas de uma simples contemplação do Rosário. Vou fazer também assim. E pregando o Rosário, este homem, mais tarde Bispo, converteu muitas almas pregando e ensinando o método de oração daquela alma humilde. Tornou-se um apóstolo do Rosário meditado.
Trésor d’Histoires-Millot
Referências:
(1) Supremi Apostolatus – 1 Setembro 1883
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(BRANDÃO, Monsenhor Ascânio. O Mês do Rosário, Edições do “Mensageiro do Santíssimo Rosário”, 1943, p. 30-37)