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O Sacrifício Eucarístico

Crucificação
Não leu o capítulo anterior? Leia agora mesmo: “A Presença Real

1. Natureza deste Sacrifício

Em que sentido a Eucaristia é o prolongamento da Redenção?

A Eucaristia é o prolongamento da Redenção porque se consagra e celebra sob a forma de verdadeiro sacrifício, renovação e atualização do mesmo Sacrifício do Calvário em que se consumou nossa Redenção.

Assim como, atualizando a presença da Humanidade de Cristo, a Eucaristia é o prolongamento da Encarnação, atualizando e tornando presente de modo novo o Sacrifício do Calvário a Eucaristia é o prolongamento da Redenção.

Que quer dizer «atualizar e tornar presente de modo novo» o Sacrifício do Calvário?

Quer dizer que Jesus Cristo, real, verdadeira e substancialmente presente neste Sacramento, por prodígio não menos admirável e misterioso, no ato em que é consagrado sob espécies distintas de pão e de vinho, aí se coloca em estado de vítima, tornando atual, de modo não sangrento, o mesmo Sacrifício de outrora, e aplicando atualmente os seus frutos de santificação.

O Sacrifício de Cristo é único e se fez uma só vez, como diz São Paulo (Hb 9, 26; 27 e 28; 10, 14).

Do mesmo modo, como se realizou no Calvário, isto é, sangrentamente, não se pode atualizar, porque Cristo ressurgido não morre mais. De modo porém, incruento, modo novo, portanto, — o poder infinito do Senhor o pode atualizar misteriosamente, no ato em que o rememoramos, segundo a ordem do mesmo Senhor:

“Fazei isto em memória de mim”

“O augusto Sacrifício da altar não é, pois, uma pura e simples comemoração da Paixão e Morte de Cristo, mas um verdadeiro e propriamente dito Sacrifício, no qual, imolando-se incruentamente, o Sumo Sacerdote faz o que fez uma vez sobre a cruz, oferecendo-se totalmente ao Pai eterno como hóstia gratíssima” — diz Pio XII na Encíclica “Mediator Dei”

Por que o Papa diz, no texto citado, que o Sacrifício da altar é «um verdadeiro e propriamente dito Sacrifício»?

Porque o Sacrifício do altar satisfaz a todas as condições de um “verdadeiro e propriamente dito Sacrifício“.

A noção que universalmente se tem de sacrifício é a da oblação de um objeto sensível, com sua imolação, feita por um Sacerdote a Deus, para adorá-lo, agradecer-lhe, pedir-lhe perdão e implorá-lo.

Em todos os tempos e entre todos os povos, ainda os mais primitivos, existiu o costume de oferecer sacrifícios a Deus. Estes sacrifícios eram sempre constituídos de coisas sensíveis, que os homens ofereciam em substituição de suas pessoas, com os fins supra enumerados, e por mãos de sacerdotes, que eram tidos como deputados oficiais para o culto divino em nome da sociedade.

Através da Sagrada Escritura vemos que Deus recebe e pede tais sacrifícios a seu povo eleito. Haja vista os Sacrifícios de Abel (Gn 4, 3-5), de Noé (id. 8, 20), de Abraão (Gn 15, 17-22) e as numerosas prescrições que Deus fez relativamente aos Sacrifícios (Ler: Lv 10 primeiros capítulos).

Temos, pois, que, segundo o entender natural do homem e a vontade ordenada de Deus, o culto divino se faz pelo Sacrifício, e que o Sacrifício é oferta ou oblação de coisa sensível de acordo com as noções que enunciamos acima.

Este conceito de Sacrifício completou-se e foi sublimado no Sacrifício de Cristo, Deus-Homem. Fazendo-se um de nós, revestindo um corpo real e passível, Ele se colocou em lugar de todas as oblações sensíveis, que já não eram do agrado de Deus (Sl 39, 7) e se ofereceu uma vez por todas como vítima pela humanidade, imolando-Se, obtendo nossa santificação e rendendo glória completa ao Senhor (Cf. Ep. aos Hb, cap. 7, 10).

Ora, precisamente este Sacrifício de Cristo, o mais perfeito e acabado Sacrifício, onde Cristo é Vítima e Sacerdote,— Sacrifício feito uma vez cruentamente no Calvário — é que de novo se oferece, atualiza e aplica às almas sobre o altar, de modo incruento e misterioso.

Eis porque o Soberano Pontífice pôde dizer que o Sacrifício do altar é “um verdadeiro e propriamente dito Sacrifício“.

Então o Sacrifício eucarístico é o mesmo do Calvário e não outro, embora de Cristo?

Não faltam teólogos que afirmem uma identidade absoluta, numérica mesmo, entre o Sacrifício do Calvário e a Missa (1)

Outros propugnam uma diferença real, de número e de espécie, entre estes sacrifícios, embora não neguem a unidade de ordem entre eles (2).

A Igreja não desceu a pormenores de distinções. Ela somente definiu que:

1. O Sacerdote e a Vítima do altar e do Calvário são idênticos numérica e substancialmente:

“Uma e a mesma é a Vítima e Aquele que oferece pelo ministério dos Sacerdotes é o mesmo que, outrora, se ofereceu na Cruz…” — (Cone. Trid. Sess. XXII, Cap. II)

2. O modo pelo qual este Sacerdote único e única Vítima se oferece é um modo diverso no altar e na Cruz (id., Ib.).

3. É também um dogma católico a unidade do Sacrifício de Cristo. Isto é, Cristo fez um só Sacrifício de Si mesmo. São Paulo o afirma, positivamente, em Hb 9, 26-28 e 10, 12 e 14.

Entretanto, das definições do Concílio Tridentino e das exposições da “Mediator Dei” ressalta uma distinção entre o Sacrifício do Calvário e Sacrifício da Eucaristia. Reafirmando a única oblação de Cristo na Cruz, o Concílio define claro que Jesus, cujo sacerdócio não devia extinguir-se pela morte, quis deixar à Sua Igreja “um sacrifício visível, como o reclama a natureza humana, próprio para representar aquele Sacrifício cruento que ia consumar-se uma vez por todas sobre a cruz”.

Neste tópico, está afirmada, positivamente, uma dualidade de sacrifícios: sacrifício cruento da Cruz e o Sacrifício visível do altar que representa o primeiro!

Prosseguindo nas suas definições, o mesmo Concílio define que Cristo instituiu “uma nova Páscoa, na qual Ele devia ser imolado pela Igreja sob sinais visíveis mediante o ministério dos Sacerdotes“. Donde se infere que o Sacrifício do altar não é somente “comemoração do Sacrifício cruento”, mas “verdadeiro e propriamente dito Sacrifício”, diz a “Mediator Dei” — pois “imolando-se incruentamente, o Sumo Sacerdote faz o que fez uma vez sobre a Cruz…”

Concluindo, sem descer a pormenores de distinções, dizemos que o Sacrifício da missa é o Sacrifício de Cristo feito uma vez cruentamente sobre a Cruz e atualizado MISTERIOSAMENTE DE MODO INCRUENTO SOB AS ESPÉCIES SACRAMENTAIS para aplicação atual dos copiosos FRUTOS do Calvário.

Mas, no Calvário, se deu a morte de Cristo; aqui não pode Cristo morrer, pois Ele é hoje glorioso… E a morte não é da essência do Sacrifício de Cristo?

Notemos que o Sacrifício de Cristo é uno e o Seu Sacerdócio é eterno. E como sacerdócio e sacrifício são correlativos, o Sacrifício uno deve perdurar enquanto perdurar na Igreja a função sacerdotal de Cristo, Sacerdote eterno. E este Sacrifício único — que inclui a morte de Cristo, — por um prodígio do poder divino se torna presente sob símbolos sacramentais, para aplicar atualmente os seus ubérrimos frutos. Logo, não se trata de Cristo morrer de novo sobre o altar. Trata-se de estender misticamente até nós a morte efetivada no Calvário — ainda que Cristo seja atualmente glorioso e impassível — e aplicar os seus divinos efeitos.

Dizemos, pois, que é da essência do Sacrifício redentor a morte, sinal do holocausto absoluto de Cristo por nossas almas. E esta morte se deu no Sacrifício único de Nosso Senhor, de que a Santa Missa é a atualização sacramental.

Mas como se pode realizar esta «atualização sacramental» de um fato passado há dois mil anos?

Pelo poder infinito de Deus. O mesmo poder soberano que pode colocar-se presente sob as espécies sacramentais, pode também colocar-se aí em estado de Vítima, atualizando o holocausto do Calvário.

Do mesmo modo pelo qual Jesus se acha presente em muitos pontos do universo e em milhões de hóstias, também deste mesmo modo atualiza milhares e milhões de vezes o seu único Sacrifício.

O poder de Deus pode realizar tudo o que não induz contradição metafísica. Caso contrário, não seria poder infinito.

Ora, já vimos que a presença a modo de substância não induz nenhuma contradição, conforme os ensinos da filosofia.

E é em virtude deste mesmo modo de presença que, sobre os altares, no instante da consagração, se torna presente também o Sacrifício único de Jesus Cristo.

Em que difere o Sacrifício de Cristo na Cruz o na Missa?

A diferença está no modo sob que Cristo faz a oblação de si mesmo; na Cruz ele a fez de modo cruento e patente, sem véus de mistérios; na Missa, atualizando e representando o mesmo Sacrifício, ele faz a oblação de si mesmo de modo incruento, imolando-Se sob véus ou símbolos sacramentais.

O Sacrifício da Missa continua a ser um Sacrifício visível, porém visível doutro modo. O Sacrifício visível e sangrento do Calvário é-nos agora apresentado realmente presente de modo incruento, mas visível somente sob os signos sacramentais.

O modo pelo qual se apresentou ao mundo o Sacrifício de Cristo no Calvário foi o modo cruento e visível sem símbolos; o modo pelo qual se nos apresenta agora é o modo incruento, e visível sob símbolos sacramentais.

Não bastava o Sacrifício da Cruz? Por que renová-lo cotidianamente?

O Concílio de Trento já respondeu a esta pergunta, dizendo que Cristo quis “deixar à Igreja, sua Esposa, um Sacrifício visível”.

Um grande teólogo — Cardeal Billot — salienta que o característico especial do Sacrifício da Missa, pelo qual ele se diferencia do Sacrifício da Cruz, é que ele é o Sacrifício da Igreja, Corpo Místico (3).

A imolação cruenta do Calvário é a imolação da Cabeça, a santificar os membros e a incorporá-los a si. No Calvário foi que nasceu a Igreja, Corpo Místico, segundo a doutrina de Pio XII. A Igreja, portanto, só participou do Sacrifício da Cruz passivamente.

No altar, na imolação incruenta, os membros já santificados e incorporados a Cristo vão participar ativamente no sacrifício redentor.

Por isto, certamente, o Concílio de Trento, falando da instituição do Sacrifício da Nova Lei, diz que, neste Sacrifício, Cristo “devia ser imolado sob sinais visíveis pela Igreja mediante o ministério de Sacerdotes“(Sess. XXII, Cap. I).

Por que Jesus quis renovar o seu Sacrifício sob símbolos sacramentais e não sob outra forma?

A esta pergunta vamos responder, ainda, com as palavras do Concílio de Trento:

“Na última ceia, na noite em que ia ser entregue, querendo (Jesus) deixar à Igreja, sua Esposa amada, um Sacrifício visível como o exige a natureza dos homens, que representasse o Sacrifício cruento a realizar uma só vez na Cruz, e para que a sua memória durasse até à consumação dos séculos e a sua salutar virtude fosse aplicada para a remissão dos nossos pecados cotidianos… ofereceu a Deus Pai o seu Corpo e o seu Sangue sob as espécies do pão e do vinho e, sob as mesmas espécies, entregou Corpo e Sangue aos Apóstolos, que, então, constituiu Sacerdotes do Novo Testamento, para que o recebessem, mandando-lhes, e aos sucessores deles no sacerdócio, que fizessem a mesma oblação” (Cone. Trid. Sess. XXII, Cap. I)

Daí se vê que, por três motivos principalmente, quis Jesus renovar seu Sacrifício sob símbolos sacramentais:

1) Para deixar à Igreja através dos séculos um sacrifício visível “como exige a natureza dos homens”. O Sacrifício da Cruz seria atualmente invisível para a Igreja, não condicente, pois, com o culto atual que os homens devem prestar a Deus.

2) Para que, através dos séculos, houvesse sempre uma rememoração eficaz do Sacrifício realizado uma vez sobre a Cruz.

3) Para que a “salutar virtude do Sacrifício da Cruz fosse aplicada para remissão dos nossos pecados cotidianos”.

E o motivo porque Nosso Senhor quis que os símbolos sacramentais fossem pão e vinho e não outros quaisquer, é a participação que Ele queria tivéssemos no seu divino holocausto por meio da manducação da Vítima. Costume era nos sacrifícios mais solenes, quer de ordenação divina, quer de instituição humana, que os oferentes comungassem da Vítima em sagrado festim, que os unia a todos com os Sacerdotes.

Inegavelmente, pão e vinho era forma de todas a mais apta que Cristo podia encontrar para nossa comunhão no augusto Sacrifício.

Por que o Sacrifício foi instituído sob duplo símbolo sacramental de pão e vinho? Não podia ser somente sob um deles?

Um só dos símbolos sacramentais, ainda contendo Cristo todo, não seria símbolo eficaz do Sacrifício. Era preciso um sinal externo que significasse a morte do Redentor. “Os símbolos sacramentais realizam o que significam”, ensinam os teólogos. Para que se efetivasse, pois, na ordem da graça, a realidade de um Sacrifício, eram de mister símbolos que significassem a morte de Cristo. Estes símbolos são as espécies consagradas, separadamente, em Corpo e Sangue do Senhor.

“Com efeito — explica o Papa Pio XII — na Cruz, Ele ofereceu totalmente a Deus o seu ser e os seus sofrimentos, e a imolação da Vítima foi consumada por meio duma morte cruenta livremente sofrida; no altar, ao contrário, por causa do estado glorioso da sua natureza humana, “a morte não mais tem domínio sobre Ele” (Rom. 6, 9), e por isso não é possível efusão do Sangue; mas a divina Sabedoria encontrou o modo admirável de tornar manifesto o Sacrifício do nosso Redentor por meio de sinais externos que simbolizam a morte. De fato, pela “transubstanciação” do pão no Corpo e do vinho no Sangue de Cristo, tem-se realmente presente tanto o seu Corpo como o seu Sangue; e as espécies eucarísticas, sob as quais está presente, simbolizam a cruenta separação do corpo e do sangue. Assim, a comemoração de sua morte, que foi real no Calvário, repete-se em cada Sacrifício do altar, porque, por meio de símbolos distintos, Jesus Cristo é significado e se nos mostra em estado de Vítima”. (Enc. “Mediator Dei”)

2. Participação no Sacrifício Eucarístico

O Sacrifício Eucarístico, como se disse, foi instituído para aplicar-nos a virtude salutar do Sacrifício redentor; logo, participamos todos nós de seus frutos?

Perfeitamente. Todos participamos, de modo geral, deste Sacrifício que nos aplica os frutos do Calvário. Não existe alma cristã que se possa frustrar aos seus insignes benefícios universalíssimos.

Entretanto, notemos que não há a considerar no Sacrifício Eucarístico somente a virtude salutar universalíssima. Não se dá, também, somente, uma participação comum de todos os homens membros de Cristo, neste Sacrifício.

Defluem do Sacrifício do altar diferentes e ubérrimos frutos que são aplicados a cada alma conforme a participação eficiente que ela buscar ter neste Sacrifício.

Deve-se mesmo dizer que a virtude universalíssima do Sacrifício redentor não salva senão aqueles que dela se queiram aproveitar.

“Portanto — ensina a “Mediator Dei” — para que, com aprazimento de Deus, se realize, para todos os indivíduos e para todas as gerações até à consumação dos tempos, a obra da Redenção e Salvação, é absolutamente necessário que cada um dos homens se ponha em contato vital com o Sacrifício da Cruz e assim lhe sejam transmitidos e aplicados os merecimentos que dele derivam”.

Quais são os principais frutos do divino Sacrifício do altar?

Distinguem os teólogos tríplice fruto do Santo Sacrifício:

1. Fruto geral ou universalíssimo, que se aplica de modo geral a toda a Igreja.

É em virtude deste fruto geral que dizíamos, na questão precedente, não haver alma de justo ou de pecador que de algum modo não se beneficie da Santa Missa; os pecadores recebem aí fruto de conversão, e os justos aumento de graças.

É que a Missa — já o dissemos também precedentemente — é o Sacrifício cultual da Santa Igreja, ou o Sacrifício do Corpo Místico. Todos, portanto, que são filhos da Igreja de qualquer modo pelo batismo, todos quantos estão unidos ao Corpo Místico, ainda como membros mortos, recebem da plenitude deste divino holocausto, conforme as disposições pessoais.

2. Fruto especial ou nominal, que se aplica à pessoa por quem nominalmente é oferecida a Santa Missa.

O costume imemorial existente na Igreja de aplicar-se o fruto da Missa, determinada e nominalmente, para uma ou mais pessoas ou intenção pessoal, justifica a afirmação de que existe um fruto especial neste divino Sacrifício.

3. Fruto especialíssimo, que se aplica ao Sacerdote, ministro do Sacrifício.

Como o Padre celebrante faz as vezes de Cristo e Cristo se oferece por mãos dele, é patente que não há união maior com a divina Vítima do que esta. E por isto que união mais estreita deve significar maior participação nos frutos da imolação, esta união do Sacerdote celebrante com Cristo Vítima, por ser em si mesma toda especial — especialíssima — está a dizer que há um fruto especialíssimo para o Padre celebrante.

Como se explica que a Santa Missa possua tantos frutos assim diferentemente aplicáveis?

Explica-se pelo fato de ela ser de valor infinito em si mesma, e de haver graus de participação entre as almas, que são finitas.

De um lado ela é o Sacrifício de Cristo, que tem valor infinito; de outro, ela é o Sacrifício da Igreja, que recebe finitamente em seus membros, que são limitados.

De fato, explicam os teólogos, o Santo Sacrifício do altar é de valor infinito em si mesmo porque aí se imola uma Vítima de infinito valor e o Sacerdote principal que a oferece — que é também a própria Vítima — possui dignidade infinita.

E o valor de um Sacrifício intrinsecamente depende da dignidade daquele que oferece e do valor intrínseco da Vítima.

Cristo se oferece na Eucaristia por mãos de Sacerdotes, mas o principal oferente é sempre Ele mesmo, que se entrega em oblação ao Pai. O Padre não é senão ministro e oferente secundário em nome da Igreja.

Encerrando, pois, em si infinito valor por ser Sacrifício de Cristo, Sacerdote e Vítima, a Missa tem frutos que poderiam ser aplicados infinitamente, houveram capacidades in¬finitas para receber estes frutos.

Mas, como Sacrifício da Igreja, a Santa Missa terá os seus frutos distribuídos por diferentes e desiguais capacidades, que são os membros da Santa Igreja…

Destarte, os frutos ubérrimos deste Sacrifício são diferentemente aplicáveis, conforme a situação dos membros da Igreja relativamente a este Sacrifício — (Sacerdote, pessoa por quem se oferece, comum dos fiéis) — e conforme a participação efetiva destes no divino mistério (colaboração no Sacrifício — reta intenção — grau de amor, etc.).

Que são precisamente estes frutos de que se fala? São frutos de perdão do pecado ou frutos de louvor de Deus, ou frutos de graças especiais?

São frutos espirituais de toda espécie: perdão do pecado, ação de graças, aumento de caridade, etc.

Cumpre-nos formular as intenções pessoais dos frutos que desejamos haurir desta fonte inesgotável. Infinito que é em si, o Santo Sacrifício nos pode obter tudo, embora nos seja feita uma aplicação limitada, conforme a nossa capacidade.

Doutra parte, reprodução que é do Sacrifício do Calvário, o Sacrifício da Missa é oferecido com os mesmos fins com que Cristo se ofereceu na Cruz.

Quais são estes fins? O Santo Padre Pio XII os menciona na Encíclica “Mediator Dei”:

1. Glorificação ao Pai celeste.
2. Ação de graças.
3. Expiação, propiciação pelos nossos pecados e reconciliação nossa com Deus.
4. Impetração das graças.

Com idênticos fins é celebrado o Sacrifício da Igreja.

E em virtude destes fins, a Santa Missa produz frutos infinitos de multiformes aplicações. Cada alma, de acordo com seu grau de amor e reta intenção, glorificará o Pai celeste, renderá ação de graças, expiará suas faltas e se reconciliará com a divina Majestade e obterá as copiosas graças que pedir, quando assistir ao divino Sacrifício ou nas suas intenções for ele oferecido.

Deve-se dizer o mesmo com relação às Missas pelos defuntos?

As Missas beneficiam, com seu fruto universalíssimo a toda a Igreja; portanto, também às almas do purgatório que constituem a Igreja padecente (4). Com seu fruto especial, a Missa beneficia somente os defuntos por quem é determinadamente oferecida, se eles estão no purgatório.

Desnecessário dizer que nenhum fruto da Santa Missa pode valer aos réprobos, definitivamente separados do Corpo Místico de Cristo.

Aos defuntos já coroados no Céu, a Santa Missa aumentará, de certo, a glória e felicidade acidental.

Certamente, também, a Missa oferecida pelos defuntos alcança todos os quatro fins.

Mas a alma do purgatório por quem é oferecida se beneficia diretamente tão só com a terceira finalidade — expiação, propiciação e reconciliação com Deus — vistas as condições em que se acha; das demais finalidades da Missa ela se beneficia indiretamente enquanto, como membro do Corpo Místico, glorifica a Deus Pai, rende-lhe ações de graças e impetra favores por toda a Igreja de que a Missa é o Sacrifício universal.

E os fiéis vivos se beneficiam de todos os quatro fins com que é celebrada a Santa Missa?

Sim, na medida das disposições com que participarem do Santo Sacrifício.

Há os que não levam nenhuma disposição, nem de caridade, nem de temor de Deus, nem mesmo de fé, para a assistência à Santa Missa. Estes, conquanto de direito, como fiéis batizados, possam participar dos frutos universalíssimos do Santo Sacrifício, de fato nada recebem por não estarem dispostos.

Há os que, em pecado mortal, mas com reta intenção, assistem com fé pelo menos à Santa Missa; estes se dispõem à conversão e, assim, se beneficiam remotamente da terceira finalidade do Santo Sacrifício, ao mesmo tempo que, em união com a Igreja, participam de algum modo dos demais fins com que ele é oferecido.

Há, finalmente, os católicos fervorosos que, em estado de graça e em exercício de efetiva caridade sobrenatural, não só assistem passivamente à Missa, mas ativamente dela participam, conforme os desejos da Santa Igreja; estes realizam, em união com Cristo, todas as finalidades do Sacrifício Eucarístico, delas se beneficiando na medida de suas boas disposições.

Como devemos participar do Sacrifício da Missa?

O Santo Padre Pio XII, na Encíclica “Mediator Dei“, tratou, pormenorizadamente, este assunto. Vamos resumir o que ele ensinou, já que não é possível citar-lhe todas as palavras.

1. Cada fiel deve participar da Santa Missa, oferecendo-a a Deus Pai juntamente com o Sacerdote celebrante.

O fiel é membro da Igreja, Corpo Místico de Jesus Cristo. Deve, pois, tomar parte na oblação que é feita em nome da Igreja. Deve oferecer, intimamente, Jesus imolado sobre o altar, enquanto o Sacerdote celebra.

O caráter batismal deu ao fiel uma participação no Sacerdócio de Cristo. Não no sentido de que o fiel possa consagrar o Corpo de Cristo. Mas no sentido de que o possa oferecer a Deus Pai em união com o Ministro Oficial do culto divino (5).

2. Mas não basta que o fiel católico ofereça a Deus a Vítima de nossos altares. Para participar do Sacrifício, deve ele também se oferecer como vítima, de algum modo, reproduzindo em si, “quanto está nas possibilidades humanas, o mesmo estado de alma que tinha o divino Redentor quando realizava o Sacrifício de si mesmo: a humilde submissão de espírito, e a adoração, honra, louvor e ação de graças à suprema Majestade de Deus; mais: que reproduza em si mesmo a condição de vítima, a abnegação segundo os preceitos do Evangelho, o voluntário e espontâneo exercício de penitência, a dor e expiação dos próprios pecados” — (Mediator Dei, nº 77).

3. Como meio para fomentar esta participação, o Papa recomenda a divulgação do “Missal Romano”, o Canto litúrgico, a presença às Missas solenes, conforme é desejo da Igreja.

4. Mas, inegavelmente, a participação mais eficiente no Santo Sacrifício é a manducação da Vítima — Jesus Cristo — por meio da Comunhão. Dela trataremos na 3ª parte desta obra.

Referências:
(1) Vide Dictionnaire de Théol. Tom. X, 1286.
(2) Lahitton, Theol. Dogmaticae theses (Beauchesne, 1932 — T. IV, p. 456).
(3) «De Ecclesiae Sacramentis». Quaestio LXXXIII, § 3, p. 549 e sgts. (Roma, tertia ed).
(4) «Quando o sacerdote celebra, honra a Deus, alegra os Anjos, edifica a Santa Igreja, socorre os vivos, alivia os defuntos e se torna participante de todos os bens» — diz a Imitação de Cristo» — (Liv. IV, Cap. V, 3).
(5) — Em os números 86, 87 e 88 da Encíclica «Mediator Dei» (Edição portuguesa da Ed. «Vozes») o Sumo Pontífice explana com pormenores esta doutrina.

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(Miranda, Padre Antônio. Doutrina Eucarística: Respostas às perguntas mais naturais que espírito humano formula diante do Mistério da Eucaristia. Editora O Lutador, 1955, p. 73-97)

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