Meditação para a Vigésima Quarta Quinta-feira depois de Pentecostes
SUMARIO
Meditaremos sobre a falsa sabedoria do mondo, e veremos:
1.º Quanto ela é digna de reprovação;
2.° Quanto efetivamente Deus a reprova.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° De deixarmos o mundo obrar, dizer e pensar o que quiser, e de seguirmos a Jesus Cristo como a única verdadeira sabedoria;
2.° De consultarmos muitas vezes este adorável Salvador, rogando-Lhe que nos esclareça a respeito de tudo o que devemos pensar, dizer ou obrar.
O nosso ramalhete espiritual será o anátema que Deus proferiu contra a falsa sabedoria do mundo:
“Destruirei a sabedoria dos sábios e reprovarei a prudência dos prudentes” – Perdam sapientiam sapientium, et prudentiam prudentium reprobabo (1Cor 1, 19)
Meditação para o Dia
Adoremos a extrema repugnância que Jesus Cristo tem à falsa sabedoria do mundo e à prudência da carne. Combate-a com as suas palavras, e declara que condenar os que a tomarem por norma de sua conduta. Recebamos com respeito e gratidão este salutar ensino.
PRIMEIRO PONTO
Quanto a sabedoria do mundo é digna de reprovação
Para o compreender, basta considerar quanto ela é falsa; porque a verdade é uma necessidade da alma; é a sua tranquilidade, a sua nobreza, a sua dignidade, o princípio da sua energia. Ao contrário, a falsidade incorre necessariamente na sua reprovação: todo aquele que mente, sente que falta a um dever e se avilta. Ora a sabedoria do mundo não é senão falsidade e mentira. É falsa em seu principio, falsa nas suas virtudes, falsa nos seus vícios.
1.° Em seu principio. Parte deste ponto, que se deve buscar a todo o custo a felicidade cá na terra; e daí conclui que convém, quando é necessário para conseguir este fim, sacrificar tudo o mais, contanto que se salvem as aparências à força de disfarce, de dissimulação e de artifícios. Ora que mais falso que este principio e as consequências que dele se deduzem?
2.° Falsa nas suas virtudes. Ela só se humilha para se exaltar; finge calar-se para que melhor a ouçam; mostra não se importar com as coisas para as obter: sofre as injúrias por hão poder vingar-se; é paciente, esperando ocasião de se irritar, caridosa quando lhe convém, religiosa quando é um meio de agradar aos outros; é em tudo falsidade e hipocrisia.
3.° Falsa em seus vícios. Chama à sua incredulidade perspicácia, à sua dobrez sagacidade e experiência dos negócios, aos seus ressentimentos e vinganças honra e bravura, às suas seduções urbanidade e polidez, à sua perseverança nas ligações criminosas constância e felicidade. Pode haver coisa que mais mereça a reprovação de toda e qualquer alma honesta e cristã?
E todavia não temos nós algum destes caracteres da falsa sabedoria do mundo?
SEGUNDO PONTO
Quanto Deus reprova a falsa sabedoria do mundo
O Espírito Santo chama-lhe, pela boca de São Tiago, uma sabedoria terrena, animal e diabólica (1). Se é terrena, não é admissível no céu; se é animal, é indigna de uma alma racional, que só deve ter sentimentos nobres e elevados; se é diabólica, é uma sabedoria infernal, que só pode levar ao inferno. Por boca de São Paulo, o mesmo Espírito Santo chama-lhe uma morte (2); seguindo-a, não se pode por conseguinte alcançar a vida. Chama-lhe uma inimiga de Deus (3): logo Deus é seu inimigo. Chama-lhe uma adversaria irreconciliável da lei de Deus (4): logo é impossível ser salvo seguindo as suas máximas. Trata-a até de estultícia (5), declara, que se compraz em confundi-la, escolhendo, para converter o mundo, os instrumentos que ela julgava mais incapazes disso (6). Podia Deus mostrar-nos melhor quanto abomina esta falsa sabedoria do mundo, quanto a reprova e condena?
Aprendamos daqui, que não devemos consultar o mundo e a sua falsa sabedoria a respeito do que temos a fazer, mas consultar a Deus na oração e a homens prudentes cheios do seu Espírito.
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Terrena, animalis, diabolica (Zc 3, 18)
(2) Prudencia carnis mors est (Rm 8, 6)
(3) Amicitia hujus mundi inimica est Dei (Zc 4, 4)
(4) Legi Dei non est subjecta: nec enim poteste (Rm 8, 7)
(5) Nonne stultam fecit Deus sapientiam hujus mundi? (1Cor 1, 20)
(6) Quae stulta sunt mundi elegit Deus, ut confundat sapientes… ignobilia mundi et contemptibilia elegit Deus, et ea quae non sunt, ut ea quae sunt destrueret: ut non glorietur omnis caro in conspectu ejus (1Cor 1, 27ss)
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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo V, p. 193-196)