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Meditação para o V Domingo Comum

Dom Henrique Soares da Costa

Por Dom Henrique Soares da Costa

Iniciemos nossa meditação da Palavra de Deus pela primeira leitura. O Livro de Jó, de modo dramático, mostra a vida humana:

“Não é acaso uma luta a vida do homem sobre a terra? Seus dias não são como dias de um mercenário? Tive por ganho meses de decepção, e couberam-me noites de sofrimentos. Se me deito, penso: quando poderei levantar-me? E, ao amanhecer, espero novamente a tarde… Meus dias correm mais rápido do que a lançadeira do tear e se consomem sem esperança. Lembra-Te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade”

Eis, caríssimos, não são palavras negativas, desesperadas, essas de Jó. São, antes uma reflexão realista e dolorosa sobre o mistério da vida humana, mas uma reflexão cheia de esperança, porque feita à luz de Deus e, portanto, uma dor feita oração; um aperto de coração feito apelo ao Senhor! Uma coisa é pensar nas realidades negativas de nossa existência simplesmente contando com nossas forças. Que desespero, que desilusão, que vazio de sentido! Outra, bem diferente, é encarar a vida, também com seus trevas, à luz de Deus, o Amor eterno e onipotente! Que esperança que não decepciona, que paz que invade o coração, mesmo na dor!

Notem, irmãos: num mundo como o nosso, que cultua o sucesso, o bem-estar, o corpo, o físico sarado, a saúde e o vigor físicos e presta tão pouca atenção ao sofrimento, à dor, ao fracasso… Num mundo que tem medo de pensar na morte e de assumir que todos morreremos, num mundo que não sabe o que fazer com o sofrimento, com a doença, com a decadência física, com a deformidade do corpo, com as limitações e frustrações da existência, estas palavras de Jó, convidam-nos a colocar os pés no chão… Repito: não são palavras pessimistas, porque aquele que chora e busca o sentido da existência, fá-lo diante de Deus. Recordem como terminam as palavras da leitura – são comoventes:

“Lembra-Te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade”

Insisto: são uma oração! O triste na vida não é sofrer, não é chorar, não é morrer… Triste e miserável é sofrer e chorar e morrer sem Deus, sem este Parceiro cheio de doce ternura que dá sentido à nossa existência!

Por isso mesmo veio Jesus, nosso Senhor! É isto que o Evangelho nos mostra hoje. Cristo nosso Deus, tomando pela mão a sogra de Pedro e erguendo-a do seu leito, revela que vem nos tomar pela mão – a nós, feridos e doentes de tantas doenças, fraquezas, apertos e medos!

Este é o Evangelho, a Boa notícia: em Jesus, Deus revela o sentido de nossa existência porque Se revela como Deus próximo, Deus de compaixão, Deus capaz de dar um sentido às nossas dores e até à nossa morte. Cristo nos toma pela mão, Cristo toma sobre Si as nossas dores. Não precisamos fingir que não envelhecemos, que não adoeceremos, que não morreremos, que tudo vai bem e no nosso caminho… Sabemos que nem a vida nem a morte nos podem afastar do amor de Cristo (cf. Rm 8,35); sabemos que Nele, tudo se enche de novo sentido… Por isso todos O procuram, porque procuram um sentido para a existência!

O grande dom que Cristo nos faz não são milagres nem curas nem solução de problemas. Deixemos essa visão miserável, mesquinha e pagã para os pagãos e os que enganam e ganham dinheiro e poder em Nome de Cristo.

Nosso modo de ver é outro, é aquele mesmo que o Cristo nos ensinou e do qual Ele mesmo nos deu o exemplo pela Sua vida e pela Sua morte! O Cardeal Ratzinger, certa feita, assim escreveu:

“Uma visão do mundo que não pode dar um sentido também à dor e não consegue torná-la preciosa, não serve para nada. Tal visão fracassa exatamente ali, onde deveria aparecer a questão mais decisiva da existência. Aqueles que sobre a dor não têm nada mais a dizer a não ser que se deve combatê-la, enganam-se. Certamente, é necessário fazer tudo para aliviar a dor de tantos inocentes e limitar o sofrimento. Mas, uma vida humana sem dor não existe e quem não é capaz de aceitar a dor, foge daquelas purificações que são as únicas a nos tornar maduros. Na comunhão com Cristo, a dor torna-se plena de significado, não somente para mim mesmo, como processo de purificação, no qual Deus tira de mim as escórias que obscurecem a Sua imagem, mas também, para além de mim mesmo, é útil para o todo, de modo que, todos nós podemos dizer como São Paulo: ‘Agora eu me alegro nos sofrimentos que suporto por vós, e completo na minha carne o que falta dos padecimentos do Cristo pelo Seu corpo que é a Igreja’ (Cl 1,24)… A vida vai além da nossa existência biológica. Onde não há mais motivo pelo qual vale a pena morrer, também não há motivo que faça valer a pena viver.”

Caríssimos, para isso Jesus veio – “foi para isso que Eu vim!”, diz o Senhor hoje. Veio para anunciar o Reino e expulsar tudo aquilo que demoniza a nossa existência. E nada nos inferniza mais que viver sem sentido! A humanidade e cada um de nós somos como a sogra de Pedro, paralisada, ardendo em febre: Jesus, nosso Senhor, nos toma pela mão, carinhosamente, e nos ergue! Ergue-nos para colocar ao Seu serviço, fazendo-nos viver não para nós mesmos, mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou (cf. Rm 14,7s). Exemplo deste modo de viver para Cristo e, portanto, viver de verdade, é-nos dado por São Paulo, na segunda leitura de hoje…

Cristãos, não vivamos como os pagãos, que vão sendo levados pela existência, fugindo da realidade e refugiando-se nas ilusões. Quanto excesso de divertimento, de eventos esportivos, de programas turísticos, de sonhos de consumo, de lazer e diversão, de carnavais na época e fora de época… Se tudo isso numa justa medida é saudável, com o excesso que hoje se vê, é prejudicial, é sinal de uma humanidade doente, que tem medo de enfrentar as verdadeiras e profundas questões da existência! É que sem uma relação viva e íntima com o Senhor, é impossível enfrentar a nossa dura realidade! É neste sentido que o cristianismo é um Evangelho e apresenta-nos um Evangelho, uma Boa Notícia: porque nos dá o Sentido, que aparece em Cristo Jesus!

Abramo-nos para o Senhor; Nele apostemos nossa existência e tornemo-nos para os outros sinais de esperança e de Vida, como São Paulo que se sentia devedor do Evangelho a todos. Que seja o Senhor Jesus consolo de nosso pranto, força no nosso caminho, alívio de nossas dores e prêmio de Vida eterna. Amém.

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