Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus 2, 13-15
Depois de partirem, o anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse-lhe: «Levanta-te, toma o menino e sua mãe, foge para o Egito e fica lá até que eu te avise, pois Herodes procurará o menino para o matar.»
E ele levantou-se de noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito, permanecendo ali até à morte de Herodes. Assim se cumpriu o que o Senhor anunciou pelo profeta: Do Egito chamei o meu filho.
Meditação para a Segunda-feira da 5ª Semana depois da Epifania
SUMARIO
Meditaremos o mistério da fuga de Jesus para o Egito, e ali aprenderemos:
1.° A ver e a prezar a vontade de Deus até nas mais cruéis provações, sem jamais nos afligirmos;
2.° A não desejar sobre a terra senão esta santíssima e amabilíssima vontade.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° De olharmos a vontade de Deus como a norma e o alvo de todas as nossas ações;
2.º De nada desejarmos fora disto, e de estarmos contentes da nossa posição, sem sonhar outra.
O nosso ramalhete espiritual será a palavra da oração dominical:
“Pai-Nosso, seja feita a vossa vontade” – Pater, fiat voluntas tua
Meditação para o Dia
Adoremos, com admiração e amor, o Menino Deus, subtraindo-Se, por meio da fugida e por uma longa estada no Egito, à perseguição de Herodes. Ó mistério profundo! Ele tinha numerosos meios para escapar à busca do tirano; mas prefere a fuga, e vai-Se, não violentado, mas de propósito, porque esta fugida será para nós instrutiva. Louvemo-lO em união com os anjos, que O acompanharam.
PRIMEIRO PONTO
A fugida para o Egito ensina-nos a ver e a prezar a vontade de Deus até nas mais cruéis provações, sem jamais nos afligirmos
A santa família vivia tranquilamente na sua pobre morada, quando de repente vem um anjo no meio da noite, dizer a José:
“Levanta-te, toma o Menino e sua Mãe, e foge para o Egito” – Surge, et accipe pueram, et matrem ejus, et fuge in AEgyptum (Mt 2, 13)
Ele não diz: Prepara-te para partir logo que amanheça; mas sim: Parte já, no meio das trevas da noite. Não diz: Vai; mas: Foge; é este um recurso vergonhoso aos olhos do mundo, e até perigoso; por que, se poderia ser descoberto e preso. Não importa; foge; e para onde? Para o Egito. Mas que fazer nessa terra desconhecida, sem amparo, sem proteção? José não discorre assim; entrega-se nas mãos da Providência, sem se afligir nem se importar com os obstáculos do caminho, com os meios de viver nesse país longínquo, e parte. Deus o quer, isto lhe basta. Se Deus o quer, proverá a tudo; porque inquietar-se? José parte tranquilo, e anda as cem léguas que o separam de Heliópolis, lugar do seu refúgio. Nem a solidão destes espaços inabitados o estorva, nem as privações de toda a espécie o abatem; Jesus está com ele, é o seu tesouro, a sua providência, a sua consolação e o seu tudo. Tendo chegado a Heliópolis, ali se estabelece; e à força de trabalho, provê às necessidades da pequena família. Todos três ali estão contentes, estão onde Deus os quer, são o que Deus quer. Que mais lhes é preciso? Quantos ensinos neste mistério! Nele aprenderemos:
1.° A desapegar-nos do nosso país, dos nossos parentes, dos nossos amigos; a deixar, de boa vontade, tudo o que mais prezamos, quando Deus assim o manda;
2.° A saber achar Deus em toda a parte;
3.° A ceder ao próximo, por circunspeção, modéstia, condescendência, preferindo perder tudo a perder a caridade, a mansidão e a paz;
4.° A confiar em Deus no meio até dos maiores revezes, a ver em tudo a Sua providência, que sabe melhor do que nós o que nos convém, que sabe tirar o bem do mal, que conhece tudo, que pode tudo, e que nos ama.
Recolhamos estes preciosos ensinos no amago do nosso coração.
SEGUNDO PONTO
A fugida para o Egito ensina-nos a não desejar sobre a terra senão a santíssima e amabilíssima vontade de Deus
A santa família parte de noite, como vimos; não deseja esperar pelo dia. Parte numa completa indigência; não deseja ter ocasião para fazer todos os preparativos de viagem. Dirige-se ao Egito, terra onde não conhece ninguém; não deseja ir para o país dos magos, onde seria bem recebida. Atravessa horríveis ermos; não deseja nem uma melhor estrada, nem hospedarias cômodas; e depois de chegar onde deve habitar, aí fica até que o céu a mande retirar. Pode sofrer, enfastiar-se, achar o exílio duro e prolongado, não importa; ela permanece lá oito anos, sempre submissa, sempre contente, pensando que só a Deus, que a colocou naquele lugar, pertence o direito de a fazer sair dele. Ela não diz, estamos aqui sem respeito nem glória, no esquecimento e desprezo, enquanto que outros, que não valem tanto como nós, são respeitados e glorificados. Ela diz consigo:
Estou onde Deus quer; onde poderia eu estar melhor?
— Que lição para esses homens que imaginam que estarão sempre melhor onde não estão, nunca se contentam com a sua posição, e sonham continuamente uma outra, como se fosse possível haver rosas sem espinhos, atalho sem trabalho! Quão mais cordatos são aqueles que sabem achar-se bem onde Deus os coloca, que vivem na dependência da Sua providência, até que dela passam para os braços da Sua misericórdia!
— Decorridos os oito anos de exílio, o anjo volta, e diz a José: Vai para a terra de Israel; mas onde fixar a sua morada? O anjo deixa isso ao seu arbítrio; e o santo patriarca escolheu a pequena cidade de Nazaré, onde a santa família terá uma vida mais humilde, mais tranquila, mais conforme à simplicidade dos seus gostos. E assim que, quando não conhecemos claramente a vontade da Providência, devemos aproximar-nos dela o mais possível, perguntando a nós mesmos:
Onde alcançarei eu melhor a minha salvação?
Onde estarei menos exposto a perder-me?
Que determinação me consolará mais na hora da morte?
São estas as nossas normas de proceder?
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 273-276)