Meditação para a Quinta-feira de Pentecostes
SUMARIO
Estudaremos:
1.° A obrigação que toda a alma cristã tem de seguir a conduta do Espírito de Deus;
2.° O que exige de nós essa divina conduta.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° De nos conservarmos todo o dia no recolhimento interior e exterior, para observar e ouvir as inspirações do Espírito de Deus;
2.º De obedecermos com amor e prontidão a este divino Espírito em tudo o que nos sugerir.
O nosso ramalhete será a palavra do Apóstolo:
“Todos os que são levados pelo espírito de Deus, esses tais são filhos de Deus, isto é, cristãos” – Quicumque Spiritu Dei aguntur, ii sunt filli Dei (Rm 8, 14)
Meditação para o Dia
Adoremos o Espírito Santo, procurando em toda a Igreja, santificar as almas. Bendigamo-lO por tão bons pensamentos, piedosos afetos, fervorosas orações, generosas resoluções, que lhes inspira. Tributemos-Lhes glória e ações de graças (1).
PRIMEIRO PONTO
Obrigação que toda a alma cristã tem de seguir a conduta do Espírito Santo
O espírito de Deus conduz pelas Suas inspirações todas as almas, que querem entregar-se-Lhe, e só se é cristão, quando se segue a Sua direção. Se algum não tem o espírito de Jesus Cristo, diz São Paulo, esse tal não é dEle (2). Não entristeçais, continua o Apóstolo, ao Espírito de Deus, resistindo-lhe (3) ou não o extingais no vosso coração apagando nEle essas preciosas centelhas com que queria nEle acender o fogo do santo amor (4). Cheios destas verdades, os primeiros cristãos entregavam-se à graça para serem guiados por ela, como um menino dá a mão a sua mãe, para que ela o conduza onde lhe aprouver (5). Quando um Deus só digna sujeitar-Se a servir-nos de guia na vida, fazer-nos ouvir as Suas santas inspirações, por uma comiseração cheia de amor pelas nossas trevas e misérias, podemos não ouvir a Sua voz, ou resistir depois de a termos ouvido? Prosseguir confiando nas nossas próprias forças sem recorrer ao Espírito de Deus, preferir à Sua luz a nossa própria luz, é pelagianismo em prática. Daí a fraqueza que abate, o peso da natureza que arrasta, a vaidade que cega; daí as resoluções sem efeito, as recaídas, as alternativas de bem e de mal; daí finalmente tantas boas obras frustradas, porque eram praticadas segundo a prudência humana, e não segundo o Espírito de Deus. Bem-aventuradas as almas que, como o Apóstolo, liadas pelo Espírito Santo (6), se conservam na Sua dependência e se deixam conduzir por Ele. Ele diz-lhes: Ide, e elas vão; fazei isto, e elas fazem-o. É assim que nos deixamos conduzir?
SEGUNDO PONTO
O que exige de nós a conduta do Espírito de Deus?
É preciso:
1.° A atenção para ouvir a Sua voz.
A atenção para ouvir a Sua voz é-nos ensinada por estas palavras da Imitação:
“Bem-aventurados os olhos da alma, que, fechados às coisas de fora, estão atentos às coisas de dentro. Bem-aventurados os ouvidos que, em vez de ouvirem o ruído exterior, ouvem no interior a verdade, que os ensina” – Beata anima quae Dominum in se loquentem audit… Beatae plane aures quae non vocem foris sonantem, sed intus auscultante veritatem… docentem (III Imitação 1)
Isto é, que devemos retirar a nossa alma da dissipação, da leviandade, do tumulto das criaturas e dos pensamentos inúteis, das paixões que agitam, e das quimeras que extraviam; devemos vigiar sobre nós mesmos, para não perturbar a ação de Deus na alma, não a tolher, não a interromper, não a enfraquecer; mas deixá-lO obrar sem obstáculo como entende, e fazer tudo, ler, falar, trabalhar em muita paz inferior, de harmonia com Ele. O Espírito Santo não opera no tremor (7); porquanto, para que falaria Ele a quem não O ouve? Para falar à alma, o Espírito de Deus quer achá-la tranquila, recolhida consigo, atenta a ouvi-lO no silêncio interior de todas as suas faculdades, prostradas de alguma sorte diante dEle como Maria, irmã de Lazaro, aos pés de Jesus, para receber com religioso respeito todas as Suas boas inspirações, e lhe dizer como Samuel: Falai, Senhor, porque o vosso servo ouve (8); ou como Davi: Eu ouvirei que é o que fala o Senhor dentro de mim (9).
2.° A generosidade para Lhe obedecer.
À atenção é preciso juntar a generosidade. O Espírito Santo abandona à sua fraqueza as almas pusilânimes, que, ternas para com elas até não quererem sacrificar uma vontade, resistem às Suas inspirações. De que serviria a Sua direção a quem a não quer seguir? Ele precisa de almas fortes e generosas que, sem hesitar, obedeçam à Sua voz, por mais que lhes custe; almas que, como esses bons servos e servas de que fala Davi, tem sempre os olhos fixos nas mãos do seu senhor para acudir ao menor sinal, ou como esses animais misteriosos de Ezequiel, que vão para toda a parte onde o Espírito de Deus os chama (10); e quando as acha assim, oh! Que rápidos progressos as obriga a fazer nos caminhos da perfeição? — Onde existe em nós este recolhimento e generosidade?
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Laudamus te, benedicimus te, gratias agimus tibi
(2) Si quis spiritum Christi non habet, hic non est ejus (Rm 8, 9)
(3) Nolite contristare Spiritum Sanctum Dei (Ef 4, 30)
(4) Spiritum nolite extinguere (Ts 5, 19)
(5) Erant traditi gratiae Dei in opus quod complaverunt (At 14, 25)
(6) Alligatus ego Spiritu, vado in Jerusalem (At 20, 22)
(7) Non in commotione Dominus (1 Rs 19, 11)
(8) Loquere, Domine, quia audit servus tuus (1 Sm 3, 9)
(9) Audiam quid loquatur in me Domine meus (Sl 86, 9)
(10) Ubi erat impetus spiritus, illuc gradiebantur (Ez 1, 12)
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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo III, p. 129-132)