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Aborrecimento da Própria Vida

Meditação para a Décima Quinta Sexta-feira depois de Pentecostes. Aborrecimento da Própria Vida

Meditação para a Décima Quinta Sexta-feira depois de Pentecostes

SUMARIO

Meditaremos sobre o segundo efeito da penitência, que é o aborrecimento da própria vida, e veremos:

1.° Que o aborrecimento da própria vida é um dever;

2.° Que o cumprimento deste dever é cheio de consolação.

— Tomaremos a resolução:

1.° De nos guardarmos de uma vida ociosa e sensual, cômoda e agradável;

2.° De nada concedermos durante o dia ao amor do prazer e ao receio de incômodo, e de seguirmos em todas as coisas o sentimento do dever.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Evangelho:

“O que ama a sua vida, perdê-la-á e o que aborrece a sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna” – Qui amat animam suam, perdet eam; et qui odit animam suam in hoc mundo, in vitam aeternam custodit eam (Jo 12, 25)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo pregando ao mundo uma máxima até então desconhecida: que devemos aborrecer a nossa vida, e sendo o primeiro a pô-la em prática pelo rigor com que se trata na sua vida e na sua morte. Agradeçamos-Lhe este ensino e exemplo; roguemos-Lhe, que nos faça compreendê-los. e conformar com eles a nossa conduta.

PRIMEIRO PONTO

Aborrecer a nossa vida é um dever

Para o compreender, basta considerar o que somos pelo fato da corrupção original. Há em nós um elemento de malignidade indizível, que nos leva continuamente ao mal; paixões que nos impelem para o que é proibido, e nos afastam do que é ordenado. A este elemento ajusta-se a pusilanimidade e moleza, que não ousa resistir a estas más tendências, e ao contrário gosta de se deixar dominar por elas. Ora é evidente que, para ser salvo em tais condições, convém tratar esta má propensão como inimiga: de outra sorte nos perderá. É o que nos diz Nosso Senhor com estas palavras:

“O que ama a sua vida, perdê-la-á, e o que a aborrece conservá-la-á para a vida eterna”

Que significa aborrecer a vida?

Significa que, assim como no mundo e fora do Evangelho, não se concede a um inimigo o que ele deseja, e basta até que deseje uma coisa para que se lhe recuse, assim também se deve recusar à natureza os prazeres sensuais que ela deseja; que, assim como se gosta de contrariar um inimigo e de lhe fazer todo o mal que se pode, assim também se deve contrariar a carne sem jamais a lisonjear nem a poupar, tratá-la com rigor; que, assim como se desconfia de um inimigo capaz de nos perder, assim também devemos desconfiar da nossa má índole, sempre disposta a servir os desígnios do demônio contra a nossa salvação: finalmente que, assim como se busca enfraquecer e vencer um inimigo, assim também se deve buscar enfraquecer e vencer a carne, cerceando-lhe os prazeres sensuais, que a fazem viver, e concedendo-lhe apenas o que se pode recusar-lhe.

Examinemos a nossa consciência. Aborrecemos nós verdadeiramente a nossa carne, e recusamos-lhe o que ela deseja? Impomos-lhe o que lhe desagrada, e só lhe damos à custo o que necessita? Finalmente, tratamo-nos como um inimigo, sobre quem se vigia, de quem se desconfia, e que se gosta de ver mal alimentado, mal hospedado, mal vestido, desprezado, fraco?

SEGUNDO PONTO

Aborrecer a própria vida é a coisa mais consoladora

Aborrecendo a própria vida, obtêm-se três grandes bens que enchem a alma de consolação:

1.° A vitória sobre as paixões, e é isto uma inapreciável felicidade, porque as paixões tornam desgraçado o coração, enchem-o de remorsos, aviltam-o a seus próprios olhos, perturbam-o e entristecem-o;

2.° A paz interior, a alegria da boa consciência, a serenidade da alma;

3.° A esperança de uma vida eterna: enquanto que aquele que regala o seu corpo, engorda uma vítima para o inferno, e aquele que o mortifica, prepara-o para a glória da ressurreição; estado bem-aventurado, em que esse corpo será impassível, imortal, ágil como os espíritos, resplandecente como o sol. De onde se segue, que aborrecer a própria vida, no sentido do Evangelho, é ter a si mesmo um amor verdadeiro, sólido e bem entendido; enquanto que amar a própria vida, no sentido do mundo, é ter a si mesmo um ódio cego, cruel e verdadeiro.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo VI, p. 187-190)