Por Dom Henrique Soares da Costa
Hoje, no Evangelho, escutamos umas frases de Jesus que nos são velhas conhecidas, tão velhas, que é arriscado não significarem muita coisa: “Vós sois o sal da terra; vós sois a luz do mundo” – diz-nos o Senhor! Pois bem, com unção e humildade, como se escutássemos pela primeira vez, escutemos, procuremos compreender e acolhamos essas afirmações, para encontrarmos nelas a Vida e vivermos de verdade!
“Vós sois o sal da terra!”
O sal, na Escritura, aparece como o elemento que dá sabor, purifica e conserva, tornando perenes e duradouros os alimentos… Daí a expressão “aliança de sal”, isto é, “uma aliança perene aos olhos do Senhor” (Nm 18,19). Por causa dessa pureza e perenidade, é que Israel deveria ajuntar o sal a toda oferta que fizesse ao Senhor Deus:
“Salgarás toda a oblação que ofereceres, e não deixarás de pôr na tua oblação sal da aliança de teu Deus; a toda a oferenda juntarás uma oferenda de sal a teu Deus” (Lv 2,13)
Pois bem, irmãos caríssimos, vós sois o sal que dá sabor, pureza e conservação ao mundo diante de Deus! Sois a pitadinha de sal que torna o mundo uma oferenda agradável e aceitável ao Senhor! Sois tão pequenos, tão poucos, tão frágeis, tão impotentes, tão tolos! Lembrai-vos da leitura do Domingo passado:
“Entre vós não há muitos sábios de sabedoria humana nem muitos poderosos nem muitos nobres… Deus escolheu o que o mundo considera como estúpido, para assim confundir o que é forte; Deus escolheu o que o mundo considera sem importância e desprezado, o que não tem nenhuma serventia, para, assim, mostrar a inutilidade do que é considerado importante… É graças a Ele que vós sois em Cristo..” (1Cor 1,26-31)
Sim, sois essa pitadinha de nada, esse tico desprezível de sal.. E, no entanto, sois o sabor, a purificação, a conservação da aliança entre Deus e o mundo! Sois, em Cristo Jesus, o povo sacerdotal! Por isso, a nós, o Senhor ordena: “Tende sal em vós mesmos” (Mc 9,50); em outras palavras: uni-vos a Mim, ao Meu sacerdócio, à Minha vida entregue ao Pai como amor que se entrega para a vida do mundo!
Lembremo-nos do conselho de São Paulo:
“Exorto-vos, portanto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: esse é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito” (Rm 12,1-2)
Era este o significado daquela pitadinha de sal que o sacerdote colocou nos nossos lábios no momento do nosso Batismo, quando nos tornamos membros do povo da aliança, povo sacerdotal. Colocando-nos o sal, ele recordou as palavras de Jesus:
“Vós sois o sal da terra!”
No entanto, não nos iludamos: somente seremos sal, se permanecermos unidos a Cristo! Sem Ele, seremos insípidos, seremos como o mundo, sem sabor e para nada serviremos, “senão para sermos jogados fora e pisados pelos homens”.
“Vós sois a luz do mundo!”
Que afirmação impressionante! Um só é a luz: Aquele que disse de Si próprio:
“Eu sou a luz do mundo!” (Jo 8,12)
Como pode, então, dizer agora que nós somos luz? Escutemos:
“Eu sou a luz do mundo; quem Me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida!” (Jo 8,12)
Eis: se em Cristo – e somente Nele – somos sal da aliança selada na cruz, também somente na Sua luz, seguindo Seus passos, tornamo-nos luz. É isso que nos afirma o Apóstolo:
“Outrora éreis treva! Agora, sois luz no Senhor! Andai como filhos da luz!” (Ef 5,8)
Por nós mesmos não somos sal, mas insípidos; por nós mesmos não somos luz, mas trevas tenebrosas! Mas, em Cristo, damos sabor ao mundo e somos reflexos da luz do Senhor! Não somos luz, mas iluminados pela luz de Cristo, refletiremos a luz sobre o mundo tenebroso, como a lua que, sem ter luz própria, mas iluminada pela luz do sol, ilumina de modo belíssimo a noite escura…
Portanto, meus caros, tenhamos cuidado: somente seremos sal se nos deixarmos salgar pelo Senhor no cadinho da provação e da participação na Sua cruz; somente seremos luz se nos deixarmos iluminar pela luz fulgurante que brota da Sua cruz!
Que o cristão não busque outro sal ou outra luz, a não ser o Cristo e Cristo na Sua humildade, na Sua pobreza, no Seu serviço, na Sua disponibilidade total em relação ao Pai:
“Não julguei saber coisa alguma entre vós, a não ser Jesus Cristo, e Este, crucificado!”
Aquilo que passa da cruz do Senhor, que foge da cruz do Senhor, que procura outro caminho e outra lógica, que não a da cruz que conduz à ressurreição, não salga e não ilumina! Então, que brilhe a luz de Cristo em nossa vida e em nossas obras! Que o nosso modo de viver dê novo sabor a este mundo tão insosso pelo pecado – vede no carnaval que se aproxima: quanta treva, quanta insipidez, quanto velho gosto da velha podridão do velho pecado, da velha manha humana! Se no nosso modo de viver formos sal e luz, cumprir-se-á em nós a palavra do Profeta:
“Então, brilhará tua luz como a aurora e a glória do Senhor te seguirá!”
Eis a nossa missão, eis a nossa vocação, eis a ordem que o Senhor nos dá! Agora, compete a nós! Como nos perguntava Paul Claudel, poeta francês, convertido a Cristo na metade do século XX:
“Ó vós, cristãos, que tendes a luz, que fazeis com essa luz?”
Ó irmãos, ó irmãs!
“Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus!”
Que o Senhor no-lo conceda por Sua graça. Amém!