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O que o corpo nos revela

Na linda natureza de Deus
Mais uma vez o acampamento sofria o enfado produzido por monótonos dias de chuva. O vento ia tangendo grandes blocos de nuvens, e nós preparávamos as refeições dentro do abarracamento.

O professor se assentou junto do Jorge, que demonstrara precedentemente formidável ignorância, quando perguntado acerca do corpo humano.

“Olhe, meu amigo, encontramos coisas bem interessantes, observando um pouco mais de perto a maravilhosa construção do corpo humano. Extasia-se nossa alma, quando examinamos a sábia e adequada disposição do organismo humano. Quase ninguém tem idéia do complicado mecanismo que trabalha no corpo. O primeiro que surge é o diretor da fábrica, que vigia toda a atividade.”

“O cérebro?”

“Exato! Como está tudo organizado maravilhosamente! Para cada atividade especial vem, de repartições particulares do cérebro, a respectiva ordem, que é levada aos locais mais distantes do corpo, pela linha telegráfica central e inúmeros ramais.”

“O cabo central é a medula espinhal, os ramais são os nervos? Não é?”

“Muito bem. Agora digam, quais são os aparelhos que transmitem as notícias, as impressões do mundo exterior, à estação central, ao cérebro?”

“Os ouvidos.”

“Sim, eles também. Os ouvidos funcionam como aparelho receptor. Os olhos, porém… Ora, rapazes, a vista, por si só, já é um órgão tão admirável, que poderíamos conversar horas a fio a respeito. Na membrana receptora, a retina, a imagem, se forma segundo as leis da luminosidade, exatamente como no aparelho fotográfico. No entanto, não existe no mundo uma câmara, que possua a sensibilidade e adaptabilidade do olho! Há pouco, alguém de vocês, por engano, tirou duas fotografias numa mesma chapa. Necessariamente, ambas falharam. Sobre a sensibilíssima chapa da vista chegam, a toda a hora, milhares de imagens e todas elas são retransmitidas claras e coloridas. Todas as imagens são imediatamente recolhidas e arquivadas pela memória, para serem novamente utilizadas, na ocasião própria.

Para regular a câmara para perto ou longe, é necessário bom número de manipulações! Há cálculos complicados que executar e tabelas que consultar, a fim de indicar quanto tempo deve durar a exposição da chapa a tal distância, com esta ou aquela luminosidade. O olho não precisa de nada disso. Seus nervos dão à pupila a convexidade adaptada ao tamanho do objetivo, à intensidade da luz. Aproximando-se o objetivo, a pupila se toma mais convexa, afastando-se aquele, ela fica mais achatada, — mas tudo isso se faz por si mesmo, sem que o percebamos. Se a luz ficar mais forte, a pupila se contrai; se diminuir, ela se dilata, — e nada notamos.

Alguns de vocês estudaram as leis de recepção, reunião dos raios e refração da luz. Vejam. A vista corresponde, perfeitamente a todas essas exigências.

Além disso notemos ainda, com grande alegria nossa, que os olhos se situam num dos pontos mais elevados do corpo, donde podemos enxergar muita coisa. Imaginem se os olhos estivessem em outro local, por ex. nos pés; que poderíamos ver?

Não existe outro órgão na superfície do corpo que seja tão suscetível como os olhos, por isso eles devem ser muito protegidos. Para esse fim, o globo ocular é atapetado fofa e elasticamente; as pálpebras e os cílios vigiam e se fecham logo que água, pó ou luz forte, ameaçam a vista. Agora, Jorge, faço-lhe uma pergunta; por que pisca o homem com os olhos?”

“Porque está com sono.”

“Ora, o dorminhoco! E quando não tem sono? Olhe, também o pestanejar serve de proteção aos olhos. Cada vez que a pálpebra se fecha, faz o mesmo que a dona de casa quando passa um pano molhado por cima da vidraça poeirenta. Mas, se mesmo a dona mais ativa não limpa a janela muitas vezes ao dia, os olhos não suportam a mínima fração de pó e limpam o globo ocular a cada instante.

E agora quero lembrar-lhes ainda uma coisa admirável acerca dos olhos. Cada um dos nossos órgãos é extremamente suscetível ao frio. Sentimos frio nos pés, mãos, orelhas, nariz, etc., e podemos até gelar. E contudo, os olhos, esses órgãos tão sensíveis a tudo, são completamente insensíveis ao frio. Os olhos não sentem frio, nem podem gelar, por mais glacial que seja a temperatura. Por que?”

“Eu sei”, adiantou Guilherme. “É porque, de outro modo, não poderíamos sair à rua durante o frio. Assim, no entanto, podemos fazê-lo, embora tenhamos de proteger os demais órgãos contra a temperatura fria. Se os olhos também pudessem gelar e devêssemos cobri-los, não poderíamos dar um passo.”

Júlio intrometeu-se na conversa:

“Estou curioso por saber que nome receberão o olfato e o gosto, nessa grande fábrica.”

“Ora, são laboratórios químicos, destinados a controlar os alimentos e ver se não estão deteriorados.”

“E o coração?”

“Nosso coração é uma bomba maravilhosa tal, que ainda a mais aperfeiçoada técnica não a pode construir. Uma bomba aspirante e premente, que através dos canais do sistema espantosamente fino das artérias e veias, fornece a todo o organismo o sangue vivificador. Os rins são filtros. Os órgãos digestivos são um sistema central de aquecedor que mantém o corpo, de contínuo, na temperatura de 37 graus centígrados. Quer haja, lá fora, 1O graus abaixo de zero, quer sejam 3O graus de calor, tanto faz; o corpo mantém sua temperatura de 37 graus. Uma meditação sobre este único ponto nos levaria horas… Quanto trabalho, no inverno como no verão a fim de assegurar à habitação uma temperatura adequada! O corpo vivo fá-lo por si mesmo, sem que o notemos.”

“Mas, senhor professor, onde há combustão, deve haver resíduos. Cada dia a empregada retira do fogão cinza e carvão. No nosso corpo não há produtos de combustão?”

“Certamente. Toda a vez que se faz uma expiração, com o ar expelido limpa-se o organismo. Produtos de decomposição também se eliminam com o suor, pelos poros; é, pois, importante que o corpo esteja limpo e nada obstrua a abertura dos poros. A caldeira, todavia, não se pode aquecer com grandes toros, a lenha precisa ser picada. A sabedoria do Criador nos forneceu por isso uma maravilhosa serraria e amassadeira.”

“É provavelmente a boca com seus dentes.”

“Além disso, dotou-nos de um incomparável instrumento musical, um órgão munido de foles que é o pulmão. Sobre um e de outro falar-lhes-ei noutra ocasião. Agora quero lembrar somente que todo esqueleto não; é mais do que a aplicação das mais modernas leis de construção, segundo as quais são estruturadas as pontes.”

“Não entendo isso.”

“Espere! Já viu um osso partido? Sim? Terá então notado, no interior dele, a chamada ‘esponjosa’ a massa esponjosa do osso, as plaquinhas, aparentemente jogadas a torto e a direito.”

“É”, disse Jorge, “em certos lugares enchem totalmente o osso, em outros apenas em parte; são como uma rede com malhas maiores e menores”.

“Exato, rapazes! Essas malhas, atiradas como que sem ordem nem nexo, não são construídas ao léu, mas seguem minuciosamente as normas que, segundo as leis técnicas de construção, são necessárias para que um corpo sólido possa resistir à tração e à pressão.

Os ossos são construídos consoante planos admiráveis. A substância óssea desenvolve-se só no sentido da tração e pressão para o osso não ser pesado demais, e a pesar de sua leveza tenha o máximo de resistência. Quão sabiamente isso está regulado, demonstra-se pelo fato de que quando um osso quebrado é mal ajustado, varia também a direção da tração e pressão. Sabem o que acontece? O ajustamento das plaquinhas ósseas varia insensivelmente para a nova direção.

Por meio de interessantes cálculos ficou provado que o fêmur é construído, rigorosamente, segundo as leis da estática, de forma que uma solução melhor para suportar a pressão e a tração, nem o mais hábil engenheiro poderia imaginar.

O esqueleto humano em si mesmo é o modelo do mais engenhoso mecanismo. Cada um dos membros é uma admirável alavanca, um guindaste. Já notaram nas fábricas, que as correias correm por cima das rodas; aqui essas correias são os músculos que cingem os ossos. São, porém, muito melhores do que as das fábricas, visto como o podem contrair-se e distender-se até os 5/6 de seu comprimento. Correias que se dilatam e se encurtam por si mesmas, ninguém no mundo pode construir.

Hoje em dia fabricam-se instrumentos extremamente delicados; onde, porém, existe instrumento tão fino, tão sensível, tão complicado como o organismo humano? E através desse organismo tão complexo corre um sistema telegráfico, que atende sem demora à mais leve moção da vontade, exatamente aquela parte do corpo que eu quero, põe-se em ação, embora eu não tenha conhecimento dos músculos precisos para isso. Não são fatos maravilhosos que nos levam a refletir? E sempre voltar ao mesmo pensamento: Quão sábio deve ser Aquele que ideou esse pasmoso organismo!”

“Realmente, depois de tais reflexões, nossa alma forçosamente se eleva para Deus”, observou Jorge.

“No entanto, amigos apesar disso há homens que, mesmo à vista dessa pasmosa e adequada organização, não são capazes de formular esse sublime pensamento.

Um exemplo ilustrará o fato.

Na bela catedral de Estrasburgo está, no lugar de um dos altares, um relógio, uma obra-prima da Idade Média. É tão alto que atinge a abóbada. Marca os minutos, as horas, os dias, os meses, as estações. Seu funcionamento movimenta uma multidão de pequenas figuras, os quartos de hora são indicados por uma criança que bate sobre um sino com um martelo; as meias horas por um jovem; os 3/4 por um adulto, as horas inteiras por um ancião. Podem imaginar como deve ser complicado o mecanismo desse relógio!

Imaginem agora uma formiga, que penetra por entre as rodas a girar e correntes a ranger. Inspeciona bem tudo, passa revista nas alavancas, nos enormes pesos, nas rodas dentadas e começa a cismar.

Afinal, nada há de maravilhoso neste complexo mecanismo. Que os ponteiros girem? É natural; tem o eixo ligado a esta roda pitoresca. Esta, por sua vez, tem comunicação com aquela outra que também gira. Mas, por que se move?

Ora, ora! Lá está pendurado o pêndulo; este se movimenta. E o pêndulo, por que se move ele? É que ali, aquele grande peso o faz oscilar. Que há de extraordinário nisso tudo? Nada! Um move o outro, este um terceiro, e assim por diante. Tudo é um brinquedo de criança.

Assim está a formiga a filosofar e julgar ter compreendido tudo, quando não compreendeu uma coisa: Não sabe quem reuniu essas rodas tão sabiamente que uma mova a outra com tal exatidão! Sim! Quem foi o relojoeiro? O inteligente e competente construtor?

Ora, o corpo humano é um mecanismo mil vezes mais engenhoso e perfeito do que o relógio da catedral de Estrasburgo”, terminou o professor.

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(TOTH, Monsenhor Tihamer. Na linda natureza de Deus. Editora S. C. J., 1945, p. 88-95)