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O Problema de Dar

Capítulo 44. O Problema de Dar - Livro Rumo à Felicidade, de Fulton Sheen
«TER» é o contrário de «dar» e, todavia, cada uma destas coisas é boa no seu devido lugar. Ter é estender a nossa personalidade: não contemos, dentro de nós próprios, todas as coisas essenciais à vida humana, e, portanto, o nosso «ser» deve ser completado também pelo «ter». A existência implica o direito de ter o necessário alimento e vestuário e um lugar para viver; não implica, contudo, o direito de ter um iate de passeio. O direito de possuir vai diminuindo à medida que os objetos se distanciam mais das nossas necessidades pessoais.A virtude de dar está dependente da de ter… pois, a não ser que possuamos alguma coisa, não a poderemos dar. (Isto também se aplica com o nosso tempo). Mas o ter, para a maior parte das pessoas, não se considera oportunidade de dar. Reputam o dar um prejuízo, porque, para eles, é o ter, em si mesmo, de mui grande valia. Isto é curteza de vistas; se se der metade de um pão, fica-se com a outra metade, e ter-se-á, também, a felicidade de dar.

Muitas pessoas, especialmente entre os ricos, julgam do valor da sua personalidade em função da posse crescente de coisas supérfluas. Não querem reduzir o seu capital, antes o aumentam cada ano, a ponto de lhes parecer o desdobramento da sua pessoa, sem o qual não estariam completas. Parcelar uma parte deste capital para esmolas, seria como cortar-lhes um braço ou uma perna.

Houve uma mulher que ficou na história, porque não teve receio de cercear o seu capital. O fato é-nos relatado pelo Evangelho:

«Estando Jesus sentado defronte da arca do tesouro, observava a maneira como a multidão lançava ali o dinheiro; e muitos ricos deitavam com abundância. Vindo, porém, uma pobre viúva, deitou duas pequenas moedas, que valiam dez centavos. E, chamando os Seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deitou mais que todos os outros que lançaram no gazofilácio. Porque todos esses deitaram do que lhes sobejava, mas esta, da sua pobreza deitou tudo o que tinha, todo o seu sustento»

Nosso Senhor estudava interessadamente os que davam esmolas, e foi mais a qualidade das suas dádivas que Lhe chamou a atenção, do que a quantidade. Ele disse um dia que, onde estiver o nosso tesouro, aí estará, também, o nosso coração. Agora diz-nos que aonde vai o coração, segue-o o tesouro. Poucos de nós adotam o Seu modo de ver no que diz respeito à esmola: não nos damos ao trabalho de ler a lista dos benfeitores, em tipo miúdo, sob o título «Quantias inferiores a…». Mas essa seria, provavelmente, para Ele a seção mais importante da lista; no Templo, Ele imortalizou a dádiva de duas das mais pequenas moedas do mundo antigo.

Provavelmente, a pobre mulher do Templo não viu o seu Juiz, nem sabia que Lhe tinha agradado, nem imaginava que, na balança da Justiça Divina, «deitou mais do que todos os outros deitavam na arca do tesouro». Eles deram do supérfluo; ela deu tudo o que tinha, «todo o seu sustento». Ela era pobre, e, não obstante, deu aos pobres. Exauriu-se para encher o vácuo dos outros. O tinido das suas duas pequenas moedas, ao cair, foi um brado que refutou toda a vil filosofia do materialismo, que ensina os homens a adquirir o mais que possam, como se este mundo fosse a nossa única morada.

Mas a pequena dádiva da viúva tem outro significado: lembra-nos que Nosso Senhor quer tudo de nós. Ele foi o primeiro «totalitarista» do espírito: pede que não Lhe subtraiam os nadas. Ele exige amor total: «com todo o entendimento, com todo o coração, com todo o espírito e com todas as forças». Só aqueles que deram todo o seu coração a Deus, Lhe podem dar, também, todo o seu capital.

Nada do que se dá com tal espírito de generosidade, se perde jamais. No cálculo do materialista, aquilo a que se renuncia é perdido para sempre. No domínio do espírito, isto não é verdade, porque aquilo que damos a Deus, é não só lançado a nosso crédito como merecimento eterno, mas até nesta vida encontra já a recompensa. Um dos meios mais práticos de assegurar que nunca nos falte o bastante, é dar e não cessar de dar, em Nome do Senhor. Igualmente é sendo totalmente generosos para com o nosso próximo que mais depressa cresceremos no amor de Deus.

«Dai e dar-se-vos-á; uma boa medida, vecalcada, cheia e acogulada será lançada no vosso regaço; porque, com a mesma medida com que medirdes, será medida para vós»

O uso que damos ao que possuímos, está intimamente relacionado com o que somos, com o nosso «ser» e com o que viremos a ser. Aquele que guarda para si tudo quanto tem, tudo há de perder, quando vier a morte; mas o que tudo deu, reavê-lo-á na moeda da imortalidade e da alegria.

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(SHEEN, Dom Fulton. Rumo à Felicidade – WAY TO HAPPINESS. Tradução de Dr. A. J. Alves das Neves, pároco de São Pedro da Cova. Livraria Figueirinhas, Porto, 1956, p. 175-178)