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Jesus Cristo ensina-nos a que aplicarmos o nosso espírito

Meditação para o Sábado da 1ª Semana depois da Epifania. Jesus Cristo ensina-nos a que aplicarmos o nosso espírito

Meditação para o Sábado da 1ª Semana depois da Epifania

SUMARIO

Consideraremos o nosso adorável mestre, Jesus Cristo, ensinando-nos com o Seu exemplo o uso que devemos fazer da nossa inteligencia. Esta faculdade da nossa alma tem duas operações: pensa, julga. Ora Jesus Cristo ensina-nos com o Seu exemplo:

1.° A não termos senão santos pensamentos;

2.° A não formarmos senão juízos prudentes.

— Depois destas duas reflexões, tomaremos a resolução:

1.° De nos guardarmos dos pensamentos inúteis, das quimeras, das distrações, e nos conservarmos recolhidos dentro em nós;

2.° De julgarmos todas as coisas como Deus as julga, e como o Evangelho nos ensina a julgá-las.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra da Imitação:

“Ditosos os olhos que, fechados para as coisas exteriores, estão abertos para as coisas interiores” – Beati oculi qui exterioribus clausi, interioribus autem sunt intenti (III Imitação 1, 1)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo no admirável e sublime uso que fez da Sua inteligência. Oh! Quão santos, elevados e celestiais eram todos os Seus pensamentos! Quão retos, prudentes e conformes aos juízos da divindade, que habitava substancialmente nEle, eram todos os Seus juízos! Louvemo-lO por ter feito tão nobre uso da Sua inteligência.

PRIMEIRO PONTO

Santos pensamentos de Jesus Cristo

A santíssima alma do Salvador somente se abria a pensamentos santos, todos para Deus, todos em Deus. Longe de a distraírem, as coisas exteriores elevavam-a à adoração da onipotência, da sabedoria, da majestade e bondade de Deus, que nelas via impressas. Em todos os acontecimentos deste mundo não apreciava senão o lado que tinha relação com a maior glória de Deus; de sorte que, durante os dias inteiros, era uma meditação em Deus, de que nada podia apartá-la; e as mesmas noites eram para ela como que uma oração continua (1). Nesta santíssima alma nenhuns pensamentos inúteis, nenhumas vagueações da imaginação, nenhumas dessas preocupações que absorvem ou interrompem a atenção.

Ah! Se me comparo com este belo modelo, que diferença! Entrego-me a muitos pensamentos inúteis, a muitas ideias quiméricas; ocupo-me em qualquer outra coisa de melhor vontade do que nas coisas de Deus. Imprudente que sou, esqueço que isto não é amar a Deus com toda a alma (2); que a conta que terei de dar dos pensamentos vãos, do tempo perdido em devaneios, não é menos terrível do que a conta das palavras ociosas e das horas consumidas sem utilidade. Eu levo a cegueira até não ver que o hábito dos pensamentos inúteis destrói toda a disposição para a oração, distrai o espírito, exaure o coração; que os maus pensamentos somente são separados dos pensamentos inúteis por um passo fácil de dar, e que as paixões não se fortificam menos pela representação dos objetos ausentes do que pelo gozo dos objetos presentes.

Ó meu Deus, eu reconheço e confesso diante de Vós o mau uso que tenho feito da minha inteligência, e a necessidade de o terminar recolhendo-mo dentro em mim, sendo pontual nos meus exercícios espirituais, fugindo do mundo que distrai, e expulsando os pensamentos maus, logo que os descubra.

Tal tem sido a prática dos santos; e nela atuaram não somente à sua santidade, mas também a sua fidelidade; porque depois dos primeiros esforços que são os únicos que custam, o hábito da união com Deus, fruto da guerra feita aos pensamentos inúteis, é um antegosto do paraíso. Oh! Quantas exprobações tenho eu aqui a fazer a mim mesmo! Quantas distrações! Quantos devaneios! Quanto tempo perdido em quimeras e pensamentos inúteis, ou estranhos ao que devia então ocupar o meu espírito!

SEGUNDO PONTO

Retos juízos de Nosso Senhor

Eram juízos sempre equitativos nos seus princípios e na sua aplicação. Assim como ouço, dizia Jesus Cristo, julgo (3), isto é, consultava o juízo de Deus sobre cada coisa, para dele fazer depois a norma dos seus próprios juízos. É deste modo que obramos? Não julgamos segundo o testemunho dos sentidos e da imaginação, segundo o interesse das nossas paixões, segundo os juízos do mundo, muitas vezes quase tão enganosos como os nossos, e algumas vezes ainda mais? Ensine-nos o exemplo de Jesus Cristo a não julgar coisa alguma senão depois de ter consultado Deus, e lido, de alguma sorte, no seu rosto e nos seus olhos o que devemos julgar, aprovar ou desaprovar (4). Então somente estimaremos a salvação e a eternidade; e nos consolaremos facilmente das perdas ou desgraças, enquanto a salvação o permitir; então o mundo já  não será para nós senão uma perspectiva que causa ilusão à vista, um sonho que desaparece ao despertar, um encanto que perturba; e não diremos que é feliz e digno de inveja aquele que é rico, poderoso, honrado. Ao contrário, diremos que ó apetecível a sorte daquele que padece, que é desconhecido, tido em pouco, mas que preza a posição que Deus lhe criou. Então julgaremos as coisas durante a vida como as julgaremos na hora da morte e por toda a eternidade, como as julgam agora até aqueles que havendo-nos precedido na morte, se deixaram seduzir pelo mundo. Depois disto, oxalá reformemos, todos os nossos juízos, mudemos as ideias que tínhamos das coisas, não tornemos a chamar mal ao que é bem, nem bem ao que ó mal, desprezemos o que o mundo preza, e prezemos o que ele despreza!

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Et erat pernoctans in oraione Dei (Lc 6, 13)

(2) Ex tota mente (Mc 13, 30)

(3) Sic audio, judico (Jo 5, 30)

(4) De viutu tuo judicium meum prodeat (Sl 16, 2)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 198-201)