Capítulo XI
“Então ele lho entregou para que fosse crucificado” (Jo 19,16).
Pilatos, depois de tantas vezes ter declarado a inocência de Jesus, e então novamente lavando suas mãos e protestando que era inocente do sangue daquele justo, sendo os judeus responsáveis por sua morte: “Mandado vir água, lavou as mãos à vista do povo, dizendo: Eu sou inocente do sangue deste justo: vós lá vos avenhais” (Mt 27,24), assim mesmo dá a sentença e o condena à morte. Ó injustiça jamais vista no mundo! O juiz condena o acusado ao mesmo tempo que o declara inocente. São Lucas escreve que Pilatos entregou Jesus nas mãos dos judeus para que fizessem com ele o que desejavam: “Entregou Jesus à sua vontade” (Lc 23,25). De fato, é o que acontece quando se condena um inocente: ele é abandonado nas mãos de seus inimigos, para que o façam morrer, e morrer da maneira que for do gosto deles. Infelizes judeus, vós dissestes: “Seu sangue caia sobre nós e nossos Filhos” (Mt 27,25), e assim chamastes sobre vós o castigo e este já vos alcançou: vossa nação já sofre e sofrerá o castigo desse sangue inocente até ao fim do mundo.
A injusta sentença de morte é lida diante do condenado. O Senhor a ouve e inteiramente resignado ao justo decreto de seu eterno Pai; que o condena à morte da cruz, não pelos delitos que lhe imputavam falsamente os judeus, mas por nossas culpas verdadeiras, pelas quais se oferecera a satisfazer com sua morte. Pilatos diz na terra: Morra Jesus, e o Padre eterno o confirma no céu, dizendo: Morra meu Filho. E o Filho diz também: Eis-me aqui; eu obedeço, aceito a morte e a morte da cruz.
“Ele se humilhou, fazendo-se obediente até à morte e a morte de cruz” (Fl 2,8).
Meu amado Redentor, aceitastes a morte que me era devida e com vossa morte me obtivestes a vida. Eu vos agradeço, meu amor, e espero poder louvar no céu as vossas misericórdias para sempre: “Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor”. Visto que vós, inocente, aceitastes a morte da cruz, eu, pecador, aceito-a com todas as penas que a devem acompanhar e desde já a ofereço a vosso eterno Pai, unindo-a à vossa santa morte. Pelos merecimentos de vossa morte tão dolorosa, concedei-me, ó meu Jesus, a sorte de morrer em vossa graça e ardendo em vosso santo amor.
Voltar para o Índice de Meditações sobre a Paixão de Cristo, por Santo Afonso