Meditação para o Vigésima Sábado depois de Pentecostes
SUMARIO
Meditaremos sobre o amor de Jesus para conosco, e veremos:
1.° Quanto éramos indignos dEle;
2.° Até que excesso nos amou, apesar da nossa indignidade.
— Tomaremos a resolução:
1.° De protestarmos muitas vezes a Nosso Senhor, com fervorosos atos de amor, que O amamos, e queremos amá-lO cada vez mais;
2.° De Lhe oferecermos todas as nossas ações, tudo o que temos e somos, nada querendo fazer nem possuir senão por Ele, e de não vermos senão a Ele nas pessoas que amamos.
O nosso ramalhete espiritual será a palavra de São João:
“Portanto amemos a Deus, porque nos amou primeiro” – Nos ergo diligamus Deum, quoniam Deus prior dilexit nos (1Jo 4, 19)
Meditação para o Dia
Adoremos Jesus Cristo como o terno amante das nossas almas, que nos amou com excesso (1), que fez para nós tudo o que existe, se entregou a Si mesmo, Se gastou todo por nós (2). Paguemos-Lhe amor com amor, quando pudermos (3).
PRIMEIRO PONTO
Quanto éramos indignos do amor de Jesus Cristo
Ó meu Deus, se é verdade que o amor é maior à medida que parte de mais alto e desce mais baixo, quanto eu era indigno de que me amasseis! Quando Vos considero no mais alto dos céus, onde reinais; quando contemplo a vasta extensão do firmamento, que construístes como um magnífico pavilhão por cima da minha cabeça, essas inumeráveis estrelas que nele semeastes, como o lavrador semeia o grão no seu campo, todo esse universo, caio abismado e confundido à vista de tanta magnificência. Quando digo comigo, que todas as gentes são diante de Vós como se não existissem, que com três dedos sustentais o globo terrestre e abalais os montes, que mandais a luz, e ela vai; a chamais, e ela vos obedece tremendo (Br 3, 33), não posso cansar-me de admirar que um Deus desça a amar-me, a mim que estou colocado tão abaixo dEle. Ó prodígio que causará a admiração dos céus durante toda a eternidade! E que sou eu, pois, para quê Deus me ame? Sou um bicho da terra, que se arrasta pelo chão; um nada, que somente tem uma existência precária; menos que isto, um pecador de origem, filho da ira por natureza; menos que isto, um pecador por malícia, um abismo de miséria e de corrupção, capaz de todo o mal, se a graça me não detém; e um Deus tão grande, tão santo, ama uma criatura tão vil; um Deus, abismo de majestade, de grandeza, de independência, ama um nada rebelde, abismo de baixeza, de indigência e de pecado! Ó amor, que aproxima as distâncias, que vence os contrastes! (4) Ainda não é tudo: Jesus Cristo bem previa que não responderiam ao seu amor senão com a frieza e a indiferença, com ingratidão e outros pecados, que O crucificariam de novo; e apesar disto, tem-nos arriado tanto! Ó mistério de amor!
SEGUNDO PONTO
Quanto Jesus Cristo nos tem amado apesar da nossa indignidade
Tem-nos amado:
1.° Com um amor proveniente, que data da eternidade (5), é que é anterior a todo o mérito da nossa parte;
2.° Com um amor gratuito: tinha em Si mesmo a plenitude de todos os bens; e sem nenhum mérito da nossa parte, concebeu para conosco um amor de preferência, que foi buscar-nos ao meio do nada, escolher-nos entre um número infinito de criaturas possíveis, que teriam feito da existência melhor uso do que nós, entre tantos milhares de infiéis para nos tornar cristãos, entre tantos milhares de cristãos para nos tornar católicos, e entre tantos milhares de católicos para nos cercar de multíplices graças de salvação.
3.° Com um amor infinito. Seria impossível referir todos os milagres de amor; o céu e a terra, a ordem da natureza e a ordem da graça, tudo é cheio do amor do nosso Deus, tudo nos clama que o amemos (6). Entre tantas maravilhas, o presépio, a cruz, o altar clamam mais alto ainda que todas as outras:
“Eis corno Jesus Cristo nos amava” – Ecce quomodo amabat
Ouçamos estas vozes no silêncio da alma, e respondamos-lhe com todo o nosso ardente amor.
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Propter nimiam caritatem suam qua dilexit nos (Ef 2, 4)
(2) Totus in usus nostros expensus
(3) Amemus, redamemus, amplectamur, in quantum possumus
(4) Quis tu, Domine? Quis ego?
(5) In caritate perpetua dilexit te (Jer 31, 5)
(6) Omnia clamant ut diligas
Voltar para o Índice das Meditações Diárias de Mons. Hamon
(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo V, p. 106-109)