Meditação XXII – segunda-feira da IV semana da Quaresma
Por Dom Henrique Soares da Costa
Reze o Salmo 118/119, 1-8:
1Felizes os que seguem o caminho da rectidão
e vivem segundo a lei do SENHOR.
2Felizes os que cumprem os seus preceitos
e o procuram com todo o coração,
3que não praticam o mal,
mas andam nos caminhos do SENHOR.
4Promulgaste os teus preceitos
para se cumprirem fielmente.
5Oxalá os meus passos sejam firmes
no cumprimento dos teus decretos.
6Então não terei de que me envergonhar,
se observar os teus mandamentos.
7Poderei louvar-te de coração sincero,
instruído pelos teus justos juízos.
8Hei-de cumprir as tuas leis;
não me abandones mais!
Retornemos à nossa Epístola. Agora, leia Gl 3, 23:
23Antes, porém, de chegar a fé, estávamos prisioneiros da Lei, estávamos fechados, até à fé que havia de revelar-se.
E também Gl 4, 1-7:
1Mas eu digo-vos: durante todo o tempo em que o herdeiro é criança, em nada difere de um escravo, apesar de ser senhor de tudo. 2Pelo contrário, está sob o domínio de tutores e administradores, até ao dia fixado pelo seu pai. 3Assim também nós, quando éramos crianças, estávamos sob o domínio dos elementos do mundo, a eles sujeitos como escravos.
4Mas, quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob o domínio da Lei, 5para resgatar os que se encontravam sob o domínio da Lei, a fim de recebermos a adopção de filhos. 6E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: “Abbá! – Pai!” 7Deste modo, já não és escravo, mas filho; e, se és filho, és também herdeiro, por graça de Deus.
1. Agora, uma outra ilustração de como a Lei é provisória e não dá a Vida. Partindo da ideia de que a Lei de Moisés tutelou o Povo de Israel até que, em Cristo, viesse o cumprimento da Promessa, o Apóstolo, agora utiliza outra imagem, comum no direito judaico e romano: o herdeiro menor de idade, que tem a herança, mas dela não pode fazer uso até a maioridade, ficando sob um tutor. Este herdeiro era Israel e o tutor era a Lei. Releia atentamente Gl 4,1-3.
2. Sugiro, aqui, que alarguemos o pensamento da Epístola. Então, quem é este herdeiro? Certamente, o Povo de Israel, a quem foram feitas primeiramente as promessas do Senhor (cf. Rm 9,4). Todo o Antigo Testamento era tempo de preparação, de espera, de levar a “criança”, o herdeiro menor de idade até o Mestre, o Prometido, Cristo (cf. Lc 16,16; 1Cor 10,1-11; Hb 1,1s). Assim, a Lei de Moisés, santa, necessária e útil, preparava e conduzia os judeus para Cristo. Mas, agora, chegado o Senhor Jesus Cristo, os judeus deviam dar o passo de crer e acolher o Prometido, reinterpretando Nele, através Dele e em relação a Ele toda a história de Israel e todas as Sagradas Escrituras e as observâncias de Lei de Moisés, que eram apenas figura do que deveria vir (cf. Jo 5,39; 6,29; Rm 9,4).
3. Mas, esse menor de idade são também os pagãos. Basta pensar no que o Apóstolo dirá no v. 8, referindo-se aos gálatas, vindos da gentilidade. Para eles também existia a Promessa, mesmo sem eles saberem. É só reler Gn 12,3! Mas, sem conhecerem o verdadeiro Deus, viviam debaixo da idolatria, sem verdadeira esperança, debaixo da lei do pecado, das paixões e dos elementos deste mundo, verdadeiros “filhos da ira” de Deus (cf. Ef 2,1-3)! Assim, judeus e gentios, “nós”, judeus (v. 3) e “vós”, gentios (v. 8),toda a humanidade era “menor”, era tutelada, à espera do Prometido, do Descendente, do cumprimento da Promessa do Senhor Deus. Certamente, os judeus eram conscientes da Promessa; tinham o conhecimento do Deus verdadeiro (cf. Jo 4,22-24), tinham esperança no Senhor e, por isso, eram superiores sim aos gentios diante de Deus! Israel será sempre o primogênito de Deus (cf. Ex 4,22; Dt 7,6; Am 3,2; Os 11,1; Rm 11,28). Mas, agora, diante de Cristo, “não há judeu nem grego, escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,28).
É este pensamento amplo e ousado que está presente nos vv. 1-3 deste capítulo 4.
4. O próximo versículo, o 4, começa com uma adversativa:
“Mas, porém…”
É a marca de uma virada, de uma verdadeira revolução, de uma mudança de tempo, de época:
“Porém, quando chegou a plenitude do tempo…”
Agora, sim, no plano de Deus, vai se passar da promessa para o cumprimento, da figura para a realidade, da profecia para a realização, do tempo de Lei para o tempo da graça no Espírito Santo, tal como os profetas de Israel haviam prometido! Releia atentamente o v. 4.
a) A plenitude do tempo: o tempo previsto na providência divina. O Senhor Deus tem um plano de salvação, uma economia da salvação, isto é, uma sequência organizada e desenvolvida na história, no tempo, segundo Sua sabedoria e providência. A plenitude do começa com Jesus, nossos Senhor. Leia Mc 1,14s. O próprio Senhor Jesus Cristo sabia que esta plenitude chegara com Ele!
b) O Filho amado vem da parte do Pai, que o envia. Esse Pai é o Deus santo de Israel. Não, portanto, oposição entre a Lei que preparou e conduziu para Jesus Cristo e a Promessa, que é cumprida em Nosso Senhor e marca a realização e plenitude da Lei! Aliás, o judeu que desejasse realmente cumprir a Lei radicalmente e no seu espírito, deveria, necessariamente, reconhecer e acolher Jesus pela fé!
Outro aspecto importantíssimo: a iniciativa radical da salvação promana do Pai:
“Deus amou tanto o mundo, que entregou o Seu Filho único, para que todo o que Nele crê não pereça, mas tenha a Vida eterna” (Jo 3,16)
Esta salvação nos vem através do Filho na potência do Santo Espírito.
c) “Nascido de mulher”. Esta é a primeira referência do Novo Testamento à Virgem Maria! A Epístola aos Gálatas é mais antiga que os quatro evangelhos. O primeiro a ser escrito foi o de São Marcos, pelo ano 64. Esta Mulher, aqui, é a Virgem (cf. Jo 2,4; 19,26; Ap 12,1). Observe que não haveria necessidade de dizer que o Filho nasceu de mulher. Ao dizer, o Apóstolo pensa na Virgem Santíssima. Ela é a Nova Eva (cf. Gn 3,15), que tem um papel primordial no desígnio salvífico de Deus! É muito importante compreender que nestes versículos que estamos meditando, o Apóstolo resume admiravelmente o núcleo da história da salvação e, precisamente aí, coloca a Mulher! Cante, com a Mulher, com a Virgem Maria, a salvação de Deus: Lc 1,46-55.
d) “Nascido sob a Lei”. Nascido de mulher pelas leis da natureza, o Cristo é também nascido debaixo da Lei de Moisés como judeu, descendência de Abraão! Assim, Ele, morrendo e ressuscitando, resgataria a todos, seja da lei da natureza decaída pelo pecado (cf. Rm 7,14-25), seja da Lei de Moisés com seu fardo pesado de preceitos e observâncias (cf. 23,4).
5. Por agora, paramos aqui. Ante o que estamos expondo, escute o Senhor. Leia e reze Mt 11,28-30. Acolha no seu coração o convite do Senhor. Repouse no Coração de Cristo. Reze a ladainha do Coração de Jesus!
Reze também o Sl 102/103