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Da caridade fraterna

Santo Antônio de Pádua repartindo o pão

Tire o maior proveito desta Meditação seguindo os passos
para se fazer a Oração Mental proposta por Santo Afonso!

Diliges proximum tuum tamquam teipsum – “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Mc 12 ,31)

Sumário. Ninguém pode amar a Deus sem que tenha amor ao próximo, porquanto o amor de Deus e o do próximo nascem da mesma caridade, e o mesmo preceito que nos obriga ao primeiro, obriga-nos também ao segundo. Examinemos em que estima tivemos até agora um preceito tão importante, e, se porventura tivermos de reconhecer faltas, façamos firme propósito de ser para o futuro mais exatos, lembrando-nos que da observância da caridade depende o sermos cristãos, não só de nome, mas de fato..

I. Não se pode amar a Deus sem amar ao mesmo tempo ao próximo. O mesmo preceito que nos manda o amor para com Deus, manda-nos igualmente o amor para com os nossos irmãos: Et hoc mandatum habemus a Deo, ut, qui diligit Deum, diligat et fratrem suum (1) — “Nós temos de Deus este mandamento, que o que ama a Deus, ame também a seus irmão”. D’onde infere Santo Tomás de Aquino, que da mesma caridade nasce o amor para com Deus e o para com o próximo, porque a caridade nos faz amar tanto a Deus como ao próximo, visto que assim o quer o próprio Deus. — Deste modo compreende-se o que São Jerônimo refere de São João Evangelista. Perguntando-lhe os seus discípulos, porque tão repetidas vezes lhes recomendava o amor fraternal, respondeu o Santo: “Porque é o preceito do Senhor; sendo bem observado, basta para a salvação.”

Certo dia Santa Catarina de Sena disse ao Senhor: “Meu Deus, quereis que eu ame ao meu próximo; mas eu não posso amar senão a Vós.” Respondeu-lhe o nosso Salvador: “Minha filha, aquele que me ama, ama todas as coisas que eu amo.” — Com efeito, quem ama alguma pessoa, ama também os parentes, os servos, as imagens e até as vestes da pessoa amada, pela razão que esta ama tais coisas. E porque é que nós devemos amar ao próximo? Porque aqueles a quem amamos são objeto da benevolência de Deus.

Por isso escreve São João que é mentiroso o que diz que ama a Deus e odeia a seu irmão (2). Ao contrário, diz Jesus Cristo que aceitará como feita a si próprio a caridade de que usarmos para com o mais pequenino de seus irmãos, que tais são os nossos próximos (3). — Examina-te aqui, se tens até agora tido na devida estima o preceito tão importante da caridade, e toma a resolução de seres mais exato para o futuro. Lembra-te que da observância deste preceito depende o seres cristão não só de nome, mas também de fato: In hoc cognoscent omnes, quia discipuli mei estis: si dilectionem habueritis ad invicem (4) — “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”.

II. Induite vos ergo, sicut electi Dei, viscera misericordiae (5) — “Vós, como escolhidos de Deus, revesti-vos de entranhas de misericórdia”. Eis aí o que, segundo São Paulo, deve fazer o cristão para conservar a caridade para com o próximo. Ele diz: induite: revesti-vos, de caridade. Assim como o homem leva para toda parte o seu vestido, que o cobre inteiramente, assim deve levar consigo a caridade em todas as suas ações e cobrir-se todo inteiro com ela. Diz ainda: induite viscera misericordiae — “revesti-vos de entranhas de misericórdia”. O cristão deve revestir-se, não somente de caridade, mas de entranhas de caridade, o que quer dizer que deve ter para com os seus irmãos tão grande ternura de afeto, como se cada um fosse o seu predileto particular.

Quem ama vivamente uma pessoa, pensa sempre bem dela, alegra-se pela sua prosperidade e entristece-se pelos seus males, como se fossem os próprios. Quando a pessoa amada comete uma falta, que empenho em defendê-la, ao menos em diminuir-lhe a culpa! Quando, ao contrário, faz algum bem, o amigo se desfaz em louvores e enaltece-a até às estrelas. Eis o que faz a paixão. Ora, o que a paixão faz nas pessoas mundanas, deve fazê-lo em nós a santa caridade, e não só para com aqueles que nos fazem bem, mas ainda para com aqueles que nos tenham ofendido.

Ah, meu Redentor, quão longe estou de me parecer convosco! Vós não fostes senão caridade para com os vossos perseguidores, e eu rancoroso e odiento para com o meu próximo! Vós rogastes com tanto amor pelos que Vos crucificaram, e eu só penso em tomar vingança de quem me desagradou! Perdoai-me, ó meu Jesus, não quero mais ser o que fui. Proponho firmemente imitar-Vos de hoje em diante, custe o que custar; proponho amar a quem me ofende e fazer-lhe bem. Dai-me a graça de Vos ser fiel.

— Ó Maria, Mãe de Deus, rogai a Jesus por mim; dai-me uma parte de vosso amor para com o próximo; a vossa proteção é a minha esperança.

Referências:

(1) 1 Jo 4, 21
(2) 1 Jo 4, 20
(3) Mt 25, 40
(4) Jo 13, 35
(5) Cl 3, 12

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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 21-24)

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