SUMARIO
Para nos excitarmos a ter uma vida melhor durante o novo ano, em que acabamos de entrar, veremos:
1.° Os motivos;
2.° Os meios de passar santamente este ano.
— Tomaremos depois a resolução:
1.° De empregar maior fervor na perfeição das nossas obras costumadas;
2.° De nos aplicarmos a reparar o mal passado com o bem presente, e principalmente de fazer cada dia uma guerra mortal à nossa paixão dominante.
O nosso ramalhete espiritual será a recomendação de São Paulo:
“Façamos bem enquanto temos tempo” – Dum tempus habemus, operemur bonum (Gl 6, 10)
Meditação para o Dia
Adoremos Jesus Cristo dignando-se dar-nos um novo ano, para trabalhar na nossa santificação e merecer um lugar no seu paraíso. Agradeçamos-Lhe este favor, e roguemos-Lhe que nos permita utilizar-nos dele.
PRIMEIRO PONTO
Motivos de passar Santamente o ano
1.º Temos um triste passado a reparar. Deus havia-nos concedido o ano findo para o empregar na nossa santificação. Que uso fizemos dele? Havia-nos dado toda a sorte de bens na ordem de natureza e na ordem da graça. Que fruto tiramos deles? Tornamo-nos melhores? Ah! Quanto mal cometido! Quanto bem omitido ou mal feito! Quantos abusos de graças! Grande Deus! Quando a Vossa justiça puser em um prato da balança o mal que fiz contra Vós, como o pouco bem que pratiquei, receio que me digais como a esse rei de Babilônia: Foste pesado na balança (1), e o peso da minha glória sobrepujou o peso dos vossos merecimentos. O único recurso que me resta, é acumular durante o novo ano uma superabundância de bem, que compense a superabundância de mal.
2.° Temos o presente a santificar. Ser-nos-á preciso dar a Deus uma rigorosa conta de todos os momentos do presente ano. Cada momento mal empregado ou somente inútil se voltará contra nós. Oh! Se reconhecêssemos o valor do dom de Deus! (2)
3.° Temos o futuro a prever. E que mais incerto que este futuro? Morrem na terra cerca de 76 pessoas cada minuto; 4.560 cada hora; 109.440 cada dia; quase 40 milhões cada ano. Não serei eu deste número durante o ano que começa? Se o soubesse, quão bem viveria! Quanto me absteria de todo o pecado! Quão santamente faria até as minhas menores obras! Quão pura conservaria sempre a minha alma! A minha morte poderia ser repentina, sem inconveniente, porque não seria imprevista. Por isso Santo Antão dizia aos seus discípulos: Vivei cada dia, como se fosse o último da vossa vida; e São Bernardo recomendava aos seus, que fizessem cada coisa, como se devessem morrer logo depois (3).
SEGUNDO PONTO
Meios de passar Santamente este ano
1.° Devemos aplicar-nos a fazer bem as nossas obras ordinárias, até as mais comuns, que nada parecem aos olhos do mundo, isto é, a fazê-las no tempo e da maneira que convém, a fazê-las para Deus, com veemente desejo de Lhe agradar. A santidade consiste mais nisto do que nessas obras extraordinárias, que por isso mesmo que são extraordinárias, são raras.
2.° Devemos tender sempre para viver melhor no momento presente do que no instante que precedeu. Se erramos, é preciso, sem nenhuma desanimação, reparar o mal passado fazendo bem o presente, Se se obrou bem, é preciso forcejar por obrar ainda melhor. A verdadeira virtude nunca diz: Basta. Nesta matéria, não avançar, é recuar. Sempre para diante, tal é a senha; sempre subir, tal é a regra do justo (4).
3.° Devemos estudar o nosso vício dominante, e depois de o termos bem conhecido fazer-lhe todo o ano uma guerra mortal, à força de vigilância, de exames de consciência, de boas confissões e de fervorosas orações. Se cada ano, diz o autor da Imitação, extirpássemos um vício, depressa seríamos perfeitos (5). Penetremo-nos bem destes três meios de passar santamente o ano, e decidamo-nos a isto fortemente.
Resoluções e ramalhete espiritual como acima
Referências:
(1) Appensus es in statera, et inventus es minus habens (Dn 5, 27)
(2) Si scires donum Dei! (Jo 4, 10)
(3) Si modo moriturus esses, an hoc vei illud faceres?
(4) Ascensiones in corde suo disposuit (Sl 83, 6)
(5) Si, omni anno, unum vitium extirparemus, cito vere perfecti efficeremur (I Imitação, 11, 5)
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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 153-155)