Sumário. Consideremos como este santo respondeu admiravelmente ao convite divino; pois, mal o convidou Jesus Cristo para o seguir, logo se levantou do telônio e o foi seguindo. E quantas dificuldades teve que vencer! Somos nós igualmente solícitos em obedecer ao convite de Deus? Há quanto tempo nos convida ele para sairmos da nossa tibieza, e lhe resistimos obstinadamente? Ah! Cuidemos que a nossa demora não nos leve finalmente a um sofrimento longo no purgatório, e quiçá, à perdição eterna, como sucedeu a tantos outros.Vidit hominem sedentem in telonio, Matthaeum nomine, et ait illi: Sequere me — “Jesus viu sentado no telônio um homem, chamado Mateus, e disse-lhe: Segue-me” (Mt 9, 9)
I A prática dos Conselhos Evangélicos não é necessária para a Perfeição Cristã
Não obstante o que se disse alma devota, talvez penseis que para possuir a perfeição, a santidade perfeita, se exige muito mais; primeiro que tudo perguntais que valia dou aos Conselhos Evangélicos, que não mencionei, e que hão de ter o primeiro lugar quando se trata da perfeição. Se os julgais indispensáveis, estais enganada. Primeiro, como diz Santo Tomás, só é preciso para a santidade à obediência aos mandamentos (ver Sum. Teol. 2-2 que. 184 a. 3) tão grande autoridade deveria bastar-vos, porém quero convencer-vos com razões evidentes. Os Conselhos Evangélicos são três, Pobreza, Obediência, Castidade perfeita. Porém se fosse verdade que a prática destes conselhos fosse necessária para se obter a santidade, talvez que só os frades e freiras pudessem aspirar a tal glória. Dela seriam excluídos os casados e todos que não sujeitam a mãos alheias a vontade própria, nem vivem de esmolas. Neste caso não seria verdade que Deus quer que todos sejam Santos, como em vários lugares afirma a Sagrada Escritura, pois não quer que todos os homens pratiquem os Conselhos. A ordem de sua Providência quer que uns observem a continência, outros se casem, sejam ricos, pobres, não desaprova o Senhor que algumas pessoas se governem a si, aprecia, porém os que se submetem à obediência sacrificando a vontade própria. No entanto, quer que todos se tornem Santos. É, pois, um erro verdadeiro pensar que os Conselhos Evangélicos são necessários para a santidade.Sumário. Eis aí uma ilusão comum aos pecadores, a qual fez e ainda faz com que muitos se condenem. Os miseráveis dizem: Deus é misericordioso, e assim como no passado tem sido tão indulgente para conosco, sê-lo-á também no futuro. Consideremos, porém, que o Senhor não é só misericordioso, mas também justo. Por isso, quando estiver cheia a medida dos pecados que ele quer perdoar, faz descer os mais formidáveis castigos. Ah! Quantos daqueles que sempre adiavam a sua conversão, confiados na bondade divina, estão agora queimando no inferno!Ne dixeris: Peccavi, et quid mihi accidit triste? Altissimus enim est patiens redditor — “Não digas: Pequei, e que mal me veio daí porque o Altíssimo, ainda que sofrido, é justiceiro” (Eclo 5, 4)
Sumário. Pobre da alma que conserva apego a qualquer bem terrestre com desagrado de Deus! Ela nunca terá paz na vida presente, com grande risco de nem na outra a conseguir. Bem-aventurado, ao contrário, aquele que só busca ao Senhor e pelo amor dele renuncia a todas as coisas! Alcançará a verdadeira liberdade dos filhos de Deus, e mesmo cá na terra terá um antegosto dos bens que lhe estão preparados no céu. Procuremos, pois, em todas as nossas ações, não ter outra coisa em mira, senão o agrado do Senhor, e digamos muitas vezes: Meu Jesus, só a Vós quero, e nada mais.Meus cibus est, ut faciam voluntatem eius qui misit me, ut perficiam opus eius — “O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou, para consumar a sua obra” (Jo 4, 34)
Sumário. Querendo a Santíssima Trindade ostentar as suas grandezas, criou a Santíssima Virgem, destinou-a para Mãe do Verbo encarnado, e em vista desta dignidade imensa e incomparável, enriqueceu-lhe a alma bendita de toda a espécie de graças, superiores às repartidas entre todas as criaturas. Por isso a Santíssima Virgem está no céu assentada num trono de majestade, à direita de Jesus Cristo, forma uma hierarquia separada, e só ela dá mais brilho à pátria bem-aventurada do que tudo o mais que há no paraíso. Façamos ato de fé nesta grandeza inefável de nossa querida Mãe, rendamos graças a Deus e unamo-nos aos espíritos angélicos para a amar e bendizer.Ave, gratia plena, Dominus tecum — “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo” (Lc 1, 28)
Sumário. O amantíssimo Jesus não quis pela morte ficar separado dos seus fiéis; e por isso instituiu o Santíssimo Sacramento. Já que o Senhor, para nos patentear o seu amor, quis ficar continuamente conosco sobre os altares, também nós, para lhe patentear o nosso amor, devemos visitá-lo frequentemente, e expor-lhe as nossas necessidades. Permaneçamos o mais tempo possível diante do Tabernáculo, e pelo nosso fervor procuremos reparar as muitas ingratidões que Jesus recebe da parte dos homens. Todos os santos acharam cá na terra o seu paraíso na presença de Jesus sacramentado.Ecce ego vobiscum sum omnibus diebus, usque ad consummationem saeculi — “Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos” (Mt 28, 20)
Sumário. Ó! Como aprouve a Deus glorificar já nesta terra as dores da Santíssima Virgem! Primeiro deu-lhe assim ocasião para patentear as suas belas virtudes, e especialmente a sua caridade para com Deus e o próximo. Em segundo lugar fê-la merecer o título glorioso de Rainha dos Mártires. Finalmente, foi pelas suas dores que Maria se tornou Mãe de todos os fiéis e Co-redentora do gênero humano. Se nos quisermos mostrar seus dignos filhos, alegremo-nos com a nossa boa Mãe e esforcemo-nos por a imitarmos, carregando com paciência as nossas cruzes. Assim virá também para nós o dia em que seremos glorificados com ela no céu.Compatimur ut et glorificemur — “Padecemos com ela para sermos também com ela glorificados” (cf. Rm 8, 17)
Sumário. Esta terra é um lugar de merecimentos e, portanto, também de sofrimentos. Para nos exortar à paciência, Jesus Cristo levou uma vida de sofrimentos contínuos, e é a exemplo de Jesus que todos os santos abraçaram as tribulações com alegria, de modo que nenhum deles chegou à glória senão por um caminho semeado de espinhos. Que vergonha para nós! Adoramos a santa Cruz, gloriamo-nos de combater sob este estandarte triunfante, de ser herdeiros dos santos, e somos-lhes tão dessemelhantes! Há de ser sempre assim ? Senhor, enviai-me as cruzes que as minhas culpas merecem, mas dai-me também força para carregá-las com paciência.Mihi absit gloriari, nisi in cruce Domini nostri Iesu Cristi; per quem mihi mundus crucifixus est, et ego mundo — “De mim esteja longe o gloriar-me, senão na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo; por quem o mundo está crucificado para mim, e eu para o mundo” (Gl 6, 14)