Vamos contemplar, neste capítulo, a figura de são José. No presépio, ele costuma estar um pouco recuado, quase na sombra, olhando para o Menino e amparando Maria e Jesus com a sua vigilância carinhosa. Que figura, a de são José! O Evangelho o define com uma só palavra: era justo (Mt 1, 19). Vale a pena meditarmos nisso.
Pode ajudar-nos lembrar que, quando a Bíblia afirma que alguém é justo, quer dizer que é bom, que é reto, que está sempre «ajustado» com Deus, ou seja, que vive sempre em sintonia com Deus, com os seus preceitos e os seus pedidos. Numa palavra, que é santo e que, por isso mesmo, também é íntegro e honesto com os outros.
Essas qualidades brilham mais quando lembramos que São José teve um caminho bastante sofrido, misto de sombras e de luzes, até chegar ao Natal. Foi reto no meio das perplexidades, foi totalmente leal a Deus e a Maria nos dias desconcertantes em que não podia entender o que estava acontecendo.
Lembremos o Evangelho (Mt 1, 18-25 e 2, 13-23). São Mateus conta que, depois de Maria ter concebido por virtude do Espírito Santo, José, seu esposo, que era um homem justo e não queria infamá-la, resolveu deixá-la secretamente.
Precisamos refletir sobre essas palavras, pois não é na hora que se apanha o seu significado. O que deve ficar claro desde o começo – porque o Evangelho o diz explicitamente – é que José resolveu abandonar Maria secretamente porque era justo, precisamente porque era justo: esse foi o motivo. Deus – que inspirou o texto sagrado de são Mateus – quis mostrar-nos com essas palavras que a resolução de José foi um ato de bondade, cheio de retidão.
Um dia ele percebeu a gravidez de Maria, que era um tremendo mistério entre ela e Deus. E aí começou a sua reação. Sofreu sem compreender nada, mas em nenhum momento quis pensar mal dela. Nem por um segundo admitiu a possibilidade de que nela houvesse a menor sombra de pecado ou de traição, ainda que esse mistério tão incompreensível lhe causasse profunda dor. Não é qualquer um que é capaz de fazer isso. É preciso ter um coração muito grande…, e agarrar-se a Deus com força!
Ele amava Maria, ele a conhecia, ele percebia a pureza dos olhos, dos gestos, da alma dela. Mas, pensando nela, sentia-se envolto num mistério que o ultrapassava. E Deus permitiu que sofresse. Talvez para que nós víssemos o que é ser justo, o que é ser bom. Porque, não querendo pensar mal, a primeira coisa que lhe veio à cabeça foi proteger Maria, não a acusar. Nem pensou em se proteger ou defender a si mesmo.
Para não a difamar, preferiu ficar pessoalmente mal, passar – se assim o quisessem pensar os outros – por um irresponsável, um covarde, que deixa a noiva grávida e não quer assumir. Dessa maneira, ela ficava inocentada. Preferia sujar a sua própria imagem, antes que profanar aquele amor santo, que o próprio Deus tinha feito nascer entre ele e Maria.
Um Homem Reto
Ser reto é isso: fazer o que a consciência indica como o caminho certo, o mais justo aos olhos de Deus, ainda que esse bom caminho nos traga renúncias e prejudique os nossos interesses. José era reto porque agia por motivos retos (por amor, por fidelidade, por honradez, por sentido do dever), e não se deixava arrastar por motivos «tortuosos» (nem pelo interesse, nem pela vaidade de preservar a sua reputação, nem pelo comodismo de lavar as mãos e dizer «eu não sei de nada»).
Precisou, para agir assim, de muita coragem. E de muita fé em Deus. Aquilo era saltar no escuro. Era lançar todo o seu futuro nas mãos do Senhor, e esperar que Ele cuidasse dele como um Pai.
Podemos dizer ainda que José foi reto e santo porque soube esquecer-se de si mesmo e dar tudo sem ostentação: deu a sua honra, renunciou aos seus planos pessoais, deu a vida em silêncio.
O desprendimento custa. Não é nada fácil vencer o egoísmo. Fácil é deixar que o interesse seja a motivação das nossas ações, dos nossos desejos, dos nossos pensamentos, dos nossos projetos. Poucos dizem:
«Vou fazer isto porque é bom, porque é justo, porque é verdadeiro, porque vai fazer bem aos outros, porque Deus me pede, ainda que me contrarie, ainda que me doa, que me exija sacrificar coisas que muito aprecio»
José fez isso.
Quantos casais não rezariam mais e lutariam melhor para superar desavenças se pensassem assim, em vez de dizer que estão saturados, que não aguentam mais, ou que chegou a hora de cada um «viver a sua própria vida», ou de «aproveitar a vida enquanto é tempo». José não quis aproveitar nada. Só quis ser fiel a Deus e à sua esposa Maria. Ele soube amar.
Um Servo Fiel
Por isso Deus o amou a ele com predileção. Passados os primeiros momentos de angústia, o Senhor tranquilizou-o.
Enquanto assim pensava – diz o Evangelho -, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: «José, filho de Davi, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que nela foi concebido é obra do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe porás o nome de Jesus, porque Ele salvará o seu povo dos seus pecados».
Que alegria deve ter inundado a alma de José ao receber essa mensagem! Com que carinho, com que admiração, com que veneração olharia a partir daquele momento para Maria, Mãe de Deus e sua esposa castíssima!
Com certeza, se antes disso já era justo e vivia em plena sintonia com Deus, a partir desse instante iria ser ainda mais justo e afinado com Deus.
É importante perceber que, quando lemos com calma o Evangelho – concretamente, os dois primeiros capítulos do Evangelho de são Mateus -, logo chama a atenção que a vida de José se pode escrever com as mesmas palavras com que Deus lhe vai manifestando a sua vontade. Recebe as indicações de Deus com o coração aberto, e não perde um minuto hesitando, negaceando. Ao contrário, na hora, com muita paz, com a segurança do homem de consciência limpa, começa a pôr em prática o que Deus lhe solicita.
Citávamos antes as primeiras palavras de Deus que ele ouviu: Não temas receber Maria. E o que fez José?
Despertando do sono, fez como lhe ordenou o anjo do Senhor, e recebeu sua esposa. Obedeceu sem titubear.
Não foi só dessa vez. Sempre fez a mesma coisa. Quando Deus o chamou para que fugisse para o Egito, livrando assim o Menino da perseguição de Herodes, levantou-se de noite – na hora! -, tomou o Menino e sua Mãe e partiu para o Egito. E quando, após a morte de Herodes, Deus lhe indicou que voltasse para a sua terra, levantou-se, tomou o menino e sua Mãe e voltou para a terra de Israel. Sempre, ao pé da letra, a sintonia com a vontade de Deus!
Esta é a grande lição que José nos dá. Se lhe temos carinho e devoção, ele nos ajudará a ser justos, a ser retos e a não torcer os caminhos da consciência com os desvios do interesse, da vaidade e do comodismo; a ser retos nos nossos juízos sobre os outros; a não pensar precipitadamente nem julgar mal; a estar sempre em harmonia com o que Deus quer.
Tomara que a nossa história também possa ser escrita como uma história de total identificação com a vontade de Deus. Se assim for, o Menino do presépio sorrirá para nós no Natal, e nós seremos felizes.
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