Por Dom Henrique Soares da Costa
1. O dom do Espírito Santo é fruto da Páscoa de Cristo
Morto como homem, Ele foi ressuscitado pelo Pai na força do Espírito Santo derramado sobre Ele enquanto homem composto de corpo e alma (cf. 1Tm 3,16; Rm 1,4).
O Espírito torna-Se a própria Energia divina que sustenta e vivifica a natureza humana de Jesus; São Paulo chega a dizer que o Senhor Jesus é o Espírito (cf. 2Cor 3,18), pois Nele, agora, “habita corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Cl 2,9). Assim sendo, o Senhor Jesus torna-Se doador do Espírito Santo: “Exaltado pela Direita de Deus, Ele (Jesus) recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e O derramou” (At 2,33).
O derramamento do Espírito deu-se no próprio dia da ressurreição, “na tarde daquele mesmo dia” (Jo 20,19): Jesus entrou no Cenáculo estando fechadas as portas, soprou sobre os Onze e disse: ‘Recebei o Espírito Santo” (Jo 20,22). Aqui nasce a Igreja; os apóstolos são batizados no Espírito Santo, tornando-se cristãos, pois receberam a Vida nova, o Pneuma do Cristo morto e ressuscitado!
2. Qual o sentido da Festa de Pentecostes?
Os judeus celebravam-na cinquenta dias após a Páscoa para comemorar o dom da Lei:
(1) Os israelitas saíram do Egito, atravessaram o Mar e, cinquenta dias após, chegaram ao pé do Monte Sinai.
(2) Como Pentecostes sempre coincidia com o início da colheita, também era considerado a Festa das Primícias.
Cinquenta dias após a Páscoa de Jesus, os apóstolos receberam o Espírito de um modo vistoso, com fenômenos exteriores:
(1) Para o novo povo de Deus, que é a Igreja, a Lei é o Espírito de Amor que Jesus derramou nos nossos corações e que habita em nós (cf. Rm 5,5).
Assim, o Amor que Jesus nos deu como mandamento não é um sentimento, mas é o Seu próprio Espírito, no qual unicamente podemos nos amar como Ele amou. É este Amor que é a plenitude da Lei (cf. Rm 13,8.10).
No texto dos Atos dos Apóstolos que narra a vinda do Espírito, aparecem as mesmas características do Monte Sinai: no deserto, o dom da Lei acontece no quadro de uma tempestade (cf. Ex 19,16), uma erupção vulcânica (cf. Ex 19,16.18)] e um terremoto (cf. Ex 19,18); no Cenáculo, aparecem os mesmo sinais: ruído, vendaval impetuoso, línguas como de fogo (cf. At 2,2s).
(2) A Igreja, fruto da ação do Espírito do Ressuscitado, é também primícias da colheita de tudo quanto Cristo realizou na Sua Páscoa…
3. Articulando o dom do Espírito no dia mesmo da ressurreição (cf. Jo 20,19) com o dom do Espírito em Pentecostes (cf. At 2), poderíamos afirmar assim:
O dom do Espírito em João, no dia da ressurreição, equivale ao nosso Batismo, quando recebemos, no símbolo da água, o Espírito de Vida do Cristo ressuscitado. A água é instrumento do dom do Espírito vivificante como o fio é instrumento da transmissão da eletricidade. Nele, Espírito que dá a Vida do Cristo, recebemos uma Vida nova, que germina até a Glória eterna.
O dom do Espírito em Pentecostes equivale à experiência de cada cristão no sacramento da Crisma, quando nos é dado o Espírito de Força para o testemunho de Jesus e a edificação do Corpo de Cristo, que é a Igreja: com a manifestação no Cenáculo, a Igreja abre as portas e começa a sair de si, lançando-se nas estradas do mundo para testemunhar Jesus e construir-se como comunidade dos discípulos Daquele que morreu e ressuscitou. O santo crisma (mistura de óleo com perfumes) devidamente consagrado, é lugar da consubstanciação do Espírito: ali Ele está presente com o fogo, que impregna o ferro incandescente. Pela imposição da mão e a unção crismal recebe-se o Espírito como maturação do Dom recebido no Batismo: a Vida tornar-se transbordante em Força!
4. Na solenidade de Pentecostes é isto que celebramos: o dom do Espírito que é dado à Igreja continuamente, na pregação da Palavra e, sobretudo, nos sacramentos, de modo particular no Batismo e na Eucaristia.
Pentecostes não é simplesmente um evento: é a inauguração de um novo modo de ser e viver da comunidade dos discípulos do Senhor: eles viverão para sempre no Espírito de Cristo e do Espírito de Cristo, recebido nos sacramentos – em todos e cada um deles, sobretudo na Eucaristia, quando o Senhor, pessoalmente, substancialmente, totalmente espirituado em glória pelo Espírito no qual o Pai O ressuscitou, dá-Se-nos como alimento de Vida eterna e divina para que, Nele, sejamos um só Corpo até a Glória eterna!
5. Nunca se deve esquecer que, sem o Espírito, não há nem pode haver Igreja.
Somente Nele, a Vida do Cristo permanece e é continuamente renovada na Comunidade dos discípulos; somente no Espírito é possível viver em Cristo, fazer o bem por amor de Cristo…
Somente no Espírito o Evangelho pode ser anunciado como boa-nova e não como letra morta e preceito exterior e opressor.
É no Espírito Santo que a Vida do Cristo não somente está no nosso meio, mas em nós, no nosso interior, inspirando-nos para o bem, dando-nos força contra o mal, plasmando em nós os sentimentos de Jesus e nos preparando para a Vida eterna.
Somente no Espírito a Comunidade pode se manter unida na verdadeira fé e ligada no mesmo amor, sem, contudo, sufocar as diversidades existentes.
Só no Espírito, a Igreja pode se lançar para o futuro, sem ter medo das novidades e, ao mesmo tempo, manter-se fiel ao passado de sua origem, sem tornar-se ancrônica ou ultrapassada.
É por tudo isso que o Espírito foi chamado pelos Santos Padres da Igreja Antiga de “alma da Igreja”: Ele a vivifica, a mantém unida, a faz cresce e a conduz à plenitude.
É também por isso que a Igreja é real e verdadeiramente Templo do Espírito Santo, que nela habita e repousa, nela permanecendo até transfigurá-la completamente no final dos tempos, quando, então, ela será plenamente Corpo do Cristo glorioso e povo de Deus Pai, para sempre.