Responsabilidade dos pais
Os pais devem ver seus filhos como se não lhes pertencessem, e devem também se recordar de que Deus, Autor da vida, os depositou em suas mãos, encarregando-lhes do cuidado de formar servidores fieis. Os filhos são de Deus. Pois, o que temos que nos pertença, se nós nem sequer pertencemos a nós mesmos?
O Senhor diz a todos os pais e a todas as mães: Tomai esta criança, alimentai-a; e eu vos recompensarei: Accipe puerum istum, et nutri mihi, ego dabo tibi mercedam tuam (Ex 2, 9). Não cometais esse crime contra o menino, porque sois responsável por seu sangue: nolite peccare in puerum, in sanguis ejus exquiritur (Gn 42, 22).
A alma dos pais responderá pelas almas dos filhos, diz o Senhor: Anima ejus eritpro anima illius (II Reg. X, 24).
Guardai a vosso filho. Se ele vier a perder-se, vossa alma pagará pela sua, acrescenta o Senhor: Custodi virum istum, qui, lapsus fuerit, erit anima tua pro anima illius (I Reg. XX, 39).
Pedir-vos-ei contas do sangue de vossos filhos, ou de sua perdição, diz o Senhor: Sanguinem ejus de manu tua requiram (Ez 3, 18).
Ocupando o lugar de Deus junto a seus filhos, os pais e as mães terão que dar-Lhe contas de como os tem tratado.
O primeiro dever dos pais é ser virtuosos
O primeiro dever dos pais é ser virtuosos. O Evangelho diz-nos que Zacarias, e Isabel, respectivamente pai e mãe de João Batista, eram ambos justos aos olhos de Deus, guardando como guardavam todos os mandamentos e leis do Senhor irrepreensivelmente: Erant autem justi ambo ante Deum, incedentes in omanibus mandatis Domini sine querela (Lc 1, 6).
Eu andava na inocência de meu coração entre os de minha família, diz o Real Profeta: perambulabam in innocentia cordis mei, in médio domus meae (Sl 100, 3).
É uma formosa qualidade a virtude dos pais; é a maior riqueza para eles e para seus filhos. A virtude dos pais, como seus vícios, passa e enraíza-se na alma de seus filhos desde o próprio ato da concepção. Um sangue impuro gera filhos viciosos. Um sangue puro dá filhos inclinados ao bem.
Em uma família, o pai e a mãe devem, com o brilho de suas virtudes e a santidade de seus costumes, resplandecer como o sol e a lua; então, os filhos serão como estrelas cintilantes, e aquela casa converter-se-á em um firmamento, em um Céu de Deus.
Quem está encarregado de corrigir aos outros, deve estar isento de vícios, diz São Gregório; o olho ferido com algum grão de poeira não pode ver uma mancha, e aquele cuja mão está plena de barro não pode limpar suas vestes: Mundus esse a vitiis debet, qui curat aliena corrigere; quia nequaquam purê maculam in membro considerat oculus, quem pulvis gravat; et super possitas sordes tegere non valet manus quae lutum tenet (Lib. Moral.).
Pais e mães, diz Santo Ambrósio, se não preservais e purificais vosso coração de toda mancha de pecado, não podereis corrigir aos vossos filhos. Começai por pacificar vosso coração, se quereis que a paz desça ao coração dos outros. Porque, como purificareis o coração dos outros, se não purificastes, antes, o vosso? Nisi tum prius interiora tua vacua fecerit ab omni labe peccati, non potes aliis ferre medicinam. A te igitur pacem incipe, ut cum fueris ipse pacificus, pacem aliis feras. Quomodo enim potes aliorum corda mundare, nisi tuum ante mundaveris (Lib. de Offic.).
O homem, acrescenta aquele mesmo Santo, deve estar sujeito a Deus para poder mandar: Homo, utpossit imperare, debet Deo esse subjectus (Ut supra).
Quem quer a submissão de seu subordinado deve ele também, por seu turno, submeter-se a seu superior, diz Santo Agostinho.
Pais, reconhecei a ordem. Que coisa mais justa e razoável que obedecer a Deus, a fim de que vos obedeçam vossos filhos? Que coisa mais formosa? Se viveis submissos a Deus, vosso filho viverá submisso a vós. Servi Aquele que vos criou, a fim de que vos sirva vosso filho, dom precioso de Deus; se vos negais a servir a Deus, nunca obtereis uma submissão perfeita de vossa família. Se vos sublevais contra Deus, vossos filhos se levantarão contra vós, e serão o vosso tormento (In Psalm. CXLII).
Somente sabe mandar quem sabe obedecer! Ninguém conhece o jugo que impõe, a não o houver carregado sobre si mesmo. Quereis, pais, saber mandar em vossos filhos? Recebei as ordens de Deus e executai-as. Quereis que vossos filhos carreguem o jugo precioso e amável de Jesus Cristo? Carregai-o também.
O filho de Tobias dizia à sua esposa: Somos filhos de santos: Filii sanctorum sumus (Tb 2, 18). Que filhos poderiam falar assim?
Por isso, Raquel disse a seu filho Tobias: Bendito sejas tu, filho meu, que és filho de um homem de bem, de um homem virtuosíssimo: Benedictio sit tibi, fli mi, quia boni et optimi viri filius es (Tb 7, 7).
Gabael disse-lhe também, por sua vez: Abençoe-te o Deus de Israel, porque és filho de um homem de bem, justo e temente a Deus, e que frequentemente dá esmolas: Benedicat te Deus Israel, quia filius es optimi viri, et justi, et timentis Deum, et eleemosynas facientis (Tb 19, 9). Se os pais não são virtuosos, como haverão de inspirar o amor pela virtude em seus filhos?
Segundo dever: o bom exemplo
O segundo dever que os pais e as mães tem que cumprir é dar bom exemplo a seus filhos.
Diz-se, no Evangelho, que um homem rico e poderoso acreditou em Jesus Cristo, e toda a sua família o imitou: Credidit (regulus), et domus ejus tota (Jo 4, 53).
O filho segue prontamente o exemplo de seus pais. Parece-se à hera que, não podendo sustentar-se sozinha, agarra-se a uma arvore ou ao muro.
O filho é como a cera morna, toma facilmente todas as formas que lhe dão.
O pai de família que é o chefe da casa, dever ser o modelo e preceder a sua esposa e a seus filhos, dando-lhes bom exemplo.
Os pais, com seus escândalos, causam a perdição de seus filhos, sacrificam- nos ao demônio, diz o Real Profeta: Immolaverunt filios suos, et filias suas daemoniis (Sl 105, 37).
Querer dar lições aos filhos e contradizer com maus exemplos as máximas ensinadas é uma vergonha e um crime; é acariciar com uma mão e ferir com a outra! É preciso que as palavras concordem com as ações. Porque tal conduta está em oposição com as palavras, inutilmente levanta-se a voz.
Santo Agostinho diz de sua mãe, Santa Mônica: Rogava com suas lágrimas e alimentava com seus bons exemplos os preceitos de vida que semeava em meu coração: Praecepta vitae quae in animo plantaverat rogabat lacrymis, alebat exemplis (Lib. Confess.).
Que impressão quereis que se gravem no ânimo dos filhos as boas advertências e os sábios conselhos de um pai blasfemo, ímpio, incrédulo, colérico, dado à embriaguez, ou de uma mãe impudica, irreligiosa e arrebatada?
Terceiro dever: a oração
O terceiro dever dos pais é a oração. Estão obrigados:
1.° A rezar por si mesmos;
2.° A rezar por seus filhos; e
3.° A ensinar-lhes, desde cedo, a fazer orações; a forçar-lhes a fazer orações; a ensinar-lhes a obrigação e a excelência das orações.
Quarto dever: a educação
O quarto dever dos pais é dar a seus filhos uma boa educação[1].
A educação visa especialmente o coração. É preciso afastar do coração dos filhos os vícios; extirpar, no possível, seu princípio; e fazer germinar os bons costumes, as virtudes e os conselhos evangélicos.
Nossos filósofos corrompidos e ímpios ensinaram aos jovens que não há Deus nem outra vida; que a Religião é uma fábula, que o homem não é mais que um animal; que toda a moral consiste em buscar o prazer e fugir da dor. Este curso de educação está prontamente concluído; não se necessita de colégios nem professores para entendê-lo habilmente. Por isso nossos jovens libertinos aprenderam prontamente, tanto quanto os seus mestres. E todos os dias podemos nos surpreender vendo os frutos desta moral humana, natural filosófica, ou melhor, animal. Moral mais digna, diz Bergier, dos estábulos de Epicuro que de uma escola de educação (Art. Education.).
Tudo está perdido no homem ou mal dirigido pelos pais. Em todo plano de educação, é necessário que se incluam a urbanidade, os bons modos e a cultura. Os pais que se descuidam de dar estes excelentes costumes a seus filhos fazem deles seres grosseiros, mal educados, tontos e detestáveis.
- O primeiro fruto de uma boa educação é a alegria que prepara aos pais e aos filhos;
- O segundo fruto é que afasta deles a miséria;
- O terceiro é que proporciona aos pais louvores e honra;
- O quarto é que confunde aos inimigos e aos ciumentos, e alegra a amizade;
- O pai daquele menino vem a morrer, diz o Eclesiástico, e é como se não morresse, porque deixa depois de si outro semelhante (Eclo 30, 4). Este é o quinto fruto de uma boa educação. Ao morrer, parece que o pai ressuscita em seus filhos; estes reproduzem sua vida, sua sabedoria, sua virtude e os fazem como imortais.
A má educação produz frutos inteiramente opostos.
Quinto dever: a instrução religiosa
O quinto dever dos pais é dar a seus filhos a instrução religiosa.
Pais e mães, diz São Paulo, educai a vossos filhos, corrigindo-os e instruindo-os segundo a doutrina do Senhor: Patres, filios vestros educate in correptione Domini (Ef 6. 4).
Corrige a teu filho, dizem os Provérbios: Erudi filium tuum (Pr 19, 18).
Tendes filhos? Diz o Eclesiástico. Doutrinai-os e curvai-os desde sua pequenez. Filii tibi sunt? Erudi illos, et curva illos a pueritia illorum (Eclo 8, 25).
É preciso ensinar aos filhos, antes de tudo, o santo Nome de Jesus, de Maria, de José, o Pai Nosso, a Ave Maria, o Credo, os três principais mistérios do Cristianismo, quais são os nossos Novíssimos, os Mandamentos de Deus e da Igreja, as vantagens e a necessidade da oração e da graça; e o que são os Sacramentos. Não se deve descuidar em nada para ensinar-lhes todo o Catecismo, ou fazê-los aprender, caso não nos achemos na possibilidade de cumprir nós mesmos com este dever.
A instrução religiosa que deve ser dada com cuidado desde a mais tenra idade até a Primeira Comunhão não se deve descuidar depois, mas desenvolver-se. A necessidade que tem os pais de dar uma instrução religiosa a seus filhos, manifesta quão necessário é que eles também estejam instruídos nesta mesma matéria.
Sexto dever: a vigilância
Diz o Gênesis que José, posto à frente da casa de Putifar, governava-a e cuidava de tudo quanto lhe fora confiado: Praepositus omnibus, gubernabat credita sibi domum, et universa quae ei tradita fuerant (Gn 39, 4). E por amor de José, o Senhor derramou a benção sobre a casa daquele egípcio: Benedixitque Dominus domini Aegiptii propter Joseph (Gn 39, 5).
Os pais estão obrigados à vigilância:
1.° Vigilância da parte da mãe, quando leva a seu filho em seus braços, a fim de não cometer nenhuma imprudência, seja andando, seja trabalhando, comendo e bebendo, quer fazendo força, e também para que não se encolerize etc.;
2.° Vigilância da parte do marido para rodear de cuidados a sua esposa; para fazer ele mesmo ou mandar fazer os mais penosos trabalhos que se tenham a fazer. Vigilância para evitar maus tratos para com ela;
3.° Vigilância de ambos para nomear padrinhos virtuosos e para batizar logo ao bebê recém-nascido;
4.° Vigilância da parte da mãe para amamentar ela mesma a seu filho, se o pode; e, se não lhe for possível, para procurar uma ama de bons costumes, boa reputação e saúde perfeita. Porque está declarado pelos cientistas e pela experiência que a criança, ao mamar o leite de sua ama, mama ao mesmo tempo suas enfermidades, seus vícios e virtudes;
5.° Vigilância para dar-lhes instrução necessária, fazer-lhes frequentar a Confissão, e preparar-lhes a ação mais importante da vida: a Primeira Comunhão.
6.° Vigilância para apartar os filhos das más companhias;
7.° Vigilância para dar-lhes bons princípios, fazer-lhes amar precocemente a virtude e a detestar o pecado;
8.° Vigilância para guiá-los ao entrar na sociedade;
9.° Vigilância para não colocar entraves à sua vocação quanto é conveniente; e, sobretudo, quando é excelente; e
10.° Finalmente, vigilância para os alimentar e vestir segundo sua condição, com limpeza, porém sem dar azo à sua vaidade.
Sétimo dever: a correção
E vós também, pais, diz o grande Apóstolo, não provoqueis com excessivo rigor a vossos filhos; mas educai-os, corrigindo-os e instruindo-os segundo o Senhor: Et vos, patres, nolite ad iracundiam provocare flios vestros; sed educate illos in disciplina et correptione Domini (Ef 6, 4).
Corrigi a vosso filho enquanto é tempo; que nem suas lágrimas nem seus gritos vos detenham; extirpai seus vícios nascentes. Aquilo que não obtiverdes hoje, não o obtereis amanhã. Não há, defeito que não se possa destruir em uma criança se as repreensões e correções são prudentes e constantes.
Castigai, porém, sem ira. Ache-se mesclada a severidade coma doçura. Quem se entrega à ira ao corrigir, prejudica-se a si mesmo e prejudica à criança, dizem os Provérbios.
Com a cólera, exaspera e escandaliza a seu filho, longe de curar-lhe. Corrigir com ira não é obedecer à caridade, senão à paixão. Feita com calma, a correção inspira respeito; feita com furor, excita a rebeldia e não produz nenhum bem.
Não sejas em sua casa como um leão, diz o Eclesiástico, aterrorizando a teus empregados e oprimindo a teus subordinados: Noli esse sicut leo in domo tua, evertens domesticos tuos, et opprimens subjectos tibi (Eclo 4, 35).
Aquele que ama a seu filho, faz-lhe sentir frequentemente o açoite ou castigo, diz a Escritura: Qui diligit filium suum, assiduat illi flagela (Eclo 30, 1). A correção deve ser feita sem debilidade, sem ira, no momento oportuno e de um modo convincente.
Oitavo dever: devem abençoar a seus filhos
A benção do pai afirma a casa dos filhos; porém, a maldição da mãe arrasa até seus alicerces, diz o Eclesiástico: Benedictio patris firmat domos filiorum; maledictio, matris eradicat fundamenta (Eclo 3, 1).
Veem-se exemplos admiráveis dos felizes efeitos da benção dos pais nas bênçãos que Sem e Jafet receberam de seu pai Noé; Isaac, de Abraão; Jacó, de Isaac; Tobias etc.
Cam manifesta-nos quais são os funestos efeitos da maldição paterna (Gn 9, 20).
Santo Agostinho conta um fato deste gênero, do qual foi testemunha todo o Norte da África: uma mãe que tinha dez filhos, amaldiçoou-os, e sua maldição entregou seus membros a um tremor espantoso, e andaram errantes e miseráveis. Quantas famílias há que se arruínam ou perecem por causa da maldição de um pai ou de uma mãe?
Quão culpáveis são os pais que descuidam o cumprimento de seus deveres. Desgraças que se preparam
Ouvi a São Paulo: aquele que não cuida dos seus, renegou de sua fé e é pior que um infiel: Si quis suorum curam non habet, fidem negavit, et est infideli deterior (1 Tm 5, 8).
Os pais culpáveis e negligentes, diz o Salmista, imolam os seus filhos ao demônio: Immolaverunt filios suos et filias suas demoniis (Sl 105, 37). E a terra está manchada, infectada e profanada por eles.
As mulheres insensatas e escandalosas tem filhos perversos, diz a Sabedoria: Mulieres insensate sunt, et nequissimi filii eorum (Sb 3, 12).
Uma raça, diz Sêneca, está sempre conforme com seus autores, e o sangue que degenera não faz mais que reproduzir a primeira estirpe: Redit ad autores genus, stirpenque primam degener sanguis refert (In Prov.).
Os vícios da alma transmitem-se aos filhos do mesmo modo que os do corpo. Os pais culpáveis são como os verdugos de sua raça; cometendo o mal, assassinam a alma de seus filhos. São, diz a Sabedoria, os desapiedados assassinos de seus filhos: Filiorum suorum necatores sine misericordia (Sb 12, 5). E sacrificam- nos: Filios suos sacrificantes (Sb 14, 23).
Os filhos e os netos imitam a seus pais, lê-se no Segundo Livro dos Reis: Filii eorum et nepotes, sicut feceruntpatres sui, ita faciunt (II Reg XVII, 41).
Se não observais fielmente o bem de vossos filhos, diz São Cipriano; se não os educais com um piedoso e profundo afeto, sois um pai prevaricador e traidor. Esforçando-vos mais para deixar-lhes terras do que para alcançar-lhes as virtudes que lhes façam dignos do Céu, fazendo-os queridos do demônio antes que de Jesus Cristo, faltais duplamente a vossos deveres e cometeis dois crimes, porque não lhe assegurais o auxílio de Deus Pai, e lhes ensinais a preferir as riquezas a Jesus Cristo[2].
Os pais que amam a seus filhos segundo a carne, como cegos e insensatos, não se atrevem a repreendê-los e a castigá-los, e os deixam satisfazer todos os seus caprichos. O que acontecerá aí? Resultará que seus filhos tornam-se atrevidos, libertinos, inquietos, incorrigíveis; caem facilmente em graves excessos; e acabam com uma morte prematura; e, algumas vezes, vergonhosa e infame. São para seus pais a causa de grandes dores, de desonra e desespero.
Estes pais arrependem-se algumas vezes, porém, demasiado tarde, de terem sido tão negligentes e tão débeis; percebem que, em vez de ter sido úteis a seus filhos e de tê-los amado, trataram-nos como inimigos e os sacrificaram com suas próprias mãos. Porque, assim como o látego é necessário para o cavalo e o aguilhão para o boi, ambos são necessários para os filhos. De outra sorte, tornam-se bestas selvagens, indomáveis e ferozes.
Ó cegos e desgraçados pais, bem vos desenhou o profeta Joel: Puseram, diz o profeta, os jovens no lugar da prostituição, e venderam as donzelas: Possuerunt puerum in prostíbulo, etpuellam vendiderunt (Jl 3, 3).
Não sois pais, exclama São Bernardo, sois assassinos: Non patres, sed peremptores (Serm. In Cant.).
Os crimes de vossos filhos converteram-se em vossos próprios crimes; e respondereis por eles diante de Deus! Ó, quão terríveis serão seus juízos para aqueles pais malditos que entregam seus filhos ao vício, ao demônio e ao inferno!
Castigos que os pais indignos atraem e merecem para si mesmos
Imolaram seus filhos e filhas, diz o Salmista, pelo que acenderam a ira do Senhor: Immolaverunt filios, et iratus est furore Dominus (Sl 105, 37.40).
O Senhor, diz a Escritura, castiga o pecado dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração: Visitas peccatapatrum in filios in tertiam et quartam generationem (Nm 14, 18).
Eli manifestou-se demasiado fraco com seus filhos; não cuidou de repreendê- los e corrigi-los. E o que aconteceu? Que sucedeu a seus filhos? Olha, diz o Senhor, eu vou fazer uma coisa em Israel, que a todo aquele que a ouvir ressoarão de terror ambos os ouvidos: eis que vou desencadear contra Eli todos os açoites com que ameacei a sua casa: darei princípio a isso, e o concluirei. Porque já lhe predisse que Eu haveria de castigar perpetuamente sua casa, por causa da iniquidade que cometeu não corrigindo seus filhos, sabendo que se portavam indignamente. Por isso, jurei à casa de Eli, que sua iniquidade não poderá jamais ser expiada nem com vítimas, nem com oferendas (1 Sm 3).
Eli, contudo, repreendia a seus filhos, porém com demasiada debilidade, deixando de lado a severidade; porém, pagou sua negligência com uma morte horrível, e seus filhos também foram mortos.
Escutai estas palavras do profeta Jeremias… são terríveis: Senhor, a iniquidade dos pais Vós a castigais, depois deles, nos seus filhos: Reddis iniquitatem patrum in sinum filiorum eorum post eos (Jr 32, 18).
Os pais indignos preparam para si mesmos castigos durante a sua vida, na morte e por toda a eternidade.
A honra dos pais brilha em seus filhos; e, quando estes são bem educados, são, por sua vez, a honra e a glória de seus pais
A boa reputação adquirida pelos pais é uma honra e uma recomendação para seus filhos, quando este seguem conservando-se dignos da origem de que procedem; posto que da boa reputação do pai resulta glória ao homem, diz o Eclesiástico. E é demérito do filho um pai sem honra: Gloria enim homini sex honore patris sui, et dedecus filii pater sine honore (Eclo 3, 13).
A conduta dos filhos vem a ser também outro motivo de honra ou de vergonha para seus pais. Os filhos de seus filhos, dizem os Provérbios, são a coroa dos anciãos, e glória dos filhos são as virtudes de seus pais: Corona senum filii fliorum, et gloria filiorum patres eorum (Pr 17, 6).
O filho mal criado é a vergonha do pai: Confusio patris est de filio indisciplinato (Eclo 22, 3).
Os filhos religiosamente educados são a felicidade, a alegria, o consolo e a glória de seus padres. São respeitosos, previdentes, afáveis, plenos de doçura e de bondade. Perpetuam, de idade em idade, a boa reputação de que goza, desde longo tempo, a sua família… reputação que a honra. Semelhante casa mantém-se sempre a mesma. Do pai aos netos, é constante um modelo de justiça, de sabedoria e de virtude; em uma palavra, é a casa bendita de Deus e dos homens.
Semelhantes famílias excitam a admiração de todo o mundo, de geração em geração. São um tesouro nacional e como um para-raios que afasta a maldição de Deus da cabeça do povo a que pertencem.
Felizes famílias unidas e em paz na terra: vão de idade em idade unir-se no seio de Deus, onde o pai abençoará para sempre seu filho, e o filho a seu pai, e todos juntos a Deus.
Modelos que os pais devem seguir
Ainda que tenha ficado viúva aos vinte anos, Autusa, mãe de São João Crisóstomo, não quis contrair segundas núpcias. Tomou a seu encargo o cuidado de inspirar os primeiros princípios do Cristianismo em seu filho. Jamais houve mãe mais digna de levar este nome. Os próprios pagãos não podiam cansar-se de admirar suas virtudes; e um filósofo exclamou falando a respeito daquela matrona: Que admiráveis mulheres encontram-se entre os cristãos (Surius, in ejus vita).
Eucrasia, mãe de São Tarásio, quis formar, por própria conta, o coração de seu filho nas práticas religiosas, e o conseguiu admiravelmente. Entre outras lições que lhe dava, insistia particularmente em aconselhar-lhe o afastamento das más companhias (Surius, Vit. Sanct.).
Quando do martírio dos quarenta confessores de Sebasta, o juiz mandou que lhes colocassem em carroças, e os lançassem em uma fogueira. Todos estavam mortos ou moribundos, menos o mais jovem, chamado Melitão, a quem acharam ainda pleno de vida. Os verdugos deixaram-no com a esperança de que lhe poderiam induzir a renegar sua fé; porém, sua mãe, que estava presente, não pode sofrer a falsa e cruel compaixão que inspirava seu filho; até atreveu-se a jogá-la na cara dos verdugos, e aproximando-se o filho, exortou-o a que perseverasse; e, logo, tomou-o em seus braços colocando-o na carroça com os demais mártires:
“- Anda, meu filho – disse-lhe ela – Anda, finaliza com teus companheiros a feliz viajem que começastes juntos; não aconteça que chegues por último à mansão de Deus” (Ut Supra).
Santa Mônica, mãe de Santo Agostinho, não cessava de chorar pelos extravios de seu filho e de rogar por ele.
“- Ide, disse-lhe um bispo, segui fazendo o que fazeis, e é impossível que pereça o filho de tantas lágrimas” (Ut supra).
A mãe de São Bernardo teve um cuidado extraordinário de educar bem a seus filhos; a todos inspirava-lhes os mais vivos sentimentos de piedade; e quis criá-los ela mesma, por medo de que, caso os confiasse a mulheres estranhas, poderiam receber alguma má impressão. Teve sete filhos, e todos se consagraram a Deus (Ut supra).
A rainha Blanca quis também amamentar ela mesma a seu filho Luiz XI, e encarregou-se de cuidar de sua educação. Inspirou nele, desde o berço, um grande respeito pelas coisas santas. Vivos sentimentos de zelo e piedade, e um amor extraordinário à castidade.
“— Certamente eu te amo, meu filho – ela dizia-lhe frequentemente em sua infância – amo-te com toda a ternura de que é capaz uma mãe; porém, preferiria muitíssimo mais ver-te cair morto a meus pés, que te ver cometer, alguma vez, um pecado mortal ”.
Tal impressão haviam causado estas palavras no espírito de São Luiz, que confessou, várias vezes, jamais tê-las esquecido e havê-las trazido cada dia a sua memória para fortalecer-se contra os atrativos do pecado (Ut supra).
Escutai o que o rei Filipe dizia a seu filho, quando se viu moribundo:
“Filho meu, a primeira coisa que te mando observar é que ames a Deus com todo o teu coração e desejes sofrer todos os tormentos antes que pecar mortalmente. Se Deus te envia adversidades, sofre-as com resignação, pensando que tu as mereceste. Vai confessar frequentemente, ouve a Missa com devoção, e procura ser bom para os pobres. Mantém os bons costumes de teu reino, e corrige os maus. Não sobrecarregues a teu povo de impostos; serve-te de homens prudentes e conscienciosos. Escuta a Palavra de Deus, e conserva-a em teu coração. Que ninguém seja minimamente atrevido para dizer diante de ti palavras más, seja contra a modéstia, seja contra a caridade. Dá frequentemente graças a Deus. Sê justo para com todo o mundo. Honra o Clero. Respeita a teu pai e a tua mãe. Trabalha para fazer desaparecer o pecado da terra. Queridíssimo filho, dou-te todas as bênçãos que um bom pai pode dar a seu filho” (Hist. da França).
A mãe de São Francisco de Sales, excessivamente atenta em afastar de seu filho tudo que pudesse ter, ainda que minimamente, a aparência de vício, não lhe
perdia de vista. Levava-lhe à Igreja e inspirava-lhe um profundo respeito à Casa de Deus e a todas as coisas da Religião. Lia-lhe a vida dos Santos, e agregava a esta leitura reflexões que estivessem a seu alcance. Quis também que ela a acompanhasse a visitar os pobres, que se acostumasse a fazer-lhes pequenos serviços, e que distribuísse as esmolas. Tudo isso tinha lugar antes mesmo de que o Santo cumprisse dez anos de idade. A condessa, que se sentia a necessidade de separar-se de seu filho por muito tempo – porque este tinha de ser educado – aumentou seu zelo para fortalecê-lo na virtude; recomendava-lhe, sobretudo, o amor a Deus e à oração, como também o horror ao pecado e às ocasiões que a ele nos levam. Repetia-lhe também muitas vezes aquelas mesmas palavras que a rainha Blanca tinha o costume de dizer a seu filho S. Luiz:
“- Filho meu, preferiria te ver morto a saber-te réu de um só pecado mortal ” (Guodesc., in ejus vita).
Santa Joana Francisca de Chantal cuidava esmeradissimamente da educação de seus filhos, e estava continuamente à guarda de sua inocência. A única graça que pedia a Deus por eles era que vivessem toda a sua vida de modo que merecessem um lugar no Céu. Ela tratava a seus subordinados como a seus irmãos e irmãs, e como coerdeiros que haviam de ser em seu reino celestial. Daqui se originava o zelo que tão ferventemente despendia para induzir-lhes a que trabalhassem para sua salvação (Guodesc., in ejus vita).
A venerável Ringarda, viúva, tratou sempre a educação de seus filhos como um de seus principais deveres. Pedia, sem descanso a Deus, as graças que eles necessitavam. Estava atenta em prevenir até os primeiros indícios de suas paixões nascentes, de maneira que a virtude lhes parecia natural. Acostumava-os a temperança, à mortificação e à penitência, fazendo-os portar vestes simples, e obrigando-os a observar as regras da mais exata sobriedade. Seus exemplos davam um novo grau de força à suas instruções (Guodesc., in ejus vita).
Santo Agostinho acusa-se de faltas que notava nas crianças, a quem, por mais jovens que sejam, parecem susceptíveis de ciúmes, de ira e de vingança.
Vemos, com efeito, que os filhos pedem com lágrimas o que lhes seria danoso caso lhes concedessem; enfurecem-se contra seus superiores, e querem sujeitá-los a seus caprichos. Manifestam, desde muito cedo, sentimentos de orgulho e vaidade.
Santo Agostinho censura o costume que existe de desculpar o que há de repreensível nas crianças, alegando a debilidade da idade; do que se segue que um excesso de complacência permitirá que se formem neles certos hábitos que chegarão a ser delitos, tão logo comecem a fazer uso da razão. Pois, não há, ao contrário, nenhuma idade que não seja capaz, até certo ponto, de receber alguma correção sensível, que, se empregada a tempo, haverá de afogar o germe das primeiras paixões.
Os primeiros princípios da educação tem uma grande influência durante toda a vida; e é natural que aqueles que tenham sido formados com a virtude desde a infância, sigam sempre as máximas do Evangelho como regra de sua conduta. As primeiras impressões tem uma força imensa quando são ajudadas e sustentadas pelos cuidados e exemplos de pais piedosos.
Toda sorte da vida depende das ideais que se dão aos filhos, dos sentimentos que se lhes inspira, e dos costumes que se lhes faz contrair em seus primeiros anos. É mais importante do que se pensa acostumar-lhes, desde então, a pequenos sacrifícios, fazer-lhes sentir os perigos dos prazeres dos sentidos, e contra as impressões destes, colocá-los em permanente estado de guarda; ensinar-lhes que estes prazeres diminuem as forças da alma; convencer-lhes, em uma palavra, de que é mais fácil dominar as paixões quando ainda se encontra em seu espírito do que mais tarde; e que, se não triunfamos delas em seu nascimento, teremos um trabalho infinito em dominá-las. É dever persuadir-lhes bem de que, na juventude, a teimosia, a obstinação, a aversão ao trabalho e amor aos prazeres são as disposições mais perigosas.
Referências:
[1] Pobreza, castidade e obediência (Nota do tradutor).
[2] Praevaricator et proditor, pater, es nisi filiis tuis fideliter consulas, nisi conservandis eis religiosa et vera pietate prospicias: qui studes terreno magis quam coelesti parimonio, filios tuos diabolo magis commendare quam christo, bis delinquis, et geminum ac duplex crimen admittis, et quod non praeparas filiis tuis Dei Patris auxilium, et quod doces filios patrimonium plus amare quam Christum (Serm.).