Pediram-me algumas pessoas que lhes proporcionasse um livro de considerações sobre as verdades eternas e que se destinasse às almas zelosas de sua perfeição e do progresso no caminho da vida espiritual. Outras reclamavam um compêndio de matérias próprias para as predicas em missões e exercícios espirituais. Para não multiplicar livros, trabalhos e despesas, entendi ser conveniente escrever a obra presente na forma que se vai ler, a fim de que possa servir para ambos os fins. Encontrarão nela os leigos assunto para meditar, por meio de três pontos em que é dividida cada consideração, e, como qualquer desses pontos pode servir para uma meditação completa, adicionei-lhes afetos e súplicas. Rogo ao leitor que se não enfade ao ver que nestas orações se pede continuamente a graça da perseverança e a do amor de Deus, porque estas são as duas graças mais necessárias para alcançar a salvação eterna.
A Graça do Amor de Deus
A graça do amor divino – disse São Francisco de Sales – é aquela que contém em si todas as demais, porque a virtude do amor para com Deus traz consigo todas as outras virtudes. Quem ama a Deus é humilde, casto, obediente, mortificado… possui, enfim, as virtudes todas.
Por isso, dizia Santo Agostinho:
Ama a Deus e faze o que quiseres
Pois aquele que ama a Deus evitará a todo transe ofendê-lo e só procurará agradar-lhe em tudo.
A Graça da Perseverança
Quanto à graça da perseverança, é por meio dela que se alcança a salvação eterna. Disse São Bernardo que o céu foi prometido aos que começam a viver santamente, mas que não é dado senão aos que perseveram até ao fim.
Ora, a graça da perseverança, segundo ensinam os Santos Padres, só se concede àqueles que a pedem. Portanto – afirma Santo Tomás, – requer-se contínua oração para entrar na glória, segundo o disse antes Nosso Salvador:
“Convém orar sempre e não desfalecer” (Lc 18, 1)
Tal é a causa por que muitos pecadores, ainda que hajam sido perdoados, não perseveram na graça de Deus: alcançam o perdão mas se esquecem de pedir a Deus a perseverança, principalmente no tempo das tentações, e recaem miseravelmente. Ainda que o dom da perseverança seja inteiramente gratuito e não o possamos merecer por nossas obras, podemos, todavia, – diz o Pe. Suárez, – obtê-lo infalivelmente pela oração, segundo já havia dito Santo Agostinho.
Esta necessidade da oração demonstraremos desenvolvidamente em outro opúsculo, que em breve publicaremos, intitulado: A Oração, o grande meio, obra essa que, apesar de breve e, portanto, de baixo custo, é fruto de largo trabalho e, no meu pensar, utilíssima para todos. (Este livro ainda é publicado e pode ser facilmente encontrado nas livrarias católicas!)
Atrevo-me assim a assegurar que, entre todos os livros espirituais, não há nem pode haver nenhum mais útil nem mais necessário para alcançar a salvação eterna do que esse que trata da oração.
A fim de que as presentes considerações possam servir para a pregação dos sacerdotes, que têm poucos livros ou que não dispõem de tempo para os ler, acrescentei-lhes alguns textos da Escritura e passagens dos Santos Padres. Estas citações, ainda que breves, encerram elevado conceito, como convém à pregação da palavra de Deus. É de observar que os três pontos de cada consideração formam um sermão completo. Por isso, procurei recolher, em muitos autores, os afetos que me pareceram mais próprios para mover o ânimo, expondo-os com variedade e concisão, a fim de que o leitor escolha aqueles que mais lhe agradem e os desenvolva à sua vontade.
Seja tudo para a glória de Deus.
Viva Jesus, nosso amor, e Maria, nossa esperança