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A “ciência imparcial”

Na linda natureza de Deus
Não existe ciência propriamente neutra. Os jovens imaginam muitas vezes a ciência como uma deusa, imperando em alturas inacessíveis, por todos cultuada, de intransigente veracidade. Todavia, tal ciência não existe. Há sim, “sábios”, que não sendo seres abstratos, mas homens que vivem entre nós, pertencem a este ou àquele grupo humano, simpatizando com seu modo de pensar, entusiasmando-se por suas idéias, apoiando suas aspirações. Os resultados científicos, não os recebemos da “imparcial deusa ciência”, a qual não existe, mas dos representantes humanos do saber, de seus tratados e livros.

Agora compreenderemos que não é indiferente ler um livro de um autor qualquer sobre esta ou aquela questão. É verdade: “A ciência não tem religião nem pátria.” — La Science n’a ni religion ni patrie — como reza a inscrição de um instituto zoológico na França; mas também é verdade o que Pasteur respondeu a isso:

“Os sábios, contudo, têm religião e pátria.”

Livros que negam ou atacam a doutrina da Religião despertam muitas dúvidas na fé. Todavia, a ciência séria nunca poderá tornar incrédulo. Engana-se quem pensa que sua fé se tornou vacilante porque estudou muito. O vacilar não vem da muita ciência adquirida, senão de que esta não foi assimilada.

“Talvez te venha à mente”, diz Tolstoi, “que tua idéia acerca de Deus é falsa, que talvez nem haja Deus, Não desesperes. Isto pode acontecer a todos nós. Não julgues que tua incredulidade provenha do fato de que realmente não exista Deus. Se já não acreditar naquele Deus em quem tiveste fé outrora, é porque alguma coisa na tua fé não está em ordem; deves zelar com persistência por conhecer sempre melhor a Deus. Se um selvagem não acredita mais em seu ídolo de madeira, isso não significa que não haja Deus, mas que esse Deus não é de madeira.”

Sem dúvida alguma nos ensina a fé muita coisa que nossa inteligência não pode compreender, mas nada apresenta que seja contrário à nossa razão. A relação entre fé e razão é a mesma do que entre o microscópio e a vista; ele amplia em escala surpreendente os horizontes. Sem o microscópio, foge-nos o conhecimento de um mundo imenso, embora ele pulule ao nosso redor e nada notemos; aquele a quem falta a fé, nega o magnífico reino da alma, do além, embora a razão humana por si mesma nunca o possa compreender perfeitamente. Esse mundo existe; mas o increu não quer saber dele.

Necessariamente não se exige que acreditemos tudo cegamente, sem justificação. Quanto melhor estivermos orientados nos diferentes campos das ciências mundanas, tanto mais se alegra a Igreja, se procurarmos nos aprofundar na fé por meio da razão. São Paulo escreve claramente que nosso culto a Deus deve ser racional:

“Meus irmãos, advirto-vos pela misericórdia divina que imoleis vosso corpo como sacrifício vivo e santo: Seja este vosso culto segundo a razão” (Rom. 12, 1).

— “Mas o cristianismo já está antiquado. Um homem moderno não pode aprender dos antigos”.

Que poderemos replicar a tão pretensiosas expressões? Responderemos que mesmo o mundo mais moderno vive dos inestimáveis valores do passado. Nossa língua descende dos árias, a escrita dos egípcios, o alfabeto dos fenícios, o cálculo do tempo da Babilônia, os algarismos dos árabes, nossa cultura clássica da Grécia e Roma, toda a cultura européia do Cristianismo. Poderíamos bem avaliar os tesouros do passado somente se tivéssemos de inventar nós mesmos tudo aquilo que hoje nos parece tão natural e simples.

No teatro luzem algumas velas antiquadas, apesar dos majestosos lustres elétricos. Pergunto ao porteiro:

“Para que estão ali?”

— “Servem para maior segurança, pois, pode acontecer que a luz elétrica falhe de repente.”

Ao lado dos grandes portais existem, cá e lá, umas portas menores com a inscrição “porta de emergência”.

“Que significa isso?” Pergunto a alguém.

— “Para que, em caso de incêndio, todos os freqüentadores possam chegar, o mais depressa possível, ao ar livre!”

— Subimos a bordo dum navio moderno, verdadeira obra prima de construção naval! E, contudo, nosso primeiro olhar interroga:

“Onde se acha o bom e velho salva-vidas?”

As estações de estrada de ferro estão profusamente iluminadas por luz elétrica, mas os lampiões dos desvios ainda são alimentados com o antiquado azeite ou querosene. Por que? Bastaria ocorrer um desarranjo na rede elétrica para acontecerem descarrilamentos e colisões. O lampião do desvio deve ser de toda confiança; por isso fica-se com o velho.
Vê! apesar do progresso moderno, malgrado o nosso orgulho, devemos recorrer freqüentemente a meios antigos! Nossa cultura moderna é o fruto do esforço dum passado milenar. E não deveríamos ater-nos aos velhos e comprovados princípios?

“Dizem que o cristianismo envelheceu, é retrógrado, que nosso século necessita de doutrinas que não estejam em antagonismo com o progresso cientifico… Por mais que progridam os conhecimentos, não poderão eliminar em nós a sensação de nossa fraqueza. Deus criou o homem de tal modo que necessitamos de um apoio, dum Ente Superior, ante o qual nos inclinemos. A humanidade sempre procurará uma divindade à qual, genuflexa, possa render culto. E se os altares desmoronarem, sobre suas ruínas se erguerão os tronos do despotismo” (Eotvos: Pensamentos).

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(TOTH, Monsenhor Tihamer. Na linda natureza de Deus. Editora S. C. J., 1945, p. 138-141)

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