Das homilias de São Macário, monge egípcio do século V
Para rezar, não são precisos nem gestos, nem gritos, nem silêncio, nem genuflexões.
A nossa oração, ao mesmo tempo sábia e fervorosa, deve ser espera de Deus, até que Deus venha e visite a nossa alma por todas as suas vias de acesso, por todos os seus caminhos, por todos os seus sentidos.
Demos tréguas aos nossos silêncios, aos nossos gemidos, aos nossos soluços: não procuremos na oração senão o abraço apertado de Deus.
Não é verdade que, no trabalho, empregamos todo o nosso corpo num mesmo esforço? Não colaboram nisso todos os nossos membros?
Que também a nossa alma se consagre toda ela à oração e ao amor do Senhor; que ela não se deixe distrair nem bloquear com pensamentos; que toda ela seja espera de Cristo!
Então Cristo iluminá-la-á, ensinar-lhe-á a verdadeira oração, dar-lhe-á a súplica pura e espiritual de acordo com a vontade de Deus, a adoração “em espírito e verdade” (Jo 4,24).
Aquele que exerce um comércio não procura simplesmente realizar um lucro. Esforça-se também, por todos os meios, por aumentá-lo e acrescentá-lo. Empreende novas viagens e renuncia às que lhe parecem não trazer proveito; só parte com a esperança de um negócio..
Como ele, saibamos também conduzir a nossa alma pelos caminhos mais diversos e mais oportunos e adquiriremos – ó ganho supremo e verdadeiro! – esse Deus que nos ensina a rezar na verdade.
O Senhor repousa numa alma fervorosa, faz dela o Seu trono de glória, ali Se senta e permanece.
Quem foi São Macário do Egito?
São Macário nasceu no alto Egito, no ano 300, e passou sua juventude trabalhando como pastor, nos campos. Movido por uma intensa graça, afastou-se do mundo, ainda muito jovem, confinando-se em uma estreita cela onde dividia seu tempo entre oração, práticas penitenciais e a fabricação de esteiras. Uma mulher o acusou falsamente de ter sido violentada por ele. Por causa disso, Macário foi preso, maltratado e chamado de hipócrita disfarçado de monge. Tudo isso ele sofreu com paciência e ainda enviou a mulher produtos de seu trabalho, e dizia para si mesmo:
“Agora, Macário, tens que trabalhar mais, pois tens que sustentar a mais um”.
Deus, porém, deu a conhecer sua inocência: a mulher que lhe havia caluniado não pode dar à luz a criança até que revelasse o nome do verdadeiro pai. Isto fez com que a raiva que o povo sentia dele tornasse admiração por causa de sua humildade e paciência. Para fugir da estima dos homens, Macário, quando já contava com 30 anos, refugiou-se em um vasto e melancólico deserto de Esquita. Assim viveu 60 anos e foi pai espiritual de inúmeras servos de Deus que lhe confiaram a direção espiritual e o governo de suas vidas com as regras que ele traçava. Todos viviam em eremitérios separados. Só um discípulo vivia com ele, encarregado de receber as visitas. Um bispo egípcio ordenou Macário sacerdote para que pudesse celebrar os divinos mistérios para seus irmãos eremitas. Mais tarde, quando o número dos eremitas aumentou, foram construídas 4 igrejas que eram atendidas por outros tantos sacerdotes. Macário Lavava um vida muita austera, alimentando-se uma vez por semana. Certa ocasião, seu discípulo Evágrio, ao vê-lo torturado pela sede, lhe rogou que tomasse um pouco de água. Macário limitou-se a descansar um pouco à sombra e disse:
“Nestes 20 anos, jamais comi, bebi ou dormi o suficiente para satisfazer a minha natureza”
Seu corpo estava debilitado e fraco, seu rosto pálido. Para contradizer suas inclinações, não recusava beber um pouco de vinho, quando outros lhe pediam. Depois, se abstinha de toda bebida durante dois ou três dias. Diante disso, seus discípulos decidiram impedir que os visitantes lhe oferecessem vinho. Macário falava poucas palavras quando dava conselhos e recomendava o silêncio e a oração contínua para toda e qualquer pessoa. Costumava dizer:
“Na oração, não faz falta dizer muitas coisas, nem empregar palavras escolhidas, basta repetir sinceramente: ‘Senhor, dá-me a graça que Tu sabes que necessito'”
Ou:
“Meu Deus, ajuda-me”
Sua mansidão e paciência eram tão extraordinárias que levou muitos sacerdotes pagãos e outros pessoas à conversão. Certa vez, Macário pediu a um jovem, que lhe procurou para um conselho, que fosse a um cemitério e lá insultasse os mortos com gritos. Quando o jovem voltou, Macário perguntou o que tinham respondido os defuntos. O jovem respondeu que os mortos não responderam nada. Macário disse então:
“Faz o mesmo quando te insultarem e quando gritarem contigo. Só morrendo para o mundo e para ti mesmo, poderás começar a servir a Cristo”
A outro jovem aconselhou: «Em pouco tempo receberás de Deus a pobreza. Recebe-a tão alegremente como recebestes a abundância. Assim dominarás tuas paixões e vencerás o demônio».
Havia um monge que se queixava que na solidão sofria grandes tentações de quebrar o jejum. Quando estava em comunidade, no monastério, podia suportar mais facilmente. Macário lhe disse:
“É agradável jejuar quando os outros nos veem. Difícil é jejuar quando ninguém nos vê”
Um ermitão que sofria fortes tentações contra a pureza foi consultar Macário que, depois de examinar o caso, chegou a conclusão de que as tentações eram resultantes da indolência do monge. Aconselhou então que o monge não se alimentasse antes do cair do sol, que se entregasse a contemplação durante o trabalho e que trabalhasse sem cessar. O monge seguiu estes conselhos e se viu livre das tentações. Deus revelou a Macário que não era mais perfeito que duas mulheres casadas que viviam na cidade. Ele foi visitá-las e averiguar como faziam elas para santificar-se e descobriu que nunca diziam palavras ásperas nem ociosas, que viviam em humildade, paciência e caridade com seus maridos, e que santificavam todas as suas ações com a oração, consagrando para a glória de Deus todas as suas forças corporais e espirituais. Certa vez, um herege da seita dos hieracitas, que negavam a ressurreição dos mortos, havia espalhado inquietações em vários cristãos. Sózimo. Paládio e Rufino relatam que São Macário ressuscitou um morto para conformar os cristãos em sua fé. Segundo Cassiano, Macário se limitou a que o morto falasse e lhe ordenou que esperasse a ressurreição no sepulcro. Lúcio, bispo ariano que havia usurpado a Sé de Alexandria, enviou tropas ao deserto para que dispersassem os piedosos monges, alguns dos quais derramaram seu sangue testemunhando sua fé. Os principais monges, Isidoro, Pambo, os dois Macários e outros foram desterrados a uma pequena ilha do Nilo, rodeada de pântanos. Pelo exemplo e pelas pregações dos monges, todos os habitantes da ilha se converteram do paganismo. Lúcio então autorizou que retornassem às suas celas. Sentindo que se aproximava seu fim, Macário fez uma visita aos monges de Nitria e lhes exortou com palavras tão profundas que estes se ajoelharam a seus pés chorando. Macário foi chamado por Deus aos 90 anos, depois de haver passado 60 no deserto de Esquita. Segundo o testemunho de Cassiano, Macário foi o primeiro anacoreta daquele vasto deserto. Alguns autores afirmam que ele foi discípulo de Santo Antonio, porém é pouco provável que tenha sido dirigido espiritualmente por Santo Antonio, antes de ir ao deserto. Contudo, parece que, mais tarde, Macário teria visitado Santo Antonio algumas vezes, pois vivia a uns 15 dias de distância um do outro.