Por Dom Henrique Soares da Costa
A Eucaristia é o Sacramento por excelência. Nela está realmente presente como Vítima sacrifical ao Pai e de comunhão para nós não somente a graça, mas o próprio Autor da graça. De tal modo a sagrada Eucaristia é o Sacramento santíssimo que se pode afirmar que os demais sacramentos somente são sacramentos em relação com o Eucaristia.
A palavra “eucaristia” significa “ação de graças“. Na Celebração eucarística os cristãos fazem memorial da Páscoa de Cristo Jesus – síntese de toda a salvação que o Pai nos deu pelo Filho no Espírito -, tornando presente o mistério da entrega que Cristo fez de Si ao Pai para a salvação do mundo inteiro através da Sua paixão, morte, ressurreição, ascensão ao Céu e do dom do Espírito Santo. Assim, cada vez que se celebra a Eucaristia torna-se presente a nossa salvação.
Eis alguns elementos que são indispensáveis de se ter presentes para compreender bem o sentido da Eucaristia:
1. Cristo, nosso Salvador e Senhor, ofereceu-Se ao Pai num Espírito eterno como sacrifício único, irrepetível e perfeito na cruz uma vez por todas. Seu sacrifício é totalmente suficiente para a salvação do mundo.
2. Este sacrifício, o Pai o acolheu no Espírito Santo (cf. Hb 9,14). Que significa isto? Toda a obra salvífica de Cristo Jesus, que culminou com Sua santa paixão, Sua piedosa morte e sepultura e Sua gloriosa ressurreição, agora encontra-se na Glória do Pai: Jesus está e estará para sempre ao mesmo tempo imolado e glorificado pela ação do Espírito Santo do Pai intercedendo por nós, Sacerdote eterno e Vítima eterna de um Sacrifício eterno (cf. Hb 5,5-10). No Santuário do Céu, o homem Jesus, em estado de imolação gloriosa, oferece ao Pai, no Espírito, Seu sacrifício pela inteira criação. Isto aparece no Novo Testamento ao menos em três imagens:
(a) Todas as vezes que os evangelhos narram os encontros do Ressuscitado com os discípulos, evitam descrever o corpo glorioso do Senhor, que já não pode ser descrito. No entanto, há um sinal que O identifica: as chagas, agora gloriosas! Tais chagas que não saram, que não se fecharão jamais, indicam que o Cristo vivo e glorioso continuará para sempre vítima pascal, eternizado na Sua imolação pelo mundo inteiro. Ele será para sempre o Imolado que é Ressuscitado e o Ressuscitado em estado de gloriosa imolação!
(b) A Epístola aos Hebreus afirma claramente que o Ressuscitado “entrou uma vez por todas no Santuário… com o próprio sangue, obtendo uma redenção eterna” (Hb 9,12). Eis a ideia: Cristo eternamente no céu oferece ao Pai o Seu sangue, isto é, o Seu sacrifício, a Sua vida, só que agora num estado glorioso!
(c) O Apocalipse apresenta a sugestiva e profunda imagem do Cordeiro de pé como que imolado diante do Trono do Pai (cf. 5,6): trata-se do Cristo ressuscitado, vencedor, mas eternamente num estado de imolação gloriosa! Conclusão impressionante e maravilhosa: o sacrifício de Cristo não está no passado, congelado no tempo; o sacrifício de Cristo, por obra do Espírito Santo, está eternamente novo, presente a todos os tempos e lugares, perene e salvífico, na glória do Pai!
3. O sacrifício glorioso de Cristo, tal como agora se encontra na Glória, torna-se realmente presente sobre nossos altares em cada Eucaristia, único, eterno, eficaz, irrepetível, santo. Em outras palavras: o Cristo eucarístico não é o Cristo no estado cruento e doloroso em que Se encontrava no Calvário, mas o Cristo vítima gloriosa como Se encontra no céu, com Sua humanidade que foi sacrificada totalmente gloriosa por obra do Espírito com o qual o Pai o plenificou na Sua ressurreição! O Sacrifício da missa não é simples e direta atualização do doloroso sacrifício do Senhor ocorrido há séculos atrás, mas a real “presentificação”, e o verdadeiro tornar-se ato entre nós (= atualização) do sacrifício ocorrido há séculos atrás e agora, atualmente e para sempre, sacrifício glorioso no Céu. Celebrando a Eucaristia, vem ao Altar, direto do Céu, o “bendito que bem em nome do Senhor”: vem para ser adorado, vem para ser glorificado pela Igreja da terra como o é pela Igreja do Céu, vem para ser oferecido por nós ao Pai no Espírito, unindo a Si, à Sua oferta eterna, a nossa pobre oferta da vida, vem para dar-Se em comunhão, pleno de Vida divina, que é o Santo Espírito, dando-nos, assim, já na terra, a Vida do Céu, vida eterna, Vida de ressurreição. Assim, que deve ficar claro o seguinte: no sacrifício da Missa, não é propriamente o passado que se faz presente, mas o céu que desce à terra sobre o altar! É verdade que é o sacrifício ocorrido há vinte e um séculos que é celebrado, mas não nas condições cruentas daquela época, mas no estado glorioso e perpétuo (incruento) em que se encontra no céu. Daí a liturgia exclamar:
“Imolado, já não morre; morto, vive eternamente!”
Daí também o costume antigo de se usar na liturgia da Missa símbolos e gestos do Apocalipse, onde se descreve de modo cheio de figuras belíssimas e sugestivas a adoração ao Cristo que Se oferta gloriosamente ao Pai como Cordeiro de pé e imolado!
Se prestarmos bem atenção nestas explicações fica claro o erro de se representar o Cristo flagelado e em dores como se a Missa fosse Seu sacrifício cruento! O Concílio de Trento é claro a este respeito:
“Neste divino Sacrifício, que se consuma na Missa, está presente e Se imola de modo incruento Aquele mesmo Cristo que Se imolou uma só vez e de modo cruento no altar da cruz… Uma só e mesma é a Vítima: e Aquele que agora Se imola pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que um dia Se imolou na cruz, sendo diferente só o modo de oferecer”.
Fica patente também como é possível que o sacrifício de Cristo seja oferecido uma vez por todas, sem repetição e, ao mesmo tempo, a Missa seja real e verdadeiro sacrifício de Cristo: é o sacrifício em estado glorioso que se torna presente no altar para que nós, na terra, participemos já das coisas do céu e entremos em comunhão com o santo Sacrifício único, perfeito, suficiente e eterno, que é propiciação pelos nossos pecados e salvação para o mundo inteiro. Fica claro também o quanto erram e se enganam nossos irmãos protestantes quando negam que a Missa seja real e verdadeiramente o mesmíssimo sacrifício do Senhor nosso Jesus Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote e Vítima perfeita pelos nossos pecados. Para eles, afirmar que a Missa é o sacrifício de Cristo seria negar o valor suficiente do único sacrifício da cruz. Ora, os católicos nunca negaram esse valor suficiente e eterno! Apenas, afirmam, seguindo a Escritura e a constante Tradição apostólica, que este Sacrifício não passou, não caducou no passado, mas eficaz e atuante na glória, torna-se realmente presente em todos os nossos altares para que todas as gerações de cristãos possam participar realmente, nos ritos litúrgicos, da Páscoa salvadora do Senhor nosso que prometeu que estaria conosco para sempre!
Portanto, na sagrada Eucaristia, torna-Se realmente presente sobre o altar o Cristo-Cordeiro em estado de imolação gloriosa para que a Igreja O apresente ao Pai na Sua Páscoa, tornada sempre presente neste mundo pela força do Espírito Santo. Ponto alto da Celebração são o momento da epíclese-consagração (invocação do Espírito para transformar as espécies no corpo e sangue de Cristo) e da anámnese (recordação em forma de memorial da entrega que Cristo fez na Última Ceia, transformando o pão no Seu Corpo e o vinho com água no Seu Sangue).
Recebendo em comunhão Aquilo mesmo que oferecemos, isto é, o Corpo do Cristo ressuscitado, pleno do Espírito Santo, nós somos divinizados, santificados, tornamo-nos, no Espírito Santo, uma só coisa com o Senhor Jesus, tendo já realmente a Sua vida ressuscitada e, Nele, tornamo-nos também uma só coisa uns com os outros. É por isso que pode-se dizer que a Eucaristia faz a Igreja.
Na Eucaristia o Senhor está presente na Sua Palavra, no Celebrante, na Assembleia, mas, sobretudo nas espécies ( = aparências ) do pão e do vinho.
A Eucaristia é a mais intensa ação de Cristo que, por nós e conosco agradece, louva, suplica, pede perdão ao Pai na potência do Espírito Santo. Unindo a Si o Seu Corpo que é a Igreja na terra e no Céu, o Cristo nos constitui em povo sacerdotal, povo de intercessores ente toda a humanidade e toda a criação!
A Eucaristia é também fonte da atividade missionária da Igreja, pois celebrando a Páscoa do Senhor, escutando a Sua Palavra e alimentados com o Pão eucarístico, somos impelidos a anunciá-Lo vivo, ressuscitado e ressuscitante entre nós até que Ele venha. Aliás, em cada Eucaristia, entramos já agora em comunhão verdadeira com o Cristo que virá e como virá e com o novo mundo transfigurado – como os elementos eucarísticos, pão, vinho e água – pleno do Espírito do Ressuscitado, Fogo bendito e divino no qual toda a criação será consumida em Glória eterna.