O Rosário e São Domingos
Leão XIII afirma sempre em suas Encíclicas com a tradição, que o Rosário foi instituído por São Domingos sob a ordem e inspiração da Mãe de Deus, a Rainha do céu (1).
“O Rosário, diz, cujo rito a Mãe de Deus ensinou em pessoa a São Domingos para que ele o propagasse” – Magne Dei Matris, 7 de Setembro 1892
Todos os Papas desde Xisto IV aceitaram esta tradição e a confirmaram em preciosos documentos. No século XVIII, o Bolandista Cuyper contestou esta gloriosa tradição em nome da crítica histórica e escreveu:
“Só temos a autoridade dos Papas e confessamos que ela é grande e é favorável à Tradição. Todavia, num assunto puramente histórico, os eruditos católicos podem discutir e ter opiniões contrárias. As bulas deste gênero não confirmam fatos históricos. Em geral os Papas dizem como provável o que apresentam”
Não há dúvida, diz o Pe. Joret O. P. (2), mas é preciso dizer também que os Papas, dos quais temos bulas sobre o Rosário, atestam a tradição desde o Século XV e diziam já ser ela antiga. E até que provém o contrário, as afirmações dos Soberanos Pontífices sobre a origem do Rosário atribuída a São Domingos, têm elas mais peso e valor do que todas as negações dos modernos. E um dos Papas mais sábios da Igreja, Bento XIV, se opôs às críticas de Cuyper que pretendia ter a devoção do Rosário aparecido só no século XV.
Dirão que o Rosário como hoje o temos é resultado de uma evolução histórica. Sim, uma devoção não surge assim perfeitamente definida, regularizada e completa. Tal não se deu com devoção alguma. O Rosário teve, portanto, a sua evolução histórica em torno, porém, da forma essencial, sempre conservada desde São Domingos. Mas esta evolução, escreve o Pe. Gorce numa obra recente “em torno de São Domingos” e tendo por centro São Domingos (3).
O Beato Alano da Rocha um dos maiores apóstolos do Rosário, quando pregava a bela devoção dominicana, a atribuía a São Domingos, e narrava a sua piedosa origem, tal como hoje no-la é contada. Papas, teólogos e historiadores a aceitam. Porque a contestar sem base, em nome de uma crítica histórica ousada?
História do Rosário
Segundo as Tradições dominicanas mais veneráveis é esta a origem do Rosário, confirmada na sua essência pelo Breviário e nas Bulas e documentos Pontifícios:
“São Domingos havia deixado a Espanha e se consagrado ao apostolado da pregação na França devastada naquela época pela terrível heresia dos Albigenses. Estes hereges constituíam um perigo à cristandade, e haviam seduzido regiões inteiras, afastando o povo dos sacramentos e formado gerações pagãs. Eram audaciosos, ímpios, e agressivos. Domingos pregou em vão durante longo tempo. Todos os seus esforços foram baldados. A obstinação diabólica da heresia não se dobrava. Nem a santidade do Apóstolo; nem os seus jejuns e penitências e orações e vigílias, nada tocava o coração empedernido dos Albigenses. Um dia em que o Santo se encontrava nos arredores de Toulouse, na França, entrou em um Santuário dos arredores da cidade, e aí, prostrado aos pés de Maria, chorou amargamente as desgraças e devastações da heresia. Fez penitências, estendeu os braços em cruz como Moisés na montanha, e implorou a proteção de Nossa Senhora. Só dela esperava a salvação.
Então, uma doce voz se ouviu, mais suave que a dos Anjos:— Domingos, meu filho, consola-te. Se queres salvar as almas, prega o meu Rosário. Põe nos lábios do povo as três orações que tem mais poder sobre o coração de Deus: o Pai-Nosso que meu Filho ensinou aos homens, a Ave-Maria que o Anjo trouxe à terra, e o Glória ao Pai que os Eleitos eternamente farão ouvir na Pátria celeste. Prega o meu Rosário! Ensina o povo a unir a meditação à oração vocal, a deter o pensamento nos grandes mistérios da fé. Prega o meu Rosário, e a piedade renascerá na Igreja e o mundo será salvo” (4)
E assim como o disse Maria, se realizou maravilhosamente a conversão, dos hereges e veio a salvação ao mundo pelo Rosário. Dentro de vinte anos a heresia foi humilhada e desaparecida das regiões devastadas. Após tantas lutas sangrentas, e as grandes calamidades, a paz baixou à terra. A luta contra a heresia que tanto sangue havia já custado aos Príncipes e ao povo, cessou miraculosamente com a vitória da Igreja e da verdade, quando o povo cristão, trazendo nas mãos o Rosário, e contemplando os seus mistérios, se instruiu e conheceu os erros perigosos de uma das maiores heresias daqueles tempos. Eis aí como veio ao mundo, a devoção do Santo Rosário.
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EXEMPLO
O Papa do Rosário
Tal foi o título que toda a cristandade espontaneamente deu ao grande Leão XIII. Nenhum Papa escreveu tantas Encíclicas e deixou mais preciosos e ricos documentos doutrinários sobre o Rosário. Com São Pio V, ele é verdadeiramente o Papa do Rosário.
Escreveu a Igreja universal doze Encíclicas luminosas sobre o Rosário e mais quatro Breves e Cartas. Ao todo dezesseis documentos riquíssimos sobre a Rainha das devoções, e que o imortalizaram como o teólogo, e o Papa do Rosário.
Ninguém poderá falar ou escrever sobre esta devoção sem lembrar o grande Pontífice. Desde menino, no Castelo de Carpineto, era já um fervoroso devoto do Rosário, e o rezava em família todos os dias junto à Mãe piedosa.
Elevado ao Trono Pontifício, revelou todo o seu amor ardente a Nossa Senhora do Rosário.
“Afirmamos, disse ele, e muitas vezes e sob diversas formas, e sempre, que no Rosário colocamos nossas melhores esperanças. É nosso voto ardentíssimo que esta devoção se propague cada vez mais pelas cidades, famílias, oficinas e campos, entre os nobres e o povo. Que para todos seja ela a devoção mais querida e se torne um sinal distintivo da fé”
E para alcançar este ideal, Leão XIII não poupou energias, e, em audiências, sermões, encíclicas, enfim, por todos os meios, se fez apóstolo do Rosário.
Não se contentava tão só em pregar o Rosário. Ele o rezava cada dia. E à noite, após as fadigas dos seus dias de tanta luta, reunia os familiares do Vaticano, diante da imagem de Nossa Senhora, e rezava com eles o Terço.
No dia primeiro de cada mês, das 22 às 23 horas, não obstante toda fadiga e a velhice, prostrado diante de Maria, rezava as 150 Ave-Marias do Rosário, de joelhos, fazendo a hora de Guarda do Rosário Perpétuo.
E ainda no dia da sua morte, Leão XIII, num esforço supremo, algumas horas antes de exalar o último suspiro, tomou as mãos do Cardeal Rafael Pierroti, dominicano, e lhe recomendou encarecidamente a sua querida devoção do Rosário. Morreu sob o olhar, a doce proteção de Nossa Senhora do Rosário, cujas glórias ele tão bem soube cantar.
Referências:
(1) Octobri mense – 22 de Setembro 1891
(2) Le Rosaire de Marie, p. 215 – Leão XIII
(3) Le Rosaire et ses antécédents Historiques
(4) L’Apostolat du Rosaire
Voltar para o Índice do livro Mês do Rosário, de Mons. Ascânio Brandão
(BRANDÃO, Monsenhor Ascânio. O Mês do Rosário, Edições do “Mensageiro do Santíssimo Rosário”, 1943, p. 22-28)