Sabedoria Eterna. — Não são discretos os que às vezes padece tribulações com pesar e queixas; pois meu paterno castigo e a vara com que os firo, procedem de profundo amor, o é suave e benigna, de forma que se pode considerar ditoso aquele que experimenta assim, pois sua aflição não procede de rigor e dureza, mas de meu terno amor; entenda-se isto, do qualquer gênero de cruz voluntariamente procurada, ou imposta, que gera virtudes; mas quando o aflito não se queira ver livre do mal contra minha vontade, antes o ofereça para minha glória eterna, com amorosa e humilde paciência; o grau desta é o quilate do seu prêmio. Grava o que te digo agora, escreve-o no íntimo do coração, e apareça sempre a teu espírito.
Em si mesma, a concupiscência é o apetite dos sentidos, uma inclinação natural aos bens sensíveis; esta inclinação, este apetite não são maus, a não ser que sejam contrários à razão e à Lei de Deus. A concupiscência não é uma potência mal produzia pelo demônio; nenhuma potência pode ser má por si mesma, nem pode ser produzida pelo demônio. A concupiscência não é tampouco o pecado original; porque o pecado original é destruído pelo Batismo, enquanto a concupiscência ainda permanece. Não é, por fim, como o quer Calvino, uma coisa corrompida pelo pecado original e semelhante a um forno sempre aceso que vomita o pecado.
Meditação para o Décimo Quarto Sábado depois de Pentecostes
SUMARIO
Meditaremos sobre outro vício oposto à humildade, que é a presunção; e veremos: 1.° Quanto este vício é indigno de uma alma cristã; 2.° De quantos modos nos tornamos presunçosos. — Tomaremos depois a resolução: 1.° De nos abismarmos diante de Deus no sentimento das nossas misérias, e de repelirmos toda a complacência no bom conceito, que fôssemos tentados a formar de nós mesmos; 2.° Confiarmos só em Deus, e de desconfiarmos de nós até evitar as menores ocasiões do pecado. O nosso ramalhete espiritual será a palavra do Espírito Santo:
"Quanto maior sois, tanto mais vos deveis humilhar em todas coisas" - Quanto magnus es, humillia te in omnibus (Ecl 3, 20)
Meditação para a Quinta-feira da Primeira Semana da Quaresma
SUMARIO
Meditaremos na maneira de fazer o exame de consciência, e veremos: 1.° Os caracteres deste exame; 2.° Os atos que devem acompanhá-lo. — Tomaremos depois a resolução: 1.º De observarmos no nosso exame as regras indicadas pelos santos; 2.º De o fazermos com uma sincera dor das nossas culpas e com um firme propósito de emenda. O nosso ramalhete espiritual será a palavra do santo rei Ezequias:
"Repassarei diante de vós pela memória toda a minha vida com amargura da minha alma" - Recogitabo tibi omnes annos meos in amaritudine animae meae (Is 28, 15)
Exordio. — A história do Filho pródigo é um quadro da vida humana e uma perfeita imagem das graças da penitência.
Proposição e divisão. — 1.° Os prazeres são mananciais de dores; 2.° As dores são mananciais de prazeres.
1.º Ponto. — Como sucedeu com o pródigo, os cristãos que se entregam aos prazeres caem, pelo próprio excesso desses prazeres, num abismo de dores; e o corpo e a alma desses infelizes são vítimas de perniciosos efeitos; são como que escravos de si mesmos.
2.º Ponto. — A semelhança do pródigo, podem por meio da dor, estar na posse tranquila duma perfeita alegria. As tristezas da Penitência são salutares, e são fecundas em consolações e alegrias.
Peroração. – O homem desprendido dos prazeres não achará a morte inexorável, nem cruel.
Homo quidam habuit duos filios, et dixit adolescentior ex illis patri: Pater, da mihi portionem substantiœ quœ me contingit.
Um homem tinha dois filhos, e o mais novo disse um dia ao pai: Meu pai, dê-me a parte da herança que me cabe.
"Miserável serás onde quer que estejas e para onde quer que te voltes, se não te converteres a Deus. Por que te afliges se te não sucede o que queres e desejas? Quem é que tem todas as coisas à medida dos seus desejos? Por certo, nem eu, nem tu, nem homem algum sobre a terra. Ninguém vive no mundo sem alguma tribulação ou angústia, ainda que seja rei ou papa.
«TENHO mau gênio», ou «bebo demais», «estou sempre a criticar» ou «sou preguiçoso», são queixas familiares a quantos acreditam ainda que a nobreza de caráter é um objetivo importante. Não fariam tais afirmações se não tivessem um forte desejo de romper a cadeia dos hábitos maus. E podem realizar este desejo, porque todo o hábito mau pode ser suprimido. Mas para se libertar dele, requerem-se quatro coisas:
SE a nossa vontade se puser do lado de Deus, nunca poderemos desanimar, porque o lado que escolhemos, está sempre vitorioso e nunca é ludibriado. Em Deus está a conservação, no mal a ruína. A realidade das coisas encontra-se sempre do lado de Deus. O mal é, necessariamente, instável, porque vai contra a natureza das coisas segundo foram criadas. Todas as leis da natureza humana nos impulsionam para o nosso destino específico tanto de santidade como de saúde. Se cuidarmos, devidamente, do nosso corpo, obedecendo às regras da saúde, seremos saudáveis; se violarmos essas leis, a nossa revolta trará a doença, e poucos tomariam o devido cuidado consigo, se a violação das leis da saúde não trouxesse algum castigo, como aviso.
Contam as tradições de Roma que São Pedro fugia, medroso, da perseguição de Nero quando encontrou Jesus no caminho, com a cruz às costas.
“Para onde vais, meu Senhor?”, pergunta o apóstolo. “Para Roma, diz Jesus, e para ser de novo crucificado”
Pedro compreendeu a lição. Voltou e sujeitou-se corajosamente ao martírio. Jesus continua ainda a sofrer. E até o fim dos séculos há de carregar, em seus ombros feridos, o peso enorme de nossos pecados.
O EGOÍSMO é uma mentira em ação: supõe que os caprichos, paixões e desejos instintivos têm precedência sobre a lei moral, a fraternidade dos outros seres humanos e a vontade do próprio Deus. O egoísta é como um pêndulo que pugna pelos seus direitos contra os do relógio ou como uma nuvem em rebelião contra o céu, ou como um braço, que teima ignorar o corpo de que faz parte. Fazendo apenas o que os seus desejos interesseiros reclamam, o egoísta acaba por odiar tudo o que faz. É como uma criança da escola progressiva, que se lamenta: