Sumário. O réprobo no inferno, vendo-se oprimido pelos seus tormentos inefáveis e desesperando de jamais remediar os seus males, será devorado por um ódio contínuo de Deus e amaldiçoará todos os benefícios que dele recebeu. Assim como amaldiçoa a Deus, amaldiçoará também todos os Anjos e Santos, e especialmente à divina Mãe, cuja intercessão não quis aproveitar. Ah, meu Jesus! Seja cortada antes a minha língua; protesto que nunca Vos quero amaldiçoar, mas sim louvar-Vos para sempre no paraíso.Peccator videbit et irascetur, dentibus suis fremet et tabescet; desiderium peccatorum peribit - “Vê-lo-á o pecador e se indignará; rangerá os dentes e se consumirá; o desejo dos pecadores perecerá” (Sl 111, 10)
Sumário. Não nos diz o Senhor que nos preparemos quando chegue a morte, mas que estejamos preparados. Porque, como ensina a fé e a razão confirma, na perturbação e confusão da morte será quase impossível por em ordem uma consciência perturbada. Quantos pensavam que se poderiam converter nesse momento e estão agora ardendo no inferno? Dize-me, meu irmão: se a morte te viesse surpreender na primeira noite, estarias bem preparado? Procura fazer agora o que então quiseras ter feito.Et vos estote parati; quia, qua hora non putatis, Filius hominis veniet - “Vós outros, pois, estai preparados; porque na hora em que menos cuideis, virá o Filho do homem” (Lc 12, 40)
Confira as importantes advertências de Santo Afonso para bem aproveitar esta obra!
CONSIDERAÇÃO XXVIII
Vermis eorum non moritur - "O seu verme não morre" (Mc 9, 47)
PONTO I
Este verme que não morre nunca significa, segundo São Tomás, o remorso de consciência dos réprobos, o qual há de atormentá-los eternamente no inferno. Muitos serão os remorsos com que a consciência roerá o coração dos condenados. Mas há três que principalmente os atormentarão, a saber: o pensar no nada das coisas pelo qual o réprobo se condenou, no pouco que tinha a fazer para salvar-se e no grande Bem que perdeu. Depois que Esaú tinha comido o prato de lentilhas, preço do seu direito de primogenitura, ficou tão magoado por ter consentido na perda que, conforme a Escritura, pôs-se a rugir... (Gn 27,34). Que gemidos e clamores soltarão os réprobos ao ponderar que, por prazeres fugidios e envenenados, perderam um reino eterno de felicidade, e se veem condenados para sempre a contínua e interminável morte! Chorarão mais amargamente que Jônatas, sentenciado a morrer por ordem de Saul, seu pai, sem ter cometido outro delito do que provar um pouco de mel (1Rs 14,43). Que pesar sofrerá o condenado ao recordar-se da causa de sua ruína!... Sonho de um instante nos parece nossa vida passada. O que hão de parecer ao réprobo os cinquenta ou sessenta anos de sua vida terrena, quando se encontra na eternidade, onde, depois de terem decorrido cem ou mil milhões de anos, vir que então aquela sua vida está começando? E, além disso, os cinquenta anos de vida na terra são, acaso, cinquenta anos de prazer? O pecador que vive sem Deus goza sempre de doçuras em seu pecado? Um momento só dura o prazer culpável; no demais, para quem vive separado de Deus, é tempo de penas e aflições... Que serão, portanto, para o infeliz réprobo esses breves momentos de deleite? Que lhe parecerá, particularmente, o último pecado pelo qual se condenou?...“Por um vil prazer que durou apenas um instante e que como o fumo se dissipou, exclamará, hei de arder nestas chamas, desesperado e abandonado, enquanto Deus for Deus, por toda a eternidade!”
Sumário. Pobres pecadores! Trabalham, afadigam-se para adquirir as ciências humanas ou a arte de granjearem os bens da vida presente, que em breve acaba, e não cuidam dos bens da outra vida, que nunca termina; ou, antes, renunciam a eles por uma satisfação passageira. Não sejamos tão loucos. Lembremo-nos que o Senhor nos pôs neste mundo tão somente para merecermos a vida eterna, e digamos muitas vezes conosco: Para que serve ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a alma? Perdida a alma, tudo está perdido.Melior est puer pauper et sapiens rege sene et stulto, qui nescit praevidere in posterum - “Melhor é um moço pobre e sábio, do que um rei velho e insensato, que não sabe prever nada para o futuro” (Ecl 4, 13)
Confira as importantes advertências de Santo Afonso para bem aproveitar esta obra!
CONSIDERAÇÃO XXVII
Et ibunt hi in supplicium aeternum - "E estes irão para o suplício eterno" (Mt 25, 46)
PONTO I
Se o inferno não fosse eterno, não seria inferno. A pena que dura pouco, não é grande pena. Se a um doente se rompe um abscesso ou queima uma ferida, não deixará de sentir dor vivíssima; como, porém, esta dor passa em breve não se pode considerá-la como tormento grave. Seria, porém, grande suplício, se a intervenção cirúrgica perdurasse semanas ou meses. Quando a dor é intensa, ainda que seja breve, torna-se insuportável. E não apenas as dores, até os prazeres e as diversões, prolongando-se em demasia, um teatro, um concerto, continuando, sem interrupção, durante muitas horas, causaria tédio insofrível. E se durassem um mês, um ano? Que será, pois, no inferno, onde não é música, nem teatro que sempre se ouve, nem leve dor que se padece, nem ligeira ferida ou superficial queimadura de ferro candente que atormenta, mas o conjunto de todos os males, de todas as dores não em tempo limitado, mas por toda a eternidade? (Ap 20,10). Esta eternidade é de fé; não é simples opinião, mas sim verdade revelada por Deus em muitos lugares da Sagrada Escritura.“Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno. — E irão estes ao suplício eterno. — Pagarão a pena de eterna perdição. Todos serão assolados pelo fogo” (Mt 25,41.46; 2Ts 1,8; Mc 9,48)Assim como o sal conserva o alimento, o fogo do inferno não só atormenta os condenados, mas, ao mesmo tempo, tem a propriedade do sal, conservando-lhes a vida.
“Ali o fogo consome de tal modo — disse São Bernardo — que conserva sempre”.
Confira as importantes advertências de Santo Afonso para bem aproveitar esta obra!
CONSIDERAÇÃO XXVI
Et ibunt in supplicium aeternum - "E irão estes ao suplício eterno" (Mt 25, 46)
PONTO I
O pecador comete dois males quando peca: aparta-se de Deus, Sumo Bem, e se entrega às criaturas.“Dois males fez meu povo: abandonaram-me a mim, que sou fonte de água viva, e cavaram para si cisternas rotas, que não podem reter a água” (Jr 2,13)Em vista de o pecador se ter dado às criaturas com ofensa a Deus, será justamente atormentado no inferno por essas mesmas criaturas, pelo fogo e pelos demônios: esta é a pena do sentido. Como, porém, sua maior culpa, na qual consiste a maldade do pecado, é a separação de Deus, o maior suplício do inferno é a pena do dano ou da privação da visão de Deus, perda irreparável. Consideremos, em primeiro lugar, a pena do sentido. É de fé que existe inferno. No centro da terra se encontra esse cárcere, destinado ao castigo dos que se revoltaram contra Deus.
Que é, pois, o inferno?
O lugar de tormentos (Lc 16,28), como o chamou o mau rico; lugar de tormentos, onde todos os sentidos e todas as faculdades do condenado hão de ter o seu castigo próprio, e onde aquele sentido que mais tiver servido para ofender a Deus mais acentuadamente será atormentado (Sb 11,17; Ap 18,7). A vista padecerá o tormento das trevas (Jó 10,21). Digno de profunda compaixão seria um infeliz encerrado em tenebroso e acanhado calabouço, durante quarenta ou cinquenta anos de sua vida. Pois o inferno é cárcere fechado por completo e escuro, onde nunca penetrará raio de sol nem qualquer outra luz (Sl 48,20). O fogo que aqui na terra ilumina, não será luminoso no inferno.Confira as importantes advertências de Santo Afonso para bem aproveitar esta obra!
CONSIDERAÇÃO XXV
Cognoscetur Dominus judicia faciens - "Conhecido será o Senhor, que faz justiça" (Sl 9, 17)
PONTO I
Não há neste mundo, quando bem se considera, pessoa mais desprezada que Nosso Senhor Jesus Cristo. Respeita-se mais a um aldeão que o próprio Deus; porque se teme que esse aldeão, vendo-se injuriado e oprimido, se vingue, movido por violenta cólera. Mas a Deus se ofende e se ultraja sem receio, como se não pudesse castigar quando quisesse (Jó 22, 17). Por isso, o Redentor destinou o dia do juízo universal (chamado com razão, na Escritura, o dia do Senhor), no qual Jesus Cristo se fará reconhecer por todos como universal e soberano Senhor de todas as coisas (Sl 9,17). Esse dia não se chama dia de misericórdia e perdão, mas “dia da ira, da tribulação e da angústia, dia de miséria e calamidade” (Sf 1, 15). Nele o Senhor se ressarcirá justamente da honra e da glória que os pecadores quiseram arrebatar-lhe neste mundo. Vejamos como há de suceder o juízo nesse grande dia. A vinda do divino Juiz será precedida de maravilhoso fogo do céu (Sl 96,3), que abrasará a terra e tudo quanto nela exista (2Pd 3,10). Palácios, templos, cidades, povos e reinos, tudo se reduzirá a um montão de cinzas. É mister purificar pelo fogo esta grande casa, contaminada de pecados. Tal é o fim que terão todas as riquezas, pompas e delícias da terra. Mortos os homens, soará a trombeta e todos ressuscitarão (1Cor 15,52). Dizia São Jerônimo:“Quando considero o dia do juízo, estremeço. Parece-me ouvir a terrível trombeta que chama: Levantai-vos, mortos, e vinde ao juízo”
“Irmãos, não queremos que ignoreis o que se refere aos mortos, para não ficardes tristes como os outros, que não têm esperança” (1Ts 4,13).O cristão não pode encarar a morte como os pagãos; nós temos uma esperança, e ela se chama Jesus Cristo, Aquele que disse “Eu sou a Ressurreição, Eu sou a Vida” (Jo 11,25)!
“Quando Jesus a viu (Maria) chorar e também os judeus que a acompanhavam, comoveu-se interiormente e ficou conturbado. (…) Jesus chorou. Diziam, então, os judeus: Vede como ele o amava.” (Jo 11, 33-36).O enterro da viúva de Naim relata:
“Ao vê-la, o Senhor, encheu-se de compaixão por ela.” (Lc 7, 13)Às vésperas da sua paixão e morte na cruz rezou:
“Sinto uma tristeza mortal! (…) Afasta de mim este cálice.” (Mc 14, 34-36)A sede de infinito pode afastar a reflexão sobre o tema do morrer. Morrer, nem pensar! Poucos consideram que viveram o suficiente. Todos se acham no direito de esticar o mais possível a vida na terra; talvez para atingir o limite máximo dos 122 anos, segundo pesquisas de cientistas americanos (cf. ZH, 15/10/2016). Então, o que fazer para saciar este desejo de infinito, de eternidade?
Sumário. É certo que a morte não respeita nem riquezas, nem poder, nem a púrpura; e quem morre (ainda que seja príncipe) nada leva consigo para a sepultura; deixa toda a glória no leito em que expira. Como é possível que os cristãos, pensando nisto, se apeguem aos bens da terra e não deixem antes tudo para se consagrarem inteiramente a Jesus Cristo, que os julgará conforme as suas obras? Se no passado fomos tão insensatos, sejamos mais prudentes para o futuro, e tomemos a resolução de sermos sempre fiéis no serviço divino.Cum interierit (homo), non sumet omnia, neque descendet cum eo gloria eius - “Em morrendo, nada levará (o homem) consigo; nem a sua glória descerá com ele” (Sl 48, 17)