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O Amor na Decepção

Capítulo 18. O Amor na Decepção - Livro Rumo à Felicidade, de Fulton Sheen
MALOGRAM-SE os casamentos, quando o amor é considerado não como algo transparente, qual vidro de janela, por onde se contempla o céu, mas como algo opaco, qual cortina, por onde nada se vê, além do humano. Quando os casados não descobrem que o amor carnal é o prefácio do amor espiritual, uma das partes transforma-se em objeto de adoração, em lugar de Deus. É esta a essência da idolatria, a adoração da imagem em vez da realidade; a mistificação da cópia pelo original, da moldura pelo quadro.

O amor humano promete alguma coisa que só Deus pode dar. Quando Deus é ignorado no amor, aquele que foi adorado como divindade, mais tarde ou mais cedo, revela não ser deus, nem sequer anjo. Visto que ele ou ela não deu tudo quanto tinha prometido, porque, não sendo divinos, eram incapazes de o dar, o outro sente-se traído, decepcionado, defraudado. Censura-se a haste da rosa por não ter produzido aquilo que nunca podia produzir — o busto marmóreo de uma divindade. Quando se verificar que o outro tem pés de barro — que é mulher e não anjo, homem e não Apolo, — o resultado será que esse amor erótico se converte em ódio. Quando cessar o êxtase, e a orquestra acabe de tocar, e o champanhe da vida deixar de espumar, a outra parte passará a ser considerada embusteiro e ladrão. E, finalmente, será chamada ao tribunal dos divórcios, sob alegação de incompatibilidade.

Começa, então, a procura de um outro cônjuge, na falsa ilusão de que um novo ser humano pode suprir o que só Deus pode dar. Em lugar de ver que a razão basilar do insucesso matrimonial foi não ter usado do amor conjugal como preâmbulo do amor Divino, pensa que as bolotas podem saciá-lo, quando lhe foi destinado alimentar-se apenas do pão dos Anjos. Até o fato de um homem ou de uma mulher procurar um novo consorte, claramente demonstra que entre eles nunca existiu amor algum, porque, se o sexo é substituível, o amor não o é. O sexo busca o prazer, o amor a pessoa.

Podem as vacas alimentar-se de diversas pastagens; uma pessoa, porém, não admite qualquer substituição. Quando alguém se identificou com um embrulho e for julgada somente pelo invólucro, não tardará muito que o ouropel perca o seu brilho e, então, lança-se fora o embrulho. Esta situação escraviza a mulher que está muito mais dependente do tempo que o homem, e cuja segurança, com o rodar dos anos, se torna cada vez menor. Ela acha-se sempre muito mais preocupada com a idade do que o homem, e pensa mais no casamento em relação com o tempo. É que o homem tem receio de morrer, antes de ter vivido, ao passo que na mulher, o temor de morrer vem fundamentalmente de ainda não ter gerado a vida. A mulher deseja a plena realização da vida mais do que o homem, e ambiciona menos a experiência da vida do que o seu prolongamento. Sempre que as leis e os costumes de um país permitem um estado de coisas no qual a mulher pode ser rejeitada por ter mãos grosseiras de cozinheira, ela passa a ser uma escrava não das panelas, mas do homem.

A vida não é armadilha, nem ilusão. Assim seria se não existisse o Infinito para satisfazer os nossos anseios. Todos desejam um Amor que não morra, nem tenha momento algum de ódio ou tédio. Esse Amor está para além do que é humano.

O amor humano é uma centelha da grande chama da Eternidade. A felicidade que mana da união de dois seres numa só carne é o prelúdio dessa comunhão maior de duas almas numa só alma. Torna-se, deste modo, o casamento um diapasão para o coro dos Anjos, ou um rio que corre para o mar. É evidente, portanto, que há uma resposta para o sutil mistério do amor, e que a alguma meta nos conduzem os humanos anelos. Esta meta é a união final com Deus, onde a procura e o encontro, o romance e o casamento se fundem numa só coisa. Sendo Deus Amor Eterno e Infinito, não se poderão sondar as Suas Profundezas sem um eterno e estático demandar.

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(SHEEN, Dom Fulton. Rumo à Felicidade – WAY TO HAPPINESS. Tradução de Dr. A. J. Alves das Neves, pároco de São Pedro da Cova. Livraria Figueirinhas, Porto, 1956, p. 69-71)

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