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A Direção Espiritual

Meditação para o Sábado da Quarta Semana da Quaresma. A Direção Espiritual

Meditação para o Sábado da Quarta Semana da Quaresma

SUMARIO

Meditaremos como complemento das nossas meditações sobre o Sacramento da Penitência:

1.° A obrigação de nos deixarmos dirigir pelo nosso confessor;

2.° A maneira com que se deve fazer esta direção.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De tomarmos parecer com o nosso confessor sobre o regulamento da nossa vida e o emprego do nosso tempo, sobre a reforma dos nossos defeitos, sobre a prática das virtudes e o gênero de boas obras que melhor nos convém, se estamos nas circunstâncias de as fazer;

2.° De consultarmos o nosso confessor nas dificuldades e dúvidas que ocorrerem.

Conservaremos como ramalhete espiritual a palavra do Espírito Santo:

“Pedi sempre conselho ao sábio” – Consilium semper a sapientia perquire (Tb 4, 19)

Meditação para o Dia

Adoremos Nosso Senhor no procedimento que teve com São Paulo depois da sua conversão: este grande Apostolo só aspira a conhecer e a fazer a vontade de Deus (1). Nosso Senhor, em vez de o esclarecer ou abandonar a sua própria direção, no estado de luz sobrenatural de que o cerca, envia-o a um sábio diretor (2). Agradeçamos-Lhe esta bela lição, que nos ensina a não confiar na nossa prudência (3), e a tomar sempre conselho pom uma pessoa sábia (4).

PRIMEIRO PONTO

Obrigação de nos deixarmos dirigir pelo nosso Confessor

Ninguém se constitua mestre do seu próprio procedimento (São Basílio, Orat de Felic.). A nossa razão engana-nos; os mais sábios perdem-se, logo que, «em vez de tomarem conselho, querem fiar-se nas suas únicas luzes» (5), diz São Bernardo. Aquele que não vê no seu confessor senão um confidente das suas faltas, para que as absolva, e não um conselheiro que o dirija no caminho da vida, não está menos exposto a perder-se do que um navio sem piloto, um cego sem gula, um enfermo sem médico; e o demônio não conhece meio mais seguro de perder os cristãos do que inspirar-lhes o presunçoso sentimento de que podem dirigir-se por si mesmos, por seu próprio juízo (6). Por isso todos os santos têm sido fiéis à prática de tomar parecer a respeito do seu próprio procedimento (7). Moisés aconselha-se com os anciãos; Davi é encaminhado por Natan e Gad, menores profetas que ele; Saul é enviado a Ananias por Jesus Cristo, que teria podido instruí-lo; finalmente o mesmo Salvador ouviu e consultou simples homens (8). É a ordem da Providência, que os homens se instruam por outros homens, e dependam uns dos outros, quanto ao seu procedimento; é também a ordem da razão: aquele que penetra a consciência de outrem, não lê na sua; ilude- se acerca das suas obrigações, dos seus vícios, das suas virtudes, dos seus méritos e de sua aptidão; e todos necessitam de um conselheiro prudente, que os estude sem prevenção e com a graça do seu ministério. É o que levava Bourdaloue, quando pregava em Paris, a dizer estas notáveis palavras:

«Não posso deplorar bastantemente a cegueira das pessoas do século, que querem confessores e não diretores, como se um pudesse ser separado do outro»

Entremos em nós mesmos; não pertencemos nós ao número daqueles que teriam feito gemer este santo pregador?

SEGUNDO PONTO

Maneira como se deve fazer a Direção

1.º É preciso ver no nosso confessor, não um homem ou um sábio, mas um anjo revestido da sabedoria de Deus, mas Jesus Cristo, mas Deus mesmo, como esse santo anacoreta, que dizia:

«Eu considero a imagem de Jesus Cristo no meu superior» (São João Clímaco, Grad., 4)

É preciso falar-Lhe, por conseguinte, com toda a franqueza, com uma perfeita confiança como ao médico caridoso, ao amigo fiel que Deus nos dá para nos guiar; descobrir-lhe todo o bem e todo o mal que conhecemos em nós, as nossas inclinações, os nossos desígnios, as nossas tentações, sem reserva, sem disfarce, sem nenhum desses artifícios de que o amor-próprio usa algumas vezes para levar ao que se quer a vontade do diretor; pôr de lado todo o respeito humano, toda a repugnância, assim como todo o sentimento de vaidade ou de curiosidade.

2.° É preciso ouvir os seus conselhos com respeito e confiança, segui-los pontualmente, seja qual for a contrariedade, de juízo, de gênio e de vontade que se sinta.

3.° É preciso entregar-nos de tal sorte à sua direção, em tudo o que interessa a salvação, que nada empreendamos sem lho propôr; que nunca recusemos fazer o que ele diz; que lhe deixemos um poder absoluto e uma inteira liberdade de nos dizer o que pensa; que não discutamos os seus conselhos, mas que os abracemos como os melhores; se temos dúvidas, exponhamo-las com tanta indiferença e tanto desapego, que quer ele diga uma coisa, quer diga outra, obedeçamos igualmente.

São estas as nossas disposições e a nossa maneira de obrar?

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Domine, quid me vis facere (At 9, 6)

(2) Tibi dicitur quid te operteat facere (At 10, 6)

(3) Ne innitaris prudentiae tuae (Pr 3, 5)

(4) Consulium semper a sapiente perquire (Tb 4, 19)

(5) Qui se sibi magistrum constituit, stulto se discipulum subdit (São Bernardo, ep. 87)

(6) Nullo alio vitio tuam praecipitem diabolus pertrahit ad mortem, quam eum neglectis consiliis, persuaserit suo judicio confidere (São Doroteu, doct., 5)

(7) Hanc via, tenuere omnes sancti (São Vincente de Ferer, de Vita spir.)

(8) Audientem illos et interrogantes eos (Juc 2, 46)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo II, p. 178-181)