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Maria no Presépio

Meditação sobre Maria no Presépio

SUMARIO

Meditaremos:

1.° Sobre a devoção da Santíssima Virgem no presépio;

2.° Nos sentimentos de Maria, que devemos adotar para passar santamente do ano que finda, ao ano que vai começar.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De nos decidirmos sinceramente a viver melhor durante o ano que se avizinha;

2.° De santificar o último dia do ano com o dúplice sentimento do reconhecimento e da contrição; do reconhecimento pelos bens recebidos de Deus este ano; da contrição pelo mal que durante ele obramos.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra de Santo Agostinho:

“Quanto deploro, ó meu Deus, os dias deste ano, em que Vos não amei!” – Vae tempori illi qui te non amavi

Meditação para o Dia

Voltemos ainda hoje ao presépio, fonte de luz, foco de amor, paraíso de delícias. Prostremo-nos mentalmente diante de Deus Menino, entre Maria e José, e ofereçamos-Lhe, ao menos com desejo, tudo o que lhe oferecem de piedoso, de terno, de devotado, estes dois primeiros adoradores do Verbo Encarnado.

PRIMEIRO PONTO

Devoção de Maria no Presépio

A devoção de Maria nesta ocasião era um misto de alegria, de dores, de santas reflexões. Ela achava um inefável prazer em olhar para o divino Menino, em acariciá-lO, em ser por Ele acariciada, e em dizer consigo:

«É este o meu Deus, o meu Deus com o seu infinito tesouro de santidade e de graça, o meu Deus com as Suas inefáveis perfeições, que enlevam o paraíso; e este Deus é o meu filho, o meu único filho. É o Salvador do mundo, que há de converter todos os povos, e que todos os povos hão de adorar. É o Rei do céu, onde me reserva o mais belo trono. É a minha riqueza, é o amor, é a alegria do meu coração»

Oh! Porque não temos nós mais fé! Porque não amamos mais! Gozaríamos coisa semelhante na meditação, na comunhão e na visita ao Santíssimo Sacramento?

— No meio desta alegria, o coração de Maria sentia uma indizível dor em pensar, vendo a cabeça desse abençoado menino, que um dia ela seria coroada de espinhos; olhando para o Seu rosto, que ele seria esbofeteado, coberto de sangue e de escarros; beijando as Suas benditas mãos, que elas seriam trespassadas pelos cravos; envolvendo-O nas faixas, que Ele traria um dia vestidos de ignomínia; deitando-O no seu berço, que a cruz seria o Seu leito de morte. Ela não podia ver imolar um cordeiro, uma pomba, qualquer animal, sem pensar na adorável vítima que figuravam; não podia ler nas Sagradas Escrituras os oráculos dos profetas, a história de Abel morto por seu irmão Caim, Isaac imolado por seu Pai Abraão, de José vendido por seus irmãos, de Davi e de Jeremias perseguidos, da serpente de bronze, do Cordeiro pascal, sem ver em tudo isto os padecimentos e a morte do seu amado Filho; e que angústias não eram para o seu coração maternal? Todavia, no meio destas tristes previsões que lhe confirmavam o espírito profético que ela possui em perfeitíssimo grau, estava tranquila, resignada à vontade de Deus: admirável modelo das almas provadas!

— No meio destas dores e delícias, ela alimentava a sua piedade com as mais santas reflexões, recolhia preciosamente em sua alma tudo o que ouvia dizer de edificante aos anjos e aos pastores (1), e tudo o que lhe dizia o Espírito Santo a respeito de tanta pequenez em um Deus tão grande, a respeito da troca do céu pelo presépio, das magnificências da glória por humildes faixas; e estas considerações lançavam a sua alma em doces enlevos, em amorosos êxtases. Ela tomava nos seus braços o divino Menino, oferecia-O ao Pai Eterno, dizendo-Lhe:

“Olhai para nós, ó Deus, que sois o nosso protetor, e lançai os vossos olhos sobre o rosto do vosso Cristo” – Protector noster, aspice, Deus, et respice in faciem Christi tui (Sl 83, 10)

SEGUNDO PONTO

Para passar santamente de um ano para outro, devemos
adotar os sentimentos que acabamos de admirar em Maria

1.º Devemos felicitar-nos, com um grande sentimento de reconhecimento, pelos favores que Deus nos concedeu durante o ano que finda, por tantos benefícios na ordem da natureza e na ordem da graça: na ordem da natureza, conservou-nos a vida, preservou-nos de inumeráveis perigos, proveu a todas as nossas necessidades enquanto que não tratou tão favoravelmente milhares de pessoas; na ordem da graça, quantos Sacramentos, quantos ensinos, quantos exemplos, quantas santas inspirações, que não concedeu a muitas outras! Louvemos a Deus por todos estes benefícios! Te Deum laudamus.

2.° Devemos deplorar ter abusado de tantas graças, desperdiçado e empregado mal tantos instantes, contemporizado tanto com os nossos defeitos, deixando sem fruto tantos meios de salvação: que matéria para a contrição! Ó Deus, compadecei-Vos de nós! Miserere mei, Deus.

3.° Devemos refletir seriamente. Que me resta do ano que está a findar? Resta-me uma grata e consoladora, lembrança dos cuidados que me custou o bem que fiz; os cuidados passaram, a grata lembrança persiste. Resta-me uma amarga lembrança dos prazeres que experimentei na minha vida efeminada e sensual; os prazeres passaram, a amarga lembrança persiste. Resta-me o bem e o mal que fiz, destinados a ser postos na balança da justiça divina, um na bacia das recompensas, outro na bacia dos castigos. Qual prevalecerá? Se continuo a viver no ano novo do mesmo modo que no antigo, posso eu esperar o céu ao cabo da minha peregrinação? É vivendo assim que os santos se salvaram? Justo Deus, compreendo que urge que eu mude de vida! Acabou-se, converto-me! Dixit: Nunc caepi (Sl 76, 10).

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Conservabat omnia verba haec, conferens in corde suo (Lc 2, 19)

Voltar para o Índice do Tomo I das Meditações Diárias de Mons. Hamon

(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo I, p. 138-142)