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Foi no exílio que João teve a célebre visão do Apocalipse."João vosso irmão, escreve ele no princípio deste livro divino, eu, participante na tribulação, no reino e na paciência de Jesus Cristo, estive na ilha de Patmos por causa da palavra de Deus e testemunho de Jesus. - Ego Joannes frater vester, et particeps in tribulatione, et in regno et patientia in Christo Jesu, fui in insulá quae appellatur Patmos propter Verbum Dei et testimonium Jesu. Um domingo fui arrebatado em espírito, e ouvi uma voz forte como de uma trombeta" - Fui in spiritu in dominicá die, et audivi post me vocem magnam tanquam tubae (Ap 1, 9-10)Era a voz solene das revelações divinas; e chegamos agora ao ponto mais maravilhoso de nossa história. A pequena distância do porto da Scala e da antiga cidade de Patmos galga-se a montanha de São João por uma rampa íngreme e mal calçada. Passando-se a escola helênica, construída há dois séculos sobre o rochedo, e onde professores afamados atraíam então numerosos estudantes da Grécia continental e das ilhas, chega-se à uma gruta que os insulares chamam a Gruta do Apocalipse. É uma grande cela formada pelas escavações naturais da montanha, coberta pela abobada fendida do rochedo, e onde se notam os vestígios de um riacho saindo da pedra, como se costuma representar a morada dos primeiros anacoretas. São Cristódulo, fundador do convento de Patmos, fez daí uma capela cujo pórtico está ornado de pinturas antigas representando cenas do Apocalipse.
Meditação para o Dia 29 de Fevereiro
A vida da graça é o gérmen do qual a vida da glória é o desabrochar. Passamos uma a lutar, na prova, e a outra, na felicidade em triunfo. Quanto ao fundo, porém, consistem na mesma vida sobrenatural e Divina, que começa aqui na terra e se consuma no Céu. Aliás, a vida da graça é a condição indispensável da vida da glória, da qual determina e marca a medida. Deve-se, pois, desejar uma como se deseja a outra. Deus assim o quer, porque este é o fim supremo de nossa existência. Nosso Senhor se ocupa em nos perder.I
No entanto, João atingia a velhice, e não estava livre da grande tristeza de que são acometidos aqueles que Deus condena a viver, que veem desaparecer em roda de si todos os seus, e que ficam sós no mundo para deles dar o testemunho e a lembrança. São Paulo, mártir em Roma, terminara ali a sua carreira, começada, havia trinta anos no caminho de Damasco, Cursum consummavi; Pedro abraçara aquele grande companheiro no caminho do suplício, e no mesmo dia teve a honra de, por sua vez, subir à cruz de seu Mestre, no alto de uma colina de onde abençoara a Cidade e o universo. Foi igualmente nos braços de uma cruz, que André havia adormecido do sono da morte, o que era digno do irmão do príncipe dos apóstolos. Depois de Tiago o Maior, depois de Tiago o Justo, Simão oferecera em Jerusalém o sacrifício de seu sangue. Tomé, presumia-se, terminara a carreira nas Índias, depois de ter levado mais longe do que todos os outros, essa fé em Jesus que mais do que os outros lhe custara alcançar. Mais perto de João, na Frígia, em Hierápolis, no seio mesmo dessa Ásia governada pelo apóstolo, Felipe tivera um martírio glorioso. Assim, pouco a pouco haviam caído todos os irmãos, e o Senhor reconstituíra quase inteiramente no céu aquela família do cenáculo da qual dizia:Só um restava ainda. Vendo a existência de João prolongar-se desse modo, os discípulos podiam crer que ele não devia morrer, e espalhou-se essa notícia entre eles, como o próprio João o declara (1). Mas, a vida era-lhe cheia de amarguras. O apóstolo parece que só tinha vivido tanto tempo para ver um imenso desastre mais inconsolável do que todos os outros: Jerusalém já não existia. Depois de desolações que enchem de pasmo a história, Vespasiano e Tito tinham armado suas tendas na mesma colina onde o discípulo vira um dia o Mestre chorar sobre a cidade culpada, que matava os profetas. A cidade estava em ruínas, o templo era um montão de cinzas; e aqueles que puderam, fugiram naqueles dias de morte e incêndio, dispersando-se pelo mundo, e João fora informado de que, dos lugares onde vivera junto de Deus e de sua Mãe, nada mais existia."Oh! Pai, eu vos dou graças, porque de todos os que me destes, não perdi nenhum"
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Estando escrito o Evangelho, era mister fazê-lo conhecido das Igrejas cristãs; São João dizia mais tarde no Apocalipse:Esta divulgação universal devia ser em breve a do Evangelho de São João. O apóstolo começou por endereçá-la em pessoa aos fiéis da Ásia. Esse é, cremos, o fim de sua primeira Epístola. Seu Evangelho dizia: No princípio era o Verbo... A Epístola, fazendo alusão a isso, começava por estas palavras idênticas: O que foi desde o princípio, o Verbo da vida, vo-lo anunciamos. Pediram-lhe que escrevesse o Evangelho, acabava de fazê-lo; e desta satisfação dada à Igreja dizia:"Vi um anjo voar pelo meio do céu, levando o Evangelho eterno, para o anunciar aos que habitam na terra, e a toda a nação, tribo, língua e povo. Dizendo em alta voz: Temei ao Senhor e o honrai; porque chegou a hora de seu juízo. Adorai aquele que fez o céu, a terra, o mar e as fontes das águas" (1)
"Escrevemos estas coisas para que vos alegreis, e que a vossa alegria seja completa" - Et haec scribimus vobis, ut gaudeatis et gaudium vestrum sit plenum (1Jo 1, 4)
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O Evangelho de São João não era unicamente uma narrativa e uma história; era a exposição de uma teologia inspirada. Primeiro, a geração eterna do Verbo, Sua operação no mundo e nos espíritos, Sua encarnação realizada e perpetuada; depois, como explicação e razão destas maravilhas, o amor de Deus, um amor eterno, infinito, dando por si só a chave de todos os mistérios: tal é o assunto e o fundo dessa teologia, a mais admirável que se possa ler. Assim como a Bíblia começava pelo Gênesis, que é a criação do mundo; o Evangelho de São João começa pela geração do Verbo, que é o gênesis do Filho de Deus. São Boaventura faz a seguinte observação:Este nome de Verbo, Jesus Cristo não se servira dele para designar-se a Si mesmo; também João nunca o põe em seus lábios divinos no correr do Evangelho. E ele, João, e só ele, que, para adaptar-se à linguagem de alguns de seus contemporâneos, faz uso desta palavra, a fim de fazê-los compreender, e melhor do que o faziam eles, como e por quem Deus se exprime no mundo.«Moisés disse os princípios da sabedoria divina, João proclamou sua consumação» - Moysés dívinae sapientiae inchoator Joannes divinae sapientiae terminator
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A vasta coligação do mal e do erro, que acabamos de descrever, pedia um testemunho brilhante da verdade cristã e da santidade de Deus. Foi então que João escreveu seu Evangelho. O que primitivamente se chamava um Evangelho, não era um livro, era uma palavra. Jesus Cristo tinha ensinado. Seus apóstolos fizeram como Ele: não escreveram, pregaram. A palavra, inspirada diretamente por Deus, provada pelos milagres, derivada de lembrança de fonte fresca e pura, devia ser suficiente para a fundação do reino de Deus. Era este o sopro do qual dizia a Escritura, que renovaria a face da terra. Era um sopro de fogo; mas apenas um sopro. Esta palavra, no entanto, não tardaram muito em escrevê-la. Uns expuseram primeiro a doutrina conforme a necessidade dos tempos: foi o fim das Epístolas. Outros redigiram a vida mesma de Jesus: é o que conhecemos e veneramos particularmente com o nome de Evangelho. Se procuramos a razão e o caráter próprio das três primeiras narrativas, chamadas sinóticas, notaremos primeiro que foram feitas ao jeito das três grandes famílias de povos entre os quais se dividiam a supremacia dos espíritos e o império das coisas.I
O mal fez suas represálias. Travou-se grande luta contra a verdade, e Éfeso não tardou em ver cumprir-se a predição que São Paulo fizera aos Anciãos em sua última despedida:Escrevendo a seu filho Timóteo, dizia-lhe ainda:«Sei que depois da minha partida, muitos dentre vós se levantarão ensinando mentiras, com o fim de arrastar após si alguns discípulos» (At 20, 30)
Mas, como ele o temia, já «os lobos famintos tinham entrado no redil», e Paulo achava que era um dever prevenir seu discípulo para que não se perdesse nas fábulas, mitos e genealogias intermináveis, «os quais são antes próprios a promover discussões do que a edificar a obra de Deus» (1Tm 1, 4).«Guarda bem o depósito da fé que te foi confiado, fugindo às notícias profanas e às antíteses de uma ciência falsa. Foi por havê-la seguido que muitos naufragaram na fé» (2Tm 1, 14; 1Tm 6, 20)
Epistola 1 de São Paciano de Barcelona (310 - 391)
Paciano saúda o seu irmão Simproniano. I. Meu senhor, e não é uma intenção carnal, como eu estou convencido, mas sim um chamamento espiritual, o que te leva a querer saber de mim a fé da verdade católica, tu, que por teres bebido muito longe do rio, pelo que consta, afastado da fonte e da origem da Igreja principal, é que devias declarar-me quais e quão diversas são as ideias que tu segues, para apresentares qual a razão que causou a tua separação da unidade do nosso corpo, pois é preciso desnudar os membros onde se deve aplicar o remédio. Ora, tapado, por assim dizer, o seio da tua carta, não consigo ver quais os membros que eu devo curar em primeiro lugar. Com efeito são tantas as heresias desde a origem do Cristianismo, que seria preciso um grosso volume para elencar o nome de todas. Na verdade, sem contar os Judeus hereges, Dositeu Samaritano, Saduceus e Fariseus, seria uma coisa muito longa enumerar quantos surgiram nos tempos dos Apóstolos: como Simão mago, Menandro, Nicolau e outros cuja memória se perdeu. Que direi de Ebion, Apeles, Marcião, Valentino, Cerdon, que viveram na época seguinte? E, não muito afastados deles, os Catafriges e Novacianos, já para não falar nas novas seitas que são como enxames? II. Qual deles, pois, eu devo refutar em primeiro lugar? Se é isso que queres, esta carta não poderá conter os nomes de todos. Ainda assim, naquilo que escreveste, dizes que te inclinaste para os que condenam a penitência segundo a doutrina dos Friges. No entanto, meu caríssimo senhor, estes têm tantos e tão diversos erros, que neles deve cortar-se, não só este único ponto que maquinaram contra a penitência, mas também as suas muitas cabeças, como a hidra de Lerna. Em primeiro lugar, eles apoiam-se em muitos autores, pois penso que o Grego Blasto é um deles. Também Teodoto e Praxeas por vezes ensinaram os vossos. Mas os Friges mais famosos, que se fingem animados pelo espírito de Lêucio e se gloriam de ser instruídos por Próculo, seguindo Montano, Maximila e Priscila, quão enormes controvérsias levantaram acerca do dia de Páscoa, do Paráclito, dos Apóstolos, dos Profetas; e muitas outras, tal como acerca deste nome Católico e acerca do perdão que se alcança pela penitência.Paciano de Barcelona foi uma Padre da Igreja, do século IV, anterior a Santo Agostinho, vivendo entre 310 até 391 d.C. Sua Primeira Carta a Simproniano, embora pequena, é riquíssima e trata do nome «católico» e seu uso na Igreja, além de uma defesa apologética do sacramento da Penitência. Apreciem a tradução inédita feita por um excelente sacerdote, que por humildade optou pelo anonimato.