Parte III
Capítulo XXXVII
Todos sabem que não se deve desejar nada de mal, porque o desejo de uma coisa ilícita torna o coração mau. Mas eu acrescento, Filotéia, que não se deve desejar nada que é perigoso para a alma, como bailes, jogos e outros divertimentos, honras e cargos importantes, visões e êxtases; tudo isso traz muita vaidade consigo e é sujeito a muitos perigos e ilusões. Não desejes também as coisas que ainda estão para vir num futuro remoto, como fazem muitos, dissipando e cansando inutilmente o coração e expondo-o continuamente a muitas inquietações. Se um jovem ambiciona ardentemente ocupar um cargo precocemente, de que lhe poderá servir este desejo? Se uma mulher casada deseja entrar no convento: a que propósito? Se pretendo comprar a propriedade de outrem antes que ele queira ma ceder, não é isto perder o meu tempo? Se, estando doente, desejo pregar, dizer Missa ou visitar enfermos ou fazer exercícios dos que tem saúde, não são estes desejos vãos, posto que nada disso está em meu poder? Entretanto estes desejos inúteis ocupam o lugar doutros que deveria ter e que Deus manda que se efetuem, como os de ser paciente, mortificado, obediente e manso em meus sofrimentos. Mas em geral os nossos desejos se parecem com os das mulheres grávidas, que no outono desejam cerejas frescas e uvas novas na primavera.Read more