A GRANDE maioria das pessoas que vivem em países de civilização ocidental está ocupada na tarefa de ganhar. Por mais estranho que isso pareça, a moral cristã está fundada no princípio oposto, de que é melhor dar que receber. Não só a oportunidade, como o encargo de dar cumprimento a este Mandato Divino recai, principalmente, sobre aqueles de nós que vivem numa civilização que tem sido abundantemente abençoada por Deus. O rendimento dos Estados Unidos, por cabeça, é de 1.500 dólares, aproximadamente, por ano, e contudo o rendimento por cabeça de um terço da população do mundo é inferior a 50 dólares por ano, enquanto dois terços da população do mundo vivem com menos de 200 dólares por ano. Nos Estados Unidos é pago ao governo em impostos 28 dólares por cada 100 dólares. Pagamos mais de impostos do que a maior parte das pessoas ganha para se manter.
Somos, sem dúvida, uma nação que auxilia os deserdados da fortuna; temos, mesmo, dado o exemplo de amar os nossos inimigos de guerra, auxiliando a sua restauração econômica. Mas agora quero referir-me menos ao espírito nacional que ao espírito pessoal de dar. A razão por que é melhor dar que receber está em que ajuda a desprender a alma do material e temporal a fim de lhe unir o espírito de altruísmo e caridade, que é a essência da religião. Cícero disse, outrora, que «os homens em nada se parecem tanto com os deuses como quando fazem bem aos seus semelhantes». Por sua vez, Aristóteles diz que, pela mesquinhez e egoísmo, pela inveja e má vontade, os homens degeneram em brutos e tornam-se lobos e tigres uns para com os outros; mas que, pela bondade e amor, pela mútua compaixão e auxílio, se tornam deuses uns para com os outros.
A história dos judeus revela como os seus bens temporais foram consagrados ao serviço de Deus e a auxiliar os pobres. Nos melhores dias da sua história, os seus dízimos e oblatas, as suas ofertas de ação de graças e as suas ofertas espontâneas faziam-se numa escala de esplêndida munificência; não perderam nada com isso, pois estavam constantemente a agradecer a Deus as Suas abundantes bênçãos. Mesmo hoje, igual espírito de generosidade tem caracterizado este povo, não só para com os seus próprios irmãos de raça, mas também para com os protestantes e católicos.
Em mais pequena escala, verificar-se-á que a unidade de uma comunidade depende, em larga medida, dos serviços e amabilidades de um indivíduo para com o outro. A população do campo de qualquer nação do mundo é um perfeito exemplo desse altruísmo. No tempo das colheitas, os lavradores ajudam-se alternadamente uns aos outros; e, quando há uma morte na família, encontram-se sempre mãos de voluntários para apanhar os cereais e cortar o trigo.
Não há sempre o mesmo espírito nas grandes cidades, em parte devido ao anonimato das massas, e, em parte, à concorrência. Quando a maior parte das pessoas, que encontramos, são desconhecidas, há uma tendência para cada qual se isolar egoistamente do mundo exterior. Nota-se isto, particularmente, na condução de um automóvel. Há homens muito delicados em casa e amáveis para os amigos que se tornam como feras raivosas, resmungando por causa de estupidez dos outros condutores, uma vez que se encontrem atrás do volante, onde o anonimato os protege.
Dar é, realmente, um, caminho divinamente indicado para reconhecer as graças de Deus. De fato, nada temos a oferecer, seja o que for, que não tenhamos recebido; e, não obstante, Deus tem prazer em aceitar as nossas ofertas, como sinal da nossa gratidão. O egoísmo torna o próprio indivíduo o centro; o altruísmo e a caridade colocam o centro no próximo. Só pelo princípio de dar, podem ser reajustadas as desigualdades da raça humana, pode o forte auxiliar o fraco, e a paz social reinar entre os homens. Não poucos homens, quando eram pobres, tinham o coração aberto a todo o apelo à compaixão; mas, quando os bens aumentaram, prenderam mais o coração a eles. O aumento da fortuna tem um efeito peculiar na alma: intensifica o desejo de adquirir. O que é, muitas vezes, a concupiscência na juventude, é a avareza na velhice. Pudessem eles experimentar a grande alegria de dar, e correspondessem às exigências da misericórdia, e sentiriam uma viva emoção na benevolência. Se grande é o prazer de receber, maior é o prazer de dar.
Há uma história antiga acerca de um escocês, Lorde Braco, que era muito rico e avarento, e que tinha grandes depósitos de ouro e prata no seu subterrâneo. Um dia, um lavrador disse-lhe:
«Dar-lhe-ei um xelim se você me deixar ver todo o seu ouro e prata»
Braco consentiu. O lavrador deu-lhe o xelim, dizendo:
«Agora sou tão rico como você. Eu olhei para o seu ouro e prata, que é para o que eles lhe servem»
Há mais felicidade em regozijar-se com o bem dos outros, do que com o nosso próprio bem. O que recebe regozija-se com o próprio bem: o que dá, com a alegria dos outros. E sobre este desce a paz, que nada do mundo pode dar.
Voltar para o Índice do livro Rumo à Felicidade, de Fulton Sheen
(SHEEN, Dom Fulton. Rumo à Felicidade – WAY TO HAPPINESS. Tradução de Dr. A. J. Alves das Neves, pároco de São Pedro da Cova. Livraria Figueirinhas, Porto, 1956, p. 171-174)