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Descobrindo a Castidade

Descobrindo a Castidade, Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz

Salve Maria!

Sempre foi cara à Igreja a temática da Santa Pureza. Muito se escrevera e inúmeros são os exemplos deixados pelos grandes luzeiros de nossa Santa Madre Igreja. Mas bastaria-nos recordar que Nosso Senhor estima muito tal virtude a ponto de nos exortar com estas palavras: “Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus” (Mt 5,8), ou seja, nosso amado Redentor quer nos dizer que para sermos Santos é preciso viver a Castidade. E São Paulo vai nos confirmar com estas palavras: “Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação; que eviteis a impureza, que cada um de vós saiba possuir o seu corpo em santificação e honestidade, sem se deixar levar pelas paixões desregradas como fazem os pagãos que não conhecem a Deus… Deus, não nos chamou para a impureza, mas para a santidade” (1Ts 4,3-7). E quanto tem sido custoso para o católico viver a Santa Pureza nos dias atuais, não é mesmo? Sem falar nos muitos católicos que ainda possuem uma compreensão errada desta virtude? Portanto, gostaria de partilhar com vocês este livreto feito pelo Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz, da diocese de Anápolis em Goiânia e também presidente Associação Pró-Vida de Anápolis, que assim o fez pensando principalmente nos jovens e futuras famílias, investigando e aprofundando à luz das Sagradas Escrituras e do Magistério a beleza desta virtude e como ela permeia os campos da formação humana e da dignidade da pessoa humana. Além disso, ainda nos apresenta toda a realidade que fere esta virtude e como devemos ter às claras todas as ciladas oferecidas por Satanás, a fim de que não caiamos em seus embustes e argumentos disfarçados com uma roupagem atraente ou inocente. Rezemos uma Ave-Maria pelo belíssimo trabalho que este sacerdote tem feito pela Igreja e pela vida!

“A castidade, uma virtude de beleza fascinante, que nos tornará capazes de ver a Deus.

Os castos não abortam. A luta contra o aborto exige uma sólida formação para a castidade. Graças a Deus, mais e mais os jovens estão descobrindo o valor e a beleza de um namoro puro, de um matrimônio fiel, perpétuo e fecundo.

Neste livro busca-se falar aos jovens sobre a sacralidade do corpo humano, da união sexual e da vida gerada nessa união”. – O autor.

“Faço votos que a iniciativa seja um instrumento valioso e prático para a formação humana e santificação dos nossos jovens e famílias” – Dom João Wilk Bispo Diocesano de Anápolis

Sumário

A família, criada por Deus
A família redimida por Cristo
O matrimônio como sacramento
Cristo Esposo e a Igreja Esposa
Loucura ou heroísmo
O amor conjugal e a “teologia do corpo”
O corpo, templo do Espírito Santo
Família, a Igreja doméstica
Tabu: uma ideia fundamental
Os pecados contra a castidade
O namoro
A prudência
Rapazes e moças são diferentes
O pudor
A pureza e a visão de Deus
Namorar a quem e durante quanto tempo?
Os filhos: um dom de Deus
O perigo do “planejamento familiar”
O pecado da anticoncepção
Como a pílula anticoncepcional funciona
A esterilização
O aborto
A cultura da castidade

A família, criada por Deus

Diz São João Paulo II em sua Carta às Famílias que “Deus cria em virtude de sua palavra: ‘Faça-se!’” (Carta às famílias, 1994, n. 6), por exemplo: “Faça-se a luz” (Gn 1, 3).

A palavra “faça-se” encontramos no relato da criação da luz, do firmamento, do sol, da lua, das estrelas, da terra, do mar, das plantas, das aves, dos peixes e dos animais terrestres. No entanto, ao criar o homem, deparamo-nos com o plural “façamos”. Isso é notado pelo Papa.

É significativo que esta palavra de Deus, no caso da criação do homem, seja completada pelos seguintes termos:

“Façamos o homem à nossa imagem, à nossa semelhança” (Gn 1, 26) . Antes de criar o homem, o Criador como que reentra em si mesmo para procurar o modelo e a inspiração no mistério do seu ser, que já aqui se manifesta de algum modo como o “Nós” divino. Deste mistério deriva, por via de criação, o ser humano: “Deus criou o homem à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; ele os criou homem e mulher” (Gn , 27).  (São João Paulo II, Carta às famílias, 1994, n. 6)

Ora, como diz uma canção:

“Deus é único sem ser sozinho: são três amando num só coração” (Pe. Lúcio Floro – letra; Ir. Maria T. Kolling – música. Divino Espírito que sois amigo. Faixa 13 do CD Envia teu Espírito, Paulus Música)

Ao criar o homem semelhante a si, Deus disse: “Não é bom que o homem esteja só” (Gn 2, 18). À semelhança da Santíssima Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo – o homem deveria viver em comunidade. Na criação, tudo era bom, aliás “muito bom” (Gn 1, 31), menos a solidão do homem. A Bíblia narra então a criação de “uma auxiliar que lhe corresponda” (Gn 2, 18), a partir da costela do homem. Por que a partir da costela? Ouçamos a resposta de Santo Tomás de Aquino:

“Era conveniente que a mulher fosse formada da costela do homem […] para significar que entre o homem e a mulher deve haver uma união de sociedade, pois nem a mulher deve dominar o homem, e por isso não foi formada da cabeça; nem deve ser desprezada pelo homem, como se lhe fosse servilmente submetida, e por isso não foi formada dos pés” (Suma Teológica I, q. 92, a. 3, resposta)

Portanto, nem da cabeça, nem dos pés, mas da costela. Ou seja, nem dominadora, nem escrava, mas companheira.

A união entre o homem e a mulher deve ser uma união de amor. Por quê?

• Porque Deus é amor (1Jo 4, 8),
• criou-os por amor
• e chamou-os ao amor (cf. São João Paulo II, Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 1981, n. 11)

“O amor é, portanto, a fundamental e originária vocação do ser humano” (Ibidem)

Como o ser humano é corpo e alma, matéria e espírito, “o amor abraça também o corpo humano e o corpo torna-se participante do amor espiritual” (Ibidem).

O autor sagrado assim exprime a união conjugal:

“Por isso, o homem deixa seu pai e sua mãe, se une à sua mulher, e eles se tornam uma só carne” (Gn 2, 24)

Comentando este texto, Jesus diz aos fariseus:

“De modo que já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe” (Mc 10, 8)

Note-se que o homem pode deixar o pai e a mãe, mas não pode deixar a sua mulher. A união entre marido e mulher é mais estreita que união entre eles e seus pais. Ambos vêm de famílias diferentes e se unem para constituir uma nova família. Esta união indissolúvel, porque fundada no amor, é também fecunda:

“Crescei e multiplicai-vos. Enchei e dominai a terra” (Gn 1, 28)

“O amor sempre dá vida. Por isso, o amor conjugal ‘não se esgota no interior do próprio casal (…) Os cônjuges, enquanto se doam entre si, doam para além de si mesmos a realidade do filho, reflexo vivo do seu amor, sinal permanente da unidade conjugal e síntese viva e indissociável do ser pai e mãe” (Papa Francisco, Exortação Amoris Laetitia, 2016, n. 165, citando Familiaris Consortio, n. 14)

Deus, que criou o primeiro homem do limo da terra, poderia ter continuado a criar do mesmo modo os outros homens. Mas não foi assim que ele fez. Quis servir-se de um casal – um homem e uma mulher – para encher a terra de pessoas.

“Deste modo, o Criador tornou o homem e a mulher partícipes da obra da sua criação e transformou-os ao mesmo tempo em instrumentos do seu amor, confiando à sua responsabilidade o futuro da humanidade através da transmissão da vida humana” (Papa Francisco, Exortação Amoris Laetitia, n. 81)

Quanta responsabilidade para quem se casa: gerar filhos com o mesmo amor com que Deus criou o primeiro homem!

A família, ferida pelo pecado

O matrimônio, tal como foi instituído por Deus, ou seja, uma união perpétua e exclusiva entre um só homem e uma só mulher, aberta à procriação e fundada no amor, sofreu a ferida do pecado original.

Entre os descendentes de Caim encontramos Lamec, que “tomou para si duas mulheres” (Gn 4, 19), dando início à poligamia. Na própria Lei de Moisés aparece uma previsão de um homem, ao repudiar sua mulher, escrever para ela uma “ata de divórcio” (Dt 24, 2).

Quando Jesus foi interrogado pelos fariseus sobre o divórcio, ele lhes disse:

“Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas no princípio não era assim” (Mt 19, 8)

Ora, por meio do profeta Ezequiel, Deus havia prometido mudar o coração do seu povo:

“Dar-vos-ei coração novo, porei no vosso íntimo espírito novo, tirarei de vosso peito o coração de pedra e vos darei coração de carne” (Ez 36, 26)

A família redimida por Cristo

Esse “transplante de coração” ocorreria com o Batismo deixado por Jesus:

“Quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus” (Jo 3, 5)

Este novo nascimento, que ocorre a partir da água, mas com a ação do Espírito Santo, é necessário para entrar no Reino de Deus, que havia sido fechado pelo pecado de nossos primeiros pais.

Com o sacrifício de si mesmo que Jesus fez na cruz, o céu se abriu para nós.

“Um dos soldados transpassou-Ihe o lado com a lança e imediatamente saiu sangue e água” (Jo 19, 34)

O sangue derramado atesta que Jesus de fato morreu. A água significa o Espírito Santo que Jesus conquistou para nós, com a abundância de seus dons.

Podemos imaginar um rio de água saindo do peito de Jesus e descendo sobre a cabeça de cada criança que é batizada. O cristão, purificado pelo Batismo que custou o sacrifício de Cristo, recebe agora “um coração novo” e um “espírito novo” (Ez 36, 26). Livres da “dureza de coração” a que se refere Jesus, agora homem e mulher são capazes, com a graça do Espírito, de conservar o matrimônio indissolúvel e perpétuo:

“Todo aquele que repudiar sua mulher e desposar outra, comete adultério contra a primeira; e se essa repudiar seu marido e desposar outro, comete adultério (Mc 10, 11-12)”

O matrimônio como sacramento

Essa condenação radical do divórcio causou espanto nos discípulos, que lhe disseram:

“Se é assim a condição do homem em relação à mulher, não vale a pena casar-se” (Mt 19, 10)

De fato, visto como um negócio, o matrimônio é péssimo. Mais do que isso: é uma loucura. É como assinar um cheque em branco e entregar ao outro negociante, aceitando qualquer valor que ele queira escrever. Por isso diz Jesus:

“Nem todos são capazes de compreender essa palavra, mas só aqueles a quem é concedido” (Mt 19, 11)

Nem todos compreendem:

• que o matrimônio não é um negócio, mas uma aliança de amor;
• os dois se casam não por causa do bem que receberão, mas por causa do bem que darão um ao outro;
• que os dois se casam não para serem felizes, mas fazerem felizes um ao outro.

E sobretudo, nem todos compreendem que “…como Jesus veio para restabelecer a ordem inicial da criação perturbada pelo pecado, ele mesmo dá a força e a graça para viver o casamento na nova dimensão do Reino de Deus. É seguindo a Cristo, renunciando a si mesmos e tomando cada um sua cruz que os esposos poderão ‘compreender’ o sentido original do casamento e vivê-lo com a ajuda de Cristo. Esta graça do matrimônio cristão é um fruto da cruz de Cristo, fonte de toda vida cristã” (Catecismo da Igreja Católica, n. 1615).

Vejamos como São Paulo fala do matrimônio como um sinal eficaz (sacramento) do amor de Cristo pela Igreja:

Sede submissos uns aos outros no temor de Cristo.

As mulheres o sejam a seus maridos, como ao Senhor, porque o homem é a cabeça da mulher, como Cristo é cabeça da Igreja e o salvador do Corpo. Como a Igreja está em tudo sujeita a Cristo, estejam as mulheres em tudo sujeitas aos maridos.

E vós, maridos, amai vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela.

[…]

Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe e se ligará à sua mulher, e serão ambos uma só carne.

É grande este mistério: refiro-me à relação entre Cristo e a Igreja (Ef 5,21-25.31-32).

Como ensina o Catecismo, “o matrimônio entre batizados é um verdadeiro sacramento da nova aliança, pois significa e comunica a graça” (CIC, n. 1617). “É grande este mistério!” (Ef 5, 32) – diz São Paulo. Não é de admirar que nem todos o entendam.

Cristo Esposo e a Igreja Esposa

O marido tem que amar como Cristo ama e a mulher tem que amar como a Igreja ama. Qual dos dois tem amor maior: Cristo ou a Igreja? Evidentemente Cristo.

Logo, o marido, justamente por ser “cabeça”, tem um dever maior de amar.

Cristo não esperou ser amado. “Ele nos amou primeiro” (1 Jo 4, 19). Assim deve fazer o marido.

Cristo se entregou e morreu pela Igreja (Ef 5,25); assim, o marido deve dar a vida pela mulher.

Cristo é o “salvador do Corpo” (Ef 5, 23); assim, o marido deve salvar a mulher. Note-se que, para o marido, ser cabeça não é uma vantagem, mas um encargo. Os chefes devem servir:

“Aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o servo de todos” (Mc 10, 44).

E para a mulher, a submissão não é uma desonra. Assim explica Costanza Miriano:

“A submissão de que fala Paulo é um presente, livre como qualquer presente, senão seria uma taxa. É um presente espontâneo de si, feito por amor” (Costanza Miriano, jornalista e escritora italiana, católica e mãe de quatro filhos, publicou em 2011 um livro dirigido às mulheres, que se tornou best seller: “Sposati e sii
sottomessa” – Casa-te e sê submissa. No ano seguinte, publicou “Sposala e muori per lei” – Casa-te e morre por ela, dedicado desta vez aos homens.

Segundo o Papa São Paulo VI (Encíclica Humanae Vitae, 1968, n. 9), o amor conjugal é:

• plenamente humano, quer dizer, ao mesmo tempo, espiritual e sensível.
total, quer dizer, sem reservas e cálculos egoístas. Quem ama verdadeiramente o próprio consorte não o ama somente por aquilo que dele recebe, mas por ele mesmo, por poder enriquecê-lo com o dom de si próprio.
fiel e exclusivo até a morte.
fecundo: não se esgota na comunhão entre os cônjuges, mas está destinado a continuar-se suscitando novas vidas.

Uma religiosa casa-se com um marido perfeito: Cristo. Nunca será traída por ele e nunca ficará viúva. É uma mulher fadada a ser feliz. O mesmo se pode dizer do padre, que se casa com uma esposa perfeita: a Igreja. É um homem fadado à felicidade.

No entanto, aqueles que não têm vocação sacerdotal nem religiosa, mas matrimonial, casam- se com pessoas imperfeitas, ou seja, que têm defeitos. Alguns defeitos já são conhecidos, outros serão conhecidos depois e ainda outros serão adquiridos depois. E apesar disso eles prometem ser fiéis um ao outro “na alegria e na tristeza, na saúde e doença”, amando-se e respeitando-se todos os dias de suas vidas. E essa fidelidade é prometida incondicionalmente: nem se o outro for infiel a mim, eu estou autorizado a ser infiel a ele! Ao casar-me, devo contar com a hipótese de ser fiel àquele que me abandonou, de amar aquele que deixou de amar-me e de oferecer a Deus minha solidão pela conversão daquele que me traiu.

Loucura ou heroísmo

Diante de tamanha exigência do matrimônio cristão, somente dois tipos de pessoas se atrevem a se casar: os loucos e os heróis.

O louco casa-se para ser feliz, na ilusão de que a outra pessoa, limitada e imperfeita, poderá saciar a ele, que foi criado para o infinito e a eternidade.

O herói renuncia a si mesmo e casa-se para fazer o outro feliz. Imitando a Cristo crucificado, esvazia-se de tudo, até da água e do sangue do seu coração. Não pensa em ser servido, mas em servir e dar a vida (cf. Mc 10, 45).

Obviamente, os cônjuges são chamados não à loucura, mas ao heroísmo. Não é à toa que Cristo elevou o matrimônio à dignidade de um sacramento, ou seja, um sinal sensível que comunica a graça que significa. Somente com a graça divina, os cônjuges podem ser fiéis a tão sublime vocação e missão.

O amor conjugal e a “teologia do corpo”

São João Paulo II tornou-se célebre pelas suas 133 catequeses semanais sobre o amor humano no plano de Deus, que passaram a ser conhecidas como
catequeses da teologia do corpo.

“O corpo, que exprime a feminilidade ‘para’ a masculinidade e, vice-versa, a masculinidade ‘para’ a feminilidade, manifesta a reciprocidade e a comunhão das pessoas. Exprime-a por meio do dom como característica fundamental da existência pessoal. […] A masculinidade-feminilidade – isto é, o sexo – é o sinal original de uma doação criadora e de uma tomada de consciência por parte do homem, varão e mulher, de um dom vivido, por assim dizer, de modo original. Tal é o significado com que o sexo entra na teologia do corpo” (Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino. Campinas, SP: Ecclesiae, 2014. Catequese 15, 09 jan. 1980, p. 73)

“Aqueles que procuram a realização da própria vocação humana e cristã no matrimônio, são chamados, antes de mais, a fazer desta ‘teologia do corpo’, cujo ‘princípio’ encontramos nos primeiros capítulos do livro do Gênesis, o conteúdo da própria vida e do próprio comportamento. Com efeito, quanto é indispensável, no caminho desta vocação, a profunda consciência do significado do corpo, na sua masculinidade e feminilidade! Quanto é necessária uma consciência precisa do significado esponsal do corpo, do seu significado gerador…!” (Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino.  Catequese 23, 02 abr. 1980, p. 116)

O corpo, templo do Espírito Santo

Na sua teologia do corpo, São João Paulo expõe a doutrina bíblica do corpo humano “comprado” por Cristo e tornado “templo” do Espírito Santo como motivos sobrenaturais para fugirmos dos pecados “contra o corpo” (contra a castidade).

“‘Não sabeis, porventura, que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós, que recebestes de Deus, e que não vos pertenceis a vós mesmos?’ – pergunta Paulo aos Coríntios (1 Cor 6, 19), depois de ter esclarecido com muita severidade sobre as exigências morais da pureza. ‘Fugi da imoralidade. Qualquer pecado que o homem comete é exterior ao seu corpo; mas aquele que pratica a imoralidade peca contra o seu próprio corpo’ (1 Cor 6, 18).

[…]

Quando o Apóstolo escreve: ‘O vosso corpo é templo do Espírito Santo que habita em vós, que recebestes de Deus’ (1 Cor 6, 19), pretende indicar ainda uma outra fonte da dignidade do corpo, precisamente o Espirito Santo, que é também fonte do dever moral que deriva de tal dignidade.

[…]

‘Fostes comprados por um grande preço’ (1 Cor 6, 20). O fruto da redenção é de fato o Espírito Santo, que habita no homem e no seu corpo como num templo” (Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino. Catequese 56, 11 fev. 1981, p. 251-253)

Por fim, a presença do Espírito Santo nos dá a certeza da ressurreição de nosso corpo, pois foi ele que vivificou o corpo de Cristo:

“Se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vós, aquele que ressuscitou Cristo Jesus dentre os mortos dará vida também a vossos corpos mortais, mediante o seu Espírito que habita em vós (Rm 8,11)” (Citado pelo CIC, n. 989)

Família, a Igreja doméstica

“Cristo quis nascer e crescer no seio da Sagrada Família de José e Maria. A Igreja não é outra coisa senão a ‘família de Deus’” (CIC, n. 1655)

E a família constituída pelo sacramento do matrimônio é uma espécie de “Igreja doméstica”, onde é necessário que “os pais sejam para os filhos, pela palavra e pelo exemplo, os primeiros mestres na fé” (Concílio Vaticano II, Constituição Dogmática Lumen Gentium, n. 11).

Concluo transcrevendo as palavras de Dom Manoel Pestana Filho, saudoso Bispo de Anápolis, escritas na capa da pasta do VIII Congresso Teológico 2004 “A Família Cristã: célula-mãe de uma sociedade melhor”:

Santificar a família é renovar a Igreja e o mundo

A família é hoje o grande campo de batalha entre a vida e a morte, a verdade e a mentira, o bem e o mal. Salvar a família é assegurar o futuro. Santificá-la é renovar a Igreja e o mundo.

Porque é a família que constrói os homens, os cristãos e os santos. Tudo o que se faz pela família, ainda é muito pouco; tudo o que se fizer sem a família é quase nada.

Antes do princípio era a FAMÍLIA divina: Pai, Filho e Espírito Santo.

No momento da criação, a FAMÍLIA humana: Adão e Eva, uma só carne, fonte da vida.

No tempo da Redenção, a FAMÍLIA humano-divina: Jesus, Maria, José, santidade e graça.

(O Congresso ocorreu nos dias 31 de julho e 1º de agosto de 2004, no Salão da Catedral Bom Jesus, Centro, Anápolis (GO). Na época, Dom Manoel já era Administrador Apostólico, e esperava a posse do atual Bispo Dom João Wilk)

E foi para promover e salvar a família que escrevi o que segue sobre a castidade.

Tabu: uma ideia fundamental

Os nativos da Polinésia chamavam de tabu a tudo aquilo que era sagrado e intocável. A vida era um tabu. A união sexual em que a vida é gerada era um tabu.

Tabu era uma palavra com sentido positivo. Significava o reconhecimento pelo homem da soberania de Deus em sua vida.

Lamentavelmente essa palavra passou para a língua inglesa (taboo) e depois para a portuguesa (tabu) com um sentido pejorativo. Tabu passou a significar qualquer coisa proibida sem motivo, simplesmente por costume ou por preconceito.

Nesse sentido, diz-se que o sexo ainda é um tabu, que precisa ser quebrado. Os chamados “educadores sexuais” defendem a quebra do tabu do sexo como um progresso para a sociedade. Para eles, não há motivo para considerar o sexo como sagrado. Por que então guardar a virgindade antes do matrimônio? Por que, depois do matrimônio, ser fiel ao cônjuge? Por que não entregar o próprio corpo à prostituição, como fonte de renda?

Os “sexólogos” modernos têm muito a aprender com os nativos da Polinésia. O sexo é realmente um tabu. Não para ser quebrado, mas para ser cultivado. Cultivar a sacralidade do sexo é cultivar a sacralidade da vida. O sexo é tão sagrado quanto a vida por ele gerada.

Dos mandamentos dados por Deus a Moisés, o quinto manda respeitar a vida: “Não matar”. O sexto manda respeitar o sexo: “Não pecar contra a castidade”.

O sexo e a vida estão intimamente ligados. Os parlamentares que defendem a profanação do sexo (por exemplo, a legalização do “casamento” de homossexuais, o reconhecimento da “profissão” de prostituta…) são os mesmos que defendem a profanação da vida (por exemplo, o aborto e a eutanásia).

O que é a castidade?

Castidade é a virtude que regula o instinto sexual.

Que é instinto sexual?

É a atração natural que existe entre o sexo masculino e o sexo feminino.

Sexo vem do latim “secare”, que significa cortar. A palavra sexo indica que o ser humano está “cortado” em duas partes, diferentes e complementares: o homem e a mulher. Um foi feito para o outro e completa-se no outro.

“Por isso um homem deixa seu pai e sua mãe, se une à sua mulher, e eles se tornam uma só carne” (Gn 2, 24)

O instinto sexual leva o homem e a mulher a unirem seus corpos. Esta união, em que os dois se tornam uma só carne, chama-se união sexual.

Para que serve a união sexual?

  • para que o homem e a mulher se completem mutuamente e exprimam seu amor;
  • para que ambos possam procriar, gerar novos seres humanos, transmitir a vida.

Os animais irracionais guiam-se unicamente pelo instinto. Na época do cio, o cachorro e a cadela acasalam-se, mais parecendo que estão se agredindo. Ocorrendo gravidez, a cadela dá à luz uma ninhada. No entanto, a fêmea, o macho e os filhotes não formam uma família. Não existe compromisso de fidelidade. No próximo cio, podem acasalar-se com outros animais. E pode haver o acasalamento entre irmãos, entre mãe e filhote ou entre pai e filhote.

O homem tem também o instinto sexual, mas tem a razão que os outros animais não têm. É a razão que deve governar o instinto.

Um exemplo análogo: tanto o homem quanto os animais têm o instinto de se alimentar. O animal, ao ver o alimento, dirige-se cegamente a ele para devorá-lo. Uma pessoa, ao contrário, ao ver um bolo na vitrine de uma confeitaria, sabe que não pode roubá-lo pelo simples fato de sentir apetite. A razão lhe diz que não é lícito apropriar- se do alheio. De modo semelhante, o homem, embora sinta fome, sabe esperar a hora das refeições. E durante as refeições, sabe guardar as boas maneiras.

Voltemos ao caso do instinto sexual. Embora o homem sinta atração pela pessoa do outro sexo, sabe que só depois do casamento poderá unir-se ao corpo dela. A razão ordena esperar. Depois de casado, embora ele sinta atração por várias pessoas do outro sexo, sabe que só poderá unir-se ao corpo de seu cônjuge. A razão o ensina que após o casamento forma-se a sociedade conjugal, composta de marido e mulher, que exige fidelidade e perpetuidade, e que deve ser aberta à procriação. Depois que os filhos são gerados, os pais entendem que é sua missão educá-los.

Quem é chamado à castidade?

Todo ser humano é chamado à castidade. Não há outra escolha: ou somos castos ou nos nivelamos aos quadrúpedes.

Quem zomba daquele que é casto é um fraco que zomba do forte, é um derrotado que zomba do vencedor.

É a castidade que faz os namorados esperarem a hora do casamento, para só depois unirem seus corpos.

É a castidade que faz os casados serem fiéis um ao outro, evitando a união sexual com um terceiro.

É a castidade que faz alguns, como os religiosos, renunciarem para sempre à união sexual “por causa do Reino dos Céus” (Mt 19, 12).

Os pecados contra a castidade

Toda vez que o homem deixa de regular seu instinto sexual segundo a razão, peca contra a castidade. Qualquer pecado contra a castidade é chamado luxúria.

Há várias espécies de luxúria: a fornicação, o adultério, o estupro, o incesto, a prostituição, a pornografia, a masturbação, o homossexualismo, a sodomia e a bestialidade.

Fornicação

É a união sexual entre um homem e uma mulher solteiros.

Por que ela é pecado?

Porque se eu sou solteiro, o corpo do outro não me pertence. Ao unir-me ao corpo dele, estou roubando.

Mas a fornicação não é um roubo qualquer. Não é o roubo de um dinheiro, de um relógio, de um automóvel… É o roubo do corpo de uma outra pessoa.

E qual é o preço do nosso corpo?

Vejamos o que diz São Paulo:

“Ou não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que está em vós e que recebestes de Deus?… e que, portanto, não pertenceis a vós mesmos? Alguém pagou alto preço pelo vosso resgate; glorificai, portanto, a Deus em vosso corpo” (1 Cor 6, 19-20).

Quem pagou um alto preço pelo nosso corpo? Cristo.

E qual foi o preço? O seu sangue derramado na cruz.

Logo, o preço do nosso corpo é o sangue de Cristo.

Ao praticamos a fornicação, estamos roubando algo precioso.

São Paulo disse, no texto acima, que nosso corpo é templo do Espírito Santo. Quando foi que o Espírito Santo passou a habitar em nós? No dia do nosso Batismo.

A fornicação é, portanto, o roubo de algo sagrado.

Imagine que alguém entrasse em uma igreja, quebrasse o altar, arrombasse o sacrário e jogasse hóstias consagradas pelo chão. Tal pessoa cometeria um sacrilégio.

A fornicação é parecida com um sacrilégio. Ela é a profanação de um templo do Espírito Santo. Por isso, diz-nos São Paulo:

“Fugi da fornicação. Todo outro pecado que o homem cometa, é exterior ao seu corpo; aquele, porém, que se entrega à fornicação, peca contra o próprio corpo” (1 Cor 6, 18)

Mas você poderia perguntar: não há outros pecados contra o nosso corpo? Não pecamos contra o nosso corpo se mutilamos um órgão que está sadio, se arriscamos sem necessidade a própria vida, se não cuidamos de nossa higiene e nossa saúde, se nos envenenamos com drogas…? Tudo isso não é pecado contra o nosso corpo? Por que São Paulo fala com tanto rigor contra a fornicação?

Porque a fornicação profana algo de especialmente sagrado em nosso corpo: a função de transmitir a vida. Ela profana a união sexual onde a vida é gerada. Ela destrói o amor que deveria haver em tal união. Por isso ela ofende tanto a Deus.

Adultério

O adultério é a união sexual entre uma pessoa casada e outra, do outro sexo, que não seja o seu cônjuge.

O adultério tem tudo de mal que a fornicação tem, e algo mais: a traição do cônjuge.

O adúltero, além de estar profanando o próprio corpo e o corpo de seu cúmplice, está violando o compromisso que fez, ao casar-se, de ser fiel por toda a vida ao seu cônjuge.

Estupro

Estupro é o pecado de forçar violentamente o outro e unir-se ao seu corpo. Além de ter todo o mal da fornicação (ou do adultério), o estupro tem o agravante da violência.

Prostituição

Prostituição é a oferta do próprio corpo para a união sexual em troca de dinheiro. Aquele que se prostitui faz do seu corpo sagrado uma simples mercadoria.

Incesto

Incesto é a união sexual entre um homem e uma mulher da mesma família. Por exemplo: entre irmão e irmã, entre pai e filha, entre mãe e filho.

O incesto é contrário ao respeito natural devido aos parentes. Os criadores de gado sabem que não devem deixar cruzar os filhotes da mesma cria. Se eles se acasalarem, terão grande chance de gerar animais defeituosos. O mesmo acontece com os seres humanos.

Para preservar a santidade da família e o respeito mútuo, os familiares não podem permitir a união sexual entre si. É bem diferente (e tem que ser diferente) o amor que um jovem tem por sua irmã e o amor que ele terá por aquela que for sua esposa.

Pornografia

Pornografia é a exibição pública da união sexual ou das partes do corpo ligadas a essa união. Tal pecado viola a intimidade e a sacralidade da união dos esposos.

As revistas e os filmes pornográficos fazem com que a união sexual, ao invés de ser expressão de amor e fonte de santificação, seja ocasião de pecado para aqueles que a presenciam.

O pecado de levar os outros ao pecado chama-se escândalo. Jesus foi muito severo ao condenar os escandalosos:

“Caso alguém escandalize um destes pequeninos que creem em mim, melhor seria que lhe pendurassem ao pescoço uma pesada mó (pedra de moinho) e fosse precipitado nas profundezas do mar. Ai do mundo por causa dos escândalos! É necessário que haja escândalos, mas ai do homem pelo qual o escândalo vem!” (Mt 18, 6-7).

“As autoridades civis devem impedir a produção e distribuição de materiais pornográficos” (CIC, n. 2354)

Masturbação

A masturbação consiste em procurar prazer solitariamente, causando excitação nos próprios órgãos sexuais. Tanto no homem quanto na mulher, a masturbação é pecado. Por quê?

Porque a excitação sexual foi colocada por Deus na natureza como preparação e início da união sexual. O prazer não é pecado, mas ele só pode ser gozado num ato de doação dos corpos de duas pessoas unidas em matrimônio.

Buscar o prazer pelo prazer, fora de uma união de amor com uma pessoa do outro sexo, é fazer do próprio corpo um objeto, um brinquedo, um instrumento.

A masturbação é um contrassenso. Quando uma mulher pratica masturbação, seu organismo produz um líquido que lubrifica a vagina, preparando-a para uma relação sexual que não ocorrerá. Quando um homem pratica masturbação, seu organismo produz espermatozoides que deveriam ser lançados no organismo feminino. No entanto, como tal excitação é provocada fora de uma união sexual, as sementes da vida (os espermatozoides) são simplesmente jogadas fora.

Pode-se perceber que a masturbação é contrária à natureza e a Deus, criador da natureza.

Homossexualismo

O homossexualismo é a união carnal entre duas pessoas do mesmo sexo.

Se for praticada entre dois homens recebe o nome de pederastia.

Se for praticada entre duas mulheres recebe o nome de lesbianismo.

Observe que, ao falar de homossexualismo, eu usei a expressão “união carnal”, e não “união sexual”. Por quê?

Porque para haver união sexual é preciso que haja dois sexos, diferentes e complementares.

O corpo do homem não foi feito para se unir ao de outro homem, nem o corpo da mulher foi feito para se unir ao de outra mulher.

Na falta de órgãos sexuais complementares (o pênis e a vagina), os homossexuais unem-se através do ânus ou da boca. Ora, a boca pertence ao aparelho digestivo e o ânus tem evidentemente função excretora!

Logo, a união carnal de duas pessoas do mesmo sexo é uma grosseiríssima caricatura da união sexual, tal como foi querida por Deus e inscrita na natureza. Não se trata de uma verdadeira união “sexual”. Falta a abertura para a geração de uma nova vida e a complementação mútua homem-mulher.

O homossexualismo é um pecado particularmente grave. Mais grave que a fornicação e o adultério. Por quê?

Porque tanto a fornicação quanto o adultério não ferem a natureza. Em tais pecados, o ato sexual é praticado naturalmente. Por que então são pecados? Não por causa do ato em si, mas por causa das circunstâncias em que ele é praticado.

Dois namorados que praticam a fornicação cometem pecado. Por quê? Porque tal ato, que em si é natural, é praticado na hora errada: antes do matrimônio. É a circunstância de tempo (quando?) que faz da fornicação um pecado.

Um homem casado que pratica adultério comete pecado. Por quê? Porque tal ato, que em si é natural, é praticado com a pessoa errada: uma mulher que não é sua esposa. É a circunstância de companhia (com quem?) que faz do adultério um pecado.

Já no caso do homossexualismo, não é uma circunstância externa que torna o ato pecaminoso. O próprio ato de homossexualismo é em si mesmo contrário à natureza. Por isso, ele é particularmente grave.

Sodomia

Sodomia é a união carnal feita através do ânus. Pode ser praticada entre dois homens (neste caso trata-se do pecado de homossexualismo) ou entre um homem e uma mulher.

Sodomia vem de Sodoma, uma cidade cujos habitantes cometiam tal pecado. Nela morava o justo Lot, que era sobrinho de Abraão. Disse Deus:

“O grito contra Sodoma e Gomorra é muito grande! Seu pecado é muito grave!” (Gn 18, 20)

Deus resolveu então destruir a cidade. Mas antes enviou dois anjos à casa de Lot a fim de que ele e sua família fossem salvos. Quando os anjos entraram na casa de Lot, todo o povo se aproximou. Chamaram Lot e lhe disseram:

“Onde estão os homens que vieram para tua casa esta noite? Traze-os para que deles abusemos” (Gn 19, 5).

Os anjos conduziram Lot, sua esposa e suas filhas para fora da cidade. Então Deus fez cair fogo do céu sobre Sodoma e Gomorra.

A sodomia é pecado, mesmo se praticada entre um homem e uma mulher? Sim, pois é contrária à natureza. O corpo do homem une-se naturalmente ao da mulher através do pênis e da vagina. Qualquer outro tipo de “união” é antinatural (por exemplo, através da boca).

E se o homem e a mulher forem casados? O pecado permanece. Pois o matrimônio dá a cada um dos cônjuges o direito ao corpo do outro, mas não o direito de abusar do corpo do outro.

O corpo humano é sagrado, seja antes seja depois do matrimônio.

Bestialidade

Bestialidade vem do latim “bestia” (animal). É a união carnal de um ser humano com um animal. Também é um pecado gravíssimo, por ser contrário à natureza.

O namoro

Você já sabe que a vida é sagrada. E como toda vida é gerada em uma união sexual, aprendeu que a união sexual também é sagrada.

Ora, a união sexual só pode ocorrer dentro de uma família. Por isso, a família também é sagrada. Ela é o “santuário da vida” (São João Paulo II, Encíclica Evangelium Vitae, n. 6).

Mas a família tem origem no matrimônio, que é um contrato (para os cristãos, um sacramento) em que o homem e a mulher doam mutuamente seus corpos para sua complementação mútua e a transmissão da vida. Por isso, o matrimônio também é sagrado.

Mas o matrimônio exige uma preparação. Pois, antes de doar os corpos, é preciso aprender a doar as almas. Tal preparação para o matrimônio chama-se namoro.

Em resumo:

A vida é sagrada.
A união sexual é sagrada.
A família é sagrada.
O matrimônio é sagrado.
O namoro é sagrado.

O respeito pela vida começa pelo respeito ao namoro. Se você, jovem, considera a vida sagrada, demonstre isso namorando de forma sagrada.

Para que existe o namoro?

O namoro existe para conhecer não o corpo, mas a alma do outro.
O namoro existe para eu doar não meu corpo, mas minha alma ao outro.

O conhecimento e a união dos corpos só virão depois do casamento.

Alguém poderia fazer uma objeção: antes de se unirem para sempre um ao outro pelo matrimônio, os namorados não deveriam experimentar o corpo alheio através da união sexual? Por que os namorados não podem fazer uma experiência?

Para responder a essa pergunta, gostaria de contar uma anedota.

Um chinês, chamado Shen-Lao, chegando ao Brasil, admirou-se com certos palitos que os vinham dentro de uma caixinha com cerca de quarenta
unidades. As pessoas abriam a caixa, tiravam um palito e o atritavam contra
uma lixa lateral. Para sua surpresa, os palitos tornavam-se luminosos e produziam calor.

A admiração de Shen-Lao foi tanta, que ele resolveu enviar uma amostra de tais palitos a seu amigo Lao-Shen, que havia ficado na China. Escreveu-lhe uma carta dizendo:

Amigo Lao-Shen.

Envio-lhe invenção brasileira chamada palito de fósforo. Abra a caixa, pegue um palito e risque-o contra a lixa que está do lado da caixa. Ele se acenderá, produzindo luz e calor.

Saudações.
Shen-Lao.

Tempos depois, Shen-Lao recebeu de seu amigo a seguinte resposta:

Amigo Shen-Lao.

Sinto muito. Invenção brasileira não funciona. Palitos de fósforo não acendem.

Saudações.
Lao-Shen.

Shen-Lao ficou intrigado com essa carta, e escreveu de volta:

Amigo Lao-Shen.

Impossível aquilo que você disse! Invenção brasileira funciona! Palitos de fósforo acendem! Experimentei todos eles antes de lhe enviar…

Na história acima, Lao-Shen não havia conseguido acender os palitos porque eles já haviam sido experimentados por Shen-Lao.

Há certas coisas nesta vida que não podemos experimentar antes de usar. Uma delas é o palito de fósforo.

Agora pergunto eu: nosso corpo vale ou não vale mais que um palito de fósforo?

Os namorados apressados, que fazem “experiência” do corpo alheio antes do matrimônio, só conseguem estragar o namoro e o matrimônio.

Nosso corpo é muito valioso para ser objeto de “experiências”.

O que é pecado durante o namoro?

Para os namorados, é pecado a prática da relação sexual. Tal pecado, como já vimos, tem um nome: chama-se fornicação.

Mas também são pecados todos os atos que causam o desejo da fornicação. Em outras palavras, os abraços, beijos, carícias que provocam excitação são todos pecaminosos. Só isso? Não. Jesus disse, para espanto da multidão, que até o olhar libidinoso já é pecado:

“Ouvistes o que foi dito: ‘Não cometerás adultério’. Eu, porém, vos digo:todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso, já cometeu adultério com ela em seu coração” (Mt 5, 27-28)

Tratando-se de namorados, a palavra “adultério” deve ser trocada por “fornicação”, uma vez que ambos são solteiros. Assim, se os namorados olham (apenas olham!) um para o outro com desejo libidinoso, já estão cometendo fornicação em seu coração.

Há certos contatos físicos que são intrinsecamente excitantes. Por exemplo: os abraços agarrados e o beijo na boca, que há décadas a televisão apresenta como normal aos nossos jovens.

A menos que os namorados estejam doentes, o beijo na boca e os abraços agarrados causam excitação. E a excitação provocada durante o
namoro é pecaminosa, porque ela já é preparação e início da união sexual.

Uma história de namorados

Dois jovens procuram o padre preocupados. Dizem:

“Não sabemos por que, mas estamos quase praticando a relação sexual”

O sacerdote responde:

“Eu sei por que: vocês não estão namorando santamente”

Os dois protestam em coro:

“Estamos sim, padre”

O padre replica:

“Vocês se beijam na boca? Vocês dão abraços agarrados?”

Os dois baixam a cabeça em silêncio.

O sacerdote pergunta ao rapaz:

“De que fruta você gosta mais?”

O rapaz responde:

“Maçã”

“Imagine – prossegue o padre – que eu aproximasse de sua boca uma maçã bonita, grande, vermelha e brilhante, de modo que suas glândulas salivares começassem a funcionar. Quando você estivesse cheio do desejo de comê-la, suponha que eu a afastasse de você dizendo: ‘A maçã não é sua! Você não pode comê- la! ’ Se eu fizesse isso, você teria razão de protestar dizendo: ‘Se eu não posso comer a maçã, então por que o senhor provocou em mim o desejo de comê- la?’. E agora eu pergunto aos dois: ‘Se vocês são solteiros, se o corpo de um não pertence ao outro, se vocês não podem praticar a união sexual, por que então praticam atos que provocam o desejo dessa união?”.

Uma história de motorista

Certo jovem entrou no carro de seu pai pela porta esquerda e sentou-se à frente do volante. Fechou a porta, atou o cinto de segurança e deu a partida no motor. Depois de alguns minutos, quando o motor já estava quente, ele desengatou o freio de mão, pisou na embreagem com o pé esquerdo e, com a mão direita, engrenou a primeira marcha. Em seguida, pisou no acelerador com o pé direito e foi lentamente retirando o pé esquerdo da embreagem.

Foi então que ele levou um susto. Colocou as duas mãos na cabeça e gritou:

— O carro está andando! Socorro!

A história é doida. Se ele não podia andar no carro (porque o seu pai o havia proibido), por que então fez todo aquele ritual? O que ele esperava que acontecesse?

— Eu esperava que, depois de fazer tudo o que fiz, o carro não andasse.

Ora, depois de tudo o que ele fez, o carro só não andaria se estivesse enguiçado. Automóveis normais, depois de tudo o que esse jovem fez, andam.

Da mesma forma, organismos normais, sadios, depois que se entregam ao beijo na boca e aos abraços agarrados, sentem excitação. O corpo se prepara para a relação sexual e quase exige que ela se complete, como se dissesse à mente: “se você quer causar excitação em mim, então leve o ato até o fim”. Nosso organismo cobra coerência.

É incoerente iniciar uma tarefa que não se poderá completar. Assim,

❖ é incoerente aproximar da boca uma maçã que eu não poderei comer;
❖ é incoerente esquentar o motor de um carro no qual eu não tenho permissão de andar;
❖ é incoerente abraçar e beijar um corpo que não me pertence, com o qual não tenho o direito de praticar a união sexual.

O cuidado com o incêndio

Certamente você já deve ter ido a algum posto de gasolina. Diga-me: você já viu placa com os dizeres “FUME POUCO” ou “ACENDA POUCAS FAÍSCAS”?

Acredito que não. Você deve ter visto frases como “NÃO FUME” ou “NÃO PRODUZA FAÍSCAS”. Pois, para causar um incêndio em um combustível, não é preciso muita coisa: basta uma centelha.

O instinto sexual é como um combustível. Pouca coisa é preciso para que ele produza um verdadeiro incêndio e leve a pessoa à loucura. Assim, todo cuidado é pouco.

Há namorados que dizem:

— Nós nos beijamos na boca, mas poucas vezes; ou então
— Nós nos beijamos na boca, mas o beijo dura muito pouco tempo;
ou então
— Nós nos beijamos na boca, mas tomamos cuidado para encostar apenas os lábios, e não a língua.

Tudo isso é ridículo. Ou os namorados separam os corpos – para poderem unir as almas – ou então se entregam de vez à união carnal. Não podem ficar em cima do muro.

Convém lembrar aqui a advertência de Jesus:

Vigiai e orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca (Mt 26, 41)

Como conhecer a alma do outro?

Você já aprendeu que o namoro existe para conhecer não o corpo, mas a alma do outro. Como se conhece a alma de alguém? Conversando. O namoro é fundamentalmente um diálogo.

Durante esse diálogo, o contato físico costuma atrapalhar o conhecimento das almas.

Imagine uma cena que, infelizmente, é muito comum:

Dois namorados, apesar de serem batizados e, portanto, filhos da luz (Ef 5,8), procuram um lugar escuro.

Procuram um lugar isolado, onde ninguém os possa ver, pois eles sabem que o que pretendem fazer é vergonhoso.

Entregam-se a abraços e beijos, mais parecendo que querem devorar um ao outro.

Pergunto: nessa triste cena de agarramento, os dois estão se conhecendo interiormente?

Claro que não. O instinto sexual está falando tão alto, a paixão está gritando tanto, o corpo está de tal forma excitado, que a alma é incapaz de conhecer e ser conhecida. O agarramento dos corpos faz com que as almas se distanciem.

Pergunto: os dois estão se amando?

Claro que não. Pois ninguém ama aquilo que não conhece. Se eles não se permitem conhecer, não conseguem amar. Se um disser ao outro “eu amo você”, estará mentindo.

Eles poderiam dizer sim: “eu gosto de você”. Gostar é bem diferente de amar. Se você gosta de uma coxinha de galinha, o que faz com ela? Come e, depois de saciado, joga fora o osso.

Assim, os dois jovens em atitude de agarramento podem dizer que gostam um do outro. Ou seja, querem extrair do corpo alheio o máximo de prazer, e depois jogar fora o bagaço.

Será que se pode chamar a isso de amor? Se, nessa triste cena, os dois não estão se conhecendo, nem se amando, será que estão se santificando?

Claro que não. Ao contrário, estão pecando contra a castidade. E será por meio de um pecado que eles se prepararão para algo tão sagrado quanto o matrimônio?

Para que serve um “namoro” em que os dois não se conhecem, não se amam e não se santificam? Serve apenas para se jogar fora.

O verdadeiro namoro, em que as almas se conhecem em preparação para o matrimônio, deve ser praticado:

  • em lugares claros, uma vez que os namorados, sendo cristãos, são filhos da luz (Ef 5,8);
  • na presença de outros (pelo menos uma terceira pessoa), pois nada há para esconder;
  • com um devido distanciamento dos corpos;
  • com uma oração inicial e um exame de consciência final.

Prova de amor

O que você acha: os namorados podem ou não podem pedir prova de amor um ao outro?

Não só podem como devem. O namoro é o tempo próprio para se provar o amor.

Porém, o amor não se prova:

— nem pelos abraços,
— nem pelos beijos,
— muito menos pela relação sexual.

Tudo isso os animais também fazem.

O verdadeiro amor se prova:

— pelo tempo,
— pela distância,
— pelo sacrifício.

Imagine o seguinte diálogo entre namorados que desejam provar que se amam.

— Você me ama?
— Amo.
— Então vamos esperar. Pois o verdadeiro amor se prova pelo tempo.
— Você me ama?
— Amo.
— Então vamos separar nossos corpos. Pois o verdadeiro amor resiste à distância.
— Você me ama?
— Amo.
— Então vamos nos sacrificar. Pois o verdadeiro amor se prova pelo sacrifício.

Suponhamos que o outro dissesse:

— Meu amor por você é tão grande que eu não aguento esperar, não consigo guardar distância, não suporto sacrificar-me. Eu quero você aqui e agora!

O primeiro, então, poderia replicar:

— Basta! Você não me ama. Você é apenas um animal na época do cio. E eu não quero casar-me com um animal.

Até onde posso ir?

Depois de ter aprendido que o beijo na boca é pecado, que o abraço agarrado também é pecado, você pode ter-se perguntado: que tipo de contato físico não é pecado durante o namoro? Ou então: até onde eu posso aproximar-me do corpo do outro sem cometer pecado?

Essa pergunta não se faz. Imagine que um filho perguntasse a um policial o número exato de pancadas que poderia dar em sua mãe sem ser preso. Só perguntaria isso quem não amasse a mãe. Quem a amasse perguntaria outra coisa: “O que devo fazer para agradar minha mãe ao máximo?”.

Assim, os jovens que amam a Deus não devem perguntar até que ponto podem se aproximar do pecado sem que cometam pecado. Sua pergunta deve ser outra: “Como devemos namorar de modo a agradar a Deus ao máximo?”.

Um exemplo pessoal

Eu nunca namorei. Desde minha adolescência, já pensava em ser padre. Na juventude, a vocação sacerdotal tornou-se uma certeza. Sendo assim, seria uma incoerência namorar. Namorar para quê? Para preparar-me para um matrimônio que nunca existiria?

Mas se a minha vocação fosse para o matrimônio, o respeito que eu teria por aquela que seria a rainha do meu lar, a mãe dos meus filhos, seria tão grande que até certos gestos, que em si não são pecados, eu evitaria.

Por exemplo: será pecado colocar o braço por trás do pescoço do outro e apoiar a mão no seu ombro? Creio que não.

Mas até isso eu evitaria. Por quê?

1°) Porque tal gesto me daria uma ideia de posse. Eu poderia ser levado a pensar que o corpo dela é meu. Mas isso não é verdade: se eu sou solteiro, o corpo dela não me pertence.

2°) Porque, ao tocar no corpo dela dessa maneira, eu esqueceria que ele é sagrado. Pois as coisas sagradas eu não as seguro dessa forma. Não é assim, por exemplo, que eu seguro o Corpo de Cristo quando celebro a Santa Missa.

Assim, para não esquecer que o corpo dela não é meu, e que é sagrado, durante o namoro eu me contentaria em conversar e dar as mãos.

E mais! Até ao dar as mãos, eu perguntaria a mim mesmo:

— Será que estou sentindo um temor (o Santo Temor de Deus) ao dar as mãos a ela, lembrando que suas mãos são sagradas e pertencem a Cristo? Ou será que estou tocando em sua mão com indiferença, como alguém que segura um lápis, um garfo, enfim, um simples instrumento?

Assim seria o meu namoro.

Por que eu namoraria desse jeito? Porque eu creio que assim o meu namoro agradaria a Deus ao máximo.

A prudência

A fundadora das Irmãzinhas de Belém, Madre Maria Helena Cavalcanti, tem uma frase sapientíssima:

“Na tentação não há fortes e nem fracos, há prudentes e imprudentes”

Isso vale especialmente para as tentações contra a castidade. Vencem-nas aqueles que, por prudência, fogem das ocasiões. Caem aqueles que, por imprudência (mas pensando ser fortes), não evitam as ocasiões.

Se não cometemos algum pecado, não nos devemos considerar superiores aos que já o cometeram. Pois, sem a graça de Deus, poderíamos cometer pecados piores.

Um exemplo bíblico: São Pedro queria seguir Jesus em sua paixão.

Respondeu-lhe Jesus:

— Não podes seguir-me agora aonde vou, mas me seguirás mais tarde.

Pedro lhe diz:

—Por que não posso seguir-te agora? Darei a minha vida por ti.

Jesus lhe responde:

—Darás a tua vida por mim? Em verdade, em verdade, te digo: o galo não cantará sem que me renegues três vezes (Jo 13, 36-38).

Examinemos esse episódio. São Pedro tinha boa intenção ao dizer que seguiria o Mestre naquela hora. Estava de fato disposto a dar a vida por ele. Porém, não contou com sua própria fraqueza. Por ser fraco, negou que conhecia Jesus. Não uma nem duas, mas três vezes antes que o dia amanhecesse!

Na terceira negação, “ele começou a praguejar e a jurar (!), dizendo: ‘Não conheço este homem!’ E imediatamente um galo cantou. E Pedro se lembrou da palavra que Jesus dissera: ‘Antes que o galo cante, três vezes me negarás’. Saindo dali, chorou amargamente” (Mt 26, 74-75).

Devemos ter sempre em mente o que ocorreu com São Pedro. Por causa de nossa fraqueza, podemos cometer pecados que nunca pensaríamos em cometer. Daí a necessidade de evitar as ocasiões de pecar, uma vez que “o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mt 26, 41).
Lembremos aquilo que há séculos escrevia Tomás de Kempis, o autor do livro “A Imitação de Cristo”:

“Todos somos fracos; mas a ninguém tenhas por mais fraco do que a ti” (Livro I, cap. 2, 4)

A seguir tentarei mostrar com exemplos como se deve guardar a prudência em um namoro.

Diálogo entre mãe e filha

— Filha, não volte tarde. Fique sempre junto de sua irmãzinha. Cuidado com os rapazes que, sem você perceber, podem levá-la ao pecado. Procure sempre os lugares claros, já que você é filha da luz.

— Eu sei, mãe, eu sei… Será que a senhora não confia em mim? Pensa que eu sou uma mulher qualquer? Ou uma jovenzinha sem juízo?

— Em você eu confio, minha filha. Mas não confio na sua força.

A jovem acima, irritada com os conselhos da mãe, demonstra ser imprudente. Acredita que, por suas próprias forças, poderá facilmente vencer as tentações. Acha desnecessário tomar tantos cuidados quantos os que sua mãe recomenda. Essa jovem é uma forte candidata a cometer gravíssimos pecados.

Se ela fosse humilde e prudente, responderia à mãe:

— Obrigada, mãe, por ter-me alertado. Quero conservar a pureza, mas sei que é preciso vigiar e orar. Como sei que sou fraca, peço que a senhora me ajude a vigiar. Afinal, a senhora já teve a minha idade e sabe por quais perigos passa uma jovem como eu. Quero contar sempre com a ajuda da senhora.

Dois jovens prudentes

Um rapaz está, de dia, na sala de estar da casa de sua namorada.

O pai da jovem diz:

— Desculpem-me, mas eu tenho que sair para descontar um cheque.

Em seguida, a mãe da jovem diz:

— Ana (assim se chama a jovem), espere enquanto eu vou comprar verduras na mercearia.

Os pais de Ana saíram, mas sua irmãzinha Andreia está brincando na sala. De repente, ouve- se uma voz na rua:

— Andreia!

A menina sai correndo ao encontro de sua amiguinha, que a chama para brincar. Nesse exato momento os dois namorados levantam-se de um salto e vão atrás de Andreia. Ela pergunta:

— Por que vocês dois estão atrás de mim?

— Porque eu e ele não podemos ficar sozinhos – responde Ana.

— Sua presença é muito importante para nós, Andreia – completa o rapaz.

Você acha que a atitude dos dois foi exagerada? Acha que eles poderiam permitir-se ficar sozinhos “um pouquinho só” sem que nada de mais acontecesse?

Pergunte a um amigo ou uma amiga que já caíram no pecado da fornicação, se tudo não começou com uma “pequena” imprudência como essa.

Um passeio

Os namorados costumam passear. Até aí tudo bem. Mas onde?

— Vamos hoje ao cinema?

— Ao cinema, não.

— Mas o filme que está passando é ótimo. Não tem nada de imoral.

— Mas o cinema é um lugar escuro. E nós somos filhos da luz.

— É mesmo! Eu não me tinha lembrado disso… Então vamos amanhã de manhã ao Jardim do Passeio Público?

— Podemos ir, mas não sozinhos. Vamos junto com nossos amigos da escola.

— Combinado!

Uma carona

— Alô, Carlos, aqui é a Ana.

— Tudo bem, Ana?

— Estou com um problema, Carlos. Perdi o ônibus e vou chegar atrasada à faculdade. Você pode me levar de carro?

— Claro que sim. Mas mande a Andreia ir se preparando enquanto vou aí.

Você acha que é exagero levar a irmãzinha até mesmo em uma simples carona para a faculdade? Pergunte a um amigo ou uma amiga que já pecou indo a um “motel” se tudo começou quando os dois perceberam que estavam sozinhos no mesmo carro.

Rapazes e moças são diferentes

Mesmo sendo semelhantes (compartilhando a mesma natureza humana), homem e mulher são diferentes. E é preciso que as diferenças sejam lembradas no tratamento mútuo.

Assim, não seria razoável que um homem exigisse de uma mulher que desatarraxasse as porcas de uma roda, que um borracheiro apertou demais. O que para o homem é possível, e às vezes até fácil, para a mulher pode ser difícil, ou até impossível. De modo contrário, não seria razoável que uma mulher exigisse de um homem o mesmo jeito especial que ela tem de cuidar de um bebê ou a mesma facilidade sua em observar detalhes.

Compreender as diferenças do outro é fundamental para um bom relacionamento humano.

No namoro isso é importantíssimo. Os rapazes devem lembrar que são diferentes das moças; e estas, que são diferentes dos rapazes.

Uma das diferenças é esta: os rapazes excitam-se mais facilmente que as moças.

Certos gestos e carícias que são apenas expressão de afeto para uma moça podem causar grande excitação em um rapaz.

Imaginemos a cena seguinte. Uma jovem, ao avistar pela janela o seu namorado, que estava longe desde muito tempo, corre ao encontro dele, dá-lhe um beijo no rosto e envolve sua cintura com os braços a fim de “matar a saudade”. O rapaz, porém, com a “delicadeza” própria dos homens, afasta-se violentamente dos braços da namorada. Ela então, admirada com aquela reação, sente-se ofendida.

— Por que você me trata com tanta brutalidade? Você não aceita meus carinhos?

O que a moça, porém, não sabe é que seus carinhos, que nela não causaram excitação, foram altamente excitantes para o rapaz. Por respeito ao corpo dela é que ele se afastou.

Muitos dos pecados cometidos entre namorados começam pela moça. Ela é a primeira a acender a faísca e o rapaz é o primeiro a incendiar-se.

Guardemos para sempre esta lição:

Durante o namoro, eu sou responsável não só pelo meu corpo, mas também pelo corpo do outro.

Devo evitar tudo o que causa excitação em mim e o que causa excitação no outro (mesmo que não cause em mim).

Uma conclusão imediata desse princípio é que dois namorados não podem andar na mesma motocicleta. Por quê? Porque, para se apoiar, a moça (que está na garupa) envolve a cintura do rapaz com os braços. Tal abraço – que tem que ser apertado a fim de evitar uma queda – pode causar grande excitação no rapaz que está dirigindo, mesmo que não cause na moça.

O pudor

“Ora, os dois estavam nus, o homem e sua mulher, e não se envergonhavam” (Gn 2, 25)

Antes do pecado original, Adão e Eva gozavam de um dom chamado integridade. Por esse dom, os sentidos e os instintos estavam harmoniosamente submissos à razão. A visão do corpo do outro, mesmo de seus órgãos reprodutores, não era capaz de causar excitação, a menos que a vontade consentisse segundo a reta razão. Por isso, não havia necessidade de se cobrir o corpo.

Sem dúvida os dois praticariam o ato sexual (“os dois serão uma só carne”), mas só quando a razão determinasse. E o instinto sexual estava perfeitamente submisso à razão.

Depois do pecado original, a integridade se perdeu. Adão e Eva “descobriram” que estavam nus e se envergonharam.

A partir daí, os instintos rebelaram-se violentamente contra a razão, sobretudo o instinto sexual. A virtude da castidade – que é o controle
desse instinto – passou a exigir muita luta e vigilância. Foi necessário cobrir o corpo.

Adão e Eva, envergonhados, cingiram-se (cobriram a cintura) com folhas de figueira (Gn 3,7). Deus, porém, não achou tal cobertura suficiente, e deu-lhes túnicas de peles de animais, para que se vestissem (Gn 3,21).

Hoje as roupas são necessárias para se conservar a castidade.

Qual é a função das roupas? Segundo São João Paulo II, as roupas cobrem o corpo para nos deixar ver os valores da alma.

“A necessidade espontânea de ocultar os valores sexuais vinculados à pessoa é o caminho natural para revelar o valor da pessoa em si mesma” (Karol Wojtyla, Amor e responsabilidade, p. 159-160)

De fato, se não cobríssemos o corpo, o instinto carnal gritaria tanto, com sede de prazer, que a razão ficaria obscurecida, incapaz de conhecer a alma.

“A pureza exige o pudor. Este é parte integrante da virtude da temperança. O pudor preserva a intimidade da pessoa. Consiste na recusa de mostrar aquilo que deve ficar escondido” (CIC, n. 2521)

Quando Moisés pediu ao Senhor “Rogo-te que me mostres a tua glória” (Ex 33,18), Deus lhe disse: “Não poderás ver a minha face, porque o homem não pode ver-me e continuar vivendo” (Ex 33,20).

A face de Deus é sagrada, e por isso devia permanecer oculta.

Pelo mesmo motivo, nosso corpo, que é sagrado, deve ser ocultado.

E se eu não cobrir devidamente o meu corpo?

Então, o meu corpo, que devia glorificar a Deus (“glorificai, portanto, a Deus em vosso corpo” – 1Cor 6,20), passa a ser ocasião de pecado para aqueles que o veem.

Como devem ser as roupas de um cristão?

  • devem cobrir o peito, as costas, os ombros e o ventre;
  • não devem ser coladas ao corpo nem transparentes;
  • em se tratando de saia ou vestido, devem cobrir os joelhos, inclusive na posição sentada.

Em matéria de cobrir o corpo, as mulheres deveriam ser mais cuidadosas que os homens. Por quê? Porque, como já falei, o homem se excita mais facilmente que a mulher. Assim, via de regra, a visão do tronco de um homem não é capaz de causar excitação em uma mulher. Por isso, os trajes de banho masculinos não costumam cobrir o tronco. Mas, ao contrário, a visão do tronco de uma mulher é capaz de causar excitação em um homem. Por isso, os trajes de banho femininos cobrem – ou deveriam cobrir – o tronco.

Curiosamente, as moças, que deveriam ser exemplares na maneira de se vestir, costumam-se vestir pior que os rapazes. Vejamos.

Em geral, os rapazes vestem camisas que têm manga e que cobrem o peito até o pescoço. Não se encontra na moda masculina uma camisa que não cubra as costas ou o ventre. E as calças costumam ser folgadas.

A moda feminina, porém, está repleta de blusas que não têm mangas (às vezes apenas duas pequenas alças), que não cobrem boa parte do peito, que não cobrem o ventre ou as costas (miniblusas). Frequentemente as moças usam roupas apertadas, coladas ao corpo ou transparentes. E se usam saia ou vestido, muitas vezes deixam descobertos os joelhos.

Por quê? Será que o corpo da mulher vale menos que o do homem, e que por isso, não é preciso tomar cuidado para cobri-lo?

Será que o preço que Cristo pagou pelo corpo das mulheres (“Alguém pagou alto preço pelo vosso resgate” – 1Cor 6,20) é menor que o que ele pagou pelo corpo dos homens?

Será que as moças se vestem indecentemente apenas para obedecerem à moda (são “maria vai com as outras”)?

Ou será que elas procuram exibir o corpo para chamar a atenção sobre si, provocando excitação nos rapazes?

Neste último caso, elas estão cometendo um pecado gravíssimo chamado escândalo.

Escândalo (do grego skandalon = tropeço) é o pecado de levar outros a pecar. As roupas que não cobrem suficientemente o corpo chamam-se roupas escandalosas.

Que disse Jesus sobre os que cometem escândalo? Palavras duríssimas:

“Caso alguém escandalize um destes pequeninos que creem em mim, melhor seria que lhe pendurassem ao pescoço uma pesada mó e fosse precipitado nas profundezas do mar. Ai do mundo por causa dos escândalos! É necessário que haja escândalos, mas ai do homem pelo qual o escândalo vem!” (Mt 18, 6-7)

“Mas eu uso essas roupas sem má intenção”

Imagine que você subisse ao terraço de um edifício localizado no cruzamento de duas ruas movimentadas do centro da cidade.

Apenas para se divertir (mas sem qualquer má intenção), imagine que você atirasse pedras nas ruas. O que poderia acontecer? Algumas pedras cairiam no chão sem causar dano. Outras atingiriam as cabeças das pessoas e as feririam. Dependendo do tamanho da pedra e da velocidade na hora do impacto, alguém poderia até morrer!

Lembre-se: você está agindo com boa intenção. E, no entanto, pode estar ferindo ou matando um número indeterminado de pessoas.

Assim, se você, sem má intenção, veste uma roupa indecente e anda em público com ela, não é capaz de calcular quantos pecam por sua causa. Um? Dois? Dez? Cem?… E você terá que responder diante de Deus por todos esses pecados…

Hoje em dia é muito comum que os sacerdotes, ao atenderem a confissões, ouçam os homens se queixarem de como é difícil conservar a pureza num mundo em que as mulheres não se cobrem.

A menina Jacinta (1910-1920), a mais nova entre os videntes de Fátima, estando muito doente, já à beira da morte em Lisboa, disse algumas palavras que foram anotadas pela Madre Maria da Purificação Godinho:

“Os pecados que levam mais almas para o inferno são os pecados da carne.

Hão de vir umas modas que hão de ofender muito a Nosso Senhor.

As pessoas que servem a Deus não devem andar com a moda. A Igreja não tem modas. Nosso Senhor é sempre o mesmo”.

Estas palavras foram ditas em 1920, ano em que Jacinta morreu, com a idade de nove anos.

Quem observa as modas de hoje, verifica que as palavras da menina se cumpriram literalmente.

De que lado você quer estar? Do lado de Deus ou do lado das modas?

“Ninguém pode servir a dois senhores” (Mt 6,24)

Pode ser que você, moça, ao ler tudo o que eu disse até agora sobre o pudor, resolva deixar de usar algumas roupas. Tenho medo, porém, que você não queira renunciar a todas as roupas escandalosas, mas apenas às mais escandalosas. Temo que sua opção por Deus não seja radical, que não vá às últimas consequências.

Sua renúncia não é total se você, por exemplo:

  • pretende continuar usando roupas apertadas, deixando de lado somente as mais coladas ao corpo;
  • pretende continuar usando roupas que mostrem apenas uma “pequena” parte do peito ou do ventre ou das costas;
  • pretende usar roupas que cubram o joelho, mas não na posição sentada;
  • pretende deixar de usar roupas escandalosas na rua, mas deseja continuar usando-as em casa, na presença de seu pai, de seus irmãos e dos visitantes.

Se, porém, sua renúncia é total, você quer renunciar a todas as roupas escandalosas, sem exceção. E neste caso eu pergunto:

— O que você vai fazer com as roupas que não vai mais usar?

Doá-las? Seria apenas transferir o seu pecado para outra pessoa que usasse tais roupas.

Deixá-las guardadas no armário? Por que motivo, se você não vai mais usá-las? Será que você deseja conservar algum apego ao pecado?

Se sua renúncia é de fato total, deve destruir as roupas escandalosas. Assim, nem sequer restará a ocasião de usá-las novamente.

Uma história da vida de Santa Teresinha

Santa Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face, conhecida como Santa Teresinha, conta em seu livro “História de uma alma” um fato ocorrido quando ela era ainda muito pequena:

“De outra feita tínhamos de ir até Grogny à casa da Sra. Monier. Mamãe falou à Maria me pusesse o lindo vestido azul celeste, com guarnição de rendas, mas não me deixasse com os braços nus, para não se queimarem ao sol. Deixei que me vestissem com a displicência que deveria ser própria de crianças com a minha idade; mas, interiormente, pensava que teria ficado muito mais graciosa com meus bracinhos nus.

Com uma índole como a minha, se fosse criada por pais carentes de virtude, ou até se fosse como Celina mimada por Luísa, ter-me-ia tornado bem maldosa e talvez me tivesse perdido… Mas Jesus olhava pela sua esposinha” (História de uma Alma: manuscritos autobiográficos, p. 41-42, grifos nossos)

O episódio é impressionante. A santa relata como até o cuidado de cobrir os braços colaborou para que, desde a infância, ela cultivasse o pudor e a castidade. Terá sido um exagero? Em matéria de cuidado com a pureza, dificilmente nós exageramos.

O pudor durante o namoro

Se devemos guardar o pudor em todos os momentos, com muito maior razão é preciso guardá-lo durante o namoro Trata-se de um período de guerra, em que não apenas nossas paixões, mas “o nosso adversário, o diabo, nos rodeia como um leão a rugir, procurando a quem devorar” (cf. 1 Pd 5, 8).

Por isso os namorados, além de guardar uma distância entre os corpos (para que as almas possam se unir), devem cobrir bem seus corpos (para que possam apreciar os valores da alma).

O pudor no dia do casamento

Como sacerdote, presidir uma cerimônia de matrimônio costuma ser um suplício. Naquele dia, a casa do Senhor enche-se de pessoas (infelizmente, mulheres) que mais parecem despidas que vestidas. Se todos os dias encontramos mulheres malvestidas, parece que quando assistem a um casamento, elas disputam umas com as outras o primeiro lugar em indecência e depravação.

Mas uma dor especial me atinge quando vejo a estrela da festa, a noiva, também ela dando um espetáculo de nudez. Ao som de uma música vibrante, ela entra com um vestido de três metros de cauda. No entanto, não obteve pano suficiente para cobrir os seios, que sempre estão expostos (salvo raríssimas exceções). Além dos seios, às vezes a noiva faz questão de mostrar os ombros ou as costas.

Enquanto o noivo está totalmente coberto, de terno e gravata, até o pescoço e os pulsos, sua futura esposa desfila (desculpe-me a comparação) como se fosse um pedaço de carne que o açougueiro expõe para atrair os fregueses.

A cena é de gelar a alma. Nem no dia das núpcias o casal aprendeu o que significa o pudor e a castidade! Como terá sido o seu “namoro”? E como será sua vida matrimonial?

— Mas eu sou obrigada a usar um vestido que mostre os seios e os ombros no dia do casamento… Não encontro outro para comprar…

— Seja sincera. Obrigada você não é. Se você aceita usar esse vestido, é porque o acha tolerável. Ou será que alguma vez você diria que é obrigada a comer veneno pois não há outra coisa para comer?

A varinha de condão

Há namorados e noivos que pensam que o padre é mágico, e que dispõe de uma varinha de condão.

Segundo o pensamento deles, é perfeitamente possível “namorar” de maneira animalesca, com beijos e abraços excitantes, e depois de tal “preparação” (?), aproximar-se de um altar para contrair matrimônio.

O padre então, como num passe de mágica, ergueria sua varinha de condão e… plim!… transformaria dois prostitutos em marido e mulher. E os dois viveriam felizes para sempre.

Pura ilusão. No matrimônio, colhe-se o que se semeou durante o namoro e o noivado.

Não vos iludais; de Deus não se zomba. O que o homem semear, isso colherá: quem semear na sua carne, da carne colherá corrupção; quem semear no espírito, do espírito colherá a vida eterna (Gl 6, 7-8).

Se o rapaz (ou vice-versa) acostumou-se a tratar sua namorada como um objeto sexual, depois do matrimônio exigirá que ela seja uma prostituta de uso doméstico.

Se a moça (ou vice-versa) durante o namoro sempre procurou egoisticamente a felicidade a todo custo, inclusive mediante a troca de um namorado por outro que lhe causasse maior “satisfação”, depois do matrimônio, logo após a primeira crise, pensará em “trocar de marido” para ser feliz.

Se o namoro foi carnal, será a carne que dominará os cônjuges.

Se, ao contrário, o namoro foi espiritual, será o espírito (o Espírito Santo) que conduzirá os cônjuges.

Por isso, os que hoje “namoram” carnalmente, devem estar preparados para as seguintes consequências:

1°) Casar-se com uma pessoa desconhecida. Sim, pois se eles se deixaram levar pelas paixões corporais, não foram capazes de conhecer o interior do outro. Casar-se com quem não se conhece é uma loucura. Loucura que é cometida por todos os que não namoram castamente.

2°) Ser traído pelo cônjuge. Durante o namoro, ele (ou ela) percebeu que não era amado, mas apenas usado para obtenção de prazer. Assim, após o casamento, o adultério não parece tão assustador. “Afinal – pensa seu cônjuge – eu vou trair alguém que não me ama…”

3°) Ser rejeitado sexualmente pelo cônjuge. A busca desenfreada do prazer desde o tempo de namoro faz com que a união sexual deixe de ser algo novo, valioso, desejável. Começa a surgir a frigidez (perda do prazer sexual). Os dois descobrem que não servem nem sequer para satisfazer os apetites corpóreos do outro!

Em uma palavra, os jovens que hoje pecam contra a castidade estão semeando a própria infelicidade conjugal já nesta vida. Acrescente-se a isso a perda da graça santificante e do direito à vida eterna, que Cristo conquistou com o preço do seu sangue…

A pureza e a visão de Deus

Ver a Deus é o desejo de todo homem. No entanto, disse Deus a Moisés:

“Não poderás ver a minha face, porque o homem não pode ver-me e continuar vivendo” (Ex 33, 20).

De fato, é tão grande a distância que há entre a santidade de Deus e a indignidade do homem, que o homem deveria morrer se visse a Deus.

Gedeão pensou que morreria depois de presenciar um fogo que devorou a carne e os pães que ele pusera sobre uma pedra para oferecer em sacrifício:

— Ah! meu Senhor! Eu vi o Anjo do Senhor face a face!

O Senhor lhe disse:

— A paz esteja contigo! Não temas, não morrerás (Jz 6, 22-23).

Manué e sua mulher, pais de Sansão, também temeram quando o Anjo do Senhor lhes apareceu anunciando o nascimento de um filho que começaria a libertar Israel das mãos dos filisteus:

— Certamente morreremos – disse Manué à sua mulher -porque vimos a Deus.

—Se o Senhor tivesse pretendido matar-nos – respondeu-lhe a mulher – não teria aceitado o holocausto nem a oblação, e não nos teria feito ver tudo o que acabamos de ver, nem nos teria revelado, ao mesmo tempo, o que nos disse (Jz 13, 22-23).

Quando o profeta Isaías viu o Senhor sentado num trono dentro do Templo, entrou em pânico e disse:

Ai de mim, estou perdido!

Com efeito, sou um homem de lábios impuros, e vivo no meio de um povo de lábios impuros, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos (Is 6, 5).

Então um dos serafins que estava junto do trono, voou para junto de Isaías trazendo na mão uma brasa que havia tirado do altar com uma tenaz. Com ela tocou-lhe os lábios e disse:

“Vê, isto te tocou os lábios, tua impiedade está removida, teu pecado está perdoado” (Is 6,7)

Quem então poderá ver a Deus? Os puros. Disse Jesus:

“Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus” (Mt 5, 8)

Essa promessa é assustadoramente maravilhosa. Quem guardar a pureza verá a Deus!

“Aos ‘puros de coração’ está prometido ver a Deus face a face e ser semelhantes a Ele. A pureza de coração é a condição prévia da visão” (CIC, n. 2519)

Veremos a Ele porque, pelo Batismo, tornamo-nos filhos dele. Diz-nos São João:

“Amados, desde já somos filhos de Deus, mas o que nós seremos ainda não se manifestou. Sabemos que por ocasião desta manifestação seremos semelhantes a ele, porque o veremos tal como ele é” (1 Jo 3, 2).

No entanto, não basta sermos filhos de Deus para vermos a Deus. É preciso que tenhamos um coração puro. Por isso, prossegue São João:

“Todo o que tem nele esta esperança, purifica-se a si mesmo, como também ele é puro” (1 Jo 3, 3).

Mas o que significa “ver a Deus”?

Deus não tem corpo. É puro espírito. Portanto, é invisível aos nossos olhos corporais. Nossos olhos poderiam ver os sinais de sua majestade – o fogo, a nuvem, os relâmpagos – tais como aparecem na Bíblia. Depois que o Filho de Deus se fez homem, nossos olhos poderiam também ver o corpo humano de Jesus.

Mas Deus, enquanto Deus, não pode ser percebido pelo sentido da visão. “Ver a Deus”, portanto, tem um outro significado: entender a Deus, ou seja, ver com a inteligência.

Essa “visão” enche o homem de felicidade. Por isso, é chamada visão beatífica (do latim beatus = feliz; beatífica = que faz feliz). Para que possa ser visto, Deus fortalece a inteligência humana com a luz da glória. Assim, no céu, a alma torna-se apta a ver a Deus como ele próprio se vê.

Aos puros de coração, Deus dirá:

“Entra na alegria do teu Senhor” (Mt 25, 21.23)

Note-se: no céu não é a alegria que entrará no coração dos puros. Os puros é que entrarão na alegria, “mergulhados” na alegria do Senhor.

Até agora, falei sobre o que os puros de coração receberão no céu. Mas… e desde já?

Desde já, os puros, embora não vejam (= entendam) a Deus face a face, entendem muito bem as coisas de Deus. As pessoas puras – por exemplo, as crianças – têm uma especial familiaridade com Deus. Ao falarmos de Deus para elas, vemos que elas nos entendem quase imediatamente.

Desde já os puros de coração veem coisas que são invisíveis (incompreensíveis) aos que se tornaram impuros.

“[A pureza de coração] desde já nos concede ver segundo Deus, receber o outro como um ‘próximo’; permite-nos perceber o corpo humano, o nosso e o do próximo, como um templo do Espírito Santo, uma manifestação da beleza divina” (CIC, n. 2519)

A alegria da pureza

O prazer é corpóreo. A alegria é espiritual. Aquele que procura o prazer encontra o prazer. Mas depois vem o vazio, o remorso de consciência e a tristeza.

Aquele que, por amor, se abstém do prazer encontra a alegria. Se os que procuram o prazer na impureza conhecessem a alegria da pureza, desejariam ser puros, nem que fosse por egoísmo. A alegria da pureza está acima do prazer da impureza como o céu está acima da terra.

Experimente e diga-me se não é assim.

A pureza e o olhar

É possível, a partir dos olhos de uma pessoa, descobrir o estado de cada parte do corpo. Uma fratura em um osso, uma úlcera no estômago, um tumor no fígado, tudo isso pode ser detectado pela observação da íris.

Foi através da diagnose pelos olhos que o missionário Pe. Aloísio Regensburger, estando na China, e tendo sido interceptado por um grupo de soldados comunistas, conseguiu salvar sua vida e a das irmãs religiosas que viajavam consigo. Eis como ele conta o episódio:

“A coisa ia-se tornando séria. Enquanto as Irmãs continuavam discutindo com ele [o chefe dos soldados], tive tempo suficiente de observar-lhe os olhos. Aquele homem raivoso tinha olhos azuis, algo inaudito na China, onde predominavam os negros. Para quem faz o diagnóstico pelos olhos – e era o meu caso — os azuis são extraordinariamente favoráveis. Tinha de necessidade, que deduzir algo, e algo que fosse todo peculiar. Observava-lhe os lugares que nos olhos correspondem às extremidades. Os relativos às pernas não mostravam mudança alguma; mas no olho direito, na seção superior correspondente ao braço, pude notar um ponto negro na íris azul. O homem, portanto, tivera no braço direito grave contusão. Podia ser muito bem ruptura do osso. Mas, como era soldado, não podia equivocar-me ao supor lesão por bala. Vestia ele túnica de soldado, cuja manga chegava até aos nós dos dedos da mão, o que me impedia de ver a cicatriz.

Da maneira mais jovial que me fora possível naquela violenta situação, dei-lhe uma palmadinha no braço direito e disse-lhe:

— Diga-me, camarada, quando foi que você recebeu o tiro?

Quedou-se o homem sem pronunciar palavra, tal a surpresa.

— Venha, permita-nos vê-la, disse-lhe eu. Calmo, arregaçou a manga da túnica, deixando a descoberto feia cicatriz. Ao se refazer do sobressalto, perguntou-me um tanto perplexo:

— Como pôde o senhor… pois é desconhecido por estas bandas?

Tudo se aclarara. Acertara na mosca. Por isso, mui senhor de mim, esclareci:

— Tenho o dom especial de curar doentes. Se os tem na aldeia, estou disposto a ajudá-los” (Chamaram-me trovão, p. 118)

O modo de tratar o missionário mudou totalmente. Trouxeram-lhe doentes para serem curados, ficaram agradecidíssimos e despediram- se dele e das Irmãs dizendo:

“A paz esteja com vocês durante toda a viagem”

Os olhos são uma espécie de janela através da qual vemos o estado do corpo da pessoa.

Porém, muito mais do que isso, os olhos permitem-nos ver a alma da pessoa.

Dizem os filósofos que “o indivíduo e inefável”. Ou seja, é impossível esgotar tudo o que há de inteligível em cada pessoa. Sempre haverá nela algo que nos escapará ao entendimento.

Mas aquilo que mais nos informa sobre o íntimo da pessoa são os olhos. Os olhos são como vulcões, que comunicam a superfície da terra com o que há nas profundezas.

Se alguém sente dor ou prazer, nem sempre o percebemos pelos olhos.
Mas os olhos denunciam o que se passa no íntimo: uma mágoa profunda, uma angústia, o entusiasmo, a alegria, a pureza.

A pureza se expressa no olhar. Ela parece deixar os olhos transparentes. Transparentes não só para quem os vê (de fora), mas para a própria pessoa que vê.

Tentarei explicar melhor. Se estamos dentro de uma sala com janela de vidro, e se a janela está limpa, conseguimos ver com clareza o que está fora da sala. E, do mesmo modo, quem está fora consegue ver-nos com clareza.

Se, porém, as janelas estão sujas, embaçadas, não conseguimos ver bem o que está fora da sala. E, do mesmo modo, quem está fora não consegue ver-nos bem.

Os olhos de uma pessoa pura – por exemplo, uma criança – são como janelas límpidas e transparentes. Ao olharmos para seus olhos, vemos algo de Deus em sua alma. E ela própria, ao olhar para as coisas, enxerga-as claramente, porque as vê segundo Deus.

Os olhos de uma pessoa impura, já corrompida pelo pecado, são como janelas sujas e embaçadas. Ao olharmos para seus olhos, uma espécie de crosta de sujeira impede-nos de ver com clareza o que há no íntimo. E a própria pessoa impura, ao olhar para as coisas, não as enxerga claramente, porque não as vê segundo Deus.

O olho é a luz do corpo

É impressionante esta passagem do Evangelho em que Jesus nos fala sobre os olhos:

“A lâmpada do corpo é o olho. Portanto, se teu olho estiver são, todo o teu corpo ficará iluminado; mas se teu olho estiver doente, todo o teu corpo ficará escuro. Pois se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão as trevas!” (Mt 6,22-23).

O texto é riquíssimo em ensinamentos. Um deles parece ser o seguinte:
A pureza de todo o corpo começa pelos olhos. Quer ter um corpo puro? Comece por purificar o seu olhar.

Alguém poderia objetar que o importante não é ter um olho puro, mas um coração puro.

Resposta: Tudo o que está no coração entra através dos sentidos. E a visão é o mais agudo de todos os sentidos. Por isso, a pureza do coração depende da pureza dos olhos. Cuidado, portanto, com o que olha!

“Caso o teu olho direito te leve a pecar, arranca-o e lança-o para longe de ti, pois é preferível que se perca um dos teus membros do que todo o seu corpo seja lançado na geena (=Inferno)” (Mt 5, 29).

Aqui Jesus não está mandando que mutilemos os olhos (o que seria um grave pecado), mas que afastemos o olhar de tudo o que é perigoso para a castidade. Tal afastamento deve ser feito com violência: “arranca-o”.

Se, porém, os olhos, que deveriam ser luz, são tenebrosos, nada podemos esperar de nosso corpo, a não ser uma grande escuridão: o pecado.

Uma história de horror

Certa vez fui à casa do meu amigo João. Bati à porta e ele respondeu lá de dentro: “Entre! ” Abri a porta e deparei-me com ele deitado sobre um sofá e com os olhos fixos na tela de televisão.

— Bom dia, João. Como vai?

— Estou bem — respondeu sem olhar para mim, mas muito concentrado no que se passava na tela.

Olhei então para o televisor e vi que estava conectado a um aparelho de vídeo. Na tela havia uma cena pavorosa: um velho sendo insultado, esbofeteado e levado à força por dois homens ao centro de uma praça.

— O que é isso? — perguntei.

— Um filme — respondeu rápido para não perder um só detalhe da cena.

— E você gosta de assistir a isso?

— Não tenho nada para me distrair — justificou-se sem desviar os olhos do televisor.

A cena tornava-se cada vez mais horrenda. Uma multidão precipitava-se sobre o velho para espancá-lo, com os golpes mais cruéis, no estômago, no peito e na cabeça. De seu corpo escorria sangue misturado aos escarros que recebera.
Reparei então na fisionomia do velho. Seu rosto era bem parecido com o de João.

— Quem é este senhor que está sofrendo?

— É meu pai.

Fiquei pálido de saber que alguém conseguia assistir com tanta calma e interesse às ofensas e aos golpes feitos ao próprio pai. Depois soube da história completa. O pai de João havia sido linchado em praça pública até a morte. Naquela hora e lugar passava um cinegrafista, que decidiu filmar tudo, e depois entregou a fita a João. Nas horas de lazer João gostava de assistir a ela.

A atitude de João é espantosa? Não é menos espantosa do que a atitude daqueles que assistem a uma novela “porque não têm nada com que se distrair”. Na tela eles assistem às piores ofensas feitas ao seu Pai: prostituição, adultério, fornicação, homossexualismo, xingamentos, mentira, violência… e tudo isso com muita calma. Não sentem nojo, não passam mal, não tremem de horror, não correm para desligar o televisor, nem se importam que Jesus tenha derramado tanto sangue por aqueles pecados. Não se sentem ofendidos vendo às ofensas a seu Pai. Pelo contrário, assistir àquelas cenas é para eles um lazer.

Se alguém aproximar o nariz de um esgoto sanitário, terá uma reação espontânea de repugnância. Mas se insistir em respirar aquele ar imundo, seu nariz não terá outra escolha a não ser habituar-se ao cheiro. Deste efeito ninguém escapa ao presenciar uma novela: a indiferença perante o pecado. Aquilo que é repugnante pela sua torpeza, passa a parecer normal e até “aceitável”.

Na vida do espectador, ao aparecer alguma ocasião de praticar os vícios apregoados na novela, ele poderá até mesmo rejeitá-los. Mas não sentirá por eles a aversão de antes. Afinal, j á se acostumou a presenciá-los todos os dias…
Ora, a aversão ao pecado é um dom do Espírito Santo, conhecido pelo nome de Temor de Deus. A Bíblia ensina que o Temor de Deus é o princípio da Sabedoria:

“O temor do Senhor é princípio de conhecimento: os estultos desprezam sabedoria e disciplina” (Pr 1, 7).

“O princípio da sabedoria é temer o Senhor, todos os que o praticam têm bom senso. Seu louvor permanece para sempre” (Sl 110, 10).

Perder o Temor de Deus, portanto, é cair na loucura. É na loucura que se encontram muitos pais e mães de família, acostumados a assistir a cenas pornográficas, inclusive na presença das crianças.

Um outro efeito, que aliás é óbvio, da assistência à pornografia televisiva é o despertar das paixões e o desejo de deleitar-se com elas. No sermão da montanha Jesus condenou até mesmo o olhar libidinoso, chamando-o de “adultério” cometido no coração (cf. Mt 5, 28). Ligar a televisão para assistir a uma novela é expor-se diretamente à ocasião de pecar. Tal exposição por si só já é um pecado.

Vale aqui lembrar que o mal da novela não está apenas nas cenas mais torpes que ela apresenta. Todo o seu enredo é uma apologia do pecado. O fato de sermos filhos de Deus deveria ser suficiente para nos sentirmos ofendidos com tais ofensas feitas ao Pai.

Devem, portanto, os pais proibir os filhos de assistirem às novelas? É claro que sim. Se os pais com razão proibiriam os filhos de tomarem veneno, com maior razão devem proibir o pior dos venenos, que é o escândalo ou a incitação ao pecado. Tal veneno destrói não o corpo, mas a graça que Cristo conquistou para nós com o preço do seu sangue. Tal veneno é capaz de destruir o brilho angelical dos olhos de uma criancinha. Tal veneno é capaz de converter a veste branca recebida no Batismo em um farrapo imundo.

Alguém poderá dizer que proibir não é o suficiente. De acordo. Não é suficiente, mas é absolutamente necessário. Além de proibir, os pais devem explicar aos filhos o porquê da proibição e convidá-los a obedecer com docilidade, alimentando em si mesmos o amor a Deus e o horror ao pecado. Em especial, os pais devem ensinar que os olhos que um dia verão a Deus não podem hoje contaminar-se com as imundícies apresentadas em uma novela. A visão de Deus face a face é prometida somente aos puros de coração (cf. Mt 5, 8).

Namorar a quem e durante quanto tempo?

Como vimos, o namoro tem por fim o matrimônio. Logo, não devem pensar em namorar aqueles que não pensam em se casar.

Se você não pode casar-se devido à pouca idade ou à falta de condições financeiras para sustentar uma família, então não é hora de namorar. Não tenha pressa de iniciar um namoro. Lembre que se sua vocação é matrimonial, o seu cônjuge (esposo ou esposa) já existe, pois Deus já o escolheu. Não é sua a tarefa de “fabricar” a pessoa com quem vai se casar. Sua oração deve ser semelhante àquela que fizeram Pedro e os outros discípulos quando desejavam saber quem iria tomar o lugar de Judas Iscariotes, que havia se enforcado:

“Mostra-nos qual destes dois escolheste” (At 1,24)

Entre os dois candidatos apresentados pela comunidade – José e Matias – era preciso saber qual Deus já havia escolhido. E a sorte caiu sobre Matias, que se associou aos onze apóstolos. A oração não foi “escolhe” ou “ajuda-nos a escolher”, mas “mostra-nos quem escolheste”. Se você é chamado ao matrimônio, peça a Deus que mostre quem Ele já escolheu para ser seu cônjuge.

Conte, porém, com a possibilidade de Deus ter chamado você para uma vocação maior: a da virgindade consagrada a Ele. Se este for o seu caso, o seu cônjuge aqui na terra não existe. É o próprio Senhor que vai ocupar o lugar dele. Você poderá então recitar o Salmo 15, cantado pelos levitas:

“Senhor, minha parte na herança e minha taça, és tu que garantes a minha porção; o cordel mediu para mim um lugar delicioso, sim, é magnífica a minha herança” (Sl 15, 6).

Quando os israelitas tomaram posse da terra de Canaã, cada tribo ocupou um território, menos a tribo de Levi, cujos membros – os levitas – eram dedicados ao sacerdócio. Eles viviam na terra de outras tribos. Sua “porção” não era um pedaço de terra, mas o próprio Senhor, a quem eles ofereciam sacrifícios.

Voltemos, porém, à vocação matrimonial. Se Deus quer que você se case, não se preocupe: Ele vai mostrar quem escolheu para você. Mas não é nos bailes mundanos nem nos divertimentos perigosos para a castidade que você deve esperar que Deus se revele. Ele costuma falar a nós no silêncio do coração.

Não comece a namorar antes de ter quase certeza de ter encontrado quem Deus escolheu para você. O namoro poderá consolidar essa certeza, mas não é bom correr o risco de namorar inutilmente. Peça a Deus que seu primeiro namorado (sua primeira namorada) seja também o único (a única). Seja exigente. Pergunte a ele (a ela):

— Você aceita que tenhamos um namoro casto?
— Aceita que levemos a castidade até as últimas consequências?
— Está disposto(a) a aceitar quantos filhos Deus nos quiser dar?

Uma resposta positiva a essas perguntas é um bom sinal. Se, porém, ele (ou ela) se mostrar hesitante, não inicie o namoro. Os riscos são imensos.

Um namoro santo deve durar pouco tempo. Um tempo suficiente para que os dois possam conhecer-se interiormente, mas não tão longo que os exponha a ocasiões de pecar. É comum que jovens venham dizer ao sacerdote: “Padre, no início nosso namoro era santo. Mas, com o tempo, passamos a relaxar a vigilância e cometemos graves pecados”.

Para que isso não aconteça com você, namore apenas quando tiver uma perspectiva próxima de casamento. Assim será possível conservar-se puro para o grande sacramento do matrimônio.

O exemplo de Tobias e Sara

O anjo Rafael conduziu Tobias até a cidade de Ecbátana, onde morava Raguel, parente de seu pai. Raguel tinha uma filha chamada Sara, que já fora dada em casamento a sete noivos, todos eles mortos na noite de núpcias pelo demônio Asmodeu. Quando o anjo disse a Tobias que deveria casar-se com Sara, o jovem manifestou seu medo: seria ele o oitavo a morrer? Mas Rafael tranquilizou-o:

“Ouve-me, eu te mostrarei quais são aqueles sobre quem o demônio tem poder. São os que se casam com tais disposições, que lançam a Deus fora de si e se entregam à sua paixão, a tal ponto que não têm maior entendimento que o cavalo e o muar; a esses o demônio supera. Mas tu, quando a tiveres recebido por esposa, viverás com ela em continência durante três dias e não cuidarás de outra coisa senão de fazer oração com ela. […] Passada a terceira noite, no temor do Senhor, tomarás a donzela, levado menos pelo instinto do que pelo desejo de ter filhos, a fim de obteres sobre teus filhos a bênção da raça de Abraão” (Tb 6,16-18.22; conforme versão Vulgata das Sagradas Escrituras, versão de São Jerônimo)

Assim fizeram Tobias e Sara. Passaram três dias em oração. Ao convidar sua esposa a orar, na noite de núpcias, Tobias disse-lhe o motivo:

“Somos filhos de santos e não nos devemos casar como os gentios que não conhecem a Deus” (Tb 8, 5)

A oração e a continência afastaram o demônio. Raguel, o pai de Sara, já havia mandado cavar um túmulo a fim de sepultar o genro antes do amanhecer, na suposição de ele haver morrido. Grande foi sua surpresa ao constatar que os recém- casados estavam vivos, dormindo, sem qualquer dano. Mandou então rapidamente fechar o túmulo que mandara cavar.

Ora, se Tobias e Sara não podiam casar-se “como os gentios que não conhecem a Deus”, muito maior razão têm hoje os casais cristãos para se distinguir dos demais.

Tobias e Sara eram filhos dos santos patriarcas, mas Cristo ainda não tinha vindo para redimi-los. Os cristãos, pelo Batismo, são filhos de Deus, membros de Cristo, templos do Espírito Santo e de modo nenhum podem casar-se como os pagãos que não conhecem a Deus. Cristo elevou o matrimônio à dignidade de um sacramento, ou seja, de um sinal eficaz do amor entre Ele e sua Igreja.

Diz São Paulo, recordando o Gênesis:

“Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe e se ligará à sua mulher, e serão ambos uma só carne. É grande este mistério: refiro-me à relação entre Cristo e sua Igreja” (Ef 5, 31-32).

Nenhum casal recém-casado está obrigado a guardar três dias de continência antes de praticar a união sexual. Mas o exemplo de Tobias e Sara recorda-nos que o verdadeiro amor sabe abster-se não só do que é pecaminoso (como as uniões sexuais antes ou fora do matrimônio), mas até do que é lícito.

Os filhos: um dom de Deus

“A Sagrada Escritura e a prática tradicional da Igreja veem nas famílias numerosas um sinal da bênção divina e da generosidade dos pais” (CIC, n. 2373)

Ora, se a família numerosa é uma bênção, ninguém pode casar-se pensando em rejeitar essa bênção. A esse respeito comenta a ex-feminista Mary Pride em seu admirável livro “De volta ao lar”:

“Se os filhos são uma bênção, então por que não queremos todos os que Deus quer nos dar? Será que você consegue pensar em qualquer outra bênção que faz os cristãos lamentarem, se queixarem e fazerem o possível para não aceitar? Não pareceria ridículo ouvir cristãos dizendo: ‘Estou farto de todo este dinheiro que Tu me deste, Senhor. Por favor, não me dês mais nada! ’ ou ‘Já tenho suficientes unções do poder do Espírito Santo sobre mim para durar pelo resto da vida. Para mim, chega, obrigado!’” (De volta ao lar: do feminismo à realidade, p. 70)

O Papa João Paulo II, quando ainda era cardeal de Cracóvia, escreveu:

“A família é na realidade uma instituição educadora, portanto é necessário que ela conte, se for possível, vários filhos, porque para que o novo homem forme sua personalidade é muito importante que não seja único, mas que esteja inserido numa sociedade natural. Às vezes fala-se que é ‘mais fácil educar muitos filhos do que um filho único’. Também se diz que ‘dois não são ainda uma sociedade; eles são dois filhos únicos’ (Amor e responsabilidade, p. 216)

Há alguns anos uma jovem enviou-me uma mensagem por correio eletrônico contando seu “problema”: estava noiva e, segundo sua previsão, estaria fértil no dia de seu casamento. Que fazer? Respondi-lhe que fazia votos de que ela engravidasse. Expliquei-lhe que não faz sentido alguém se casar já pensando em não ter filhos (sem dúvidas, ela e seu noivo, após o casamento, poderiam livremente imitar Tobias e Sara, guardando alguns dias de continência. Mas o objetivo não poderia ser o de evitar filhos, e sim do de consolidar o amor conjugal). Se ela me dissesse que desejava ter filhos sim, mas só depois de três anos, eu lhe responderia: “então você se case daqui a três anos”.

Sem se dar conta, aquela moça, que aliás estava com boa-fé, havia-se tornado vítima da mentalidade segundo a qual os filhos devem ser cuidadosamente “planejados”. Gerá-los logo no início do matrimônio seria um ato de “irresponsabilidade”.

A doutrina da Igreja, porém, é outra. Dentro do matrimônio, a regra é gerar filhos. Não gerar filhos é a exceção. Vejamos o que nos ensina o Papa São Paulo VI sobre paternidade responsável em sua histórica encíclica “Humanae Vitae”, n.10:

“Em relação às condições físicas, econômicas, psicológicas e sociais, a paternidade responsável exerce-se tanto com a deliberação ponderada e generosa de fazer crescer uma família numerosa, como com a decisão, tomada por motivos graves e com respeito pela lei moral, de evitar temporariamente, ou mesmo por tempo indeterminado, um novo nascimento”

Note-se como a Igreja elogia a família numerosa e como, ao mesmo tempo, só admite evitar um novo nascimento “por motivos graves” e com respeito pela lei moral. O Catecismo adverte que cabe aos esposos “verificar se seu desejo [de espaçar os nascimentos] não provém do egoísmo, mas está de acordo com a justa generosidade de uma paternidade responsável” (CIC, n. 2368). O único meio admitido pela Igreja para espaçar os nascimentos é a continência periódica, ou seja, a abstinência de relações sexuais nos dias férteis:

“A continência periódica, os métodos de regulação da procriação baseados na auto- observação e o recurso aos períodos infecundos são conformes aos critérios objetivos da moralidade” (CIC, n. 2370)

Porém, para evitar que o casal decida valer-se da continência periódica por motivos egoísticos, a Igreja dá aos confessores a seguinte orientação:

“Será conveniente [para o confessor] averiguar a solidez dos motivos que se têm para a limitação da paternidade ou maternidade e a liceidade dos métodos escolhidos para distanciar e evitar uma nova concepção” (Pontifício Conselho para a Família, Vade-mécum para os confessores sobre alguns temas de moral relacionados com a vida conjugal, 1997, n. 12)

Na minha opinião, o intervalo entre um filho e outro não deveria ser maior do que dois anos. Acima disso, a diferença entre as idades dificulta o entrosamento. Imagine um casal com quatro filhos: um de quinze anos, outro de dez anos, um terceiro de cinco anos e o caçula de um ano. O mais velho não se interessa pelas brincadeiras do de dez anos; o de dez anos não brinca com o de cinco anos; e o de cinco anos não brinca com o caçula. A excessiva distância entre as idades faz deles quatro filhos isolados, como se fossem filhos únicos. Você, que já foi criança, deve ter sentido como foi bom ter tido (ou como foi mau não ter tido) irmãos com idades próximas à sua.

O perigo do “planejamento familiar”

Antes de construir uma casa é preciso planejá- la. Será grande ou pequena? Terá um ou dois pisos? Quantos quartos e quantos banheiros? A resposta a essas perguntas depende da vontade do construtor e da utilidade que ele pretende dar à edificação.

Uma família, porém, é diferente de uma casa feita de tijolos. O tamanho dela não depende simplesmente da vontade do casal. Ele não pode “planejar” a família como faria com um edifício. O termo “planejamento familiar” dá a entender que compete ao casal – e somente a ele – determinar o número e o espaçamento de seus filhos. Ora, essa autonomia absoluta não existe. Só Deus é o Senhor da Vida. O que o casal pode e deve fazer é ficar atento aos sinais de Deus para descobrir qual é a sua vontade, e pô-la em prática.

Deus nos escolheu antes da criação do mundo (cf. Ef 1, 4). Portanto, para ele, não há vida humana que não esteja no seu plano. Também a vinda de seu Filho ao mundo estava obviamente no seu plano.

E Maria, como todos os israelitas, ansiava pela vinda do Messias. Mas não estava absolutamente no plano da Virgem de Nazaré que fosse ela a mãe do Messias. Sua gravidez, planejada por Deus desde toda a eternidade, não havia sido “planejada” por ela. Surpreendida pelo anúncio do anjo, ela pergunta:

“Como é que vai ser isso, se eu não conheço homem algum?” (Lc 1, 34)

Aliviada com a resposta do anjo de que ela conceberia por obra do Espírito Santo, sem perder a virgindade, responde:

“Eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1, 38).

Assim, graças a uma gravidez “não planejada”, mas aceita com amor, é que a salvação chegou ao mundo.

Os documentos oficiais do Santo Padre e da Cúria Romana sobre a regulação da procriação nunca empregam o termo “planejamento familiar” (aliás, a maior rede privada de aborto, esterilização e anticoncepção chama-se Federação Internacional de Planejamento Familiar – IPPF). Pode-se em vão procurar essa expressão na encíclica Humanae Vitae (Paulo VI, 1968), nos documentos do Concílio Vaticano II (1962-1965), na exortação apostólica Familiaris Consortio (João Paulo II, 1981), na encíclica Evangelium Vitae (João Paulo II, 1995) ou no Catecismo da Igreja Católica (1992). A expressão tampouco aparece no Vade-mécum para os confessores sobre alguns temas de moral relacionados com a vida conjugal (Pontifício Conselho para a Família, 1997), que trata especificamente do tema da anticoncepção.

Ao contrário, a Igreja usa:

  • “paternidade responsável” (que inclui a abertura para uma família numerosa),
  • “continência periódica” e
  • “métodos de regulação da procriação”.

Lamentavelmente há católicos, incluindo sacerdotes, bispos e até Conferências Episcopais, que dizem que a Igreja aceita o “planejamento familiar natural” ou os métodos naturais de “planejamento familiar”. Essa dissonância com o Magistério da Santa Sé deveria absolutamente ser evitada, porque não é uma mera questão de palavras. Por trás das palavras estão conceitos que podem distorcer a doutrina cristã sobre o matrimônio e a procriação.

Continência periódica é a abstenção do ato conjugal durante os períodos férteis com o fim de evitar, por razões graves, uma nova gravidez. É vulgarmente conhecida como “método natural” de regulação da procriação. No entanto, ela não é só um “método”, mas sobretudo uma virtude. Significa autodomínio e renúncia. Não pode ser vista como um meio eficiente de se evitar uma coisa indesejável chamada “filho”. Não pode ser empregada com o mesmo espírito com que se usa um método anticoncepcional. Sobre isso, assim se exprimia o então Cardeal Karol Wojtyla, futuro Papa João Paulo II:

A continência como virtude não pode ser concebida com um ‘meio anticoncepcional’. […] A continência interesseira, ‘calculada’ desperta dúvidas. Ela, como qualquer outra virtude, deve ser desinteressada, concentrada na ‘retidão’ em si, não só na ‘utilidade’. […] Se a continência deve ser virtude e não só ‘método’, no sentido utilitarista, não pode contribuir para a destruição da disponibilidade procriativa daqueles que convivem ‘maritalmente’ como esposos. […] E por isso não se pode falar da continência como virtude quando os esposos aproveitam os períodos de infertilidade biológica unicamente para não ter filhos, e convivem só e exclusivamente nestes períodos para o próprio conforto. Proceder assim equivale a aplicar o ‘método natural’ em contradição com a sua natureza. Opõem-se tanto à ordem objetiva da natureza, como à essência do amor” (Amor e responsabilidade, p. 215-216)

Ou seja,

  • é verdade que o muco cervical (que escorre pelo colo uterino) se torna fluido e úmido nos dias férteis e seco nos dias inférteis;
  • é verdade que a observação do muco não exige que a mulher tenha um ciclo menstrual regular;
  • é verdade que esse método – conhecido como método Billings – pode ser usado pelos casais mais pobres e mais incultos;
  • é verdade que a Organização Mundial de Saúde (OMS), após ter experimentado o método Billings em diversos países – Filipinas, Índia, Nova Zelândia, Irlanda e El Salvador – concluiu que sua eficácia é de 98,5%.

Mas também é verdade que esse método não pode ser usado por motivo fútil.

Não é, portanto, louvável a atitude de um casal que usa o método Billings para não procriar:

  • porque tem medo dos riscos normais de uma nova gravidez,
  • porque não tem confiança na Providência de Deus,
  • porque não quer ter o trabalho de educar mais filhos,
  • porque acha que gerou um número de filhos “suficiente”.

A Igreja não precisa tanto de casais que deem testemunho de que o método Billings é “eficiente” para não ter filhos. Precisa sobretudo de casais que testemunhem que os filhos são sempre bem- vindos, e que só por motivos graves (e enquanto durar tais motivos) se servem desse método para não procriar.

O pecado da anticoncepção

O ato conjugal tem dois significados: o unitivo (“eles se tornam uma só carne” – Gn 2, 24) e o procriador (“sede fecundos, multiplicai-vos” – Gn 1, 28). Serve para exprimir o amor entre os cônjuges (união) e para transmitir a vida humana (procriação).

Nem sempre o ato conjugal gera filhos, mas ele deve estar sempre aberto à procriação. Senão, ele deixa de ser um ato de amor para ser um ato de egoísmo a dois.

No seio da Santíssima Trindade, o Pai ama o Filho:

“Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3, 17)

O Filho ama o Pai: “guardei os mandamentos de meu Pai e permaneço no seu amor” (Jo 15, 10). Mas porque o amor de ambos é autêntico, não permanece estéril. Dele procede uma terceira pessoa: o Espírito Santo (“que o Pai enviará em meu nome” – Jo 14, 26).

De fato, não pode existir um amor fechado entre dois. O verdadeiro amor sempre se abre a um terceiro. O amor conjugal é “amor fecundo, que não se esgota na comunhão entre os cônjuges, mas que está destinado a continuar-se suscitando novas vidas” (Paulo VI, Humanae Vitae, 1968, n. 9).

Uma mulher depois da menopausa não pode mais ter filhos. Nem por isso ela está proibida de ter relações sexuais com seu marido. Pois ela não pôs obstáculos à procriação. Foi a própria natureza que a tornou infecunda.

Um homem que tenha o sêmen estéril não pode ter filhos. Nem por isso ele está proibido de ter relações sexuais com sua esposa. Pois ele não pôs obstáculos à procriação. Foi a própria natureza que o tornou infecundo.

Porém se o homem e a mulher fizerem alguma coisa para impedir que o ato conjugal seja fecundo, eles estarão pecando contra a natureza. Pois é antinatural separar a união da procriação, separar o significado unitivo do significado procriador do ato conjugal. A este pecado chama-se anticoncepção. A Bíblia condena-o. Vejamos.

Judá tinha um filho primogênito chamado Her, que se casou com uma mulher chamada Tamar. Her morreu sem deixar filhos. Quando isso ocorria, segundo a lei do levirato (do latim “levir” = cunhado), a viúva deveria casar-se com o irmão do falecido.

“O primogênito que ela der à luz tomará o nome do irmão morto, para que o nome deste não se apague em Israel” (Dt 25, 6)

Ora, o irmão de Her chamava-se Onã. Judá disse a Onã:

“Vai à mulher de teu irmão, cumpre com ela o teu dever de cunhado e suscita uma posteridade a teu irmão” (Gn 38, 8)

Mas Onã sabia que o filho não seria considerado dele, mas de Her, para efeitos jurídicos. Que fez então?

“Onã sabia que a posteridade não seria sua e, cada vez que se unia à mulher de seu irmão, derramava por terra para não dar uma posteridade a seu irmão. O que ele fez desagradou ao Senhor, que o fez morrer também” (Gn 38, 9-10).

O pecado de Onã, conhecido como onanismo ou coito interrompido, consistiu em interromper o ato conjugal antes da ejaculação, a fim de evitar a procriação. O castigo de Deus para esse pecado foi a morte.

Anticoncepção é “toda a ação que, ou em previsão do ato conjugal [preservativo, diafragma, pílulas, injeções], ou durante a sua realização [onanismo], ou também durante o desenvolvimento de suas consequências naturais [lavagem vaginal], se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação” (Paulo VI, Humanae Vitae, 1968, n. 14).

Note-se que enquanto a fornicação e do adultério não respeitam as circunstâncias (quando, com quem?) em que o ato conjugal é realizado, a anticoncepção está num nível de gravidade maior: ela corrompe o ato conjugal em si. É um pecado contra a natureza. Está na mesma classe de pecados que contém o homossexualismo.

Como vimos, não é pecado praticar o ato conjugal mesmo quando se prevê que ele será infecundo. Por exemplo: quando a mulher chegou à menopausa ou quando o homem sabe que tem o sêmen estéril (após uma cirurgia na próstata). Pelo mesmo motivo, não é pecado praticar o ato conjugal nos dias em que a mulher é infértil (dias que ocupam a maior parte de seu ciclo menstrual). Mas, para que o casal possa licitamente praticar o ato conjugal somente nos dias inférteis a fim de impedir uma nova gravidez, é preciso uma razão grave. Essa abstinência de atos conjugais nos dias férteis chama-se, como vimos, continência periódica. Ela só é lícita por motivo sério (perda de um emprego, falta de acomodações na casa…) e só enquanto durar esse motivo.

Há uma diferença essencial entre a continência periódica e o pecado da anticoncepção. O casal que pratica a continência periódica nada faz para tornar um ato conjugal infecundo. Quando prevê que aquele ato será fecundo, o casal se abstém de praticá-lo. Nos dias em que o pratica, pratica-o naturalmente. Ao contrário, o casal que usa meios anticoncepcionais torna infecundo um ato que seria naturalmente fecundo.

“No primeiro [caso], os cônjuges usufruem legitimamente de uma disposição natural; enquanto que, no segundo, eles impedem o desenvolvimento dos processos naturais” (Paulo VI, Humanae Vitae, 1968, n. 16).

Como a pílula anticoncepcional funciona

Na base do crânio existe uma glândula em forma de pera chamada hipófise. Na mulher, a hipófise é responsável por lançar no sangue a cada mês o hormônio folículo-estimulante (FSH), que provoca o amadurecimento de um óvulo no ovário. Sem o FSH, não há ovulação.

Durante a gravidez, a mulher não ovula. Por quê? Porque a hipófise deixa de enviar o FSH, uma vez que o organismo está esperando o nascimento da criança que já foi concebida.

O que a pílula (ou injeção) anticoncepcional faz é enganar a hipófise, dando-lhe uma mensagem falsa de gravidez. A droga anticoncepcional é constituída de dois hormônios: estrógeno e progesterona. Quando são lançados na corrente sanguínea, eles vão até a hipófise e informam (falsamente) a essa glândula que a mulher está grávida. Enganada por essa mensagem, a hipófise deixa de produzir o FSH, à espera de que a criança – que não existe – venha a nascer. Assim, a mulher para de ovular. Deixando de produzir um óvulo, ela deixa de conceber.

De tudo o que foi dito, percebe-se que a pílula anticoncepcional não é um remédio, mas um veneno. Ela não cura um organismo doente. Ao contrário, ela faz com que o ovário – que está funcionando bem – pare de funcionar.

Você não chamaria de remédio:

  •  a um comprimido que alguém tomasse para fazer que o coração – que está batendo – parasse de bater;
  • nem a uma injeção que alguém tomasse para fazer que o pulmão – que está respirando – deixasse de respirar;
  • nem a uma pomada que alguém aplicasse para que os olhos – que estão enxergando – parassem de enxergar.

Pelo mesmo motivo, não é coerente que se chame de “remédio” a uma combinação de hormônios que se toma para paralisar os ovários. A pílula anticoncepcional é um veneno no sentido próprio da palavra.

O efeito dela, porém, não se limita aos ovários. A ingestão artificial de hormônios desequilibra o sistema endócrino e causa danos a todo o organismo. As mulheres que usam pílulas estão mais sujeitas a (cf. Maria do Carmo Gaspar; Arion Manente Góes. Amor conjugal e paternidade responsável, p. 51):

  • doenças circulatórias: varizes, tromboses cerebrais e pulmonares, tromboflebites, trombose da veia hepática, enfarto do miocárdio;
  • aumento da pressão arterial;
  • tumores no fígado;
  • câncer de mama;
  • problemas psicológicos, como depressão e frigidez;
  • obesidade;
  • manchas de pele;
  • cefaleias (dores de cabeça);
  • certos distúrbios de visão;
  • aparecimento de caracteres secundários masculinos;
  • envelhecimento precoce .

Esse é um preço muito caro que a mulher paga para se tornar, nas palavras de Santo Agostinho, “meretriz (prostituta) do próprio marido”. Eis o texto completo em que o santo reprova os casais que praticam anticoncepção:

“Se marido e mulher assim pensam, não são cônjuges. Se desde o princípio assim pensaram, não se uniram pelo casamento, mas pelo pecado. E se, finalmente, só a mulher é que assim pensa, ou só o marido, ouso dizer que, de algum modo, degenerou aquela em meretriz do próprio marido, e este em adúltero da própria mulher” (De nuptiis et concupiscentia, cp. 15)

As primeiras pílulas anticoncepcionais continham alta dose de estrógeno e progesterona. Com a finalidade de diminuir os efeitos colaterais, os fabricantes diminuíram a quantidade desses hormônios. As pílulas de hoje, com baixa dose, têm menor capacidade de impedir a ovulação. Ou seja, nem sempre elas são capazes de enganar a hipófise com um sinal falso de gravidez. Isso significa que às vezes a mulher que usa pílula pode ovular. E, se tiver relação sexual, pode conceber. Mas quando a criança concebida na trompa chegar ao útero, não encontrará um revestimento preparado para acolhê-la. O resultado será um aborto nos primeiros dias de gravidez.

A pílula anticoncepcional, portanto, é também abortiva. Este é um dos seus mecanismos de ação: impedir a implantação da criança no útero. Isso está escrito, por exemplo, na bula de anticoncepcionais como Evanor e Nordette:

mudanças no endométrio (revestimento do útero) que reduzem a probabilidade de implantação [da criança]”.

A bula de Microvlar diz:

Além disso, a membrana uterina não está preparada para a nidação do ovo (a criança)”.

Em resumo, as pílulas e injeções anticoncepcionais funcionam:

a) inibindo a ovulação;

b) aumentando a viscosidade do muco cervical, o que dificulta a penetração dos espermatozoides;

c) impedindo a implantação da criança concebida (aborto).

A malícia da pílula, portanto, vai além do pecado da anticoncepção. Seu uso pode causar um aborto, isto é, a morte do próprio filho concebido, sem que a mulher o perceba. O efeito abortivo é mais frequente nas pílulas de hoje do que nas de antigamente, que continham alta dose de hormônios.

A esterilização

Saindo de Betânia para Jerusalém, Jesus teve fome.

“Ao ver, à distância, uma figueira coberta de folhagem, foi ver se acharia algum fruto. Mas nada encontrou senão folhas, pois não era tempo de figos. Dirigindo-se à árvore disse: ‘Ninguém jamais coma do teu fruto’. E seus discípulos o ouviram. Passando por ali de manhã, viram a figueira seca até as raízes” (Mc 11, 13-14. 20).

No episódio acima, Jesus, através de uma ação simbólica, amaldiçoou uma figueira que não tinha frutos, mas apenas folhas. E não adiantou a desculpa de que “não era tempo de figos”. Por quê? Porque o cristão deve frutificar todo o dia. Não há nenhum tempo em que estejamos dispensados de dar frutos de caridade:

“Meu Pai é glorificado quando produzis muito fruto e vos tornais meus discípulos” (Jo 15, 8).

Que dizer então daqueles e daquelas que voluntariamente entregam seus órgãos reprodutores ao bisturi a fim de se tornarem estéreis? Cometem um pecado grave. Mutilam o próprio corpo, que é templo do Espírito Santo (1 Cor 6, 19), rejeitam a bênção dos filhos (Sl 126, 3) e atraem sobre si a maldição da esterilidade. A Igreja condena “a esterilização direta, tanto perpétua quanto temporária, e tanto do homem [vasectomia] como da mulher [laqueadura ou ligadura de trompas]” (Paulo VI, Humanae Vitae, 1968, n. 14).

Pode haver algum procedimento médico ou cirúrgico que cause indiretamente a esterilidade. Imagine uma mulher com tumor no útero ou um homem com tumor na próstata. É necessário fazer uma cirurgia para remover o órgão doente, antes que o câncer se espalhe pelo organismo. Tal cirurgia é feita para tratar o câncer, não para causar a esterilidade. No entanto, como efeito secundário indesejado, mas inevitável, o homem (após a remoção da próstata) ou a mulher (após a remoção do útero) ficará estéril. Não é isso o que a Igreja condena. Ela condena a esterilização direta, ou seja, aquele ato que tenha como fim ou como meio tornar a pessoa estéril.

Imagine que você, que tem os olhos sadios, resolvesse arrancá-los. Cometeria um grave pecado contra o próprio corpo, pelo qual Cristo pagou um alto preço (1 Cor 6, 20). Se você, porém, resolvesse arrancar ou estragar não os olhos, mas um órgão do aparelho reprodutor (as trompas de Falópio na mulher ou o canal deferente no homem), o pecado seria maior. Pois tais órgãos foram criados por Deus para a sublime missão de transmitir a vida.

A esterilização direta continua sendo um pecado grave mesmo se feita “com boa intenção”. Ninguém pode dizer a uma mulher que ela é “obrigada” a fazer laqueadura, alegando que há o grave perigo de que ela morra na próxima gravidez. Pois quem disse que ela é obrigada a engravidar? A gravidez não vem por acaso, mas é sempre fruto de uma relação sexual. E a relação sexual é um ato livre. Ninguém é “obrigado” a praticá-la. Se não convém para a saúde uma nova gravidez, o casal pode muito bem abster-se das relações sexuais no período fértil. É para casos como esse que serve a continência periódica. Nunca é necessário nem lícito mutilar os órgãos reprodutores para evitar a procriação.

O aborto

Os castos não abortam. O aborto é o fundo do abismo em que caem aqueles que não souberam valorizar a castidade. Que é o aborto?

“O aborto provocado é a morte deliberada e direta, independentemente da forma como venha a ser realizada, de um ser humano na fase inicial de sua existência, que vai da concepção ao nascimento” (João Paulo II, Encíclica Evangelium Vitae, n. 58)

Para que haja um aborto, não importa o meio usado para matar a criança. Ela pode ser aspirada em pedacinhos (aborto por aspiração), esquartejada (aborto por curetagem), envenenada por uma solução cáustica (aborto por envenenamento salino) ou extraída viva e deixada morrer à míngua (aborto por cesariana).

Qual o juízo da Igreja sobre o aborto?

“O aborto direto, isto é, querido como fim ou como meio, constitui sempre uma desordem moral grave, enquanto morte deliberada de um ser humano inocente” (João Paulo II, Encíclica Evangelium Vitae, n. 62)

A Igreja, portanto, condena o aborto:

  • O quando ele é querido como fim em si mesmo;
  • O ou quando ele é querido como meio para obter um fim. Não importa que esse fim seja bom (por exemplo, aliviar o sofrimento da mãe, livrá-la de uma desonra ou mesmo salvar a sua vida). O fim não justifica os meios.

Se a criança em gestação é gravemente doente, os pais devem amá-la com um amor especial. Longe de pensar em matá-la, eles devem acolhê-la, levá-la para ser batizada (em caso de emergência, qualquer pessoa pode batizar a criança, derramando água sobre sua cabeça, enquanto pronuncia as palavras:’Eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo'”), dar-lhe um nome e acompanhá-la em todos os momentos de sua vida, mesmo que ela viva pouquíssimo tempo após o nascimento. Depois de sua morte, devem dar-lhe as honras de um enterro cristão. É inadmissível abortar a criança doente como se ela fosse um produto defeituoso que deve ser jogado fora.

Se a criança foi gerada em um ato de estupro, abortá-la é uma injustiça monstruosa. Mais monstruosa que o próprio estupro. Será justo que a mãe faça com a criança o que nem o estuprador fez com ela: matá-la? A repugnância contra o crime nunca pode converter-se em repugnância contra um inocente concebido nesse crime. A vida é sempre um dom de Deus, ainda que gerada em circunstâncias pecaminosas, como o adultério, a prostituição ou a violência sexual.

Pergunta-se: existe algum caso em que o aborto seja o único meio para salvar a vida da gestante? Deixemos que responda o médico-legal Dr. João Batista de Oliveira Costa Júnior em sua aula inaugural aos alunos dos Cursos Jurídicos da Faculdade de Direito da USP de 1965:

“Ante os processos atuais [de 1965!] da terapêutica e da assistência pré-natal, o aborto não é o único recurso; pelo contrário, é o pior meio, ou melhor, não é meio algum para se preservar a vida ou a saúde da gestante. Por que invocá-lo, então?” (João Batista de O. Costa Júnior, Por quê, ainda, o aborto terapêutico?, Revista da Faculdade de Direito da USP, 1965, volume IX, p. 236)

E mais adiante:

“O aborto terapêutico não é o único meio para preservar a vida da gestante, sendo mesmo mais perigoso do que o prosseguimento da gravidez” (Ibidem)

Antigamente, porém, quando a cesariana era uma operação arriscada, com alta taxa de mortalidade materna, parecia que, diante de uma mãe com bacia estreita, o único meio de salvá-la seria matar o bebê, perfurando-lhe o crânio com o parto já iniciado e aspirando-lhe a massa cerebral. Esse procedimento era chamado craniotomia. O Santo Ofício – hoje Congregação para a Doutrina da Fé – foi então consultado:

Pode-se ensinar com segurança nas escolas católicas que é lícita a operação chamada craniotomia quando, omitindo-a, morreriam a mãe e o filho e, ao invés, executando-a, a mãe seria salva e o bebê morreria?

A resposta, de 28 de maio de 1884, foi: “não se pode ensinar com segurança”.

Ainda, portanto, que existisse algum caso em que o aborto fosse “necessário” para salvar a vida da gestante, ele seria gravemente pecaminoso. Nunca é lícito matar diretamente um inocente nem sequer para salvar outro inocente.

Dizia o Papa Paulo VI:

“Nunca é lícito, nem sequer por razões gravíssimas, fazer o mal [por exemplo, matar a criança], para que daí provenha o bem [a saúde da mãe]” (Paulo VI, Encíclica Humanae Vitae, n. 14)

E dizia São João Paulo II:

“Nenhuma circunstância, nenhum fim, nenhuma lei no mundo poderá jamais tornar lícito um ato que é intrinsecamente ilícito, porque contrário à Lei de Deus, inscrita no coração de cada homem, reconhecível pela razão, e proclamada pela Igreja” (João Paulo II, Encíclica Evangelium Vitae, n. 62)

O duplo efeito

Pode acontecer, porém, que durante a gravidez a mãe precise tomar um remédio ou fazer uma cirurgia que ponha em risco a vida do bebê. Por exemplo:

1. Uma mulher grávida com infecção renal precisa tomar um antibiótico, que pode ser nocivo ao bebê.

2. Uma gestante com alguma doença no coração precisa submeter-se a uma cirurgia cardiovascular. Essa cirurgia, como qualquer outra, é perigosa para a criança.

Nos exemplos acima, a morte do bebê não é o fim visado pela ingestão de antibiótico nem pela cirurgia (o fim é a cura da mãe). Também não é um meio (pois não é a morte da criança que “causa” a cura da mãe). Se a morte da criança ocorrer, será simplesmente um efeito secundário ou efeito colateral. Aliás, tais procedimentos médicos seriam feitos mesmo se a mulher não estivesse grávida.

Pergunta-se: É lícito praticar um ato bom que produza dois efeitos, um bom (querido como fim) e outro mau (tolerado como efeito)? Sim, desde que:

— o efeito bom (no caso, a cura da gestante) não seja obtido por meio do efeito mau (no caso, a morte do bebê);

— haja uma proporção entre o efeito bom querido e o efeito mau tolerado.

É preciso, pesar, portanto:

  • de um lado a gravidade da doença da mãe e a urgência do procedimento médico ou cirúrgico;
  • de outro lado, a possibilidade, que existe, mas é remota, de a criança sofrer a morte.

Se fosse possível esperar até o nascimento do bebê ou se houvesse outro meio terapêutico que fosse inofensivo para a criança, não seria lícito ingerir o antibiótico ou submeter-se à cirurgia.

O que acabamos de expor acima é o princípio da ação com duplo efeito. Note-se bem que não se trata de “praticar um ato mau com boa intenção”. Isso nunca é moralmente lícito. O fim não justifica os meios. Trata-se de praticar um ato bom com boa intenção, mas que produz um efeito colateral mau indesejável, mas inevitável, embora previsível.

Ato Bom (e praticado com boa intenção)

=> Efeito Bom (querido pelo agente como fim, e decorrente diretamente do ato bom.

=> Efeito Secundário Mau (não querido pelo agente, mas inevitável, pois decorrente diretamente do ato bom)

Nos casos que acabamos de ver, a morte do inocente não é direta, isto é, não é querida como fim nem como meio. O aborto diretamente provocado nunca pode ser aceito, quaisquer que sejam as circunstâncias, as intenções ou mesmo a suposta “necessidade” de praticá-lo.

O aborto é um dos pouquíssimos pecados que a Igreja pune com a pena canônica da excomunhão automática (latae sententiae):

Cânon 1398: Quem provoca aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae.

Não é preciso que a autoridade decrete a excomunhão. Quem comete o delito do aborto é excomungado pelo próprio fato de cometê-lo. Explica o Catecismo:

“Com isso, a Igreja não quer restringir o campo da misericórdia. Manifesta, sim, a gravidade do crime cometido, o prejuízo irreparável causado ao inocente morto, a seus pais e a toda a sociedade” (CIC, n. 2272)

A cultura da castidade

A vida deve ser respeitada ainda antes da concepção. O respeito à vida deve começar pelo respeito à sexualidade, que é a fonte e a raiz da vida. A cultura da vida coincide com a cultura da castidade. O aborto é o fundo de um abismo que se inicia com o desregramento sexual.

Se você quer ser pró-vida, seja um defensor ardente da castidade. Essa virtude deve brilhar em toda a sua vida: na roupa que você veste, nas coisas que você olha ou deixa de olhar, na maneira prudente de namorar, na fidelidade conjugal e na abertura aos filhos.

Espero que, com a leitura deste livro, você tenha descoberto a beleza fascinante da castidade. Se você descobriu, anuncie sua descoberta aos outros, que ainda não a conhecem.

Desejo que um dia nós, por termos guardado a pureza de coração, nos encontremos no céu, vendo a Deus face a face.