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Os Batistas

Pe. DR. L. Rumble, M. S. C.

IMPRIMATUR
POR COMISSÃO ESPECIAL DO EXMO. E REVMO. SR. DOM MANUEL PEDRO DA CUNHA CINTRA,
BISPO DE PETRÓPOLIS. FREI LAURO OSTERMANN, O. F. M. PETRÓPOLIS, 6-IV-1959.

ÍNDICE

Os Batistas
Origem e desenvolvimento
O credo batista
A Bíblia somente
O rito batismal
Atitude para com as crianças
Idéia de Igreja
Ministério e culto
Igreja e Estado
Terreno comum
Mal-entendidos
Princípio falso
Prova histórica
Problema da unidade
“Batismo do crente”
A imersão
Conclusão
Apêndice: Os Batistas no Brasil
Perguntas frequentes

John Smyth fundador batistas
John-Smyth (1570-1612), ministro inglês anglicano e primeiro fundador dos Batistas

Os Batistas

Os Batistas constituem provavelmente a maior de todas as denominações Protestantes. Numa base mundial, eles somam quase uns 13.000.000, dos quais para mais de 10.000.000 se encontram nos Estados Unidos da América. Por isto, à parte tudo o mais, a sua importância numérica torna-os merecedores de atenção. Que é que, na apresentação Batista do Cristianismo, granjeia a fidelidade de tantos milhões de pessoas? Por outro lado, a gente é levado a perguntar o que é que ela inclui ou omite que o resto dos 685.000.000 de Cristãos professos, no mundo, tem de rejeitar? Foram estas questões que instigaram a redação deste folheto, dedicado a um estudo imparcial da história e dos ensinamentos das Igrejas Batistas.

Origem e Desenvolvimento

Os Batistas devem o seu nome ao seu ensino de que o Batismo cristão só pode ser recebido por crentes adultos, como um símbolo do seu parentesco pessoal com Cristo; e que ele deve ser administrado somente por imersão.

A origem deles como denominação separada data dos primórdios do século XVII. Alguns tentaram sustentar a continuidade deles através de todos os séculos desde o tempo de São João Batista, que eles declaram haver batizado por imersão. Mas historicamente, os primeiros Batistas conhecidos não tiveram idéia de impor o batismo por imersão. Rejeitavam o batismo de crianças, mas, ao batizarem crentes adultos, faziam-no derramando-lhes água na cabeça, de acordo com o costume até então aceito. O batismo por imersão foi prescrito pela primeira vez em 1644, mais de trinta anos depois de começado o movimento.

Escritores mais bem informados não reclamam a contínua existência incorporada da sua Igreja através dos tempos, mas, dizem que as suas principais crenças e práticas nunca deixaram de ter representação entre as seitas, anteriores à Reforma, que se separaram de Roma; e que os seus princípios, pelo menos, derivam do Novo Testamento e dos cristãos do século primeiro. Mas esta é uma teoria dependente, quanto ao seu valor, de evidência histórica, evidência que outros negam existir.

Volvendo-nos para a história real, pouco depois de haver Martinho Lutero iniciado a Reforma protestante na Alemanha, em 1517, ali surgiu um “leader” chamado Thomas Munzer, que entendeu que Lutero não tinha ido bastante longe no seu repúdio à velha religião. Em 1525, Munzer procurou estabelecer o que ele considerava como um reino espiritual de almas convertidas, independentes de toda autoridade, eclesiástica ou civil. Com Lutero, ele ensinava que a Bíblia é a guia única do homem para a verdade religiosa, e que os homens são justificados somente pela fé. Porém foi mais longe do que Lutero, declarando que todas as pessoas que haviam sido batizadas em criança de modo algum estavam validamente batizadas; e que deviam ser convertidas novamente a Deus, e ser rebatizadas como adultos. O nome Anabatistas, que significa rebatizantes, foi-lhes dado por causa dessa prática. Mas o fanatismo selvagem e destruidor que caracterizava muitos desses Anabatistas levaram-nos a descrédito, e os Batistas modernos negam qualquer ligação com eles. Todavia, a doutrina Batista do batismo dos crentes, e a insistência deles sobre a independência eclesiástica ou civil, são, indubitavelmente, devidas em grande extensão à influência dos Anabatistas.

Como real fundador dos Batistas deve ser considerado John Smyth. John Smyth era um clérigo anglicano que, juntamente com o seu rebanho, recusou conformar-se à Igreja da Inglaterra, então estabelecida. Em 1602, ele e os seus sectários fugiram da Inglaterra para Amsterdam, na Holanda. Ali, influenciados pelos Anabatistas, rejeitaram o batismo infantil, e em 1609 ele se rebatizou a si próprio, derramando água na cabeça. Em tempo algum acreditou ser necessária a imersão. Contudo, teve dúvidas sobre a validade do rebatismo por si mesmo administrado, e mais tarde foi novamente batizado pelos Menonitas holandeses, embora, uma vez mais, não por imersão.

Em 1611, com um companheiro chamado Thomas Helwys, redigiu uma declaração de fé insistindo sobre a Bíblia como a única autoridade em religião, sobre a justificação pela fé, sobre os crentes adultos como os únicos objetos legais do batismo, e acentuando particularmente a completa separação entre a Igreja e o Estado. Declarou que as autoridades civis são obrigadas, a um tempo, a abstrair-se de religião e a limitar-se só aos negócios temporais, deixando os indivíduos absolutamente livres de adotar e praticar qualquer religião, ou nenhuma, como lhes aprouver. Ele parecia não recear qualquer perigo de que os dirigentes políticos, concitados a deixarem sozinha a religião, breve dissessem também à religião para os deixar sozinhos, não reconhecendo na sua legislação qualquer obrigação de religião ou dos seus princípios, e deixando assim aberto o caminho para o Estado irreligioso, e mesmo anti-religioso!

No ano seguinte, 1612, John Smyth morreu na Holanda. Thomas Helwys, com uma quantidade dos separatistas ingleses exilados, voltou então para a Inglaterra e fundou a primeira Igreja Batista, em Spitalfields, Londres. Por sua vez, Thomas Helwys morreu em 1616.

Os Batistas fundados por Smyth e Helwys eram conhecidos como “Batistas Gerais”, pelo fato de repudiarem a doutrina de Calvino acerca da predestinação só dos eleitos, sustentando que Cristo morreu por todos os seres humanos em geral. Eles acentuavam que cada indivíduo é verdadeiramente responsável pela sua decisão de aceitar ou rejeitar a salvação. Por volta de 1650, mais de trinta anos depois da morte de Helwys, os Batistas Gerais começaram a ensinar que o batismo por imersão é a única forma válida. Esta doutrina eles a adotaram dos “Batistas Particulares”, dos quais veremos mais alguma coisa dentro em breve.

No século XVIII, muitos dos Batistas Gerais desviaram-se da sua crença na Divindade de Cristo, e tornaram-se praticamente Unitários. Mas, em 1770, os que permaneceram ortodoxos sobre este assunto formaram uma associação separada chamada a “Nova Liga”, assim continuando a Igreja Batista original.

Inteiramente independente da origem dos Batistas Gerais foi a dos Batistas Particulares. Estes organizaram-se primeiramente em Southwark, na Inglaterra, em 1633, sob a direção de John Spillsbury, que se separara dos Independentes, os precursores dos Congregacionalistas, tomando deles a estrita doutrina calvinista sobre a predestinação. Longe de crer que Cristo morreu por todos os homens, ele sustentava que Cristo morreu só pelos eleitos, e não pelos outros. Daí o nome de “Batistas Particulares”, por oposição ao de “Batistas Gerais”. Em 1644, os Batistas Particulares aditaram à sua doutrina do batismo dos crentes a declaração de que a única forma válida deste é por imersão; decisão, como vimos, adotada pelos Batistas Gerais em 1650.

A princípio, devido ao seu Calvinismo, os Batistas Particulares eram muito exclusivistas. Porém a influência do reavivamento wesleyano acarretou modos de ver mais brandos, e em muitas das suas Igrejas eles começaram a admitir à sua companhia e à Comunhão até mesmo os não-batizados, contanto que professassem fé em Cristo. Tornaram-se também mais moderados na sua atitude para com a atividade missionária. A princípio, toda atividade missionária era condenada. Eles sentiram que era dever seu esperar até que viessem a eles aqueles missionários predestinados por Deus. Mas, em 1792, foi formada por William Carey (1761-1834) a Sociedade Missionária Batista; e, em 1816, os Batistas Gerais fizeram o mesmo, com a sua própria Sociedade Missionária.

Por anos continuaram os Batistas na Inglaterra divididos em duas secções, Gerais e Particulares; mas, em 1891, uniram-se para formar a União Batista da Grã-Bretanha e Irlanda. Contudo, muitas congregações individuais mantiveram-se afastadas da União; e, até hoje, há muitos grupos separados de Batistas em congregações isoladas.

Nos Estados Unidos da América, as Igrejas Batistas devem a sua origem a Roger Williams (1600-1683). Elas não têm ligação estritamente histórica com o Movimento Batista na Inglaterra; porquanto, embora Roger Williams tenha vindo da Inglaterra, não veio como Batista. Na Inglaterra, ele fôra ordenado clérigo anglicano, mas decidiu romper com a Igreja do Estado, e fez-se Independente. Fugiu para a América a fim de salvaguardar a sua liberdade; e, ali, chegou à conclusão de que a Igreja só pode constar de membros regenerados. Em 1639 repudiou o batismo que recebera em criança, e um leigo chamado Holliman rebatizou-o por imersão, em Providence. Então ele, por sua vez, rebatizou Holliman e outros. Assim estabeleceu Roger Williams a primeira Igreja Batista na América. Porém pouco depois afastou-se da Igreja que fundara, abandonou inteiramente a crença no batismo, e não mais quis saber de quaisquer corporações cristãs organizadas.

A Igreja Batista tem manifestado crescimento fenomenal nos Estados Unidos, contando hoje em dia para mais de 10.000.000 de adeptos. Mas esses adeptos estão muito divididos entre si. Organicamente estão agrupados nas três maiores Convenções, a do Norte, a do Sul e a de Côr; e há uma quantidade de seitas Batistas independentes, tais como: Batistas do Sétimo Dia, Dunkards ou Batistas alemães, Batistas do Livre Arbítrio, Batistas Primitivos, Batistas dos Seis Princípios, Batistas Separados, Batistas Unidos, Igreja Batista de Cristo, e muitas outras. Mas, em geral, todas concordam em rejeitar o batismo em criança, restringindo o rito só aos crentes adultos, e em exigir o batismo por imersão Cinicamente.

O Credo Batista

Volvendo-nos para um estudo das crenças religiosas dos Batistas, desde o princípio deveria ser notado que, praticamente, o credo deles é o de não dever haver Credo nenhum; ou, pelo menos, o de não estar ninguém obrigado em consciência a adotar qualquer Credo. Eles têm resistido a todo esforço daqueles de seus membros que têm querido conseguir a aceitação de uma declaração autoritária de doutrina a ser imposta a todas as Igrejas. Declaram que, embora os Credos antigos devam ser respeitados, devem, entretanto, ser considerados como meras declarações de vistas prevalentes no tempo em que foram formuladas, porém de modo algum como sendo de obrigação. E nenhuma subscrição de quaisquer afirmações dogmáticas é necessária para ordenação no ministério Batista. Eles insistem em que a prova do cristianismo de alguém é antes a qualidade da sua vida do que qualquer sistema fixo de doutrina.

Ao mesmo tempo, não podiam fugir inteiramente à necessidade de afirmar a sua posição doutrinária. Assim, em 1688, publicaram a “Confissão de Filadélfia”. Era esta uma revisão da “Confissão de Westminster” de 1642, quando o partido Presbiteriano na Igreja da Inglaterra reviu numa direção calvinista os “Trinta e Nove Artigos de Religião”. Em 1833, foi publicada a já menos Calvinista “Confissão de New-Hampshire”; e muitas outras “Confissões de Fé” seccionais têm sido publicadas.

Porém os Batistas insistem em que todas essas declarações de fé são meras exposições da doutrina geralmente aceita, que todas estão sujeitas à revisão mediante recurso à Bíblia, e que cada leitor da Bíblia é competente para formar por si mesmo as suas idéias sobre a verdade. Eles não parecem perturbar-se com o pensamento de que, se dois Batistas individualmente chegam a conclusões diametralmente opostas, é impossível, para ambos, ter chegado à verdade! Para eles, o individualismo subjetivo precede todas as leis da lógica objetiva.

A Bíblia Somente

Contudo, a despeito da sua rejeição de qualquer Credo obrigatório, há algumas afirmações doutrinárias que eles consideram absolutamente essenciais. Certamente eles exigem a admissão do dogma básico protestante de que a Bíblia, e só a Bíblia, contém “todas as coisas necessárias à salvação, de modo que tudo quanto não é lido nela e nem pode ser provado por ela, de ninguém se deve exigir que seja crido como artigo de fé, ou seja julgado requerido ou necessário para a salvação”.

Os Batistas crêem que a Bíblia é o guia infalível e autorizado para tudo na vida. A cada leitor individualmente ela fala por si mesma. Não há necessidade de Igreja ou de entendido para explicar o significado dela; e não há interpretação geralmente reconhecida do texto à qual possa alguém ajustar as suas conclusões.

Cada vez mais, no entanto, os Protestantes, inclusive mesmo muitos Batistas, começam a duvidar do valor do princípio “a Bíblia somente”. No seu recente livro “The Bible today”, o Prof. C. H. Dodd, de Cambridge, escreve que os reformadores protestantes, colocando a Bíblia à disposição dos não-instruídos, deu um passo fatal. Pôde ela então ser lida, e foi largamente lida, “sem nota ou comentário”, sem a orientação que havia sido fornecida pela tradição. Permitir e incentivar isto era, inevitavelmente, admitir o direito do juízo privado a interpretá-la… Porém a pretensão de poder a Bíblia ser lida justamente como se apresentava, sem a orientação da tradição, expunha-a aos perigos de um individualismo caótico… A exigência de uma desqualificada liberdade de interpretação abriu o caminho a aberrações sem limite” (pp. 21-22).

O Prof. H. Wheeler Robinson, também Batista, escreve no seu livro “The Bible in its Ancient and English Versions”, p. 294:

“O apelo protestante à Bíblia é suscetível da acusação de subjetivismo; de fato, fica ele aberto a abuso por parte de qualquer homem que quisesse ler seus próprios caprichos dentro da interpretação da Bíblia. Sem dúvida a Bíblia sofreu grandemente com isso, e a mera pretensão de ser o leitor guiado pelo Espírito de Deus não prova nada”.

A solução do Prof. Wheeler Robinson para o problema é que, enquanto a Bíblia é um guia para o conhecimento religioso, a nossa interpretação da Bíblia deve também estar sujeita à guia das tradições da Igreja. Sempre o movimento dos que desejam defender a verdade da religião cristã fica para trás em relação à posição católica, com demasiada pressa abandonada e denunciada pelos primitivos Reformadores protestantes.

O Rito Batismal

Uma segunda doutrina à qual os Batistas originariamente exigiam adesão, mesmo até o ponto de separação com todos os outros grupos cristãos, era o seu ensino distintivo sobre o rito do Batismo. Os fundadores do movimento declararam que só podiam ser considerados genuínos cristãos os que haviam sido batizados como adultos, depois de haverem experimentado uma conversão interior, e de haverem professado a sua fé pessoal em Cristo. Posteriormente, como vimos, eles repudiaram a administração do batismo mediante derramamento de água sobre a cabeça do aspirante, e insistiram em que a única forma válida é pela completa imersão da pessoa toda.

Entretanto, imediatamente surgem dificuldades quando se pergunta que significação os Batistas emprestam ao rito do Batismo. A despeito das palavras de Cristo: “Na verdade, na verdade, eu te digo, se o homem não renascer da água e do Espírito Santo, não pode entrar no reino de Deus” (Jo 3, 5), eles negam que qualquer renascimento seja efetuado pelo real rito do batismo. A “Ordenação do Batismo”, como os Batistas preferem chamar-lhe de preferência a “Sacramento do Batismo”, não passa de símbolo de uma regeneração da alma, regeneração que já teve lugar. Assim sendo, o rito em si mesmo é inteiramente secundário. A experiência pessoal de conversão, e de haver recebido a graça de Cristo, constitui os membros da Igreja Cristã. O batismo é apenas um sinal visível e externo de já se haver alguém tornado membro da invisível e espiritual Igreja de Cristo. O alvo é uma Igreja de “almas convertidas”, uma Igreja consistente em santos.

Mas tudo isto deixa lugar a dúvida quanto ao fato de ser o batismo um rito absolutamente necessário! Se alguém já se tornou membro da Igreja pela experiência pessoal de conversão à Fé, por que então se deveria exigir alguma coisa mais? Se fosse dito que aqueles que se tornaram membros da invisível Igreja de Cristo devem receber o rito visível do batismo para se tornarem membros da Igreja visível, surge outra dificuldade, pelo fato de muitos Batistas não crerem em nenhuma Igreja de Cristo visível.

Muitas Igrejas Batistas, sob a influência de tais considerações, contentam-se com ensinar o valor e o privilégio do batismo, deixando à consciência individual a decisão relativa a ser ele efetivamente recebido ou não. Eles estão preparados para acolher em qualquer espécie de comunidade restrita todos os cristãos evangélicos que professam lealdade a Cristo, às vezes mesmo admitindo os não-batizados à participação na Comunhão da Ceia do Senhor. Contudo, os Batistas estritos ainda insistem sobre a batismo por imersão como condição de participação na Igreja, e como qualificação para admissão à Comunhão.

Atitude para com as crianças

A doutrina segundo a qual o rito do batismo não causa, mas apenas pressupõe, a regeneração, resulta logicamente na rejeição do batismo das crianças. Se a Igreja é uma sociedade espiritual de santos, constando somente daqueles que experimentaram conversão e estão justificados pela fé em Cristo — experiência simbolizada pelo batismo subseqüente —, então as crianças que ainda não atingiram a idade de razão nem pertencem à Igreja nem podem ser batizadas.

Portanto, os Batistas rejeitam como pura “mágica” a idéia de que a Ordenação dó Batismo possa efetuar qualquer mudança numa criança incapaz de qualquer ato pessoal de fé em Cristo. Aprovam a dedicação de tais crianças a Deus, como um sinal de que a Igreja reconhece os direitos de Deus sobre elas; mas nem por isso as crianças se tornam membros da Igreja.

Então, que vem a ser das crianças que morrem sem batismo? Os Batistas sustentam que todas as crianças que morrem antes de atingir a idade de responsabilidade serão salvas. No seu livro “Christian Reunion”, p. 120, Hugh Martin, proeminente Ministro Batista, diz:

“A recusa dos Batistas de batizar as crianças certamente nunca se deveu a qualquer falta de crença no amor de Deus a elas, ou a qualquer recusa de fé cristãs; antes, pelo contrário. Eles sustentavam que nenhum rito era necessário para tornar uma criança filho de Deus”.

Ensino tal obviamente nega ou qualquer ordem sobrenatural de graça ou a queda do gênero humano e o nascimento de todo filho de Adão em estado de pecado original ou herdado. Também nega a necessidade da Igreja estabelecida por Cristo, e dos Sacramentos por Ele instituídos como meios de salvação, de vez que tais crianças podem ser salvas sem se tornarem membros da Igreja ou por fé e conversão pessoal ou pela recepção de qualquer Sacramento.

O insistente repúdio do batismo infantil cria uma brecha intransponível entre a Igreja Batista e outras Igrejas. O próprio Hugh Martin, no livro há pouco citado, declara que só poderia concordar com a reunião a outras Igrejas desde que ele não tivesse de renunciar à sua crença de que as crianças não necessitam de batismo e não devem recebê-lo. Mas concordaria com a continuação do batismo infantil em outras Igrejas, entendido que ele tivesse o mero valor de oração pelas crianças assim batizadas. Mas isso reduziria o Sacramento do Batismo ao nível do serviço da dedicação antebatismal dos próprios Batistas, e presumivelmente reclamaria a repetição do batismo quando a criança atingisse a idade de responsabilidade! E, como o batismo válido, mesmo de acordo com os Batistas, não pode ser recebido duas vezes, o batismo infantil de Hugh Martin sancionaria em outras Igrejas seria por sua própria natureza um rito inválido!

Nenhuma solução do problema é possível por compromisso. Os Batistas devem perguntar-se se não se enganaram rejeitando a doutrina da regeneração batismal e a prática da admissão das crianças ao rito sacramental, doutrina e prática sancionadas pelo uso cristão através de todos os séculos, e aceita pela esmagadora maioria dos cristãos hoje em dia, como em todas as idades precedentes.

Idéia de Igreja

Porém um elemento ainda mais vital na posição Batista diz respeito à doutrina da própria Igreja e à natureza da composição desta.

Lutero na Alemanha, Calvino na Suíça e os Anglicanos na Inglaterra quiseram todos conservar uma Igreja única, visível, organizada. Declararam que queriam uma “Igreja Reformada”, embora discordassem quanto ao modo como ela seria reformada. Na realidade, abandonaram a antiga Igreja e fundaram novas organizações protestantes; mas as suas Igrejas intentavam ser de per si instituições organizadas, cada qual pretendendo ser a Igreja verdadeira e reformada, Luterana, Presbiteriana ou Anglicana, conforme o caso.

Porém outras surgiram, chamadas Independentes, as quais declararam que a Igreja até então existente era incapaz de reforma, e que a única coisa que o “Povo do Senhor” tinha a fazer era abandoná-la inteiramente, e formar-se ele próprio, como melhor pudesse, em grupos ou congregações, às quais só os dignos pudessem pertencer. Este princípio dos Independentes foi adotado pelos Batistas.

Toda a idéia católica da Igreja como sociedade única, unida e visível foi, assim, rejeitada por eles. Para o Batista, a Igreja é uma associação voluntária de homens e mulheres convertidos, composta só de crentes. O Batismo, como vimos, é de mera importância acidental. A coisa essencial é a fé e a conversão experimentadas pelo adulto, e não o seu batismo.

Ademais, o princípio da “Bíblia somente” como regra de fé, com a absoluta liberdade de cada leitor indidualmente interpretá-la por si mesmo, conduziu ao Protestantismo na sua forma mais extrema e individualista.

Nele não poderia haver coisa tal como autoridade da Igreja. Assim como cada Batista era uma lei para si mesmo, assim também cada grupo voluntário de Batistas era independente dos outros, habilitado a fazer os seus próprios regulamentos e a escolher os seus próprios ministros. “Igreja”, para um Batista, significa apenas uma congregação local; de modo que, na realidade, não há “Igreja Batista”, mas somente “Igrejas Batistas”. É significativo que Roger Williams, o fundador do movimento Batista na América, tenha acabado cortando a sua ligação com toda religião institucional, até mesmo com o congregacionalismo Batista.

Sem embargo, conquanto pertençam a Congregações independentes, os Batistas acharam necessário para fins práticos formar Convenções dentro de certos limites geográficos, estaduais e nacionais. E agora têm Superintendentes Gerais para prover ao suprimento de ministros, à obra educacional, caritativa e missionária das Igrejas, e à administração dos fundos gerais. Tal federação de Igrejas Batistas é, ao menos, um passo inicial na jornada de volta à idéia de autoridade na organização de uma Igreja unida, e para fora do separatismo de congregações distintas e independentes, sujeitas a qualquer legislação que não seja a que cada um faz para si.

Ministério e Culto

Ante o que anteriormente foi dito, quase não é necessário dizer que os Batistas rejeitam tudo quanto cheire a hierarquia eclesiástica e a sacerdócio sacrifical. Qualquer idéia de um Sacramento das Sagradas Ordens conferindo poderes especiais transmitidos na Igreja por sucessão contínua desde os Apóstolos é completamente estranha a eles. Eles aceitam implicitamente o princípio protestante de que cada alma tem acesso direto a Deus, sem necessidade de quaisquer intermediários. Os funcionários nas Igrejas deles, como guias na oração e para a pregação da Palavra, são escolhidos por maioria de votos em cada congregção, e ordenados por conselhos de ministros e de representantes das Igrejas vizinhas. Tal “ordenação” consiste na autorização ou comissionamento de um leigo para funcionar em nome de todos; e não cria diferença real entre o assim ordenado e os outros na congregação.

As formas de culto nas Igrejas Batistas são, em muito, as mesmas que as dos Metodistas e Congregacionalistas. O púlpito é de suma importância para o ministério da pregação. O serviço religioso normal consiste na leitura da Escritura, orações de improviso feitas pelo ministro, hinos, sermão e bênção. Duas Ordenações sacramentais são reconhecidas, a do Batismo e a da Ceia do Senhor. Esta última é celebrada usualmente uma vez por mês, porém eventualmente mais vezes. Tal como o Batismo, também a Comunhão não é produtora de graça, mas mero símbolo desta. As palavras da consagração não se acredita que efetuem qualquer mudança nos elementos. Os Batistas não creem que, após a consagração, haja qualquer “Presença Real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho”, como a Igreja Católica ensina.

Mas o rito da Ceia do Senhor entre os Batistas não é considerado como sendo um rito de mera comemoração.

“Como é que podemos ter um mero memorial de Alguém que ainda está vivo, que ainda é a nossa vida, que ainda está presente conosco e agindo em nós?”, escreve P. T. Forsyth, no seu livro “The Church and the Sacraments”.

Os Batistas creem que em todo tempo foi dado especial significado à última refeição de Jesus com os Apóstolos; e que, embora o pão e o vinho fiquem sendo pão e vinho, e sejam apenas sinais ou símbolos do corpo e do sangue do Senhor, o rito comemorativo acarreta consigo um significado moral e espiritual, despertando entre os participantes um senso místico de comunidade com Cristo e de uns com os outros, proporcionadamente ao grau de fé da parte destes. Porém, ao passo que creem que o Senhor lhes está espiritualmente presente, de alguma maneira inteiramente especial, durante a celebração do rito eucarístico da Última Ceia, não acreditam, contrariamente aos católicos, que Ele tenha pretendido deixar à sua Igreja a sua Presença Real na própria Eucaristia.

Igreja e Estado

Mais outro aspecto bem definido da crença Batista pede atenção. Nenhum corpo de cristãos professos é mais insistente do que o dos Batistas sobre a absoluta separação entre a Igreja e o Estado. Cada um destes deve ser completamente independente do outro. A autoridade secular não pode ter nada que ver com a religião, e é o cúmulo do absurdo falar de Igreja de Estado.

A história dos Batistas dá uma chave para as razões da sua rígida oposição a qualquer ligação entre Igreja e Estado. O fundador deles na Inglaterra, John Smyth, e o seu fundador na América, Roger Williams, haviam sido ambos clérigos anglicanos. Ambos haviam-se revoltado contra a Igreja da Inglaterra dominada pelo Estado, o primeiro fugindo para a Holanda e o último para a América. E nunca quiseram ver outra vez uma religião controlada pelo Estado, ou um Estado controlado pela Igreja. Identificavam a religião controlada pelo Estado com o Anglicanismo, e o Estado controlado pela Igreja com o Catolicismo.

Mas a identificação de Igreja com Estado como imaginada por eles é uma idéia puramente protestante, e nunca foi idéia católica. O ensino católico sempre foi que há duas autoridades distintas, espiritual e temporal; ambas pretendidas e sancionadas por Deus. A Igreja deve ocupar-se do bem-estar espiritual e eterno dos homens; os governantes civis devem ocupar-se da ordem pública e do bem-estar dos homens neste mundo. Nas coisas espirituais e eternas, todos, governantes e súditos igualmente, devem fidelidade à Igreja. Nos negócios temporais e mundanos, os cristãos, como bons cidadãos, devem obedecer às leis justas do Estado. Assim a sociedade toda deve “dar a Deus o que é de Deus, e a César o que é de César”.

Mas, pela sua exigência em Augsburgo, em 1555, de que “Cujus regio, ejus religio”, isto é, de que a religião do Estado deve ser a do seu governante civil, os Reformadores protestantes aplainaram o caminho para uma Igreja dominada pelo Estado, com resultados desastrosos. Que os Batistas e todos os outros não-conformistas se rebelassem contra isso, tal como o fazem os Católicos, é perfeitamente inteligível. Mas ir até o outro extremo, e exigir completa separação entre a Igreja e o Estado, isto é e tem provado ser igualmente desastroso.

Dizer aos governantes civis que eles devem ignorar a religião, e que o Estado deve ser não-religioso, isto inevitavelmente leva a uma legislação irreligiosa, e até mesmo antirreligiosa. Não somente todas as instituições religiosas devem, nesse caso, ficar privadas da assistência do governo, como também uma educação controlada pelo Estado deve restringir-se exclusivamente a assuntos seculares, com conséqüente declínio do conhecimento religioso e interesse em futuras gerações de cidadãos sujeitos a uma atmosfera assim irreligiosa nos seus anos mais formativos. Os próprios Batistas começam a ver isto. Enquanto a vasta maioria, deles ainda insiste fortemente na absoluta separação entre a Igreja e o Estado, os mais ponderados entre eles estão se tornando cada vez mais hesitantes. Assim Hugh Martin, no capítulo sobre “Igreja e Estado”, do seu livro “Christian Reunion”, apóia a idéia de que a Igreja e o Estado têm mútuos deveres entre si, e que cada um, atuando dentro da sua respectiva esfera, pode promover notavelmente o bem do outro. Ele acentua o perigo decorrente, para a Igreja, de qualquer espécie de patrocínio pelo Estado, com a conseqüente tentação, para ela, de se tornar subserviente para com o poder secular. Mas pergun-ta:

“Enquanto, sem qualquer interferência ilegítima na soberania da Igreja no seu reino peculiar, o Estado quiser prestar à Igreja reconhecimento e incentivo, haverá alguma razão para que a Igreja rejeite esse auxílio?” (p. 166).

E declara que homens de Igreja livres estão “prontos a procurar um sistema de RECONHECIMENTO da Igreja Cristã pelo Estado que não envolva CONTROLE do Estado em assuntos espirituais”.

Nem todos os homens de Igreja livres concordariam com essa afirmação. Porém o Sr. Martin, embora rejeitando qualquer idéia de identificação entre Igreja e Estado, nega que a única alternativa no caso é que deva haver completa separação entre eles, sem ligação orgânica de qualquer espécie.

De acordo com o ensino católico, o ideal TEÓRICO é o de uma população cristã em que todos professem exatamente a mesma fé, formando uma só nação sob o ponto de vista secular, e uma só Igreja sob o ponto de vista religioso. A nação inteira, governantes e súditos igualmente, aceitariam então a direção espiritual da Igreja; e o governo salvaguardaria e promoveria os interesses temporais da Igreja. Por sua vez, a Igreja inspiraria o perfeito cumprimento, pelos seus membros, de todos os deveres, tanto religiosos como cívicos.

Na PRÁTICA, entretanto, tais condições em parte alguma são perfeitamente realizadas; e, na vasta maioria dos países do mundo, nem sequer aproximadamente realizada. E, certamente, não seria de esperar que algum Estado reconhecesse como Igreja nacionalmente aceita uma que não fosse largamente representativa da vida religiosa da nação. Portanto, onde o povo de qualquer país, como na América, professa as mais diversas religiões, ou mesmo absolutamente nenhuma, o Estado não tem opção senão adotar uma atitude de imparcial tolerância para com todas. Mas isto não veda a assistência do Estado às Igrejas para uma obra realizada como o próprio Estado teria de fazer se as Igrejas não a empreendessem por motivos religiosos e espirituais.

Uma coisa é certa. Devemos acautelar-nos contra soluções ultra-simplistas para problema tão complexo.

“Nós todos”, escreve o Batista Hugh Martin, “precisamos rezar pelo livramento da rigidez na nossa atitude para este resultado. Muitos dos nossos gritos de guerra herdados soam um pouco fracos no ar hoje em dia” (“Christian Reunión”, p. 160).

Terreno comum

Com muitas das coisas, na exposição acima feita, em que os Batistas colocam a sua ênfase principal, não podem os católicos senão simpatizar. Os aspectos da verdade plena que foram tolamente desprezados não deveriam cegar-nos para com os verdadeiros princípios vitais que os Batistas defendem contra a influência corrosiva de uma indiferença e descrença apenas larguissimamente difundida. A um convertido da Igreja Batista ao Catolicismo diríamos:

“Nada do que é bom e verdadeiro em tudo o que você até aqui sustentou deve ser abandonado. Aquilo que você creu enganadamente deve ser corrigido. As demais verdades para as quais você não atentou anteriormente, deve você permitir que enriqueçam a sua vida. Mas quaisquer verdades genuínas contidas na religião que até agora professou, você as achará também no Catolicismo, juntamente com novos motivos para uma lealdade ainda mais profunda a elas. Se você creu em Cristo, creia nEle mais firmemente ainda; se O amou, conserve esse amor, e desenvolva-o, pois nunca pode amá-lO como Ele merece, e como a Igreja Católica deseja que você O ame”.

Tomemos a fé na Bíblia como na Palavra de Deus. O fato de os Batistas não reconhecerem outra autoridade a não ser a da Bíblia não altera o fato de eles crerem que o conteúdo da Sagrada Escritura foi revelado por Deus. Que nem sempre eles hajam interpretado corretamente esse conteúdo não altera o fato de haverem lutado pela preservação da Bíblia contra os constantes e destruidores ataques da crítica racionalista. E nisto, ao menos, provavelmente mais do que quaisquer outras Igrejas Protestantes, eles se acham em simpatia com um aspecto muito importante do ensino católico. Porquanto a Igreja Católica definiu como artigo de fé que Deus é o principal autor quer do Antigo quer do Novo Testamento, doutrina da qual jamais pode ela recuar. Embora neguem que só a Bíblia é fonte adequada de doutrina cristã, os católicos sustentam com todas as veras a verdade de tudo o que a Bíblia contém, pedindo apenas dos que dela estão separados uma consideração mais profunda daquilo que o conteúdo da Bíblia realmente implica.

Novamente, tomemos a necessidade da fé. Tanto Católicos como Batistas concordam em que a fé em Cristo é necessária para a salvação. Isto não pode ser demasiadamente destacado. Como é que a virtude da fé pode ser implantada na alma de uma criança pelo batismo, isto é assunto a ser discutido em qualquer outra parte; mas essa questão de modo algum prejudica a insistência católica sobre a necessidade da fé. Se alguns Batistas têm ido longe demais, acima de todos os dos primeiros tempos, em sustentar que os homens podem ser salvos pela fé sem as boas obras, essa visão exagerada é menos perigosa do que o oposto, isto é, que os homens podem ser salvos pelas obras sem a fé — erro que substituiria pelo mero humanitarismo e filantropia a religião cristã. A doutrina católica de que tanto a fé como as boas obras pelo amor de Deus, de que tanto a fé cristã como a conduta cristã são requeridas do homem que quer salvar a sua alma, certamente não deveria deixar de apelar em pró do bom viver de qualquer Batista.

A insistência Batista sobre a necessidade de conversão pessoal também frisa um aspecto muito valioso e importante da verdade. Nenhum cumprimento meramente formal das práticas de religião salvará quem quer que seja. Como Santo Tomás de Aquino aponta, os ritos religiosos externos só têm valor como expressões de disposições interiores de piedade e de amor a eles correspondentes e despertados por eles. Até mesmo os Sacramentos, embora possuindo especial eficácia em si mesmos, têm os seus efeitos proporcionalmente às disposições dos que os recebem. Nesta matéria, pois, a verdade católica fica entre os dois extremos. Se uma religião externa, institucional, não pode dispensar ninguém da religião espiritual pessoal, daí não se segue que esta última possa dispensar da primeira. O homem não é um espírito desencarnado, e não pode viver por meio de uma religião desencarnada. Assim como a sua alma está engastada num corpo material, assim também uma religião de acordo com a sua natureza estará engastada em Sacramentos e cerimônias visíveis e tangíveis. Os próprios Batistas não podem evitar todos os ritos externos; e a questão não versa sobre se as práticas rituais são legais, mas sim sobre o que serão. Este é o problema que merece, de muito, ulterior cogitação.

Outro ideal Batista com o qual, como ideal, ninguém poderia razoavelmente contender, é o da liberdade política e religiosa. Aqui todas as divergências concernem à aplicação do ideal, e não ao próprio ideal. Insistindo na absoluta separação da Igreja para com o Estado, os Batistas temem algo que cheire a controle político da religião, ou a controle religioso da política. E aqui está uma das maiores fontes da antipatia deles para com a religião católica, a qual pensam que defende ambas as coisas. Em 1215, foi o Arcebispo Católico Langton, de Cantuária, quem tomou a dianteira em arrancar do rei João aquele grande Documento de Liberdade, a Magna. Carta, uma de cujas provisões foi a de que a Igreja seria livre da interferência régia. E, quando, em 1534, Henrique VIII apertou os grilhões do Estado sobre a Igreja da Inglaterra, Católicos e Não-conformistas a um tempo sofreram as penas de oposição a uma Igreja de Estado subserviente a um dirigente político. Não menos oposta é a Igreja Católica ao controle religioso da política. Ela afirma, sim, que os dirigentes políticos devem formular suas leis de acordo com os princípios cristãos, e não com violação deles. Mas, dado que eles se conservem dentro da lei de Deus, ela insiste em que a administração temporal pertence aos dirigentes temporais e não constitui dever da Igreja. Nem tampouco, onde estiver em jogo uma liberdade de consciência puramente religiosa, poderia qualquer Batista discordar da doutrina católica corretamente entendida. Imenso respeito pela consciência individual caracteriza a teologia católica; tanto assim que ela ensina não somente dever o homem ser livre de seguir a sua própria consciência, mas também ser obrigado perante Deus a assim fazer mesmo se, por incapacidade para descobrir as suas verdadeiras obrigações, se tratar de uma consciência errônea. Uma vez mais, a discussão não versa realmente sobre os direitos soberanos da liberdade política e religiosa, mas sim sobre a natureza e escopo deles.

Mal-entendidos

O que acima foi escrito sugere mal-entendidos doutrinários da parte dos Batistas no tocante à natureza da Religião Católica. O Sr. Hugh Martin, no seu livro “Christian Reunion”, cândidamente admite a existência deles. Com efeito, escreve ele:

“A maioria dos cristãos conhece muito pouco história da Igreja, mas tende a herdar o modo de ver de antiqüíssimas controvérsias. A sua descrição daquilo que os de outras denominações realmente crêem está freqüentemente, sem esperança, fora de uso, se realmente alguma vez foi verdadeira”, p. 47.

Mas a dificuldade não se limita a inexatidões doutrinárias. Forças psicológicas mais profundas são envolvidas. Preconceitos desarrazoados, receios, e mesmo antipatias que bordam pelo puro ódio para com tudo o que é católico, não são raros entre muitos protestantes; e, na verdade, os Batistas, muitas vezes, estão na dianteira dos que denunciam a Igreja Católica e abertamente exprimem desconfiança dos seus membros para com ela. A atitude deles é inexplicável para os Católicos, e os próprios Batistas são incapazes de dar razões adequadas para ela. É um pendor herdado que não os deixa sequer olhar para a posição católica; ou, se eles o fizessem, não lhes permitiria estudá-la de maneira objetiva, desprendida e imparcial.

A questão toda do que sucedeu na reforma protestante do século dezesseis precisa de reconsideração numa atmosfera mais calma do que naqueles dias de acesa dissensão. As vistas superficiais, populares, da maioria das pessoas certamente não são exatas.

O Dr. Nathaniel Micklem, Congregacionalista Principal do Mansfield College, de Oxford, escreveu recentemente:

“Quanto alto-explosivo nós, Católicos Romanos e Protestantes, nos temos atirado uns nos outros, na triste controvérsia desses quatrocentos anos passados — e, geralmente, com pouco efeito! Controvérsia deve haver, para assuntos da Verdade sobretudo; mas entre nós deveria ela ser controvérsia de irmãos que procuram compreender, e que lamentam a nossa separação” (Prefácio ao “Catholics and Non-conformists”, de Fr. Vincent McNabb, p. 3).

Mas um julgamento equilibrado não é fácil de alcançar. Erguer-se acima dos preconceitos históricos é difícil em extremo. Contudo, o esforço para fazê-lo deve ser feito pelos que querem a verdade plena. No seu livro “The Protestant Reformation in Great Britain”, p. XV, Mr. Joseph Clayton, F. R. Hist. S., também um convertido ao Catolicismo, não hesita em escrever:

“Milhares de católicos contentam-se com repudiar a Reforma como a mera revolta, como a rebelião de homens maus inspirados pela cobiça e movidos pelo demônio a derrubarem a religião verdadeira. Milhares de protestantes complacentemente consideram a Reforma um grande despertar, uma obra gloriosa, abençoada por Deus e levada a efeito por bons homens divinamente inspirados. Ora, obviamente ambos esses julgamentos não podem ser verdadeiros. E, realmente, nenhum é verdadeiro, porquanto ambos são pinturas fantasiosas feitas de boa fé, porém falsamente delineadas por falta de conhecimento. Ignorância e preconceito — mas raramente falsidade deliberada — são responsáveis pelos erros — e pelo contrassenso — que passa como sendo história”.

Mas, neste livrinho, interessa-nos mais a doutrina do que a história; e devemos passar à consideração dos aspectos do ensino Batista que deixam de fazer justiça à religião cristã tal como o seu Divino Fundador entendeu que ela fosse.

Princípio falso

No nosso breve estudo da origem do movimento Batista, vimos que John Smyth e Thomas Helwys, que o fundaram na Inglaterra, e Roger Williams, que o fundou na América, haviam todos três pertencido originariamente à Igreja da Inglaterra. Mas, embora insatisfeitos com aquela Igreja estabelecida pelo Estado, para a solução dos seus problemas não cogitaram de voltar à Igreja Católica que os Anglicanos haviam abandonado. Tomaram como concedido o princípio protestante de que a Bíblia sozinha, interpretada por si mesmo por cada leitor sob a guia do Espírito Santo, era a única fonte autêntica de verdade cristã. E, agindo com base neste princípio, chegaram a conclusões infelizes que na realidade eram baseadas em fragmentos isolados da Escritura, e estes mesmos mal entendidos.

Tivessem-na eles, porém, estudado mais de perto, e teriam descoberto que a própria Bíblia nega que ela contenha um relato completo da revelação de Deus, e também que ela condena expressamente a teoria da interpretação privada. A grande incumbência final dada por Cristo aos seus Apóstolos foi a de que eles deveriam ensinar todas as Nações “a observarem todas as coisas que Eu vos mandei” (Mt 28, 20). Mas nem todas as coisas que Ele ensinou aos Apóstolos foram confiadas à escrita, de modo algum. São João conclui o seu Evangelho com estas palavras:

“Ainda há muitas outras coisas que Jesus fez, as quais, se fossem escritas de per si, o próprio mundo, penso eu, não poderia conter os livros que seriam escritos” (Jo 21, 25).

De fato, Jesus não mandou seus Apóstolos escreverem coisa alguma. Ensinou-os oralmente, e incumbiu-os de pregar o Evangelho. Os primeiros cristãos são descritos como “perseverando na doutrina dos Apóstolos” (At 2, 42). Esse ensino Apostólico teve de ser transmitido, como a tradição na Igreja, através de todas as idades subsequentes. Somente uns vinte ou trinta anos depois da fundação da Igreja é que parte do ensino Apostólico foi confiado à escrita; mas todo ele tinha de ser aceito, escrito ou não. Assim achamos São Paulo escrevendo aos Tessalonicenses:

“Irmãos, ficai firmes, e mantende as tradições que aprendestes, quer por palavra, quer por epístola nossa” (2 Tess 2, 14).

A Bíblia, pois, não é em si mesma um guia suficiente para a plenitude da fé cristã. E nem aprova a interpretação privada como um guia seguro para o conveniente entendimento de tudo quanto foi escrito. São Pedro nos adverte:

“Entendei primeiro isto, que nenhuma profecia da Escritura é feita por interpretação privada” (2 Ped 1, 20).

Pode ser arguido significarem essas palavras que os escritos sagrados não são devidos a um pensamento meramente humano, mas à inspiração divina. Significam, sim. Mas não significam somente isso. Conforme retamente acentua o Bispo Anglicano Ellicott, elas também significam que “o leitor não deve presumir interpretar privadamente aquilo que é muitíssimo mais do que pensamento humano comum”. Por isto, na epístola há pouco citada, São Pedro declara que, nos escritos de São Paulo, há “certas coisas difíceis de entender, as quais os ignorantes e versáteis adulteram, como o fazem também com as outras Escrituras, para sua própria perdição” (2 Ped 3, 16).

A própria razão nos diz que a Bíblia nunca poderia ter sido proposta como guia de cada homem para a verdade. Durante mais de mil anos antes da invenção da imprensa era impossível multiplicar exemplares da Bíblia em quantidades suficientes para possibilitar a cada um possuí-la. E que cada leitor devesse ser guiado pelo Espírito Santo na leitura da Escritura, isto é claramente confutado pelo fato de, desde a distribuição universal da Bíblia, sinceros e zelosos leitores dela terem chegado a uma multidão de conclusões colidentes e contraditórias. Se essa direção espiritual fosse uma realidade, o mesmo Espírito Santo teria levado a uma só e mesma verdade todos aqueles que confiavam na sua assistência!

Estas considerações forçam-nos a voltar à doutrina católica de que, embora a Escritura e a Tradição contenham os ensinamentos divinos, o nosso guia imediato para o conhecimento e compreensão deles é a Igreja estabelecida e garantida por Cristo. “Edificarei a minha Igreja”, disse Ele (Mt 16, 18). A essa Igreja, então representada na pessoa dos Apóstolos, Ele declarou:

“Quem vos ouve, a mim me ouve” (Lc 10, 16).

E, ainda, de cada membro dessa Igreja Ele disse:

“Se ele não ouvir a Igreja, seja como o pagão e o publicano” (Mt 18, 17).

Não admira que São Paulo tenha declarado que “a Igreja do Deus vivo” é “a coluna e o fundamento da verdade” (1 Tim 3, 15).

Prova Histórica

A própria menção da Igreja neste contexto introduz-nos em considerações da história. Cristo não disse somente “Edificarei a minha Igreja”, mas acrescentou que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela (Mt 16, 16). E prometeu aos Apóstolos — e, obviamente, aos sucessores legais destes, já que eles não poderiam continuar para sempre na terra:

“Eis que eu estou convosco todos os dias, até à consumação dos séculos” (Mt 28, 20).

A verdadeira Igreja de Cristo deve estar no caso de mostrar que foi pessoalmente estabelecida por Cristo; e que desde então tem estado neste mundo todos os dias, e que ainda está agora, como ainda há de durar até o fim do tempo. As Igrejas Protestantes têm todas o mesmo problema. Todas têm que encarar o fato de não haver Cristo dito que enviaria homens no século dezesseis para estabelecerem a sua Igreja. Todas elas têm de justificar a sua presunção de que as portas do inferno prevaleceram contra a Igreja Católica até então existente, forçando os homens a abandoná-la, e a fundar outras Igrejas diferentes, a despeito da própria e definida predição de Cristo de que tal estado de coisas nunca surgiria. E todas elas têm de dar razão de não terem estado neste mundo todos os dias desde Cristo, para agir em nome dEle através dos séculos. Os Batistas ingleses vieram à cena 1611 anos tarde demais para isso; os Batistas americanos independentemente estabelecidos, 1639 anos tarde demais.

Problema de Unidade

Quando nos volvemos para a natureza da Igreja como entendida pelos Batistas, absolutamente não achamos real correspondência com o Novo Testamento. Como acima vimos, foi adotado o princípio Congregacionalista, sendo cada grupo local independente de todos os outros, e não sujeito a qualquer autoridade ou disciplina além da de sua própria criação. E o resultado é, como ali apontamos, não haver uma única e unida Igreja Batista, mas apenas “Igrejas Batistas”.

Ora, o próprio Cristo disse: “Edificarei a minha Igreja”, e não “as minhas Igrejas”. E o verdadeiro modo de ver é, sem dúvida, dado pelo Rev. Dr. Goudge, Régio Professor de Teologia em Oxford, quando escreve:

“No Novo Testamento, crentes em Cristo não membros da única Igreja Apostólica visível não hão de ser achados em parte alguma. Com efeito, ouvimos nele falar das “Igrejas” tanto como da Igreja, mas essas Igrejas são muito diferentes das “Igrejas” de que ouvimos falar hoje em dia. As Igrejas da Oalácia, ou da Macedônia, são as comunidades cristãs, todas igualmente sob a autoridade de São Paulo, nas cidades Gálatas e Macedônias… A relação das Igrejas para a Igreja é como a relação das nossas agências de correio locais para o Correio Geral central. Há um só Correio, não sendo aqui permitida a empresa privada. Mas o Correio Geral tem as suas agências locais nas cidades e aldeias, e, tratando com elas, estamos tratando com o próprio Correio Geral. Em toda parte no Novo Testamento a Igreja é uma, e somente uma” (“The Church of England and Reunion”, p. 168).

Os Anglicanos não são os únicos que começam a se dar conta disto. Escrevendo como um Batista, Mr. Hugh Martin diz:

“O que está fora de questão é a insistência do Novo Testamento sobre a unidade como marca essencial da Igreja. Ela está implícita em cada metáfora usada, e acentuada em muitos lugares em termos os mais positivos. A unidade é inerente à verdadeira idéia da Igreja, tal como o Evangelho é um só e Deus é um só. O texto central de São João (17, 21) não fornece argumento para nenhum esquema particular da ordem de Igreja: todavia, ele fala de uma unidade visível tão expressa a ponto de ser discernível não somente pelo homem espiritual, mas também pelo mundo com os olhos de carne. Deve ela ser uma unidade manifestada em termos compreensíveis pelo homem de rua. ‘(Rogo) que eles todos sejam um: assim como Tu, Pai, estás em mim e Eu em Ti, possam eles estar também em nós: para que o mundo conheça que me enviaste’. É certamente uma questão irreal a que pergunta se a Igreja é visível ou invisível. A Igreja é e deve ser ambas as coisas” (“Christian Reunion”, pp. 67-68).

Conquanto o sr. Martin declare ser este o ensino positivo do Novo Testamento, os primitivos fundadores do movimento Batista passaram por cima disso inteiramente. Cogitaram só de uma Igreja invisível composta de homens e mulheres convertidos ligados por laços de unidade de modo algum visíveis na Igreja única. Nenhuma autoridade eclesiástica singular foi reconhecida. Em nome da liberdade, indivíduos e grupos de indivíduos podiam pretender independência de outros. O resultado foi toda sorte de variações, sem esperança de qualquer legislação universal, reivindicando cada nova seita resultante o nome de Batista. Um esforço de integração foi feito mediante o estabelecimento de Convenções que começam a afirmar cada vez mais autoridade sobre as Igrejas a elas filiadas; e uma Aliança Mundial Batista foi fundada em Londres em 1905. Porém muitas Igrejas Batistas mantiveram-se afastadas até mesmo dessas formas de associação; ao passo que os que as aceitam conservam a sua independência radical, de modo que não é possível mais do que um acordo voluntário para cooperação com fins práticos. Porém isto não é a unidade orgânica requerida pelo Novo Testamento. Hugh Martin admite que o Novo Testamento exige “uma unidade visível… manifestada em termos compreensíveis pelo homem de rua”. Não é significativo que todos os homens reconheçam a unidade visível e orgânica da Igreja Católica no mundo inteiro? E ainda mais significativo não é que não a reconheçam em nenhumas outras Igrejas que não a Igreja Católica?

“Batismo do Crente”

Pode-se dizer que, embora como organizações de Igreja os Batistas sejam independentes uns dos outros, existindo como congregações locais e autônomas, todos estão unidos na doutrina do batismo só de adulto, e na negação da validade do batismo das crianças. Todavia, esse testemunho unido, em favor de uma doutrina particular, não os tornaria o corpo orgânico único reclamado pelo ensino do Novo Testamento; nem compensaria as divergências em outras e mais vitais matérias doutrinárias.

Mas que seria se, deixando de parte estas considerações, só a insistência Batista sobre o batismo adulto fosse errônea? Sem embargo, indubitavelmente este característico principal da religião deles está errado.

Os próprios Batistas têm de admitir que não há no Novo Testamento preceito expresso limitando o batismo só aos crentes adultos. A doutrina deles baseia-se inteiramente em ilações injustificadas e em má vontade para aceitar qualquer eficácia inerente aos ritos sacramentais. Eles citam a exigência de João Batista: “Arrependei-vos e sede batizados”; e o ensinamento de Cristo: “Quem crer e for batizado será salvo”. Então eles inferem que, visto as crianças não poderem crer e arrepender-se, não podem validamente receber o batismo.

Mas desdenham o fato de que tanto João Batista como Cristo se dirigiam a adultos, em cuja fé e arrependimento residiam condições absolutamente necessárias para a recepção da regeneração batismal. A conclusão lógica, à luz do ensino batismal em toda parte do Novo Testamento, é que os que não são adultos não estão sujeitos a essas mesmas condições.

Enquanto isso, muitíssimo mais solidamente fundada é a ilação de que, logo desde o começo, o batismo era administrado às crianças. São Paulo nos diz que o batismo é a circuncisão dos cristãos (Col 2, 11). Na Lei Antiga, a circuncisão era administrada às crianças. Deverá a Nova Lei ser menos perfeita do que a Antiga, não contendo rito purificador para as crianças? Além disso, os Atos (16) comemoram o batismo de duas famílias na Igreja por São Paulo; e não há razão para supor que essas famílias se compusessem só de adultos.

Porém a dificuldade de raiz é talvez teológica. Os Batistas nutrem preconceito contra qualquer idéia de regeneração batismal. Não vêem como um rito sacramental, mesmo instituído por Cristo, possa realizar isso. Insistem em que a regeneração deve ter lugar pela fé e arrependimento antes do batismo, sendo o rito mero símbolo de uma mudança de coração já ocorrida. Contudo, Cristo mesmo atribui à própria ação sacramental o conferimento da nova vida de graça. Diz Ele:

“Se alguém não renascer da água e do Espírito Santo, não entrará no reino de Deus” (Jo 3, 5).

São Paulo, por sua vez, declara expressamente que nós somos salvos “pelo lavacro de regeneração, e pela renovação do Espírito Santo” (Tit 3, 5). E quem pode crer que logo desde o começo, e através de todas as idades, os cristãos tenham caído em erro sobre este ponto vital, e que aos Anabatistas na Alemanha, a John Smyth e Thomas Helwys na Inglaterra, e a Roger Williams na América, foi deixado, ao cabo de 16 séculos, o descobrirem a real verdade cristã?

Será, pois, de admirar que os próprios Batistas estejam ficando cada vez mais incertos da sua situação a respeito do batismo? A sua doutrina não-escriturística está levando-os a duvidar até mesmo da necessidade do batismo. Entre eles, muitas Igrejas “abertas” já não insistem mais sobre ele como condição para participação nelas; e seria realmente estranho se aqueles que começaram apoiando tudo no batismo acabassem desprezando-o inteiramente!

A Imersão

Encaremos agora outro aspecto deste assunto. Tratando sobre o modo como o batismo deveria ser administrado, os Batistas dizem que ele deve ser por completa imersão, para ser válido. Uma vez que, de acordo com a explicação deles, o batismo não faz nada, mas apenas simboliza uma regeneração já ocorrida, é difícil ver como realmente importe para eles que ele seja válido ou não. Talvez seja por isto que eles se estão tornando menos insistentes até mesmo sobre a recepção dele.

Todavia, ainda insistem em que, se ele for administrado, deve sê-lo por imersão, argumentando que a palavra grega “batizar” só pode significar “mergulhar”; que, em todo caso, o Novo Testamento só registra o batismo por imersão; e que o simbolismo de ser sepultado com Cristo e com Ele ressuscitado para uma nova vida é perdido se for usado qualquer outro método que não o de imersão. São, porém, verdadeiras estas afirmações?

O argumento tirado do significado da palavra grega “batizar” já foi definitivamente provado como infundado. No grego não-bíblico, verificou-se que a palavra tem uma variedade de significados, sendo usada para o manchar dos dedos por suco de fruta, para a tintura de água pelos tintureiros, e para o lambuzar das mãos com pintura! Na versão grega dos Setenta do Antigo Testamento, a palavra é usada como “molhado com o orvalho do céu”. No grego bíblico do Novo Testamento a palavra é usada freqüentemente no sentido de lavar; e, muitas vezes, metaforicamente. Tanto os sofrimentos de Cristo durante a sua paixão como a descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos no Pentecostes são descritos como “batismos”. Portanto, enquanto a palavra grega “batizar” pode significar “imergir”, nem sempre nem necessariamente significa isso.

Quanto aos batismos reais registrados no Novo Testamento, absolutamente não há certeza de terem sido por imersão. São João Batista poderia ter administrado o seu rito derramando água sobre as pessoas quando elas ficavam nas águas rasas próximas às margens do Jordão. Depois do primeiro sermão de São Pedro, para mais de três mil pessoas, foram batizadas ali mesmo em Jerusalém, e investigação feita sobre o abastecimento de água da cidade naquele tempo mostra que a imersão teria sido praticamente impossível. O próprio São Paulo foi batizado na casa de Ananias. Mais tarde, quando em prisão, batizou ali o seu carcereiro. Em nenhum desses casos teriam as circunstâncias permitido a imersão. E nem aos próprios doentes e pessoas moribundas deveria ser recusado o batismo sob o pretexto de não poderem eles ser tirados dos seus leitos de doentes para serem mergulhados.

Historicamente, é absolutamente certo que, logo desde o começo os cristãos reconheceram como alternativa válida para a imersão o derramar água sobre os que deviam ser batizados; e eles sabiam que o simbolismo espiritual do sepultamento e da ressurreição com Cristo era plenamente realizado no lavacro da morte do pecado e na ressurreição para a nova vida de graça.

Portanto, também aqui é novamente impossível crer que toda a Igreja Cristã houvesse caído em erro durante séculos, e que aos Batistas fosse deixado o descobrirem a verdade real somente depois de 1.600 anos! E, se isso não fosse estranho, e se o batismo por imersão fosse a única forma de batismo válida, acaso os verdadeiros fundadores do movimento Batista na Europa teriam ignorado o fato? Se o Espírito Santo é responsável pela doutrina Batista de que só o batismo adulto é válido, por que então o mesmo Espírito Santo não tornou claro aos fundadores John Smyth e Thomas Helwys que o rito seria nulo e vazio se não fosse administrado por imersão? Todavia, nenhum deles soube nada disso. Ambos receberam o rebatismo por meio de água derramada sobre eles; e ambos conferiram a outros o rito do mesmo modo. John Smyth morreu em 1612; Thomas Helwys, em 1616. Os Batistas Particulares decidiram, em 1644, que a imersão era essencial; os Batistas Gerais, em 1650. E para o ensino de ser essencial a imersão absolutamente não há garantia real.

Conclusão

Este livreto tratou principalmente da história e das afirmações positivas dos Batistas, pelas quais eles se creem justificados de manter as suas próprias Igrejas, à parte e distintas da Igreja Católica. Mas, além deste aspecto positivo da situação, há também um aspecto negativo, a rejeição por eles dos ensinamentos e práticas próprias ao Catolicismo. Por outras palavras, um Batista explicaria a sua incapacidade de vir a ser Católico não somente por afirmar a sua crença em doutrinas que a Igreja Católica rejeita, como também pela sua falta de crença em muitos ensinamentos que essa Igreja afirma.

Ora, seria impossível neste livrinho empreender uma exposição das doutrinas e práticas especificamente católicas que parecem inaceitáveis aos Batistas, dando todas as razões para elas, e respondendo às dificuldades a elas concernentes. Este livrinho, afinal de contas, propõe-se ser um exame da posição Batista, e não da posição Católica. Portanto, um estudo positivo do Catolicismo deveria ser procurado noutro lugar.

Mas, se o que nestas páginas foi dito evidencia a fraqueza das pretensões Batistas, sugerindo a necessidade da séria reconsideração delas, seria errado não sugerir também onde deva ser achada a verdade que todos os homens de boa vontade desejam. Descobrir que alguém está andando em direção errada não é necessariamente saber a direção certa. E é esta última, acima de tudo, que se precisa realmente saber. E ela deve ser achada na religião Católica.

Histórica, escritural e logicamente, nenhuma forma de Protestantismo pode subsistir. Cada uma das formas do Protestantismo, entre as quais se situam as congregações Batistas originou-se pelo menos dezesseis séculos tarde demais para serem a Igreja dada ao mundo pelo próprio Cristo. Todas pretendem estar baseadas só na Bíblia, embora a própria Bíblia não pretenda conter um relato adequado e completo da revelação cristã; e todas operam sobre o princípio falaz de poder cada leitor chegar infalivelmente ao verdadeiro sentido do que está escrito na Bíblia, sem necessidade de qualquer direção autoritária oriunda da Igreja. Sem embargo, os frutos desse princípio na prática foram caos doutrinário e divisões intérminas, sem nada da consistência reclamada pela verdade, e sem nenhum traço da unidade, entre eles mesmos, que deveria caracterizar os seguidores de Cristo.

Por outro lado, historicamente só a Igreja Católica remonta diretamente a Cristo e aos Apóstolos, e só ela pode herdar a promessa que Ele fez de que as portas do inferno não prevaleceriam contra a sua Igreja, e de que Ele estaria com ela todos os dias até o fim do mundo.

Escrituristicamente, só a Igreja Católica está em completo acordo com tudo o que está contido na Palavra de Deus; só ela manifesta essa consistência nos seus ensinamentos reclamada pela verdade; só ela exibe essa unidade entre todos os seus membros, através do mundo, a ser esperada de um só rebanho sob um só pastor, como Cristo pretendeu que o fosse a sua Igreja. Só ela proclama saber infalivelmente o que quer, e oferecer aos homens a certeza, a ser esperada de uma Igreja divinamente estabelecida. Nela, os poderes dos Apóstolos, poderes docentes, santificadores e controladores, para o bem-estar espiritual dos homens, têm sido continuados por sucessão ininterrupta; poderes que deveriam ser úteis aos cristãos do século vinte como aos do século primeiro, ou de qualquer outra idade na era cristã. Nela é achada a perfeição do culto sacrifical de Deus instituído pelo próprio Cristo, e todos os sete canais sacramentais por Ele fornecidos para a transmissão mais certa e mais eficaz da graça às almas dos homens.

Só a Igreja Católica, portanto, pode comprovar as suas pretensões a ser, neste mundo, a única forma de religião cristã completamente verdadeira; só ela pode dizer-nos definitivamente o que deve ser crido e feito pelos que desejam realmente seguir Cristo; só ela pode oferecer-nos todos os auxílios espirituais necessários em forma de direção, de inspiração e de assistência, para conhecermos a verdade plena e vivermo- la nas nossas vidas cotidianas. Brilhantes sábios no decorrer das idades acharam na Igreja Católica a luz e a verdade para satisfazer suas almas; os santos mais perfeitos trilharam os seus caminhos rumo à perfeição; fracos e frágeis pecadores acharam-na sempre pronta a dispensar misericórdia e perdão em nome de Deus, e a oferecer uma renovada esperança de salvação a todos os necessitados do Médico Celestial. Contentar-se com alguma coisa que não a religião católica é contentar-se com pouquíssimo demais; com muito menos do que Cristo Nosso Senhor e Nosso Redentor pretendeu que possuíssemos.

Palavras tais podem parecer estranhas àqueles cujas idéias sobre a Igreja Católica têm sido diferentes destas, ou mesmo inteiramente opostas a elas. Mas, se os Protestantes têm boas razões para duvidar da solidez da sua própria posição, acaso não haverá lugar para duvidar também da exatidão das impressões que lhes foram dadas, ou que eles formaram por si mesmos, a respeito do Catolicismo? E a própria declaração das pretensões católicas não é um convite a um fervoroso e piedoso estudo delas? Dezenas de milhares de convertidos à Igreja Católica dir-vos-ão que atender a esse convite ver-se-á mais tarde na vida ter sido o primeiro passo rumo à plenitude da luz, refrigério e paz que Cristo veio outorgar às almas dos homens.

Os Batistas no Brasil

Em 1859 a Junta das Missões Estrangeiras apresentou à Convenção Batista do Sul dos EE.UU. as vantagens de um trabalho no Brasil, alegando entre outras coisas o depoimento do protestante Kidder:

“Estou firmemente convicto de que não há no globo outro país católico romano de sentimentos tão tolerantes e liberais para com os protestantes” (“Brazil and the Brazilians”, p. 148).

Na realidade a infiltração batista efetivou-se no Brasil só mais tarde, quando algumas famílias do Sul dos EE.UU., desanimadas pelos efeitos trágicos da guerra entre o Norte e o Sul, procuraram o Brasil, então em fase de acentuado progresso, e, com a permissão liberal do governo imperial, fundaram a colônia americana de Santa Bárbara, na Província de São Paulo, onde se levantou, a 10 de setembro de 1871, a primeira igreja batista. Mas a primeira igreja batista, organizada com o fim de conquistar os brasileiros, foi a da Bahia, em 15/10/1882. E em 1889, quando se proclamava a República, os batistas possuíam 8 igrejas, com 312 membros. A obra no Brasil só pôde se firmar com auxílio de pessoal norte-americano e dos dólares (só no final do século passado foram destinados 5.000 dólares para a Bahia e 10.000 para o Rio).

Apesar disso, a redução de auxílios vindos de Richmond ocasionou, em 1896, o cisma na primeira igreja da Bahia. Até hoje operam na Bahia três organizações batistas: a Convenção Batista Baiana, com 87 igrejas, a Associação Batista da Bahia, com mais de 40 igrejas, e a Missão Independente, com 5 igrejas.

O passo decisivo para a extensão do trabalho batista no Brasil foi a fundação, em 1900, da Casa Editora Batista, no Rio, tendo como diretor o Dr. Entzminger. Dois anos mais tarde, no Recife, o denodado missionário Salomão Oinsburg organizava o Seminário Teológico do Norte. O Seminário Teológico batista do Sul só foi fundado em 1908, como um Departamento do Colégio Batista do Rio de Janeiro. Com a organização da Convenção Batista Brasileira, em 1907, passava o governo batista oficialmente para as mãos dos nacionais, sem romper os laços de união e de proteção da Junta de Richmond. Até 1936, quando se firmaram as “Novas Bases de Cooperação”, perdurou a divisão entre os batistas brasileiros de origem norte-americana. Na Convenção de Recife, em 1936, eram apresentados os seguintes dados estatísticos:

  • Membros de Igrejas: 43.306
  • Igrejas: 539
  • Pastores e missionários: 250
  • Evangelistas: 78
  • Templos: 315
  • Pontos de pregação: 1.178
  • Escolas dominicais: 759

Desde que se organizara a Convenção, há 28 anos atrás, o crescimento era de 500%.

Recentemente, o fato mais significativo na história dos batistas foi a organização, em junho de 1953, na Bahia, da Associação Batista do Brasil, patrocinada pela North American Baptist Association (NABA), que sustenta 5 casas de missionários no Brasil. Várias igrejas da Bahia, Pernambuco e São Paulo aderiram à nova Associação, preferindo, no dizer do Rev. Ebenezer G. Cavalcanti, ao imperialismo da Junta da Richmond, com a qual trabalha a Convenção Batista Brasileira, o espírito neo-testamentário tipicamente batista da NABA. A questão ficou ainda mais azeda em vista do proselitismo da Associação com igrejas filiadas à Convenção Batista Brasileira. Em 24 de julho de 1956 o mesmo Rev. Ebenezer G. Cavalcanti lidera um movimento de retorno à Convenção Batista Brasileira…

As estatísticas de 1954 da Convenção Batista Brasileira acusam:

  • Igrejas: 1.218
  • Congregações: 1.358
  • Pastores: 660
  • Membros: 135.590

Esses membros são os “arrolados”, os adultos batizados. Se contarmos os filhos que estão sob a influência batista, o número ultrapassa os 200.000.

A mais importante de outras organizações batistas é a Convenção das Igrejas Evangélicas Batistas Independentes do Brasil, com sede em Porto Alegre. Essa Convenção é o fruto do trabalho da Junta Missionária de Orebo, Suécia (fundada em 1829), que enviou ao Brasil seu primeiro missionário, o Rev. Erik Jansson, em 1912, o qual se localizou no Rio Grande do Sul. Em 1952 as igrejas batistas independentes se constituíram em Convenção. E por que se denominam independentes? Simplesmente porque não querem ligar-se às “Igrejas Batistas Regulares, que têm afrouxado por demais a sua disciplina e o mundanismo tem tomado conta dos seus arraiais” (cf. Boletim n.° 1 da Convenção, 1954, p. 10). Como fundadoras da Convenção figuram 18 igrejas, todas do Rio Grande do Sul. Em 1954 já eram 22 no Rio Grande do Sul, 2 em Santa Catarina e 4 em São Paulo. Neste Estado chamam-se também Igrejas Evangélicas Batistas Filadélfia; no Rio Grande do Sul, muitas delas se chamam também de Betei.

Existem ainda, no Brasil, várias igrejas batistas livres, bem como igrejas batistas alemãs, letas e russas.

Perguntas Frequentes sobre os Batistas

Qual o signifnicado do nome Batistas?

Os Batistas devem o seu nome ao seu ensino de que o Batismo cristão só pode ser recebido por crentes adultos, como um símbolo do seu parentesco pessoal com Cristo; e que ele deve ser administrado somente por imersão.

Qual o significado de Anabatistas?

O nome Anabatistas, que significa rebatizantes, foi-lhes dado por causa do ensinamento de que todas as pessoas que haviam sido batizadas em criança de modo algum estavam validamente batizadas; e que deviam ser convertidas novamente a Deus, e ser rebatizadas como adultos.

Quem fundou a religião Batista?

John Smyth é tido como fundador dos Batistas em conjunto de Thomas Helwys que fundou a primeira Igreja Batista em Londres, após a morte de Smyth.

Quem são os Batistas Originais e por que este nome?

São os Batistas fundados por Smyth e Helwys e recebiam este nome pelo repúdio à doutrina de Calvino acerca da predestinação só dos eleitos, sustentando que Cristo morreu por todos os seres humanos em geral.

O que é Igreja para um Batista?

“Igreja”, para um Batista, significa apenas uma congregação local; de modo que, na realidade, não há “Igreja Batista”, mas somente “Igrejas Batistas”. É uma associação voluntária de homens e mulheres convertidos, composta só de crentes.